Estudos e dedicação à Igreja marcaram a vida de Bento XVI
Biografia do 265º Papa da Igreja Católica reafirma o
porquê do Pontífice ser considerado um dos maiores teólogos da atualidade
Julia Beck
Da
redação, com colaboração de Denise Claro e informações de agências
Considerado um dos
maiores teólogos da Igreja Católica, Papa Bento XVI teve uma vida marcada por
grandes obras, acontecimentos e feitos. Nascido em um Sábado Santo, no dia 16
de abril de 1927, e batizado no mesmo dia, Joseph Ratzinger era de família simples
e natural de Markt, Diocese de Passau, na Alemanha.
O pai de Ratzinger
era membro da polícia rural e sua mãe era cozinheira em hotéis. Seus avós,
agricultores e artesãos. Aos cinco anos de idade, mudou-se com a família para
Auschau am Inn. Em 1937, mais uma mudança, agora para Hufschlag, nos subúrbios
da cidade do Traunstein, onde Joseph passou a maior parte da sua adolescência e
recebeu sua formação cristã, humana e cultural.
Seminário e ordenação
sacerdotal
Em novembro de 1945,
Joseph e seu irmão mais velho, Georg, retornaram ao seminário. Em 1947,
Ratzinger ingressou no Herzogliches Georgianum, um instituto teológico ligado à
Universidade do Munique.
Em 29 de junho de
1951, Josef e seu irmão Georg foram ordenados sacerdotes pelo Cardeal Faulhaber
na catedral de Freising, na Festa dos Santos Pedro e Paulo.
Academia
De 1952 até 1959, o
jovem padre alemão foi membro da Faculdade da Escola Superior de Filosofia e
Teologia, em Freising. Em 1953, doutorou-se em teologia com a tese “Povo e Casa
de Deus na Doutrina da Igreja de Santo Agostinho sobre a Igreja”.
Passados quatro anos,
sob a direção do conhecido professor de teologia fundamental Gottlieb Söhngen,
Ratzinger conseguiu a habilitação para a docência com uma dissertação sobre “A
teologia da história em São Boaventura”.
Em abril de 1959, o
sacerdote tornou-se professor principal da Teologia Fundamental na Universidade
de Bonn. De 1962 a 1965, assistiu às quatro sessões do Concílio Vaticano II em
qualidade de perito, como conselheiro teológico principal do Cardeal Frings de
Colônia.
Em 1963, foi para a
Universidade de Münster e, em dezembro daquele mesmo ano, perdeu sua mãe. Em
1966, foi nomeado professor de teologia dogmática na universidade de Tübingen.
A partir de 1969,
passou a ser catedrático de dogmática e história do dogma na Universidade de
Ratisbona, na qual ocupou também o cargo de vice-reitor. Logo foi nomeado
Decano e Vice-presidente. Nesse mesmo ano, também foi nomeado Conselheiro
Teológico dos Bispos Alemães.
Ordenação episcopal
A intensa atividade
científica levou Joseph Ratzinger a desempenhar importantes cargos a serviço da
Conferência Episcopal Alemã e na Comissão Teológica Internacional.
Em 25 de março de
1977, o Papa Paulo VI o nomeou arcebispo de München e Freising. Foi convencido
por seu confessor a aceitar o cargo e escolheu como seu lema episcopal
“Cooperadores da verdade”.
Entrada para o
Colégio Cardinalício e participação de conclaves
Foi consagrado, em 28
de maio, pelo bispo de Würzburg, Josef Stange. Em junho desse mesmo ano, foi
criado cardeal presbítero pelo Papa Paulo VI e recebeu o título de S. Maria
Consolatrice ao Tiburtino. No mesmo ano, também assistiu à IV Assembleia Ordinária
do Sínodo dos Bispos, no Vaticano.
Ainda em 1977, Paulo
VI tornou Ratzinger cardeal do título presbiteral de “Santa Maria da Consolação
no Tiburtino”, no Consistório de 27 de junho.
Em 1978, Joseph
participou do Conclave celebrado de 25 a 26 de agosto, o qual elegeu João Paulo
I. Este nomeou-o seu enviado especial ao III Congresso Mariológico
Internacional, que teve lugar em Guayaquil (Equador) de 16 a 24 de setembro. No
mês de outubro daquele mesmo ano participou também do Conclave que elegeu João
Paulo II.
