REFLEXÃO DOMINICAL II
31 de março – Domingo da Páscoa
na Ressurreição do Senhor
Por Maicon André Malacarne*
Ressurreição: buscar Jesus e
deixar-se encontrar por ele
I.
Introdução
geral
A primeira atitude
pascal é “buscar” Jesus Cristo. De fato, o Evangelho deste domingo, dia da
Ressurreição, fala de uma grande correria: Madalena que corre, Pedro que corre,
o discípulo amado que corre! Todos se tornaram “buscadores”, porque algo tinha
acontecido: “o sepulcro estava vazio” e o corpo morto de Jesus já não estava
lá.
O
que nos torna buscadores é a faísca de amor que habita nosso coração. Sempre
procuramos por amor! A Páscoa é ativar a brecha do amor e deixar-se encontrar
por ele. A Páscoa é um grande sim ao amor! A grande mística francesa Simone
Weil desenhou, de maneira forte e profunda, esta imagem: “Deus espera com
paciência que eu queira enfim concordar em amá-lo. Deus espera como um mendigo
que fica de pé, imóvel e silencioso, na frente de alguém que talvez lhe dê um
pedaço de pão. O tempo é essa espera. O tempo é a espera de Deus que mendiga o
nosso amor” (Quaderni, volume
IV, tradução nossa).
Nossa vocação de
“buscadores” é iluminada, hoje, com outra verdade: nem sempre o lugar onde
buscamos o amor é o lugar onde ele está. De fato, o amor prefere os espaços
abertos e não gosta das prisões: “Ide à Galileia, lá vocês me verão!” O
sepulcro é apenas sepulcro!
II.
Comentário
dos textos bíblicos
1.
I
leitura (At 10,34a.37-43)
Pedro,
que havia negado conhecer Jesus por medo das autoridades, conforme acompanhamos
no relato da paixão, aparece nos Atos dos Apóstolos muito diferente. O Pedro
audacioso é a antecipação daquilo que Eduardo Galeano chamou de “fé fugitiva”:
“dos medos nascem as coragens, os sonhos anunciam outra realidade possível” (O livro dos abraços,
2002).
A leitura, de fato,
começa afirmando que “Pedro tomou a palavra” (v. 34a). Assumiu a
responsabilidade de anunciar Jesus, que “andou por toda parte fazendo o bem”
(v. 38). Não obstante tudo que havia realizado, “o mataram, pregando-o numa
cruz. Mas Deus o ressuscitou ao terceiro dia” (v. 39-40). Ao resumir todo o
programa de vida de Jesus, Pedro anuncia a salvação realizada por obra de Deus.
No discurso de Pedro,
o livro dos Atos dos Apóstolos transmite uma espécie de fragmento da primeira
evangelização da comunidade nascente: o centro é a pessoa de Jesus Cristo,
“ungido por Deus com o Espírito Santo” (v. 28). Os apóstolos testemunham com a
própria vida tudo que ele tinha realizado e, obedecendo ao mandato missionário,
tornam-se os primeiros a comunicar ao mundo a boa notícia da ressurreição. O
encontro com a pessoa de Jesus Cristo transformou-lhes a vida!
2.
II leitura (Cl 3,1-4)
O ponto de partida da
carta de Paulo aos Colossenses é a Páscoa de Jesus: “Se ressuscitastes com
Cristo, esforçai-vos para alcançar as coisas do alto” (v. 1). Pelo batismo, os
cristãos são chamados a uma vida nova por graça de Deus, mas Paulo recorda a responsabilidade
de cada um: “aspirai às coisas celestes e não às coisas terrestres”. Essa
linguagem paulina indica que todos os cristãos devem assumir sua vida de
ressuscitados.
A Páscoa precisa mexer e provocar nossa
vida de batizados!
A ideia de “morrer”
para as coisas terrestres não significa uma fuga do mundo, uma espiritualidade
desconectada com a realidade, mas sim a capacidade de transcender tudo o que
reduz a vida e “ascender”, elevar a vida que nos habita e habita o mundo. A
ressurreição é o erguimento de toda a condição humana, que participa do mesmo
destino e da mesma solidariedade de Cristo morto e ressuscitado. Paulo sugere o
céu, “as coisas do alto”, para compor a gramática dos buscadores.
2.
Evangelho
(Jo 20,1-9)
A primeira a “buscar”
Jesus, depois da crucificação, no Evangelho de João, foi Maria Madalena. O amor
de Maria Madalena não permitia que ela ficasse parada: ela foi “bem de
madrugada, quando ainda estava escuro” (v. 1). O jogo entre escuridão e luz,
que acompanha todo o texto joanino, expressa-se também neste momento crucial –
entre a morte e a ressurreição. O amor de Madalena fez que suas trevas, sua
tristeza e seu desespero pela morte se movimentassem na direção da luz,
movimento próprio de quem ama!
Ao perceber que a
pedra do túmulo tinha sido retirada (v. 2), Madalena saiu correndo e foi contar
a Pedro e ao discípulo amado. A corrida de Madalena passou a ser acompanhada
pela corrida de Pedro e pela corrida do discípulo amado. Todos correm porque
buscam! Se a morte de Jesus paralisava e amedrontava, aquela correria começava
a contar ao mundo uma novidade: o túmulo estava vazio.
