REFLEXÃO
DOMINICAL II
Remédios contra asTentações!
Neste primeiro Domingo da
Quaresma encontramos Jesus que, depois de ter recebido o batismo de João
Batista no rio Jordão (Mc 1, 9), sofre a tentação no deserto (Mc 1, 12-15). O
deserto de que se fala tem vários significados. Pode indicar a situação de
abandono e de solidão, o “lugar” da debilidade do homem, onde não existem
ajudas nem seguranças, onde a tentação se faz mais forte. Mas ele pode indicar
também um lugar de refúgio e de amparo, como foi para o povo de Israel que se
livrou da escravidão egípcia, onde se pode experimentar de modo particular a
Presença de Deus. Jesus, “permaneceu quarenta dias no deserto, onde foi tentado
pelo demônio (Mc 1, 13).
Quaresma é para nós um tempo
forte de conversão e renovação em preparação à Páscoa. É tempo de rasgar o
coração e voltar ao Senhor. Tempo de retomar o caminho e de se abrir à Graça do
Senhor, que nos ama e nos socorre. É um tempo sagrado para aprofundar o Plano
de Deus e rever a nossa vida cristã. E nós somos convidados pelo Espírito ao DESERTO
da Quaresma para nos fortalecer nas TENTAÇÕES, que frequentemente tentam nos
afastar dos planos de Deus.
A Quaresma comemora os quarenta
dias que Jesus passou no deserto, como preparação para esses anos de pregação
que culminam na CRUZ e na glória da Páscoa. Quarenta dias de oração e de
penitência que, ao findarem, desembocam na cena que Marcos narra no cap. 1,
12-15. É uma cena cheia de mistério, que o homem em vão pretende entender –
Deus que se submete à tentação, que deixa agir o Maligno –, mas que pode ser
meditada se pedirmos ao Senhor que nos faça compreender a lição que encerra.
São Leão Magno comenta que “o Senhor quis padecer o ataque do tentador para nos
defender com a sua ajuda e para nos instruir com o seu exemplo”. Que nos pode
ensinar este episódio? Como lemos no Livro da Imitação de Cristo, “o homem
nunca está totalmente isento da tentação, enquanto viver… mas é com a paciência
e a verdadeira humildade que nos tornaremos mais fortes do que todos os
inimigos” ( Livro l, c. Xlll ), a paciência e a humildade de seguir o Senhor
todos os dias, aprendendo a construir a nossa vida sem O excluir, ou como se
Ele não existisse, mas nele e com Ele, porque é a fonte da vida verdadeira. A
tentação de eliminar Deus, de pôr ordem sozinho em si mesmo e no mundo,
contando unicamente com as próprias capacidades, está sempre presente na
história do homem.
É a primeira vez que o demônio
intervém na vida de Jesus, e faz isto abertamente. Põe à prova Nosso Senhor;
talvez queira averiguar se chegou a hora do Messias. Jesus deixa-o agir para
nos dar exemplo de humildade e para nos ensinar – diz São João Crisóstomo –,
quis também ser conduzido ao deserto e ali travar combate com o demônio a fim
de que os batizados, se depois do batismo sofrem maiores tentações, não se
assustem com isso, como se fosse algo de inesperado. Se não contássemos com as
tentações que temos de sofrer, abriríamos a porta a um grande inimigo: o
desalento e a tristeza.
Jesus proclama que “o tempo se
cumpriu, e o Reino de Deus está perto” (Mc 1, 15), anuncia que nele acontece
algo de novo: Deus dirige – se ao homem de modo inesperado, com uma proximidade
singular, concreta, cheia de amor; Deus encarna – se e entra no mundo do homem
para assumir sobre si o pecado, para vencer o mal e restituir o homem ao mundo
de Deus. Mas este anúncio é acompanhado pelo pedido de corresponder a um dom
muito grande. Com efeito, Jesus acrescenta: “Arrependei –vos e crede no
Evangelho” (Mc 1, 15); é o convite a ter fé em Deus e a converter todos os dias
a nossa vida à sua Vontade, orientando para o bem todas as nossas obras e
pensamentos. O tempo da Quaresma é o momento propício para renovar e tornar
mais sólida a nossa relação com Deus, através da oração quotidiana, dos gestos
de penitência e das obras de caridade fraterna.
A narrativa das tentações que
Jesus sofreu mostra que Jesus “foi experimentado em tudo” (Hb 4, 15),
comprovando também a veracidade da Encarnação do Verbo de Deus.
