quinta-feira, 2 de março de 2023

"MAIS CEDO OU MAIS TARDE O CREPÚSCULO CHEGA! PREPARADO PARA QUANDO ELE CHEGAR?"

 

"MAIS CEDO OU  MAIS TARDE  O CREPÚSCULO  CHEGA! PREPARADO PARA QUANDO ELE CHEGAR?"

Por  Lindolivo Soares Moura(*)

 

 "Se  a morte fosse mesmo o fim de  tudo,  seria um ótimo negócio para os perversos, pois  ao  morrer teriam eles  canceladas todas  as  suas maldades, tanto as do  corpo como as  da alma". [Sócrates].

 

Aprecio muito a afirmação de que "texto fora de contexto é pretexto", estando ou não quem faz uso deste ou daquele conteúdo consciente disso. Se o pretexto é bom ou ruim, essa já é uma outra história! Cortar bem é a "virtude" ou excelência da faca, seja ela utilizada para se preparar um aguardado jantar entre amigos, seja para ser cravada nas vísceras de um inimigo com o intuito de tirar-lhe a vida. Em ambos os casos, se ela cumpre bem sua função, por mais antagônicas que possam ser as intenções em jogo colocadas, não perde um percentual sequer de sua virtuosidade. Já em relação às intenções que governam o ser humano, estas sim, podem variar de um extremo ao outro num piscar de olhos, tanto em natureza como em qualidade. Talvez nenhum outro ser vivo se revista desta característica única, ao que tudo indica "exclusiva" do ser humano: transitar de um extremo ao outro, da mesquinhez à grandiosidade, e "versa-vice". Bicho raro, é esse tal de bicho homem! Mais raro que elefante habitando a Amazônia! Conta-se que, ao ser solicitado a escrever uma crônica Natalina para um jornal carioca, Assis Chateaubriand -  figura polêmica e controversa - teria respondido da seguinte forma, sem sequer ter se atentado para o teor  da solicitação: "contra ou a favor"? Coisas do Assis! "Assis Chateau", que nada tinha a ver com o Machado que também levava o Assis, só que como sobrenome. De Chateaubriand ficaria famosa também a afirmação proferida em razão do litígio configurado por sua separação, quando tudo fizera para manter ao seu lado Getúlio - o Vargas - em sua reivindicação pela guarda do filho: "Se a lei está contra mim - proclamou em alta voz como se num comício discursasse - então teremos que mudar a lei"! Mas não é sobre Chateaubriand que a presente reflexão propõe se debruçar. Falávamos dele apenas como um exemplo dessa ambigüidade que acompanha o ser humano desde que o homem é homem - masculino e feminino naturalmente - e do uso "abusado'' do qual muitos lançam mão ao retirar textos de seus contextos, provocando com isso não poucas confusões.

Um exemplo típico dessa espécie de "maldade" para com o idioma, e mais ainda, para com o texto, ficara patente numa "rodinha de amigos" - meia de amigos, meia de parentes - em que lá pelas tantas - não me recordo bem se de um aniversário ou durante as festas de fim de ano - alguém do grupo, ferrenho defensor do trabalho humano, incluindo aí o capitalismo com suas ilações decorrentes, argumentava de forma eufórica que Deus havia descansado apenas um único dia, tendo trabalhado incansavelmente  nos outros seis. Acrescentava a isso o fato de que, no projeto "final" do Criador, trabalho era sim, tarefa árdua e suada - "sangue, suor e lágrimas!" - e não férias estendidas, como a maioria dos que estavam na roda pretendiam que fosse. Arrematava seu discurso afirmando que não fora ele, e sim o criador de tudo, a ter disposto as coisas tais como elas assim se encontravam, depois de uma bendita fria na qual homem e mulher haviam entrado após o primeiro pecado. Fiquei  imaginando em silêncio, com meus botões, que provavelmente o discursante em questão deveria ter lido o tratado sobre a escravidão, que o grande Aristóteles havia escrito! E se isso de fato tivesse acontecido, seu ponto de vista seria perfeitamente compreensível, e sua conclusão plenamente justificada. "Texto fora de contexto é pretexto", continuei pensando! No caso do tratado aristotélico sobre a escravidão, era notório, para qualquer mente minimamente exigente, que malgrado a grandeza do mestre - Hegel diria bem mais tarde, que se a humanidade tinha mestres esses seriam Platão e Aristóteles -  lamentavelmente ele não havia sido feliz ao escrever o referido tratado, visto que ao fazê-lo ele na verdade não teria refletido "sobre", mas refletido "a'", escravidão existente ao seu tempo, e que persistiria por séculos e séculos depois não só na sociedade grega como em muitas outras que herdariam, dos gregos, esse procedimento como legado. Isso mostra o quanto o cientista e o pesquisador também são, conscientes disso ou não, espelho e reflexo de seu meio e de seu próprio tempo, malgrado a manifesta intenção de objetividade e neutralidade. Muitas coisas boas sem dúvida os gregos nos deixaram, mas essa, dentre outras possíveis, deveria ter ficado sepultada no passado! Como ninguém é perfeito, como diz o ditado, ficam gregos e troianos - Aristóteles e seu povo -  parcialmente desculpados! Mas que a maioria das culturas tenham aceitado o fato da escravidão como fato natural e consumado, e que apenas uma ou outra voz aqui ou ali, tenha contra ela se levantado, isso não tem desculpa! É imperdoável! É algo equivalente, e em certo sentido e dimensão ainda pior, que esquecer ou justificar o extermínio nazista: intolerável e imperdoável!

