XVI DOMINGO DO
TEMPO COMUM
Por Enzo Bianchi*
Continuamos a leitura do discurso
parabólico de Jesus no Evangelho segundo Mateus. Depois da
parábola do semeador e da sua explicação, eis outra parábola ainda referente à
semeadura. Mas, se na primeira, a ênfase caía nos diversos terrenos nos quais
caía o grão bom, aqui, ao contrário, a atenção vai para o objeto da semeadura:
boa semente ou má semente.
Ouçamos, portanto, a narração:
“O Reino dos Céus é como um homem que
semeou boa semente no seu campo. Enquanto todos dormiam, veio seu inimigo,
semeou joio no meio do trigo, e foi embora. Quando o trigo cresceu e as espigas
começaram a se formar, apareceu também o joio.”
Assim acontece na vida dos seres humanos e na história do mundo. Há uma semeadura de grão bom, que é feita durante o dia pelo agricultor no seu campo para obter fruto, um fruto abundante e bom. Às vezes, porém, acontece que alguém faz outra semeadura: e a faz de noite, às escondidas, porque sabe que está cometendo uma ação maléfica. Ele semeia joio, erva que não dá fruto, mas explora o terreno e acaba sufocando a boa semente. Assim, em certo momento do crescimento do trigo, aparece também essa erva daninha... Então, o campo não é mais uma esperança de boa colheita, mas parece ameaçado, de modo que o fatigante trabalho não dará o fruto previsto.
Essa descoberta surpreende e entristece
o agricultor. Como é possível? Por quê? O que aconteceu e o que o agricultor
não viu, não observou? São perguntas que dizem respeito ao mal presente ao lado
do bem. Em certo ponto da nossa existência, nós também descobrimos a presença
do mal: quem o introduziu em nós e ao nosso redor? Por que não o percebemos?
É uma experiência dolorosa também, que
requer um discernimento sobre nós e sobre a nossa vida: acolhemos a palavra de
Deus, meditamo-la e conservamo-la, também tentamos realizá-la (cf. Mt 13,
22-23), mas eis que aparece o mal como obra das nossas mãos.
É também a experiência da comunidade cristã,
da Igreja, que é um corpus
mixtum, porque fazem
parte dela fortes e fracos, simples e eruditos, justos e pecadores, fiéis e
infiéis. Não era assim também a pequena comunidade de Jesus? No seu
interior, houve quem traiu, quem renegou, quem era medroso e covarde, quem
fugiu...
Quem lê situações como essas se
assemelha aos servos da parábola, que, dada a situação do campo, interrogam o
dono sobre o trigo semeado; e, sabendo que um inimigo fez a operação de
semeadura do joio, propõe extirpar essa erva daninha. Aos seus olhos, tal
separação é necessária para que o trigo possa crescer sem ser privado de
substâncias vitais e de espaço.
Mas o dono tem outra ótica: a da
paciência, da espera paciente de um tempo em que se possa separar a erva
daninha da boa semente, sem prejudicar esta última. Ele sabe que, no desejo de
erradicar o mal, existe o risco de erradicar ou pelo menos de desestabilizar
também o bem. É preciso paciência por parte do dono e, por parte da boa
semente, um exercício de mansidão, que aceita ao seu lado a presença de plantas
más.
É claro, virá a hora da colheita, do
juízo – como Jesus esclarece melhor na explicação da parábola,
solicitada pelos discípulos – e, então, haverá a separação, porque o pão será
produzido com o trigo bom, enquanto o joio será queimado: mas, enquanto isso,
há a necessidade de espera paciente e de mansidão.
A intransigência, a busca da pureza a
todo custo, a rigidez de querer uma comunidade composta totalmente por justos é
perigosa, porque as fronteiras entre o bem e o mal, entre justiça e injustiça,
às vezes, não são tão claras. Essa primeira parábola é uma advertência sobre o
nosso estilo de vida eclesial, pedindo aquela paciência que sabe adiar um ato
legítimo, mesmo por parte daqueles que são competentes, como os ceifadores, e
enviá-lo para a hora que não nos pertence, a do juízo. Sim, para as pessoas que
creem, há tentações ao mal justamente quando “veem” o bem: intolerância,
partidarismo, integralismos, militância contra... É a tentação do catarismo:
somente puros!
Depois, Jesus propôs outra
pequena parábola:
“O Reino dos Céus é como uma semente de mostarda que um homem pega e semeia no seu campo.”
Aqui, ele chama a atenção para a
pequenez da semente de mostarda: uma planta do pomar, um arbusto cuja semente é
muito pequena, minúscula. Porém, se for semeada no campo, ela cresce, cresce
até se tornar uma planta com ramos nos quais os pássaros podem fazer os seus
ninhos.
