domingo, 30 de maio de 2021

ECLESIOLOGIA

ORIGEM, FUNDAÇÃO, MISSÃO DA IGREJA E O MISTÉRIO DA IGREJA– SEGUNDA PARTE (2ª Parte)


III. O MISTÉRIO DA IGREJA

770. A Igreja está na história, mas ao mesmo tempo a transcende. É unicamente “com os olhos da fé” que se pode enxergar em sua realidade visível, ao mesmo tempo, uma realidade espiritual, portadora de vida divina.
Parágrafo relacionado 812

A Igreja - ao mesmo tempo visível e espiritual

771. “O Mediador único, Cristo, constituiu e incessantemente sustenta aqui na terra sua santa Igreja, comunidade de fé, esperança e caridade, como um 'todo' visível pelo qual difunde a verdade e a graça a todos.” A Igreja é ao mesmo tempo:
Parágrafos relacionados 827, 1880, 954

· “sociedade provida de órgãos hierárquicos e Corpo Místico de Cristo; · assembleia visível e comunidade espiritual;
· Igreja terrestre e Igreja enriquecida de bens celestes”.

Essas dimensões constituem “uma só realidade complexa em que se funde o elemento divino e humano”: Caracteriza-se a Igreja por ser humana e ao mesmo tempo divina, visível, mas ornada de dons invisíveis, operosa na ação e devotada à contemplação presente no mundo e, no entanto, peregrina. E isso de modo que nela o humano se ordene divino e a ele se subordine, o visível ao invisível, a ação à contemplação e o presente à cidade futura, que buscamos. Ó humildade! Ó sublimidade! Tabernáculo de Cedar e santuário de Deus; morada terrestre e palácio celeste; casa de barro e sala régia; corpo de morte e templo de luz; finalmente, desprezo para os soberbos e esposa de Cristo! És negra, mas formosa, ó filha de Jerusalém: ainda que desfigurada pelo labor e pelado longo exílio, a beleza celeste te adorna.

A Igreja - mistério da união dos homens com Deus

772. É na Igreja que Cristo realiza e revela seu próprio mistério como a meta do desígnio de Deus: “Recapitular tudo nele” (Ef 1,10). São Paulo denomina de “grande mistério” (Ef 5,32) a união esponsal entre Cristo e a Igreja. Por estar ela unida a Cristo como a seu Esposo, a própria Igreja também se torna mistério. Contemplando nela o mistério, São Paulo exclama “Cristo em vós, a esperança da glória” (Cl 1,27).
Parágrafos relacionados 518, 796

773. Na Igreja, esta comunhão dos homens com Deus pela “caridade que nunca passará” (1 Cor 13,8) é a finalidade que comanda tudo o que nela é meio sacramental ligado ao mundo presente que passa. Sua estrutura se ordena integralmente à santidade dos membros do corpo místico de Cristo. E a santidade é medida segundo o ‘grande mistério’, em que a Esposa responde com o dom do amor ao dom do Esposo. Maria nos precede a todos na santidade que é o mistério da Igreja como “a Esposa sem mancha nem ruga”. Por isso, “a dimensão marial da Igreja antecede sua dimensão petrina”.
Parágrafos relacionados 671, 972

A Igreja - sacramento universal da salvação

774. A palavra grega “mysterion” foi traduzida para o latim por dois termos: “mysterium” e “sacramentum”. Na interpretação ulterior, o termo “sacramentum” exprime mais o sinal visível da realidade escondida da salvação, indicada pelo termo “mysterium”. Neste sentido, Cristo mesmo é o mistério da salvação: “Non est enim aliud Dei mysterium, Christus - Pois não existe outro mistério de Deus a não ser Cristo”. A obra salvífica de sua humanidade santa e santificante é o sacramento da salvação que se manifesta e age nos sacramentos da Igreja (que as Igrejas do Oriente denominam também “os santos mistérios”). Os sete sacramentos são os sinais e os instrumentos pelos quais o Espírito Santo difunde a graça de Cristo, que é a Cabeça, na Igreja, que é seu Corpo. A Igreja contém, portanto, e comunica a graça invisível que ela significa. É neste sentido analógico que ela é chamada de “sacramento”.
Parágrafos relacionados 1075, 515, 2014, 1116

775. “A Igreja é, em Cristo, como que o sacramento ou o sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero humano”. Ser o sacramento da união íntima dos homens com Deus é o primeiro objetivo da Igreja. Visto que a comunhão entre os homens está enraizada na união com Deus, a Igreja é também o sacramento da unidade do gênero humano. Nela, esta unidade já começou, pois ela congrega homens “de toda nação, raça, povo e língua” (Ap 7,9); ao mesmo tempo, a Igreja é “sinal e instrumento” da plena realização desta unidade que ainda deve vir.
Parágrafo relacionado 360

