terça-feira, 26 de maio de 2020

MARIA E O ESPÍRITO SANTO


Pe. Raniero Cantalamessa, O.F.M. Cap.

Nos Atos dos Apóstolos, depois de ter listado os nomes dos onze apóstolos, o autor continua com estas palavras: “Todos eles perseveravam unanimemente na oração, juntamente com as mulheres, entre elas Maria, a Mãe de Jesus, e os irmãos dele” (Atos 1,14).

Em primeiro lugar, devemos nos desvencilhar de uma interpretação errada. Também no Cenáculo, como no Calvário, Maria é mencionada estando junto com algumas mulheres. Poderíamos dizer, portanto, que ela está lá como uma delas, nem mais nem menos que isso. Mas aqui a qualidade de “Mãe de Jesus”, logo após a menção do seu nome, muda tudo e coloca Maria em um nível completamente diferente, superior não apenas ao das mulheres, mas também dos apóstolos.

O que significa Maria estar lá como a mãe de Jesus? Significa que o Espírito Santo que está por vir é “o Espírito de seu filho”! Entre ela e o Espírito Santo há um laço objetivo e indestrutível que é o próprio Jesus que eles geraram juntos.

De Jesus, no Credo, diz-se que ele “se encarnou pelo Espírito Santo, no seio da Virgem Maria”. Maria não está, portanto, no Cenáculo simplesmente como uma das mulheres, embora no exterior não haja nada que a distinga das outras, nem ela faz qualquer coisa para se distinguir delas.

Maria, que se apresenta aos pés da cruz como Mãe da Igreja, aqui, no Cenáculo, aparece para nós como madrinha. Uma madrinha forte e segura. A madrinha, para poder desempenhar este papel, deve ser alguém que já tenha recebido o batismo. Assim foi Maria: uma batizada no Espírito Santo que agora aguarda a Igreja ser batizada no mesmo Espírito.

Maria, que nos é apresentada nos Atos como aquela que ora com perseverança na espera do Espírito Santo, é a mesma que o evangelista Lucas nos apresenta, no início de seu Evangelho, como aquela sobre quem o Espírito Santo desceu.

Alguns elementos sugerem um estreito paralelo entre a vinda do Espírito Santo sobre Maria na Anunciação e a chegada do Espírito à Igreja em Pentecostes, seja pelo paralelismo desejado pelo evangelista, seja pela correspondência devida entre as duas situações.

Para Maria, o Espírito Santo é prometido como “a força do Altíssimo”, que “descerá” sobre ela (cf. Lc 1, 35); aos apóstolos ele é prometido igualmente como “poder” que “desce” sobre eles “do alto” (cf. Lc 24, 49; Atos 2,8). Após receber o Espírito Santo, Maria começa a proclamar (megalynei), numa linguagem inspirada, as grandes obras (megala) realizadas nela pelo Senhor (cf. Lc 1,46.49); do mesmo modo, os apóstolos, tendo recebido o Espírito Santo, começam a proclamar as grandes obras (megaleia) de Deus em várias línguas (cf. 2, 11). Até mesmo o Concílio Vaticano II reúne os dois eventos, quando diz que no Cenáculo “vemos Maria implorar com sua oração o dom do Espírito, que na Anunciação a havia coberto com sua sombra”.

“O Espírito Santo descerá sobre ti, e a força do Altíssimo te envolverá com a sua sombra” (Lc 1,35). Todos aqueles a quem Maria é enviada, depois desta descida do Espírito Santo, são por sua vez tocados ou movidos pelo Espírito Santo (cf. Lc 1, 41; 2, 27). É certamente a presença de Jesus que irradia o Espírito, mas Jesus está em Maria e age através dela. Ela aparece como a arca ou templo do Espírito, como a imagem da nuvem que a cobriu com sua sombra também sugere. De fato, recorda a nuvem luminosa que, no Antigo Testamento, era sinal da presença de Deus ou da sua vinda na tenda (cf. Ex 13, 22; 19, 16).

A Igreja reuniu esse dado revelado e colocou-o rapidamente no coração de seu símbolo de fé. Desde o final do segundo século, o artigo no qual Jesus “nasceu do Espírito Santo e de Maria Virgem” está presente no chamado Símbolo Apostólico. O Concílio Ecumênico de Constantinopla de 381 – aquele no qual foi definida a divindade do Espírito Santo – também introduziu o artigo no credo Niceno-Constantinopolitano, onde lemos sobre Cristo que “se encarnou pelo Espírito Santo, no seio da Virgem Maria”.

É, portanto, uma questão de fé aceita por todos os cristãos, tanto do Oriente quanto do Ocidente, por católicos e protestantes. É uma base segura e não pequena se encontrar a unidade dos cristãos em torno da Mãe de Deus. Maria parece estar ligada ao Espírito Santo por um laço objetivo, pessoal e indestrutível: a própria pessoa de Jesus que, juntos, mesmo com contribuições muito diferentes, eles geraram. Para manter Maria e o Espírito Santo separados, é necessário separar o próprio Cristo, em quem suas diversas operações se materializaram e se tornaram objetivos para sempre.

Jesus uniu Maria e o Espírito Santo mais do que um filho une pai e mãe, porque se toda criança, com sua simples existência, proclama que pai e mãe se uniram por um instante segundo a carne, esse filho que é Jesus proclama que o Espírito Santo e Maria se uniram “segundo o Espírito”, portanto, de maneira indestrutível. Também na Jerusalém celeste Jesus ressuscitado permanece aquele que foi “gerado do Espírito Santo e da Virgem Maria”. Também na Eucaristia, recebemos aquele que foi “gerado do Espírito Santo e da Virgem Maria”.





Nenhum comentário:

Postar um comentário