Atividades
Em 1980, Ratzinger
foi relator na V Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que tinha
como tema “Missão da família cristã no mundo contemporâneo”, e Presidente
Delegado da VI Assembleia Geral Ordinária, celebrada em 1983, sobre “A
reconciliação e a penitência na missão da Igreja”.
Em 1981, Papa João
Paulo II nomeou-o Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé e Presidente da
Pontifícia Comissão Bíblica e da Comissão Teológica Internacional. Um ano
depois, Cardeal Ratzinger renunciou ao governo pastoral da arquidiocese de
München e Freising.
Foi Presidente da
Comissão encarregada da preparação do Catecismo da Igreja Católica. Após seis
anos de trabalho (1986-1992), apresentou-o ao Santo Padre.
Em novembro de 1998,
Papa João Paulo II aprovou a eleição do Cardeal Ratzinger para Vice-Decano do
Colégio Cardinalício. No dia 30 de novembro de 2002, aprovou a sua eleição para
Decano. Com este cargo, foi-lhe atribuída também a sede suburbicária de Óstia.
Em 3 de janeiro de
1999, foi como enviado especial do Papa às celebrações pelo XII centenário da
criação da diocese de Paderborn, Alemanha. Desde 13 de novembro de 2000, era
Membro Honorário da Academia Pontifícia das Ciências.
Cúria Romana
Na Cúria Romana,
Joseph Ratzinger foi membro do Conselho da Secretaria de Estado para as
Relações com os Estados; das Congregações para as Igrejas Orientais, para o
Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, para os Bispos, para a
Evangelização dos Povos e para a Educação Católica.
O cardeal também foi
membro do Conselho da Secretaria de Estado para o Clero, e para as Causas dos
Santos; dos Conselhos Pontifícios para a Promoção da Unidade dos Cristãos, e
para a Cultura; do Tribunal Supremo da Signatura Apostólica; e das Comissões
Pontifícias para a América Latina, “Ecclesia Dei”, para a Interpretação
Autêntica do Código de Direito Canônico, e para a revisão do Código de Direito
Canônico Oriental.
Reconhecimento
Ratzinger recebeu
numerosos doutoramentos “honoris causa” pelo College of St. Thomas, em St. Paul
(Minnesota, Estados Unidos), em 1984; pela Universidade Católica de Eichstätt,
em 1987; pela Universidade Católica de Lima, em 1986; pela Universidade
Católica de Lublin, em 1988.
O purpurado também
recebeu o título Doutor Honoris Causa pela Universidade de Navarra (Pamplona,
Espanha), em 1998; pela Livre Universidade Maria Santíssima Assunta (LUMSA,
Roma), em 1999; e pela Faculdade de Teologia da Universidade de Wroclaw
(Polonia) no ano 2000.
Papa da Igreja
Em 19 de abril de
2005, após a morte do Papa João Paulo II, o então Cardeal Josef Ratzinger foi
eleito o 265º Papa, com a idade de 78 anos e três dias
Em maio de 2007,
Bento XVI visitou o Brasil, entre os dias 9 e 13, para dar início à 5ª
Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe, em Aparecida, no
interior de São Paulo. Na ocasião, o Pontífice canonizou Frei Galvão,
tornando-o Santo Antônio de Sant’Anna Galvão, o primeiro santo nascido no
Brasil.
Em 11 de fevereiro de
2013, Papa Bento XVI anunciou sua renúncia. O pontificado de Bento XVI
terminou oficialmente no dia 28 de fevereiro de 2013. A partir disso, o Papa
Emérito permaneceu em Castel Gandolfo até terminarem as obras de reforma no Mosteiro
Mater Eclesiae, no Vaticano.
Em 2 de maio de 2013,
Bento XVI ingressou no Mosteiro, onde dedicou-se à reflexão e oração pela
Igreja. Na nova residência, contava com o suporte de seu secretário particular,
Dom Georg Gänswein, e quatro leigas consagradas da comunidade “Memores Domini”.
Em 23 de março de
2013 aconteceu o primeiro e histórico encontro entre Bento XVI e Papa
Francisco.