776. Como sacramento, a Igreja é instrumento de Cristo. “Nas mãos dele, ela é o instrumento da Redenção de todos os homens” o sacramento universal da salvação” pelo qual Cristo “manifesta e atualiza o amor de Deus pelos homens”. Ela “é o projeto visível do amor de Deus pela humanidade” que quer que o “gênero humano inteiro constitua o único povo de Deus, se congregue no único Corpo de Cristo, seja construído no único templo do Espírito Santo”.
Parágrafo relacionado 1088

RESUMINDO

777. A palavra “Igreja” significa “convocação”. Designa a assembleia daqueles que a Palavra de Deus convoca para formarem o Povo de Deus e que, alimentados pelo Corpo de Cristo, se tornam Corpo de Cristo.
778. A Igreja é ao mesmo tempo caminho e finalidade do desígnio de Deus: prefigurada na criação, preparada na Antiga Aliança, fundada pelas palavras e atos de Jesus Cristo, realizada por sua Cruz redentora e por sua Ressurreição, ela é manifestada como mistério de salvação pela efusão do Espírito Santo Será consuma na glória do céu como assembleia de todos os resgatados da terra.
779. A Igreja é ao mesmo tempo visível e espiritual, sociedade hierárquica e Corpo Místico de Cristo. Ela é una, formada de elemento humano e um elemento divino. Somente a fé pode acolher este mistério.
780. A Igreja é no mundo presente o sacramento da salvação, o sinal e o instrumento da comunhão de Deus e dos homens.

Revisando temas

1.    JESUS FUNDOU A IGREJA?

Essa é uma questão muito atual. Da resposta a essa questão dependem muitas afirmações que hoje fazemos sobre a Igreja: sacramento da salvação, santidade, apostolicidade, unidade. Na doutrina pré-conciliar sobre a Igreja e na dogmática neo-escolástica a questão da fundação foi resolvida mediante a referência a algumas passagens bíblicas: Jesus instituiu e fundou a única Igreja (DS 3540).

A Igreja como instituição ou fundação de Jesus, nesse contexto, significa: o Senhor terreno e ressuscitado cumpriu consciente e expressamente determinados atos jurídicos formais, mediante os quais fundou a Igreja como instituição visível e juridicamente estruturada por sua vontade em todos os pontos essenciais. Na exegese moderna essa concepção se tornou problemática por vários motivos.

1. Os evangelhos foram escritos na situação eclesial pós-pascal e transmitem as palavras de Jesus já como palavras atualizadas para essa situação eclesial.

2. Também o termo “ekklesia”, quando aparece nos sinóticos (Mt 16,18s; 18,17) derivam da situação pós-pascal. 3. A pregação pré-pascal de Jesus era o Reino de Deus e nesse sentido ele se dirige a todo Israel. Sua intenção era o de reunir, renovar e preparar todo o povo para a vinda iminente do Reino. Nesse sentido ele não quis fundar uma nova comunidade religiosa, nem constituir um resto santo ou uma comunidade particular dentro de Israel. O fato de que nesse movimento de congregação se verificou uma divisão-separação não depende da vontade de Jesus, mas da reação dos interlocutores. Nesse sentido, é muito difícil falar de uma fundação da Igreja em senso estrito e tradicional do termo. “Igreja” e “fundação” são, de fato, termos que podem ter conteúdos e amplitudes diferentes.

I. Se falarmos de “Igreja” em senso estrito (a comunidade de fiéis que sob a direção do Papa e dos bispos professam a mesma fé eclesial e recebem os mesmos sacramentos), devemos responder que ela não foi fundada por Jesus.

1. O aparecimento da Igreja depende de um processo de separação de Israel. 2. Ela tem o seu centro e lugar específico na celebração eucarística.

3. Por isso, no senso estrito do termo, somente depois da Páscoa e Pentecostes tem lugar a Igreja na sua institucionalização concreta.

II. Se, pelo contrário, usarmos o termo “Igreja” em senso amplo e aberto (a comunidade dos que creem, esperam e amam, inaugurada pelo Pai no Espírito Santo mediante Cristo) é indubitável dar uma resposta positiva.

1. O desenvolvimento pós-pascal somente é possível com a história de Jesus pré-pascal.

2. O movimento de reunião escatológica inaugurado por Jesus em Israel e os sinais do advento do Reino de Deus por ele realizados e constitutivos de uma comunidade formam a base teológica objetiva e histórica da institucionalização pós-pascal da Igreja.

III. Também o termo “fundação” pode ser entendido segundo modelos diversos que descrevem a relação entre Jesus e a Igreja. São três as abordagens globais dessa relação: fundadora, originária e fundante.

1. Relação fundadora. A instituição da Igreja está profundamente ligada à questão relativa à pessoa e à consciência pessoal de Jesus. Nesse sentido, a teologia fala de uma “eclesiologia implícita e processual”, uma vez que dessa maneira se exprime que há uma continuidade fiel (não de traição nem de mera substituição) entre o Reino de Deus iniciado por Jesus e a Igreja. Somente assim se pode falar de uma “fundação” da Igreja por Jesus (cf. LG 5).

