NATAL DE NOSSO SENHOR
FESTAS LITÚRGICAS25 dezembro
Desde o início, os cristãos celebravam o que o
Senhor Jesus fez pela salvação da humanidade: todos os domingos, na
"Páscoa semanal" e a festa anual, no domingo após a primeira lua
cheia de primavera, a Páscoa.
No início do século IV, o calendário litúrgico
começou a mudar, dando mais valor à experiência "histórica"de
Jesus: na Sexta-feira Santa comemorava-se a morte de Jesus e também a Última
Ceia... Neste prisma, temos o Natal, o nascimento de Jesus, sobre o qual, em
336, temos o primeiro testemunho, depois do qual, veio a festa do Natal
oriental da Epifania, em 6 de janeiro. Esta data era associada à festa civil
pagã do "Natal do Sol Invencível" (“Natale Solis Invicti”),
que o imperador Aureliano havia introduzido, em 274, em homenagem à divindade
siríaca do Sol de Emesa, celebrada, precisamente, no dia 25 de
dezembro.
A Solenidade do Natal é a única festa, que
podia ser celebrada com quatro Missas: véspera, noite, amanhecer e dia. Os
textos desta solenidade são os mesmos para os três Anos Litúrgicos. Trata-se de
uma escolha que visa aprofundar e valorizar, quase em câmara lenta, o
Acontecimento que mudou o curso da história: Deus se fez homem!
Véspera:
"Genealogia de Jesus Cristo, filho de
Davi, filho de Abraão... Matã gerou Jacó. Jacó gerou José, esposo de Maria, da
qual nasceu Jesus, que é chamado Cristo" (Mt 1,1-25).
Noite: “Não temais, eis que vos anuncio uma
Boa-Nova que será alegria para todo o povo: hoje, vos nasceu, na Cidade de
Davi, um Salvador, que é o Cristo Senhor. Isto vos servirá de sinal: achareis
um recém-nascido envolto em faixas e posto numa manjedoura” (Lc 2,1-14).
Manhã: “Depois que os anjos os deixaram e
voltaram para o céu, falaram os pastores uns com os outros: “Vamos até Belém e
vejamos o que o Senhor nos manifestou”... Foram com grande pressa... Voltaram
os pastores, glorificando e louvando a Deus” (Lc 1,15-20).
Dia de Natal: “No princípio era o Verbo e o
Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus"... "E o Verbo se fez
carne e habitou entre nós" (Jo 1,1-18).
A Luz veio ao mundo. Hoje, como há mais de dois
mil anos, a Luz atravessa a obscuridade da noite e das trevas e nos ilumina.
Esta Luz tem um rosto e um nome para nós: Jesus Cristo, que o profeta Isaías
preanunciou: “O povo que andava nas trevas viu uma grande luz” (Missa
da Noite de Natal, Is 9,1-6). Ele é a Luz do mundo que ilumina as trevas (Evangelho
do Natal, Jo 1,9; 3,19); Ele é a Esperança que não decepciona (Rm 5,5);
Jesus, raiz e estirpe de Davi (cf. 2Sam 7,8ss, promessa de Deus ao Rei Davi;
IV domingo do Advento, Ap 22,16); Jesus é a estrela radiante da manhã (Ap
22,16).
Acontecimento
Eis o Natal: um Fato, um Acontecimento capaz de
mudar o curso da história. “Deus se fez homem para nos tornar filhos de Deus” (Santo
Irineu). Um acontecimento tão importante e tão decisivo que a liturgia quis que
nos rejubilássemos dele, quase em câmara lenta, a ponto de permitir não apenas
uma celebração, mas quatro Missas de Natal: às vésperas (por volta das 18h00);
à Noite (geralmente entre às 21 e 24 horas, este ano por volta das 20 h0ras);
de Manhã (mais ou menos entre às 7 e às 9 horas); e a do Dia de Natal (entre às
10 e às 18 horas, aproximadamente).
Quatro Missas para experimentarmos toda a
alegria deste acontecimento, que surpreendeu e transtornou os planos humanos.
Eis a alegria do Natal: “Hoje, vos nasceu um Salvador, que é o Cristo Senhor”
(Evangelho da Noite, Lc 2,11). O Senhor Jesus veio em meio a nós para
nos dizer “não temais”, para dissipar a indiferença uns dos outros, porque
Deus, em Jesus seu Filho, se comprometeu com a humanidade, ferida pelo pecado,
para nos salvar.
Detalhes históricos
O texto do Evangelho de Lucas, que ouvimos na
Missa da Noite, é rico de detalhes cronológicos e históricos: “Naqueles
tempos, apareceu um decreto de César Augusto, ordenando o recenseamento de toda
a terra... foi feito antes que Quirino fosse governador da Síria...” (Lc
2, 1-2). Eram detalhes que podiam nos deixar indiferentes pela ansiedade de
receber a notícia de que Jesus havia nascido; mas, não são detalhes
secundários, porque indicam que o nascimento de Jesus não pertence aos
"contos de fada", mas era um fato plenamente inserido na história.