Aparições públicas
após a emeritude
Em 27 de abril de
2014, o Papa Emérito participou da cerimônia de canonização de São João Paulo
II e São João XXIII, na Praça São Pedro. Em setembro do mesmo ano, a convite de
Francisco, Bento XVI voltou à Praça São Pedro, onde participou do encontro com
a terceira idade. Já em outubro, concelebrou com o Papa Francisco o rito de
beatificação do Papa Paulo VI.
Em fevereiro do ano
seguinte, o Papa Emérito voltou à Basílica de São Pedro, onde participou do
consistório no qual Francisco criou 20 novos cardeais. Em dezembro, Bento XVI
passou a Porta Santa da Misericórdia da Basílica de São Pedro, aberta pelo Papa
Francisco para o Jubileu.
No ano de 2016, o
Papa Emérito celebrou seus 65 anos de vida sacerdotal com Papa Francisco e
Colégio Cardinalício.
Em junho de 2020,
durante a pandemia da Covid-19, Bento XVI encontrou-se com Georg, seu irmão
também sacerdote, que estava doente. Em julho daquele mesmo ano, Georg faleceu
aos 96 anos.
Com
a saúde já debilitada pela idade, o Papa Emérito faleceu aos 95
anos neste sábado, 31, no Mosteiro Mosteiro Mater Eclesiae, no Vaticano.
Bento XVI: o Papa que uniu
fé e razão, esperança e caridade
Bento XVI, afirmou Papa Francisco, foi “um grande Papa” pelo “seu amor à
Igreja e aos seres humanos”. Um amor que inspirou o Pontificado no qual o
Pastor moderado e firme, por 8 anos, segurou – com coragem e sabedoria – o
timão do Barco de Pedro, mesmo navegando em águas agitadas e com ventos
contrários.
Vatican News
Na reportagem
especial de Alessandro Gisotti, voltamos a reviver alguns
dos momentos do Pontificado de Bento XVI, o Papa que, por amor à Igreja,
renunciou ao Ministério Petrino.
27 de
abril de 2014. Um milhão de olhares se dirige ao sagrado da Basílica de São
Pedro, no Vaticano. Em maior número são aqueles que assistem ao evento em
cadeia internacional: Bento XVI, o Papa emérito, abraça Francisco, o
Papa reinante.
O abraço
fraterno acontece sob as tapeçarias dos dois Pontífices Santos, João XXIII e
João Paulo II. O primeiro remete imediatamente ao Concílio Vaticano II, onde o
jovem e brilhante teólogo Joseph Ratzinger participou como conselheiro do
Cardeal Frings. O segundo refere-se, naturalmente, à especial amizade e à
fecunda colaboração entre o Papa polonês e o cardeal alemão. Naquele momento,
impensável até um ano antes, se encerra o sentido da vida e do ministério
petrino de Papa Bento XVII.
O dia
memorável dos “quatro Papas”
Dois
Papas que celebram dois Papas santos: são as manchetes dos jornais em todo o
mundo. Um evento quase inacreditável. Mas “inacreditável” já tinha sido o
primeiro sentimento com o qual o mundo inteiro tinha escutado estas palavras,
em 11 de fevereiro de 2013:
“Conscientia
mea iterum atque iterum coram Deo explorata ad cognitionem certam perveni vires
meas ingravescente aetate non iam aptas esse ad munus Petrinum aeque
administrandum…” (11 de fevereiro de 2013)
A
Renúncia pelo amor à Igreja
Um
conhecido teólogo italiano afirma – com sinceridade – que “não estamos
preparados para um Papa que se demite”. Reação que une crentes e não-crentes, e
levanta um dilúvio de comentários e declarações quase como se se fosse obrigado
a dizer alguma coisa para acalmar a inquietação gerada por um evento
imprevisível. Ainda mais enunciado numa língua, o latim, que na era do hi
tech parece um eco que soa da pré-história.