Voltaremos à interpretação "fora de contexto" do texto mencionado, daqui a pouco; precisaremos dela, só que devida e adequadamente contextualizada. Mas caso você esteja aguardando já com certa ansiedade por uma melhor explicação sobre a que tipo de "crepúsculo" estamos nos referindo, melhor então satisfazer desde já sua curiosidade. Então vamos lá! Um por de sol estonteante ao findar da tarde, com certeza isso você já viu! Mais que isso, contemplou! Lindo de se ver, algo maravilhoso para com o qual se possa extasiar! "Crepúsculo", como se sabe, é outro termo freqüentemente usado como sinônimo para o "por do sol", isto é, aquele momento em que o astro-rei se retira-se de cena e vai para seus aposentos descansar, depois de um longo dia de trabalho iluminando tudo e todos! Ao menos para parte da humanidade, já que para outras ele pode, nesse mesmo e exato momento, estar "nascendo" e não, se pondo. Sei que existem também crepúsculos matinais, lunares, e outros mais. Fiquemos entretanto apenas com o crepúsculo solar, por enquanto, aquele que ocorre lá pelo início da noite e fim da tarde. Ora, assim como o sol tem seu crepúsculo, a vida também tem o seu! A metáfora usada significa que estamos falando da fase última de nossa vida, digamos assim, como uma espécie de preparação para nossa "saída de cena", de despedida da vida, "de tudo e de todos" junto aos quais e para os quais tivemos o privilégio de fazer com que nossa luz brilhasse por certo tempo. É desse momento ou fase que estamos falando e abordando na presente reflexão. "E por que falar sobre isso?", você poderia estar "se" ou "me" perguntando. Há várias e variadas respostas para essa indagação! A nossa é bastante simples: refletir sobre o crepúsculo de nossas vidas é importante porque o crepúsculo se pode vivenciá-lo ou experienciá-lo de maneiras muito diferentes, nem todas elas entretanto produtivas e desejáveis, como seria de se esperar. Isso equivale dizer que nem todos, de fato, "se preparam" para atravessar e vivenciar esse período da existência bem, de bem com a vida e em alto astral! Talvez a maioria, não se prepare bem para isso! Podem até trazer consigo ótimas expectativas, esperança redobrada, súplicas e preces multiplicadas, mas "se preparar" para ele, pouco ou quase nada! E sabe qual é o mais lamentável disso tudo? É o fato de que muita gente, quando ouve a expressão "se preparar", leva logo as mãos no bolso e se põe a pensar nos investimentos e contas-correntes que estão ativos! Como se isso bastasse e fosse suficiente para garantir um "crepúsculo" seguro, bonito, de paz e tranqüilidade! Esse é um ledo engano que pode, além de pegar muitos de surpresa, deixar muita gente decepcionada! Isso porque de nada bastam cofres cheios, grandes celeiros, e contas abarrotadas, se a mente e a alma estão vazias, ou pior ainda, cheias de crenças, percepções e filosofias doentias e equivocadas.