O movimento do
discípulo amado compõe como que uma metáfora de todos os que amam: 1) corre
mais veloz do que Pedro (v. 4); 2) chega antes ao sepulcro (v. 4); 3) sabe
esperar quem vem depois (v. 5); 4) viu as faixas de linho e o pano que estava
sobre a cabeça de Jesus e acreditou (v. 8). Trata-se de verdadeira gramática: o
amor é mais veloz e, por isso, sempre chega antes! Não obstante a condição de
“primeirear”, o amor sabe ter paciência, sabe esperar o outro, porque prefere a
comunhão no lugar do isolamento. O amor acredita antes porque “primeireia” e
sabe olhar tudo com os olhos da fé.
O
papa Francisco inaugurou este verbo que parece estranho, primeirear, que é
do coração do Evangelho:
A
Igreja em saída é a comunidade de discípulos missionários que “primeireiam”,
que se envolvem, que acompanham, que frutificam e festejam. Primeireiam –
desculpai o neologismo –, tomam a iniciativa! A comunidade missionária
experimenta que o Senhor tomou a iniciativa, precedeu-a no amor (cf. 1Jo 4,10),
e, por isso, ela sabe ir à frente, sabe tomar a iniciativa sem medo, ir ao
encontro (Evangelii Gaudium,
n. 24).
O amor de Maria
Madalena, o amor de Pedro e o amor do discípulo amado alcançam “as faixas de
linho deitadas no chão e o pano que tinha estado sobre a cabeça de Jesus” (v.
6-7). Dentro do túmulo, começaram a entender tudo o que Jesus havia dito e
ensinado (v. 9). Essa realidade do túmulo, assumida por Jesus, anuncia a
derrota da morte. De dentro do túmulo, os buscadores comunicaram ao mundo que o
amor é mais forte do que a morte, aquela mesma verdade vivida pelos amantes do
Cântico dos Cânticos (8,6). De fato, a experiência da ressurreição é muito
próxima da experiência do amor!
III.
Pistas
para reflexão
Os textos da Palavra
de Deus deste domingo são um convite a acender a luz de Jesus ressuscitado. O
anúncio da salvação de Deus na pessoa de Jesus Cristo, por obra do Espírito
Santo, é o centro de toda a evangelização da Igreja nascente e torna-se o ponto
de referência para todo o anúncio do Evangelho na história. Mais do que um
grande discurso, a ressurreição de Jesus deve ser um convite a “viver as coisas
do alto”, ou seja, a entrar na dinâmica do Ressuscitado por meio de uma vida
nova, erguida de toda prostração e morte. O Evangelho nos convida a participar
da “correria” dos que buscam Jesus Cristo. A partir do “túmulo vazio”, da
fragilidade, do trauma, o movimento de buscar é um convite a toda a humanidade
a pôr-se a caminho do amor, “primeireando” e fazendo o bem.
Concluímos com o
convite a “rolar as pedras” feito pelo bispo italiano Tonino Bello, conhecido
como “o dom dos pobres”:
Vou
recorrer à sugestão da pedra que as mulheres, ao chegarem ao jardim na manhã de
Páscoa, viram retirada do túmulo. Cada um de nós tem sua própria pedra. Uma
pedra enorme, colocada na boca da alma, que não permite a passagem do oxigênio,
que oprime com um aperto de gelo, que bloqueia cada raio de luz, que impede a
comunicação com o outro. É a rocha da solidão, da miséria, da doença, do ódio,
do desespero, do pecado. Somos sepulturas alienadas! Cada um com seu próprio
selo de morte! Que a Páscoa seja, então, para todos, o rolar da pedra, o fim
dos pesadelos, o início da luz, a primavera de novos relacionamentos, e se cada
um de nós, tendo saído de sua tumba, se esforçar para remover a pedra da tumba
ao lado, o milagre do terremoto que marcou a primeira Páscoa de Cristo
finalmente se repetirá! A Páscoa é a festa das pedras roladas! É a festa do terremoto!
(Parabole e metafore,
2002, tradução nossa).
Maicon André Malacarne*
*é presbítero da diocese de Erexim-RS. Possui
mestrado em Teologia Moral pela Pontifícia
Academia Alfonsiana (Roma), onde atualmente é doutorando na mesma área. É
especialista em Juventude no Mundo Contemporâneo pela Faculdade Jesuíta de
Filosofia e Teologia (Faje – Belo Horizonte-MG), formado em Filosofia pelo
Instituto de Filosofia Berthier (Ifibe – Passo Fundo-RS) e em Teologia pela
Itepa Faculdades (Passo Fundo-RS). É aluno de doutorado em Teologia Moral da
Pontifícia Academia Alfonsiana (Roma). E-mail: maiconmalacarne@gmail.com
https://www.vidapastoral.com.br/roteiros/31-de-marco-domingo-da-pascoa-na-ressurreicao-do-senhor/
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