Quando,
porém, se deposita o pó erguido pelo terremoto – que teve seu epicentro na Sala
do Consistório do Palácio Apostólico – a figura do Pastor é que permanece em pé
e que, para o bem do seu rebanho, não tem medo de escolher uma estrada nunca
antes percorrida:
“Queridos
irmãos e irmãs, como sabem, decidi… (aplausos)… Obrigado pela simpatia…
(aplausos)… Decidi renunciar ao ministério que o Senhor me confiou em 19 de
abril de 2005. Fiz isso em plena liberdade para o bem da Igreja, depois
de ter rezado por muito tempo e de ter examinado diante de Deus a minha
consciência, bem consciente da gravidade desse ato, mas também consciente
de já não estar em condições de prosseguir no ministério petrino com aquela
força ele exige.” (Audiência Geral de 13 de fevereiro de 2013)
São
passadas 48 horas do clamoroso anúncio quando Bento XVI pronuncia essas
palavras e abre a porta do seu coração aos fiéis, reunidos na Sala Paulo VI, de
maneira que possam aproximar-se aos seus sentimentos. Então se começa a
compreender que a Renúncia do Papa não é nenhum “abandono”, mas, ao contrário,
um ato supremo de amor a Cristo, inspirado pelo Espírito Santo.
Não deixo
a Cruz, servirei à Igreja em oração
Depois de
poucas horas da conclusão do seu ministério, em 27 de fevereiro, na sua última
Audiência Geral, Bento XVI reitera che não está deixando a Cruz, “mas à
serviço da oração” permanece, “por assim dizer, no recinto de São Pedro”.
Naquele mesmo dia, o Papa encontra os purpurados que se preparam ao Conclave.
Entre eles, está inclusive o Cardeal Bergoglio. Para todos o Pontífice tem
palavras de afeto e incentivo:
“Que o
Senhor lhes mostre aquilo que é da vontade dEle. E, entre os senhores, no
Colégio dos cardeais, está também o futuro Papa, ao qual prometo, já de hoje, a
minha reverência incondicional e obediência.” (Encontro com os cardeais em 28
de fevereiro de 2013)
Um
humilde trabalhador na Vinha do Senhor
A
humildade de Bento XVI comove, mas não surpreende, porque é bem essa a virtude
que sempre o caracterizou, como o mundo já pôde apreciar das primeiras palavras
pronunciadas depois da eleição como Sucessor de Pedro:
“Queridos
irmãos e irmãs, depois do grande Papa João Paulo II... (aplausos)... os
senhores cardeais me elegeram, um simples e humilde trabalhador na vinha do
Senhor. Consola-me o fato de que o Senhor sabe trabalhar e agir também com
instrumentos insuficientes. E, sobretudo, confio nas suas orações. Na alegria
do Senhor ressuscitado, confiantes do seu apoio permanente, vamos em frente. O
Senhor nos ajudará, e Maria, Sua Santíssima Mãe, está do nosso lado.” (19 de
abril de 2005)
Um
trabalhador humilde a quem a coragem não falta. “O pastor moderado e
firme” enfrenta com excepcional determinação alguns escândalos que surgiram na
Igreja, como a terrível ferida dos abusos sexuais em menores por parte
de membros do clero. Bento XVI é o primeiro Pontífice que encontra as vítimas
desse crime horrível: e faz sem clamor, longe dos refletores, em Malta, nos
Estados Unidos, na Austrália e no Reino Unido.
Dispõe
novas regras que assegurem uma “tolerância zero” àqueles que se mancham desse
delito. E, no Ano Sacerdotal, há 150 anos da morte de Curato d’Ars, envoca uma
nova transparência. As suas palavras têm a força de uma profecia:
“Devemos
encontrar uma nova resolução na fé e no bem. Devemos ser capazes de penitência.
Devemos nos esforçar para tentar tudo o que for possível, na preparação do
sacerdócio, para que uma coisa semelhante não aconteça mais. Mas este também é
o lugar para agradecer de coração todos aqueles que se comprometem em ajudar as
vítimas e em dar, novamente a elas, a confiança na Igreja, na capacidade de
acreditar na sua mensagem.” (20 de dezembro de 2010).
Pastor
moderado e firme, comprometido com a transparência
Bento XVI
expressa a mesma determinação no processo de renovação do Ior e
da gestão das atividades econômicas no Vaticano. E isso, mesmo com os
sofrimentos, inclusive pessoais, que deverá suportar por causa do escândalo
“Vatileaks”. Mais uma vez, atinge a brandura do Papa que perdoa o
assistente de quarto que lhe tinha roubado documentos privados. Um
gesto que lembra o perdão de João Paulo II a Ali Agca.