Árvore genealógica
Como o Evangelho da véspera é indicativo,
porque insere Jesus em uma árvore genealógica, não exatamente perfeita, visto
os personagens, Ele aceita entrar nesta história familiar, que, certamente, não
é constelada de Santos. Na longa lista são citados os Patriarcas e, depois, os
Reis, antes e depois do exílio da Babilônia. Alguns Reis eram fiéis, outros
idólatras, imorais e assassinos. E o que dizer do Rei Davi, no qual se
entrelaçam fidelidade a Deus, pecados e crimes (recordamos apenas o crime que
ele confessou no Salmo 50, após ter matado Urias).
A genealogia quer testemunhar e confirmar que
Jesus é da "estirpe de David" (cf. Mt 1,6ss) e que a promessa
que Deus fez a Davi, de construir-lhe "uma casa" (cf. 2Sm, IV
domingo do Advento) encontrou sua plenitude em Jesus. A genealogia mostra
que faz parte de uma história bem maior, que vale para o homem Jesus, que
inaugura uma nova história. Atrás de cada nome, às vezes enigmático, há uma
história, através da qual Deus tornou possível a realização de alguma coisa.
Trata-se de uma página que revela: atrás de cada rosto, há uma eleição de Deus
e uma sua promessa, “como era no princípio, agora e sempre”. Também nós somos
"eleitos" pela graça de Deus: “Não fostes vós que me escolhestes,
mas eu vos escolhi" (Jo 15,16). Não fomos escolhidos pelos
nossos méritos, mas pela sua Misericórdia: “Amo-te com eterno amor” (Jr 31,3).
Eis a nossa certeza: “"O Senhor chamou-me desde o seio de minha mãe”
(Is 49,1).
Como no passado, hoje Jesus entra nesta
história e nos convida a olhar para longe, a ler este tempo histórico e social
particular, não com uma ladainha de derrota e lamentos, mas com aquela Luz, que
vem de cima e ilumina tudo.
Enfim, nem José e Maria viveram em um contexto
fácil, no entanto...
Manjedoura
“Completaram-se os seus dias e ela deu à luz
seu filho primogênito, envolvendo-o em faixas, e o depôs em uma manjedoura”
(Missa da Noite, cf. Lc 2,7). Deus Pai, Todo-Poderoso, por meio de
Maria, depôs um Menino, o Emanuel, Deus conosco, em uma manjedoura: um Menino
que dá início (arché) a um novo Reino, a uma nova História de salvação:
Reino de justiça e paz, de amor e verdade.
“E o depôs em uma manjedoura”. O verbo,
em grego, indica a posição de quem faz a refeição, quase deitado, como um
soldado romano. Porém, o Menino Jesus foi deposto em um cocho de animais: um
receptáculo de insetos, babas de animais, sujeira; um sinal de como seria toda
a vida de Jesus: os Anjos cantam no céu, enquanto Herodes o perseguia; um dia,
será aclamado pelo povo e, no outro, condenado pela mesma multidão; um dia,
como rei, e no outro, pregado na cruz como malfeitor. Rejeição e glória serão
os sinais que distinguirão este Menino.
Há também outro detalhe que, geralmente, é
proposto pelos ícones: o Menino é colocado no lugar onde os animais comiam.
Este mesmo Menino, que precisava ser nutrido para crescer, é recordado, desde o
início, como o "pão" que alimenta: "Fazei isto em memória de
mim".
Este Menino, nesses detalhes, revela-se como
era, mas, ao mesmo tempo, revela o caminho que devemos seguir em nossa vida
boa. Em um tempo, em que o homem é escravo dos seus apetites superficiais,
Jesus indica uma nova vida, capaz de pôr ordem seus tantos apetites
desordenados, que só saciam a própria ilusão e ambição de querer "ser como
Deus", da sua autoafirmação e emancipação de Deus, consequências do pecado
original: “A mulher, vendo que o fruto da árvore era bom para comer, de
agradável aspecto e apropriado para adquirir sabedoria, tirou-o da árvore e,
depois, o ofereceu também ao seu marido” (Gn 3,6).
Da manjedoura, Jesus manda-nos um sinal para
que nos alimentemos com o que conta, para que, de comedores compulsivos,
aprendamos a ser "pão que se doa". Recordemos que a primeira das
tentações de Jesus no deserto se referia, precisamente, ao conceito de
"alimento": “Se és Filho de Deus, ordena que estas pedras se
tornem pães...” Jesus respondeu: “Não só de pão vive o homem, mas de toda
palavra que procede da boca de Deus” (Mt 4, 3-4), indicando-nos
assim o exemplo que devemos seguir.