2. Relação originária. Jesus é origem da Igreja. A Igreja na sua formação histórica é composta por um elemento divino e outro humano em analogia ao mistério do Verbo encarnado; ela é santa e, ao mesmo tempo, sempre necessitada de purificação (LG 8). Nesse sentido, deve-se sublinhar que a Igreja é “mistério” e “sujeito histórico” com a consequente “plenitude e relatividade” de sua existência histórica. Por isso ela pode ser analisada pelas ciências históricas e sociológicas como “povo de Deus que caminha para o Reino”, mas consciente de que é, ao mesmo tempo, “o Reino de Deus já presente no mistério”.

3. Relação fundante. Jesus é o fundamento da Igreja. Os mistérios salvíficos de Cristo são fundamento da Igreja. Os mistérios de Cristo foram preparados já desde as origens (Ecclesia ab Abel, LG 2) e estão articulados na sua encarnação, no seu mistério pascal e no envio do Espírito Santo.

2.    O MISTÉRIO DA IGREJA

O que é a “Igreja”? Para o cristão, essa questão se torna ainda mais decisiva quando experimenta a distância existente entre a Igreja enquanto objeto de fé e a Igreja histórica. Ele recita o Símbolo da fé, no qual confessa a Igreja una, santa, católica e apostólica. Ao mesmo tempo, constata com grande intensidade que a Igreja concreta e histórica não corresponde à Igreja crida. A questão da “essência” da Igreja não tem resposta fácil, pois tal essência existe de fato somente e sempre nas suas manifestações históricas. Nesse sentido, Concílio Vaticano II descreveu a Igreja como um mistério que não pode ser adequadamente expresso por um único conceito. Por isso é preciso ilustrar o mistério da Igreja mediante numerosas imagens e conceitos que se corrigem e se completam reciprocamente (LG 1-8). A sociedade provida de órgãos hierárquicos e o corpo místico de Cristo, a assembleia visível e a comunidade espiritual, a Igreja terrestre e a Igreja enriquecida de bens celestes, não devem ser consideradas duas coisas, mas formam uma só realidade complexa em que se funde o elemento divino e humano. É por isso, mediante uma não medíocre analogia, comparada ao mistério do Verbo encarnado. Pois como a natureza assumida indissoluvelmente unida a Ele serve ao Verbo Divino como órgão vivo de salvação, semelhantemente o organismo social da Igreja serve ao Espírito de Cristo que o vivifica para o aumento do corpo (LG 8,1). De fato, a Igreja é uma realidade extremamente complexa: ela é mistério da fé e uma realidade empírica, divina e humana, assembleia visível e comunidade espiritual. Como realidade histórica, ela pode ser empírica e historicamente estudada. Mas para o crente isso não é suficiente para captar a sua essência, a sua dimensão profunda, que tem suas raízes na ação de Deus na história. A ação salvífica livre e gratuita de Deus não é um constitutivo periférico da Igreja. Tal ação divina, porém, só pode ser captada e experimentada pela fé. Por outro lado, é a própria fé que obriga a fixar o olhar na história. Assim os dois aspectos dessa complexa realidade devem ser distintos; não podem ser confundidos nem mesmo separados. Outra característica dialética fundamental da Igreja é que, de um lado, ela existe somente como fruto da ação divina (dimensão objetiva e passiva: Igreja reunida por Deus) e, de outro, ela é também sujeito de ações humanas realizadas em vista da salvação (dimensão subjetiva e ativa: Igreja que congrega). As dimensões objetiva e subjetiva são distintas entre si e, ao mesmo tempo, unidas. A Igreja é também realidade complexa porque, de uma parte, é o resultado de múltiplas ações individuais. Por isso ela é tanto a ação concreta de se reunir e de interagir dos fiéis quanto o resultado dessa ação social individual. Nesse sentido, a Igreja é uma instituição social constituída pela reunião dos cristãos. Por outro lado, a Igreja é também organismo institucional que antecede a ação cristã individual. Desse organismo fazem parte a liturgia, o direito canônico, o edifício da igreja, o ordenamento eclesiástico, o ministério eclesiástico. Sem essa instituição eclesial não existiria também o indivíduo cristão. A instituição é, portanto, espaço vital normativo e pré-existente. Por fim a Igreja é desde sempre o lugar histórico e concreto da salvação. Ela já é a unidade em meio à dispersão do pecado, é a reconciliação em meio à separação. Por outro lado, ela deve também cumprir uma missão, uma função, um serviço no e para o mundo. A Igreja é uma realidade complexa: é mistério da fé e uma realidade empírica, é objeto e sujeito, assembleia reunida e instituição, pátria e missão. Os dois aspectos correspondentes entre si não devem ser confundidos nem separados. Tanto a distinção quanto a unidade das correspondências são essenciais.

http://www.arquisp.org.br/sites/default/files/arquivos/regiao-lapa/estudo_catecismo_40_tema_758-780.pdf

 

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