 

Comecemos com um exemplo simples, desse tipo de equívocos que não poucos cometem, e que acabam surpreendendo negativamente os menos avisados quando o crepúsculo bate à porta - por vezes nem isso ele faz! - e entra para não sair jamais. É claro que quando chega o "crepúsculo" você passa a ter mais tempo livre para sí, para os seus e para a vida em geral, assim como certamente passa a ter mais liberdade e autonomia para muitas coisas, que antes você não tinha! O fato é que nem todos  estão preparados para  o exercício dessa liberdade e dessa autonomia. Por que não!? Não tem como responder diferente: porque não se preparam para isso! Imaginavam que, como o maná no deserto, também essa preparação cairia do céu de mão beijada! Reflita bem sobre o que Rubem Alves ensina a respeito disso! E depois não deixe de levar isso mais a sério! Diz ele: "todo mundo diz que deseja liberdade. É mentira!" - tava bravo ele, nesse dia! - "A liberdade traz muita confusão à cabeça. Melhores são as rotinas, que nos livram da responsabilidade de ter que tomar decisões sobre o que fazer com a liberdade e a autonomia! Quem tem rotinas não precisa tomar decisões! A vida já está decidida!". Não sei se Rubem pensava "nela", quando escreveu isso, mas sabia que existe um tipo de depressão chamada "depressão pós aposentadoria!? E olhe que as estatísticas sobre esse tipo de mal psico-fisico não são lá muito favoráveis não! Diversos estudos apontam para os riscos que o simples fato de deixar de trabalhar - a tão aguardada aposentadoria - pode representar para a saúde mental. Chegam a afirmar, por exemplo, que o simples fato de se aposentar, sem que para isso a pessoa tenha se preparado e  planejado, pode elevar em aproximadamente quarenta por cento as chances da pessoa entrar em depressão. E qual seria a principal recomendação? Se quer sair da linha do trem, é só continuar lendo com atenção: "antes de tudo, é essencial se preparar para essa etapa da vida!" - advertem os entendidos!  "Se preparar como!?", você pergunta! Entre outras coisas, empreendendo uma mudança consciente e profunda de hábitos, atitudes, percepções e crenças, isso não só quando já se está vivendo em pleno crepúsculo! Isso também é importante, claro! Mas o processo de mudança e adaptação, sobretudo quando se trata da mente, da alma e do coração, precisa começar bem antes! Quanto antes, melhor! Sem obsessão e ansiedade, claro;  com calma, sim, com certeza, mas também com disposição e determinação! Feito isso, e constando tal preparação como parte fundamental do seu "projeto de vida", dificilmente alguma porta ficará aberta para a choradeira, o pessimismo e a depressão. E aí você poderá dizer com  a segurança de quem sabe o que está dizendo: "vem não, depressão!!! Vem não que não tem!!! Aqui não!!!".

Um segundo tipo de surpresa que o crepúsculo costuma trazer consigo, sobretudo para aquelas  pessoas pouco habituadas à reflexão e à meditação, consiste no seguinte. Existe um tipo particular de tristeza que é característico dessa fase da vida, do crepúsculo. Exatamente por isso Rubem Alves a chama de "tristeza crepuscular"! Essa, pouca gente se dá conta dela, apesar de experimentá-la de forma bastante intensa e profunda, sem todavia sequer imaginar de onde ela vem. E o mais triste dessa tristeza é que o consultório e a terapia pouco ou nada podem fazer para amenizá-la, e menos ainda para exorcizá-la! Em Psicologia é clássica a afirmação de que "para o que não há cura, sempre há tratamento"! Claro que no sentido amplo do termo "tratamento", isso é verdade! No caso da "tristeza crepuscular", entretanto, o que está em jogo não é a possibilidade ou não de tratamento, mas sim o grau de sua "eficácia", que Rubem Alves coloca como estando próximo de zero! E por qual razão ele faz tal afirmação? Ele mesmo nos explica: "eu acho que essa tristeza crepuscular é mais que uma perturbação psicológica! Acho que ela tem tudo a ver é com a sensibilidade perante a dimensão trágica da vida! A vida é trágica porque tudo que a gente ama vai mergulhando no rio do tempo! Há, assim, um trágico que não está ligado a 'eventos trágicos'! Está ligado à realidade da própria vida!". A melhor alternativa, nesse caso - agora já somos nós que estamos sugerindo - será a entrada em cena, ou "mudança" se for o caso, de uma boa filosofia de vida -  "cosmovisão" ou visão de mundo, como se preferir - e não tanto de terapia. Isso porque de fato "nem tudo Freud explica"! Até porque no caso da tristeza crepuscular o diagnóstico já é bem conhecido; o prognóstico é que não se revela nada favorável. Primeiro em razão da natureza do problema e da ineficácia de toda e qualquer terapia; e por fim, porque via de regra a terapêutica é prevalentemente de intervenção, e pouco ou quase nada tem de prevenção e profilaxia! Num quadro desses, não é de admirar que o prognóstico se revele bastante desfavorável, e mais difícil ainda de ser revertido.

