Ida de Boulos ao 2º turno em São Paulo sinaliza avanço de esquerda jovem pelo país.
Mariana Schreiber
De Brasília para a BBC
News Brasil
Após a
onda de direita que varreu o Brasil em 2016 e 2018, o primeiro turno da eleição
municipal de 2020 foi palco para algumas lideranças jovens, com menos de 40
anos, despontarem no campo da esquerda.
Liderando esse fenômeno, o candidato a prefeito pelo PSOL em São Paulo, Guilherme Boulos, de 38 anos, alcançou 20% dos votos e vai disputar o segundo turno com o atual governante da cidade, Bruno Covas (PSDB), que somou 32%.
Com uma longa trajetória na militância por moradia popular e a projeção nacional alcançada como candidato do PSOL à Presidência em 2018, Boulos conseguiu agregar a maioria dos votos de esquerda da capital paulista, espaço que há décadas era ocupado pelo PT — o candidato petista, Jilmar Tatto, ficou com apenas 8,55% dos votos, em sexto lugar, atrás do ex-governador de São Paulo, Márcio França (PSB), que teve 13,65%, de Celso Russomano (Republicanos), que somou 10,5%, e de Arthur do Val (Patriota), com 9,78%.
Outra candidatura jovem da esquerda que se beneficiou da projeção alcançada há dois anos foi a de Manuela D'Ávila (PCdoB), que na disputa em Porto Alegre levou 29% votos e vai disputar o segundo turno com Sebastião Melo (MDB), que teve 31%.
Manuela D'Ávila retirou sua candidatura a presidente em 2018 para ser candidata a vice na chapa de Fernando Haddad (PT), dupla que recebeu 47 milhões de votos no segundo turno, perdendo para o atual presidente, Jair Bolsonaro (então no PSL e atualmente sem partido), apoiado por 57,8 milhões de eleitores.
Dessa vez, o PT aceitou não ter candidato em Porto Alegre, indicando Miguel Rossetto como vice da chapa de D'Avila. Ele já foi vice-governador do Rio Grande do Sul e ocupou cargos de ministro nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
A cientista política Talita Tanscheit, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, destaca que ambos Boulos e D'Avila escolheram nomes experientes como candidatos a vice-prefeito, o que pode ter contribuído para o bom desempenho das campanhas. Boulos tem como colega de chapa a deputada federal Luiza Erundina (PSOL), que já foi prefeita de São Paulo (1989 a 1992) pelo PT.
"São duas candidaturas novas, mas não são uma aventura, mostram para o eleitor que têm bagagem", analisa. "Me parece que a Manuela não conseguiria ter esse desempenho sem não tivesse o vice do PT, com o todo o recall (lembrança na memória dos eleitores) e a experiência que o PT tem na cidade", disse também, lembrando que Porto Alegre foi governada por petistas de 1989 a 2005.
No caso de Boulos, a professora da UFRJ considera que sua candidatura também é alavancada pelo seu histórico de militância em movimentos populares.
Boulos
é a principal liderança do MTST (Movimento de Trabalhadores Sem Teto), que
organiza acampamentos em terrenos e prédios urbanos desocupados para
reivindicar moradia para famílias pobres.
A partir desse trabalho que ele foi convidado a entrar no PSOL e concorrer à Presidência em 2018, quando se destacou como orador e em debates com outros candidatos.
"Boulos é muito mais um quadro de esquerda do que do PSOL. Talvez seja a maior inovação da esquerda porque o grande desafio desse campo após o PT deixar o poder é se reconectar às organizações de base, aos movimentos populares", ressalta Tanscheit, que no momento estuda a esquerda na América Latina em sua tese de doutorado.
Sua análise vai ao encontro da pesquisa feita pela cientista política Esther Solano, professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). Em entrevistas com ex-eleitores do PT, Solano tem identificado um sentimento de "abandono" em relação ao partido.
"A falta de renovação das lideranças e da cúpula burocrática do partido é uma crítica que ouvimos muito, assim como o afastamento do PT dos territórios, do convívio mais cotidiano com a população ", disse Solano, em entrevista recente à BBC News Brasil.
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