Em faixas
Maria “envolveu” o Menino “em faixas”:
apesar da precariedade do momento, Maria sabe se organizar. O seu exemplo nos
leva a aprender a "nos organizar" para que o Menino, que pede para
nascer em nosso coração e em nossa vida, encontre acolhimento, cuidado e
proteção. Em outras palavras, podemos dizer que a memória do Natal de Nosso
Senhor ilumina os nossos "natais cotidianos", onde a fé, ou seja, a
amizade com o Menino Jesus, precisa ser acolhida e mantida nas
"faixas" das nossas atenções e cuidados, para não desfalecer.
Através daquele “Menino”, envolto em faixas e
deitado na manjedoura, somos convidados a observar a lógica com que Deus age,
e, através dela, aprender a agir “como Deus”; somos convidados a inverter
nossas lógicas e estratégias, que requerem mudança de mentalidade e
perspectiva. O que conta não é a grandeza e a importância, mas a pequenez,
aparentemente insignificante: da grandeza à pequenez, da força à debilidade, do
poder ao dom, porque é assim que Deus age!
Também nós, como cristãos, somos chamados a ser
“sinais” discretos do poder do amor de Deus, humildes instrumentos do Reino do
Senhor, cientes de que “a fraqueza de Deus é mais forte do que os
homens” (cf. 1Cor 1,25) . O termo "sinal" não deve
ser entendido como fraqueza ou conformidade, porque se “o sal perder o
sabor, para nada mais serve, senão para ser lançado fora” (cf. Mt
5, 13). Nosso modo de ser cristãos deveria tornar-se aquele convite vivo e
crível do grão de trigo que produz fruto; deve ser aquele "sinal" do
Menino de Belém, Jesus, aqui e agora; deve ser um viver e um agir, capazes de
demonstrar a alegria do "Natal", por uma Vida vinda do Alto, capaz de
"entregar-se" pelos outros por amor (Páscoa).
Os Pastores
A entrada de Deus na história dá-se por
"portas secundárias" e métodos não convencionais, tanto que os Anjos
levam o anúncio aos pastores e não aos sacerdotes do Templo. Os pastores eram
pobres guardiões, pagos para cuidar das ovelhas; eram excluídos do povo por
serem nômades e por frequentarem pessoas fora do povo, estrangeiras e,
portanto, impuras segundo a lei. Por isso, foi primeiro a eles que os Anjos
transmitiram o anúncio. Confia-lhes, por primeiro, a tarefa de adorar e ir
anunciar: “Vamos a Belém e vejamos o que se realizou e o que o Senhor nos
manifestou. Foram com grande pressa e viram Maria e José e o Menino deitado
numa manjedoura... Os pastores voltaram glorificando e louvando a Deus...”
(Lc 2, 15-20, Evangelho da Missa da Manhã).
Naqueles pastores nômades, que, como Jesus, não
sabiam “onde repousar a cabeça” (Mt 8,20), vemos os nômades
guardiões do nosso coração, aquela nossa parte inquieta que vigia,
busca e espera Alguém, mas que, muitas vezes, se confunde, enganando a
verdadeira fome e sede do coração. No fundo, cada um de nós é aquele pastor que
tenta seguir seus pobres ideais e, quando pensa ter conseguido, percebe que o
caminho ainda é muito longo.
Natal
O Natal de nosso Senhor Jesus recorda-nos que
Deus está presente em todas as situações, nas quais pensamos que ele está
ausente ou nas quais achamos que ele não pode estar. A nossa fé estimula-nos a
viver o tempo natalino com maior serenidade e esperança: Deus está aqui, tão
presente que, talvez ou com certeza, nos convida a rever nossos costumes;
convida-nos a lembrar que, assim como Ele veio para nos salvar, também nós,
através dele, só podemos nos salvar se caminharmos juntos, se aprendermos a
cuidar uns dos outros; somos convidados a ser uma “manjedoura”, onde os outros
possam se alimentar do pão da amizade, do amor, da misericórdia, da esperança.
O Senhor oferece-se a nós para que possamos dar seu testemunho com a nossa
vida. Como cristãos, somos convidados a assumir a esperança desta humanidade
desnorteada e solitária, a sermos sentinelas da nova manhã ... para que as
trevas deste tempo sejam rompidas pela Luz, que vem do Senhor Jesus.
Jesus, nossa realidade decisiva
Jesus é a realidade decisiva da minha e da
nossa existência. No Senhor Jesus, que se fez um de nós, aprendemos a ser todos
irmãos, partilhando nossa solidariedade e a proximidade interior, que é o
dom mais precioso, e louvando junto com os Anjos: “Glória a Deus nas alturas
e paz na terra aos homens amados pelo Senhor”.
https://www.vaticannews.va/pt/feriados-liturgicos/natal-de-nosso-senhor-.html
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