Mas afinal, o que é exatamente essa tal de "tristeza crepuscular"!? É o que agora veremos mais de perto. Afirmava Heráclito que a única constante da vida é o movimento e a mudança! Tudo que evolui em princípio evolui para melhor, é o que se espera! Fase ascendente, portanto. Alcançado determinado alcance, vem o limite! A partir daí o movimento e a mudança começam a ser de "declínio", descendência, e não mais de ascendência, supondo-se que de agora em diante num sentido mais desfavorável que favorável! Ao menos num certo sentido! Até a metade da vida estamos entrando nela; a partir de então, querendo ou não já estamos saindo!Toda vida - assim como tudo que adentra o tempo e o espaço - tem um início, meio, e fim! Não há exceção a essa regra! Qualquer luta ou batalha que se trave contra esse tipo, "aspas", de "inimigo", pode até ser vencida, no sentido de retardar um pouco mais as coisas, mas é certo que no fim essa é uma guerra perdida! A "tristeza crepuscular" é isso: quando a pessoa vai se dando conta de que tudo que ela mais amou, construiu e vivenciou ao longo de toda uma vida, vai chegando ao fim! Não em razão de um desastre, uma catástrofe, ou algo assim, mas em razão do fim que persegue a própria vida, e que se aproxima.

"Tudo passa!", advertiam os mais sábios quando queriam nos infundir fé e esperança diante de uma dificuldade a ser vencida! Só que no "crepúsculo" a pessoa vai experimentando na própria pele,  cada vez mais de perto, a verdade de que essa máxima também se aplica à própria vida! E aí não tem jeito: bate forte no peito o que chamamos de "nostalgia"! Que é bem diferente de "saudade", diga-se de passagem! Chegam perto, se abraçam por vezes, mas têm identidades diferentes! Saudade todo mundo sabe o que é, ninguém deixou de senti-la algum dia! Já a nostalgia, talvez não! Saudade diz respeito a alguém, um tempo ou um lugar qualquer, uma viagem inesquecível ou um amor que se viveu ou até se deixou de viver! Já a nostalgia parece estar relacionada a algo grande, muito maior e mais importante, relacionado à própria vida! Jovens sentem saudade, raramente sentem nostalgia!  Porque  a nostalgia é uma espécie de ponto de intersecção onde dois tempos distintos se encontram: um que já se foi, e sabemos que não volta mais, e outro que está próximo, às vezes  iminente e batendo à porta! Tempos estes sobre os quais não temos praticamente controle algum. Um tempo que não volta mais, um sentimento para o qual não há remédio, para com o qual pouco ou nada valem sessões e sessões de terapia! À janela de uma varanda, em meio às tantas casinhas brancas de um vilarejo grego, o personagem principal do filme "Zorba, o Grego", relinchava como um cavalo! Relinchava e dizia: "um homem como eu deveria viver pelo menos mil anos!"! No crepúsculo de cada um de nós, quem já não disse certamente dirá algo parecido algum dia! Isso também é nostalgia! Mais que saudade, é uma espécie de "saudosismo", para com o que se foi e se viveu um dia, e que o crepúsculo sinaliza estar chegando ao fim! "Somos feitos da mesma matéria dos nossos sonhos", dizia Shakespeare. "Recorda, pois, ou sonha, alma minha! A fantasia é tua substância eterna - o que não foi! Com tuas figurações faze-te forte, que isso é viver, e o restante é morte!", dizia Unamuno.