Mesmo
empenhado em reagir à crise e imprevistos, o Pontificado de Bento XVI será
pró-ativo e inovativo em muitos aspectos, como demonstra também a instituição
de um Ordinariado pessoal para os anglicanos que entram em plena comunhão com a
Igreja Católica, depois da publicação da Constituição “Anglicanorum Coetibus”.
Nasce o
“Pátio dos Gentios”, dialogar com os não-crentes
O Papa
leva adiante o confronto com os não-crentes e acelera a nova evangelização para
combater “a eclipse de Deus”. Convicto, como o seu amado Santo Agostinho que a
opção cristã é “aquela mais racional”, Papa Bento lança a ideia de um “Pátio
dos Gentios” (Cortile dei gentili), um espaço privilegiado de diálogo com os
“distantes”:
“Ao
diálogo com as religiões se deve acrescentar hoje, sobretudo, o diálogo com
aqueles pelos quais a religião é uma coisa estranha, aos quais Deus não é
conhecido e que, todavia, não gostariam de ficar simplesmente sem Deus, mas
aproximá-lo ao menos como Desconhecido.” (21 de dezembro de 2009)
Peregrino
no mundo, do Ground Zero à Mesquita Azul
O humilde
trabalhador da vinha planta sementes inclusive no terreno do diálogo inter-religioso.
Visita as sinagogas de Roma, Colônia e Nova Iorque, e convoca um novo
Dia pela Paz em Assis, em outubro de 2011, aberta não somente aos homens de
fé, mas também aos não-crentes.
Também
com o mundo muçulmano, depois da incompreensão desencadeada por uma citação no
discurso de Ratisbona, o diálogo se reforça graças inclusive à carta aberta de
38 “sábios muçulmanos” que se transformam em 138 e, depois, em 216, para
encontrar um terreno comum de encontro. O que sintetiza esse diálogo renovado é
a imagem de Bento XVI que, na Mesquita Azul, se recolhe em meditação ao lado do
Imam de Istambul.
“Permanecendo
alguns minutos em recolhimento naquele lugar de oração, me dirigi ao único
Senhor do céu e da terra, Pai misericordioso da inteira humanidade. Possam todos
os crentes se reconhecer como suas criaturas e dar testemunho de verdadeira
fraternidade!” (Audiência Geral de 6 de dezembro de 2006)
O diálogo
ecumênico merece um capítulo especial. Papa Bento recolhe frutos
importantes: encontra várias vezes o Patriarca de Constantinopla Bartolomeu I e
abre uma nova fase de relações com o Patriarcado Ortodoxo de Moscou. Altamente
simbólica foi a visita a Erfurt, no convento agostiniano de Martinho Lutero, e
o encontro em Londres com Rowan Williams, da Comunidade Anglicana.
Enfim,
todas as 24 viagens internacionais de Bento XVI deixam um sinal: daquele
comovente no Líbano, onde encontra os jovens sírios refugiados, àquele
histórico em Nova Iorque, onde reza no Ground Zero e fala às Nações Unidas. De
Camarões ao Brasil, da Austrália a Cuba, o Papa visita nos seus 8 anos de
Pontificado todos os 5 “continentes geográficos”.
Em
Auschwitz, como filho da Alemanha
Difícil
escolher um momento em tantos, mas claramente a visita de um Papa,
“filho da Alemanha” ao campo de concentração de Auschwitz-Birkenau, tem um
valor extraordinário:
“Papa
João Paulo II veio aqui como filho do povo polonês. Eu estou aqui hoje como
filho do povo alemão e, justamente por isso, devo e posso dizer como ele: não
podia não vir aqui. Tinha que vir. Era e é um dever perante a verdade e ao
direito de tantos que sofreram, um dever diante de Deus, de estar aqui como
sucessor de João Paulo II e como filho do povo alemão.” (29 de maio de 2006).
“Colaborador
da Verdade”, como diz o seu lema episcopal, Papa Bento é também testemunha de
Caridade. Os cristãos perseguidos em
tantos lugares do mundo encontram nele um baluarte seguro. É o primeiro
Pontífice a falar de “cristianofobia” e a denunciar as violações da liberdade
religiosa, como acontece no Paquistão com a lei da blasfêmia.