A atenção é posta sobre o momento
inicial e sobre o final, e, portanto, a mensagem deve ser apreendida na
oposição “o menor/o maior”. É surpreendente, em certo sentido até mesmo
escandaloso, mas é assim: o reino dos céus pertence a realidades que não se
impõem por grandeza, quase não se veem, como o grão de mostarda. No início, a
realidade é realmente pequena, e os homens não parecem não levar isso em conta
nem têm a possibilidade de apreciá-la. No entanto, pequenas realidades têm
inscrita dentro de si a capacidade de ser uma força, de instaurar uma dinâmica
que se manifesta em um crescimento aparentemente prodigioso, especialmente se
considerarmos a pequenez inicial da semente.
Jesus mostra que está ciente de que
esse início da pregação do Reino quase não era observável, mas também sabe que
haverá um crescimento e a presença do Reino se fará sentir quando, tendo
crescido como uma árvore, oferecer os seus ramos aos gentios, aos não judeus,
aos pagãos, para que eles também possam habitar nos ramos do Reino.
E atenção: a dýnamis (cf. Rm 1, 16), o poder
imperceptível da semente de mostarda, que a faz se tornar uma árvore, não se
identifica com os cristãos, mas com o Reino, de modo que a árvore não é a
Igreja, mas o Reino. E, ainda, não é a árvore que dá força à semente, mas é a
semente que, com a sua força, se desenvolve em árvore!
Assim acontece com o reino dos céus: no
hoje dos fiéis, ele sempre parece ser uma realidade pequena, mas, no futuro,
será manifestada a sua grandeza. O discípulo deve olhar para o contraste entre
o hoje e o futuro, mas também deve entender que o futuro depende precisamente da
pequenez do hoje.
A parábola, portanto, é revelação,
levanta o véu sobre o fato do reino e declara que os critérios de grandeza e de
aparência, critérios mundanos, não devem ser aplicados à história do reino de
Deus: a força do Reino não deve ser confundida com o fascínio da grandeza,
conjugável, de vez em quando, como número, prestígio, poder...
Na mesma perspectiva segue a parábola ou, melhor, a semelhança do fermento, voltada novamente a mostrar a relação pequeno/grande: uma pitada de fermento faz fermentar “três medidas”, isto é, cerca de 40 kg de massa!
Nas cartas paulinas, há uma imagem
negativa do fermento (1Co 5, 6-8; Gl 5, 9), mas aqui a semelhança é invertida,
subverte tal concepção, e, assim, a atenção do discípulo é capturada ainda mais
eficazmente: o bem também é contagioso, não só o mal.
Por outro lado, se, na parábola
anterior, a árvore que cresceu a partir da semente era visível, aqui o fermento
desaparece na farinha, quase como que dizendo que aquela força que entrou na
massa a faz fermentar justamente desaparecendo nela.
Conhecemos bem essa imagem, muitas vezes
citada também nas homilias e na catequese, mas é preciso ser vigilante e
inteligente: não ceder à metáfora fácil dos cristãos como fermento do mundo,
porque o fermento é o Reino, é ele a força que faz fermentar o mundo, não os
cristãos. Estes não são nem o fermento nem a massa, mas são aqueles que o
fermento já fez fermentar para ser “pão cozido” (como se lê no “Martírio
de São Policarpo” 15, 2), despedaçado pelo mundo e oferecido ao Senhor.
Na conclusão das duas parábolas e da
semelhança, eis a anotação do narrador, o evangelista Mateus:
“Tudo isso Jesus falava em parábolas às
multidões. Nada lhes falava sem usar parábolas, para se cumprir o que foi dito
pelo profeta: ‘Abrirei a boca para falar em parábolas; vou proclamar coisas
escondidas desde a criação do mundo’ (Sl 77, 2).”
Essa citação se encontra no Salmo
77, atribuída a Asaf (Sl 77, 1), profeta cantor que medita sobre a
vinda de Davi (cf. 2Cr 29, 30), o servo de Deus pastor de Israel. Ele diz
que proclama, literalmente, “os enigmas dos tempos antigos” (Sl 77, 2). Mateus
prefere falar de “coisas escondidas desde a criação do mundo”, mas a ideia
expressada é semelhante. Deus escondeu a realidade antes da criação do mundo, para
a revelar no tempo oportuno: de fato, se se esconde algo (justamente como o
fermento, literalmente, “está escondido” na farinha), é para reencontrá-lo mais
tarde!
E assim somos confrontados com a
revelação de Jesus, mistério inesgotável, no qual há realidades escondidas
a serem descobertas, a serem acolhidas, a serem invocadas da parte do Senhor
como revelação plena, levantada do véu. E tudo isso para que possamos conhecer
mais a ele, o Senhor Jesus Cristo (cf. Fl 3, 10), e, conhecendo-o, amá-lo mais,
em uma íntima comunhão de vida, capaz de nos transformar sem que saibamos como
(Mc 4, 27).
IHU - Tradução Moisés Sbardelotto.
*Enzo
Bianchi é monge italiano e fundador da Comunidade de Bose.
Fonte: https://domtotal.com/noticia/1173008/2017/07/deixai-que-o-joio-e-o-trigo-crescam-juntos/
Parábolas....São palavras de vida para reflexão individual e necessidade de cada um de nós...entendo eu
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