 

Agora estamos adentrando a parte mais delicada de nossa reflexão! Logo, você irá perceber por que digo isso! Agora é também hora de fazer reentrar em cena a interpretação do "ato da criação divina", apenas mencionado no início de nossa reflexão, e que deixamos no "stand by" com a intenção de retomar mais a frente. Dizer que o Criador descansou um único dia, e trabalhou outros seis ininterruptamente, como forma e argumento de justificar o chamado "capitalismo selvagem" e sua arrogante selvageria, é se deixar cair numa trama sem tamanho, sem esboçar reação de indignação e até de rebeldia! "Trabalhe dobrado hoje, quantas horas extras puder; puxe a carroça com mais força, pois só assim você poderá descansar tranqüilo e sossegado um dia"! Isso é loucura! Para não dizer, covardia! Argumento falacioso e mesquinho, que não suporta sequer o contra-argumento da simples presença de uma criança! Aliás, essa violência mental e emocional começa cedo, “temprano” demais, quando se é ainda criança! O que ensinam as escolas, senão isso: transformar crianças em adultos!? Com o que se preocupam tanto os pais, mães, e até muitos avós, senão com isso: transformar crianças em adultos! Com o que se preocupam as crenças e ideologias de todo tipo, que desde cedo nos são ensinadas, senão ensinar criança a ser adulto!? "Criança não é 'meio' para se chegar ao adulto e a nenhum outro fim" - ensinava quem entendeu de criança como poucos: "Criança é fim, o lugar aonde todo adulto deve chegar! Na linguagem dos sonhos: é preciso que os adultos se transformem em crianças! Na linguagem da Psicanálise: o princípio da realidade precisa estar subordinado ao princípio do prazer! Na linguagem política, o poder só encontra sua razão de ser se estiver subordinado ao prazer e à alegria do ser", dizia Rubem Alves! Não do prazer egocêntrico e egoísta de adultos eternamente insatisfeitos, e que sequer danem respeitar os direitos do "ser" e "viver" como criança, que todo infante traz inatamente, e que toda e qualquer Constituição não faz favor algum em reconhecer! Mas de que valem e para que servem leis e constituições se estas já nascem "letra morta", incapazes que são de fazer cumprir o bem que defendem como virtude, e que na prática vem desmentido pelo vício do acúmulo indevido, apropriações indébitas, e  corrupção sem limites! Acumulamos o que amamos, diz Rubem Alves! E se só acumulamos dinheiro é porque só amamos dinheiro!

"Mas e se foi justamente isso, o que ao longo de minha vida tenho acumulado, tudo que poderia ter feito de bom e de correto, está perdido!? Aí é que você se engana! Isso é o que você pensa! Não há melhor fase na vida para se dar conta das transformações que podem e precisam ser operadas, que o crepúsculo! É isso mesmo que você ouviu! E isso não é um mero jogo de palavras! Pare, olhe, escute, e reflita: tudo que está dentro de você, ensina Anselm Grün, tem seu próprio sentido! A raiva que você sente, assim como seu ressentimento, se você os aceita e  examina a fundo, e procura identificar seu real motivo, podem levá-lo a uma transformação colossal e profunda! Eles podem lhe mostrar que durante muito tempo você não fez senão o que as outras pessoas queriam, e a luz crepuscular lhe sugere agora que está na hora de fazer o que você deseja, o que você mesmo quer e lhe dá prazer! O medo, que por durante tanto tempo o tem acompanhado, sob os raios da luz crepuscular revela a você que você tem andado errado, e que esse erro só lhe tem causado prejuízo, e que está na hora - "a hora é essa, é agora"! - de escolher um caminho melhor e mais humano, e conferir ao seu medo um novo significado! Ele lhe dirá que o mundo lhe será grato quando - e sobretudo quando! - você se arriscar por algo sem primeiro pedir licença a todo mundo para transformar suas ideias em atos! Se você estiver atento, nessa etapa do crepúsculo, verá que muitos anjos - uma simples criança com quem você brinca e que olha para você com um olhar de ternura - lhe mostrarão quão insignificantes são os problemas que o atormentam, fazendo você perceber que não, que você não está vivendo sem rumo! Que você pode e deve sim, chegar com nobreza, beleza e dignidade, ao destino de sua vida! Não há arte mais sublime que "a arte de ser", e nenhuma transformação mais importante que a de "transformar-se a si mesmo"! O primeiro e o último ato de reconciliação é e será sempre para consigo mesmo, e não para com mais ninguém antes disso! Deus e os demais podem esperar! "Precisam esperar", pois ninguém pode amar a outrem e a Deus sem antes aprender a amar a si mesmo! Desta forma o crepúsculo revela verdades simples mas  importantes, que a correria da vida impediu que você percebesse! No tempo da vida muitas vezes não se dedica "tempo ao tempo"! Isso é "crhonos", nada mais! O verdadeiro tempo - o tempo que de fato importa - é contado pelo número de oportunidades nas quais operamos transformações; profundas e radicais! Isso não é tempo e nem "questão de tempo"! Isso é "KAIRÓS"! Basta de hesitação! Transforme-se em quem você deve ser enquanto é tempo! Sua morte ainda não o tocou! Beba a taça até o fim!