Através
do Cor Unum está na linha de frente para ajudar as populações
atingidas pelas guerras e desastres naturais. Emocionantes as suas visitas aos
pobres, aos idosos, aos doentes na Itália e no exterior, em especial, aos
pequenos pacientes do Hospital Bambino Gesù, de Roma, e ao Hospital Caritas
Baby, de Belém.
No
Brasil, vai encontrar os jovens toxicodependentes da Fazenda da Esperança. Na
Jordânia, nos Estados Unidos e na Espanha visita os portadores de deficiência
dos centros de assistência. Gestos que enaltecem como, aos olhos de Deus, cada
pessoa seja única e preciosa.
Um
magistério global, das Encíclicas ao Twitter
De outro
lado, justamente ao amor cristão dedica a sua primeira Encíclica Deus
Caritas est (2006). Seguem, então, Spe Salvi, sobre
a esperança, e Caritas in Veritate (2009), sobre o
desenvolvimento humano integral. Essa chegou a ser lida pelos operadores de
Wall Street: em meio à crise econômica mundial que começou nos Estados Unidos,
oferece a reflexão original da Igreja para colocar a pessoa no centro das
dinâmicas econômicas:
“Não
devemos esquecer… como lembravo na Encíclica Caritas in veritate,
que também no campo da economia e das finanças há intenção, transparência e
busca de bons resultados compatíveis e que nunca devem ser dissociados.” (10 de
dezembro de 2011)
Além das
três Encíclicas, o Papa publica também 4 Exortações Apostólicas pós-sinodais e
19 motu proprio, entre eles, o Summorum Pontificum,
sobre a liturgia e a histórica carta dirigida aos católicos chineses, de 2007.
Inovador
é o seu livro-entrevista “Luz do mundo”, em que oferece a sua visão a 360°
sobre os desafios da Igreja, e a trilogia sobre Jesus de Nazaré – um best
seller mundial, no
qual Joseph Ratzinger oferece a sua pesquisa de crente sobre a figura histórica
de Jesus.
Mas o
surpreendente é, sobretudo, a convicção com a qual o teólogo Bento se encaminha
pelas estradas da comunicação, inexploradas por um Papa. Em ocasião da JMJ, envia
um sms ao jovens do mundo inteiro, se conecta via satélite com os austronautas
de uma estação espacial e assina um editorial para o Financial Times.
Sobretuto encoraja
a mídia católica e vaticana a evangelizar o “continente digital”. E dá o bom
exemplo abrindo, em 2012, a conta no Twitter, @Pontifex:
“Hoje
somos chamados a descobrir, também na cultura digital, símbolos e metáforas
significativas para as pessoas que possam ser de ajuda ao falar do Reino de
Deus ao homem contemporâneo.” (28 de fevereiro de 2011 – Discurso ao Pontifício
Conselho das Comunicações Sociais).
A Igreja
se comprometa com as famílias feridas, na esteira do Concílio
E, ao
homem contemporâneo, Bento XVI não deixa de lembrar da sacralidade da vida, da
beleza do matrimônio natural entre um homem e uma mulher, da urgência da
liberdade educativa. Aqueles valores que não mudam com o tempo e, por isso,
“não são negociáveis”.
A família
é um dos temas que mais importa ao Papa que vê com particular atenção os casais
feridos, de quem viveu o drama de uma
separação. Significativas também, considerando o caminho sinodal sucessivo a
pedido de Francisco, as palavras que Bento XVI pronuncia no Encontro Mundial
das Famílias em Milão, em 2012:
“Parece-me
uma grande tarefa de uma paróquia, de uma comunidade católica, a de fazer
realmente o possível para que eles se sintam amados, aceitados, que não estão
‘fora’, mesmo se não podem receber a absolvição e a Eucaristia; devem saber
que, assim mesmo, vivem plenamente na Igreja.” (3 de junho de 2012)
Uma igreja que Bento XVI serviu por toda a sua
vida, desde jovem e brilhante teólogo até como Sucessor de Pedro, tendo sempre
como “bússola” o Concílio Vaticano II que
– e são palavras suas – “permite à Igreja de proceder em mar aberto”. (AG/AC)
https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2022-12/bento-xvi-papa-que-uniu-fe-e-razao-esperanca-e-caridade.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário