Homilia do D. Henrique Soares da Costa
At 13,14.43-52; Sl 99; Ap 7,9.14b-17;Jo 10,27-30
Uma imagem muito comum neste tempo
pascal é aquela do Cordeiro “de pé, como que imolado” (Ap 5,6). Este Cordeiro,
eternamente diante do trono do Pai, é o Cristo no seu estado de perpétua
imolação e glória, de entrega sacrifical e ao mesmo tempo vitoriosa, por nós.
Mas, misteriosamente, este Cordeiro é também Pastor: “O Cordeiro que está no
meio do trono será o seu pastor e os conduzirá às fontes da água da vida”. Que
imagem impressionante: um cordeiro que é pastor que dá vida às ovelhas. Pois
bem, Jesus afirmou: “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas suas
ovelhas” (Jo 10,11). Estejamos atentos: este dar a vida possui dois sentidos:
primeiro: Cristo nos dá a vida porque morre por nós, por nós entrega sua vida
humana: “Eu dou minha vida pelas minhas ovelhas” (Jo 10,15). É, portanto, um
pastor que ama profundamente o seu rebanho: “As minhas ovelhas escutam a minha
voz, eu as conheço e elas me seguem”. Num segundo sentido, Cristo dá a vida
porque transmite às ovelhas a vida divina, a vida eterna, a vida glorificada
que ele recebeu do Pai na ressurreição: “Eu dou-lhes a vida eterna e elas
jamais se perderão. E ninguém vai arrancá-las de minha mão!” Que afirmações
estupendas! Nosso Pastor, que por nós se fez Cordeiro imolado, dá-nos a vida
eterna e imperecível, uma vida que nos saciará eternamente! Cristão,
compreende: como é grande, como é concreta, como é verdadeira a tua esperança,
como é certa a tua herança!
Esta vida, que o Cordeiro-Pastor nos
prepara, é para todos, é em abundância. Isto já aparece na primeira leitura: diante
da recusa dos judeus como um todo em acolher o Evangelho da salvação em Jesus,
o Apóstolo volta-se para os pagãos: “Era preciso anunciar a palavra de Deus
primeiro a vós, judeus. Mas, como a rejeitais e vos considerais indignos da
vida eterna, sabei que vamos dirigir-nos aos pagãos”. E estes, cheios do
Espírito Santo, ficaram cheios de alegria. Eis! A salvação que Cristo nos
trouxe, com sua morte e ressurreição, com seu mistério pascal, é plena, é total
e é para todos[1]!
É com estas ideias e sentimentos no
coração que devemos, agora, contemplar a estupenda imagem que o Apocalipse nos
apresenta na liturgia de hoje. Toda a humanidade, “uma multidão imensa de gente
de todas as nações, tribos, povos e línguas, que ninguém podia contar”… de pé,
diante do trono e do Cordeiro”. Pensemos bem! É toda esta humanidade tão
sofrida, de vida tão frágil, de esperança tão incerta, que é chamada a este
momento tão grandioso: de pé (posição de quem venceu, de quem está vivo) diante
do trono de Deus e do Cordeiro, o Cristo nosso Senhor, Aquele que venceu!
Observem que nossa esperança nada tem de espírito de seita. A salvação não é
para um grupinho de eleitos que excluem os demais farisaicamente! Não! Nunca!
Deus quer “que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da
verdade” (1Tm 2,4). Os cristãos têm o dever de olhar o mundo com amor
benevolente. Nós, amados por Deus em Cristo, não podemos guardar só para nós
esse amor e essa salvação: é preciso anunciá-la, comunicá-la, e com um coração
bom, benévolo para com o mundo: nunca uma atitude de seita, de acusação, de
fechamento! Dizer a verdade, sim; anunciar a verdade, sim; denunciar o erro e o
pecado, sim; mas, com uma atitude de amor e respeito, de benignidade, como o
coração do Bom Pastor, que deu a vida pelas ovelhas e quis morrer pelo rebanho!
Estes eleitos “trajavam vestes
brancas” símbolos da glória, de vida, da pureza e da imortalidade; “traziam
palmas na mão”, símbolo da vitória. Quem são eles? “São os que vieram da grande
tribulação. Lavaram e alvejaram as suas vestes no sangue do Cordeiro”. Que
imagem fantástica! É a multidão dos cristãos de todos os tempos, que
perseveraram e vencerão no combate das tribulações desta vida… às vezes, até à
morte! Pensemos: somos nós, se formos fiéis no combate do Cristo; somos nós, se
perseverarmos e guardarmos a fé e a esperança no Senhor nas lutas e provações
desta vida! Estejamos atentos: “lavaram e alvejaram as vestes no sangue do
Cordeiro!” Sangue bendito e precioso, que lava, que purifica, que alveja! Nenhum
de nós chegará diante do trono limpo por sua própria limpeza, mas sim pelo
sangue do Cordeiro que é nosso pastor! “Nunca mais terão fome, nem sede. Nem os
molestará o sol, nem algum calor ardente”. Bendito Cordeiro, bendito Pastor,
bendito Cristo-Senhor, que nos dá uma vida tão plena! Ele mesmo nos tinha
prometido: “Quem vem a mim nunca mais terá fome e quem crê em mim nunca mais
terá sede” (Jo 6,35). Bendito Jesus, que é tão fiel! “E o Cordeiro, que está no
meio do trono, será seu pastor e os conduzirá às fontes da água da vida”. Aonde
nos conduzirá o Pastor? Que lugar é este, com tanta vida e tanto frescor e
consolação? Escutem a Palavra: “Aquele que está sentado no trono os abrigará na
sua tenda… E Deus enxugará as lágrimas de seus olhos!” Eis, irmãos, aonde o
Cristo imolado e ressuscitado nos conduz: à tenda do coração do Pai, para nos
aconchegar, para nos consolar, para nos enxugar as lágrimas, para nos dar a
vida em abundância: “Meu Pai, que me deu estas ovelhas, é maior que todos, e
ninguém pode arrebatá-las da mão do Pai. Eu e o Pai somos uma só coisa!”
É por isso, caríssimos, que a Páscoa
de Cristo é também nossa: sua vitória é penhor da nossa, é certeza de nossa
esperança agora e plenitude um dia. Vivamos fielmente os combates do presente,
deixemo-nos guiar pelo Bom Pastor, lavemos nossas vestes no sangue do Cordeiro
e sejamos herdeiros da vida que ele nos prepara. Ele, bendito pelos séculos dos
séculos. Amém.
https://www.presbiteros.org.br/homilia-do-d-henrique-soares-da-costa-iv-domingo-de-pascoa-ano-c/
Nenhum comentário:
Postar um comentário