Por fim talvez a lição mais importante a ser aprendida por aqueles que vivem ou estão em vias de começar a viver o seu "crepúsculo"! Vou colocá-la toda em maiúsculo, na expectativa de que você possa parar e pensar profundamente sobre ela! Quem sabe até, revisitá-la mais vezes, ao término da presente reflexão! Ela equivale a um "projeto de vida", a ser vivido não apenas no "crepúsculo", mas ao longo de toda nossa jornada rumo a ele! E depois nele, claro! Princípio que pode ser tido como a "regra de ouro" no trato consigo mesmo, para com os outros, e para com a própria vida! Seja em casa, no trabalho, e nas tantas relações interpessoais que estabelecemos ao longo de nossa trajetória! Eis aí o princípio que certamente você há de julgar como o mais controvertido de todos! Não importa! Ainda assim ele não pode deixar de ser explicitado! Para você, que vive seu "crepúsculo", ele é ainda mais relevante, já que ora passa como desconhecido, ora simplesmente ignorado! Eis aí o mais nobre dos princípios: "NÃO NASCEMOS E TAMPOUCO FOMOS CHAMADOS À VIDA PARA SER ÚTEIS! VIEMOS À EXISTÊNCIA E VIVEMOS PARA VIVER A VIDA EM TODA A SUA PLENITUDE! E ISSO, EM TODAS E CADA UMA DAS FASES DE NOSSA VIDA! Não existe uma etapa melhor que a outra, como querem alguns! São apenas e tão somente etapas diferentes, nada mais que isso! Se quer usar a expressão, tudo bem, faça isso! Mas que ela seja usada da forma certa e no contexto devido: "a melhor fase da vida é aquela EM QUE NÓS ESTAMOS, e nenhuma outra"! E se para com você que vive um crepúsculo bonito, de bem com a vida e sem medo da morte, ainda assim vez por outra rola alguma dúvida sobre a validade desse princípio,  não se esqueça de uma coisa: foi justamente quando o Criador pôs fim a toda a sua obra que Ele sentiu a maior das alegrias! Pois terminado o tempo do trabalho chegara o tempo do gozo, do deleite e do desfrute! Só então ele pôde baixar as mãos e os braços, abrir melhor os olhos, os ouvidos e todos os demais sentidos, e contemplar não mais como Criador, mas como "Amante", tudo que havia criado! Olhou e viu que tudo era bom, lindo, maravilhoso, e se pôs a passear pelo jardim embasbacado e extasiado,  gozando das delícias do vento fresco e deleitando-se com o gosto dos frutos e o perfume das flores! Pois que razões teria ele para criar coisas tão belas e boas, se não sentisse nelas prazer, satisfação e gozo? Não se esqueça, portanto: "NÃO NASCEMOS PARA SER ÚTEIS"! Acreditar que somos como uma pá, enxada ou martelo, que depois de usados e não mais usáveis são jogados fora, descartados como imprestáveis, não faz sentido! Falando claro!? Isso é pura babaquice! Burrice também serve! Fica a seu critério a escolha do melhor termo!