Diz Santo Agostinho que, na sua
passagem por este mundo, nossa vida não pode escapar à prova da tentação, dado
que nosso progresso se realiza pela prova. De fato, ninguém se conhece a si
mesmo sem ser experimentado, e não pode ser coroado sem ter vencido, e não pode
vencer, se não tiver combatido e não pode lutar se não encontrou o inimigo e as
tentações.
Por isso, a existência do ser
humano nesta terra é uma batalha contínua contra o mal. É esta luta contra o
pecado, a exemplo de Cristo, que devemos intensificar nesta Quaresma; luta que
constitui uma tarefa para a vida toda.
O demônio promete sempre mais
do que pode dar. A felicidade está muito longe das suas mãos. Toda a tentação é
sempre um engano miserável! Mas, para nos experimentar, o demônio conta com as
nossas ambições. E a pior delas é desejar a todo o custo a glória pessoal; a
ânsia de nos procurarmos sistematicamente a nós mesmos nas coisas que fazemos e
projetamos. Muitas vezes, o pior dos ídolos é o nosso próprio eu. Temos que
vigiar, em luta constante, porque dentro de nós permanece a tendência de
desejar a glória humana, apesar de termos dito ao Senhor que não queremos outra
glória que não a dEle. Jesus também se dirige a nós quando diz: “Adorarás o
Senhor teu Deus e só a Ele servirás”. E é isto o que nós desejamos e pedimos:
servir a Deus, alicerçados na vocação a que Ele nos chamou.
O Senhor está sempre ao nosso
lado, em cada tentação, e nos diz afetuosamente: “Confiai: Eu venci o mundo”
(Jo16, 33). E com o salmista podemos dizer: “O Senhor é a minha luz e a minha
salvação; a quem temerei?” (Sl 26, 1).
“Procuremos fugir das ocasiões
de pecado, por pequenas que sejam, pois aquele que ama o perigo nele perecerá”
(Eclo 3, 27). Como Jesus nos ensinou na oração do Pai Nosso: “Não nos deixeis
cair em tentação”; é necessário repetir muitas vezes e com confiança essa
oração! Porque “quem procura a Deus querendo continuar com os seus gostos,
procura-O de noite e, de noite, não O encontrará” (São João da Cruz).
Contamos sempre com a graça de
Deus para vencer qualquer tentação. Usemos as armas para vencermos na batalha
espiritual, que são: a oração contínua, a sinceridade com o diretor espiritual,
a Eucaristia, o Sacramento da Confissão (Penitência), um generoso espírito de
mortificação cristã, a humildade de coração e uma devoção terna e filial a
Nossa Senhora.
Que a Quaresma seja para todos
os cristãos uma ocasião de conversão e de estímulo mais corajoso à santidade.
“Converter-se quer dizer para nós, procurar novamente o perdão e a força de
Deus no Sacramento da Reconciliação e assim recomeçar sempre, avançar
diariamente” (São João Paulo ll).
O Senhor nos pede, de modo
especial, na Quaresma, o jejum, pois o jejum “fortifica o espírito,
mortificando a carne e a sua sensualidade; eleva a alma a Deus; abate a
concupiscência, dando forças para vencer e amortecer as suas paixões, e prepara
o coração para que não procure outra coisa senão agradar a Deus em tudo” (São
Francisco de Sales).
Supliquemos, com fervor, à
Maria Santíssima, a fim de que acompanhe o nosso caminho quaresmal com a sua
tutela e nos ajude a imprimir no nosso coração e na nossa vida as palavras de
Jesus Cristo, para nos convertermos a Ele.
Contamos sempre com a Graça de
Deus para vencer qualquer tentação. “Não te esqueças, meu amigo, de que
precisas de armas para vencer nesta batalha espiritual. As tuas armas serão: a
oração contínua, a sinceridade e franqueza com o teu diretor espiritual, a
Santíssima Eucaristia e o Sacramento da Confissão, um generoso espírito de
mortificação cristã – que te levará a fugir das ocasiões e a evitar a
ociosidade –, a humildade de coração e uma devoção terna e filial à Santíssima
Virgem – Consoladora dos aflitos e Refúgio dos pecadores. Dirige-te sempre a
Ela com confiança e diz-lhe: Minha Mãe, confiança minha!”
Mons. José Maria Pereira
https://presbiteros.org.br/homilia-do-mons-jose-maria-i-domingo-da-quaresma-ano-b/
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