À guisa de conclusão: fique agora com as palavras do Rubem, sem rodeios e interpretações, sem segundas ou terceiras intenções. Oxalá elas ajudem você a viver um "crepúsculo" bonito, sereno e sem grandes percalços. Talvez seja justamente essa a porta de entrada para aquilo que nossos sonhos e fantasias chamam de "paraíso"! Rubem, bem vindo! Agora é contigo!

 

"Oi gente, prazer em estar aqui! Sobre esse tal de crepúsculo, vou começar dizendo o seguinte: existem tristezas de dois tipos. Primeiro são as tristezas diurnas, quando o mundo está iluminado pelo sol! Tristezas para as quais há razões! Quem não sente essas tristezas está doente, e tem que fazer terapia para aprender a ficar triste. Tristeza é parte da vida, reação natural da alma diante da perda de algo que se ama! O mundo está luminoso e claro, mas há algo, uma perda, que faz tudo ficar triste! Segundo,  são as tristezas de crepúsculo! O crepúsculo é triste naturalmente! Não, não há perda nenhuma! Tudo está certo, tudo está no lugar! Não há razões para ficar triste! A despeito disso, no crepúsculo a gente fica! Talvez porque o crepúsculo seja uma metáfora da própria vida: a beleza efêmera das cores que que vão mergulhando no escuro da noite! A  alma é um cenário: por vezes ela é como uma manhã brilhante e fresca, inundada de alegria! Outras vezes ela é como um crepúsculo, um pôr de sol, nostálgico e triste! Estou convicto de que essa tristeza crepuscular é mais que uma perturbação psicológica! Creio que ela tem a ver mesmo é com a sensibilidade perante a dimensão trágica da vida! A vida é trágica porque tudo que a gente ama, incluindo a própria vida, vai mergulhando no rio do tempo! Não há melhor ajuda para esse tipo de tristeza que conversar! Mas para isso é preciso ter alguém que nos escute, que entenda de tristeza, sobretudo de tristeza crepuscular! Muitas pessoas procuram terapia para isso; não porque estejam doentes ou sejam 'doentes da mente'; não, não é isso! Elas o fazem porque precisam compartilhar sua tristeza com alguém que conheça e entenda dessa peculiar fase da vida!

Segunda lição importante: jamais por favor se esqueçam disso! Nossa vida começa justamente com o advento da 'inutilidade'. Pois o momento da inutilidade marca o início da vida de gozo. Nada mais preciso fazer! Combati o bom combate, travei as batalhas que tinha que travar! Não devo nada a ninguém, e se devo vou procurar por um certo Zaqueu! Disseram-me que ele tem algo importante a ensinar sobre isso! Feito isso estarei livre para me entregar ao deleite, ao ócio, ao tempo livre que a vida me proporciona! Nada de 'nec otium' - 'negócio - daqui para frente!

Por fim, se você me pergunta, onde está a escola que ensina tudo isso, essa sabedoria tantas e tantas vezes esquecida, eu lhe respondo: não! Não há escolas que ensinam isso! Todas as escolas só nos ensinam a ser ferramentas! Será preciso que você procure mestres que não foram ainda enfeitiçados por elas! Você deve procurar as crianças! Pois somente elas têm o poder de quebrar o feitiço que pode estar matando você ainda em vida! E quando seu crepúsculo chegar, faça as pazes com ele o quanto antes! Não há porque temê-lo, se você se preparou bem para isso! Quem sabe o sábio Unamuno não tenha razão! Sabem o que ele disse? "Não seria a vida inteira um sonho, e a morte um despertar?"! Bonito isso! E pra terminar, termino com o Mário! Mário Quintana, poeta dos grandes e um grande amigo. Ouçam o que ele diz, e com isso termino: "um dia... Pronto! Me acabo! Pois seja o que tem que ser! Morrer!? - que me importa!? O diabo é deixar de viver!"!

                    

                     L.S.M. 01/23

(*) Reflexão enviada de Vitória(ES) por whasapp.

 

 

 

 

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