REFLEXÃO DOMINICAL III
Homilia de D.
Henrique Soares da Costa – II Domingo de Páscoa – Ano B
At 4,32-35; Sl 117; 1Jo 5,1-6; Jo
20,19-31
Há
oito dias atrás, no primeiro dia após o Sábado dos judeus, ao anoitecer, Jesus
ressuscitado entrou onde estavam os discípulos e lhes disse: “A paz esteja
convosco!” Há oito dias, no Dia da Ressurreição, o nosso Jesus, vencedor da
morte, enviado pelo Pai no Espírito Santo, soprou esse mesmo Espírito sobre
seus discípulos, sua Igreja, e disse: “Como o Pai me enviou, também eu vos
envio. Recebei o Espírito Santo!” Há oito dias atrás, Tomé, teimoso e
incrédulo, afirmou peremptoriamente: “Se eu não vir as marcas dos pregos e não
puser a mão no seu lado, não acreditarei!” Todas essas coisas que ouvimos no
Evangelho de hoje, ocorreram no Domingo de Páscoa, no Dia da Ressurreição, há
precisamente uma semana.
Hoje
é a Oitava da Festa Pascal, o Domingo seguinte. E como no Domingo passado,
também hoje, neste Domingo, o Senhor vem ao encontro dos seus discípulos e
coloca-se no meio deles. Será sempre assim: a cada oito dias os cristãos
reunidos experimentarão na Palavra proclamada e no Sacrifício eucarístico
celebrado, a presença real, viva e atuante Daquele que ressuscitou e caminha
conosco, ou melhor, caminha à nossa frente. E como Tomé, nós, a cada Domingo,
admirados, exclamamos: “Meu Senhor e meu Deus!” E queremos, emocionados,
ouvi-lo novamente dizer a nossa respeito: “Acreditaste porque me viste, Tomé.
Bem-aventurados os que creram sem terem visto!” Bem-aventurados nós, caríssimos
meus em Cristo, aqui presentes! Bem-aventurados nós que firmemente cremos no
Senhor e participamos do seu Sacrifício eucarístico, ainda que não tenhamos
visto o Senhor com os olhos da carne!
Eis
precisamente aqui a mensagem deste Domingo da Oitava: fazer-nos conscientes do
nosso encontro, da nossa comunhão real, íntima, transformante, com o Senhor
ressuscitado. Este encontro que ocorre de modo mais intenso a cada Domingo na
Eucaristia – e, por isso mesmo, faltar à Missa dominical é excluir-se da
Comunidade dos discípulos, é “ex-comungar-se”, é colocar-se fora da Comunhão
com o Ressuscitado e aqueles aos quais ele chama de “meus irmãos”… Este
encontro que ocorre de modo mais intenso a cada Domingo, nesta Eucaristia, não
começou aqui; iniciou-se no nosso Batismo, quando recebemos, no símbolo da
água, o Espírito Santo do Ressuscitado, passando a viver nele que, no seu
Espírito, veio realmente viver em nós! Três misteriosas palavras da Missa de
hoje exprimem este mistério. Ei-los: (1) A palavra da segunda leitura: o Autor
sagrado afirma que quem crê em Jesus nasceu de Deus e vive uma vida de amor aos
irmãos. Quem crê em Jesus, diz ele, vence o mundo, vence o pecado, vence a
tragédia de uma vida sem sentido, distraída apenas com eventos, futilidades e
copas do mundo. Eis as suas palavras: “Quem é o vencedor do mundo, senão aquele
que crê que Jesus é o Filho de Deus?” E, então, acrescenta de modo belo, forte,
surpreendente e misterioso: “Este é o que veio pela água e pelo sangue: Jesus
Cristo. Não veio somente com a água, mas com a água e o sangue. E o Espírito é que
dá testemunho, porque o Espírito é a Verdade”. Caríssimos, que palavras
impressionantes! Se nossos irmãos protestantes as compreendessem pediam
imediatamente a comunhão com a Igreja de Cristo! Aqui o Autor sagrado está
falando do Batismo e da Eucaristia. Vence o mundo quem crê em Jesus; não num
Jesus do passado, mas num Jesus que está vivo e na força do Espírito Santo, o
Espírito da Verdade, que ele derramou sobre nós, vem ao nosso encontro, habita
em nosso íntimo. Como? Pelos sacramentos! É nos sacramentos que recebemos o
Espírito Santo, é nos sacramentos que o Senhor entra em comunhão conosco e nós
com ele. Ele vem continuamente, vivo e vivificador pela água do Batismo e o
Sangue da Eucaristia! Nos santos sacramentos, nós experimentamos Jesus, recebemos
a vida de Jesus e podemos testemunhar ao mundo que Jesus está vivo e atuante!
Que realidade tão misteriosa; que graça tão grande: Jesus é o que vem sempre à
sua Igreja na água e no sangue; e ambos nos dão o Espírito Santo de Jesus! (2)
A segunda palavra desta liturgia é da oração inicial. Ali a Igreja nos ensinou
a pedir ao Pai que compreendêssemos melhor “o Batismo que nos lavou, o Espírito
que nos deu nova vida e o sangue que nos redimiu”. Mais uma vez o Batismo e a
Eucaristia que, dando-nos o Espírito de Jesus, nos colocam em comunhão íntima
com ele. (3) Finalmente, as palavras da Entrada da Missa de hoje, como aparecem
no Missal, tiradas da Primeira Epístola de são Pedro: “Como crianças
recém-nascidas, desejai o puro leite espiritual para crescerdes na salvação!
(2,2). A Igreja pensa nos que foram batizados na Vigília Pascal, nossos
irmãozinhos em Cristo, criancinhas no Senhor. Que recebendo a cada Domingo a
Eucaristia, puro alimento espiritual, possam – eles e nós – crescer na
salvação.
Ora,
caríssimos, se vivemos mergulhados nesse mistério tão grande, que é a real e
íntima comunhão com o Senhor ressuscitado, se experimentamos sua força e sua
graça nos sacramentos, se nele, Vencedor da morte, somos criaturas novas, então
vivamos de modo novo. E não somente de modo individual, mas como Comunidade dos
salvos e redimidos por Cristo. Vede, irmãos meus, o exemplo descrito na
Primeira leitura, a Igreja católica de Jerusalém, logo após a Ressurreição e o
Dom do Espírito: nós éramos “um só coração e uma só alma”, sabíamos repartir
amor e bens, colocando a vida em comum, e toda a nossa vida comunitária era uma
clara proclamação da novidade, da alegria e da esperança de quem sabia e vivia
a Ressurreição do Senhor. Dois mil anos após, não damos mais a impressão de um
bando de discípulos sonolentos e cansados? Não parecemos mais uns conformados e
desanimados, mornos pelo peso do tempo? Nossa vida, será que não exprime mais
comodismo e falta de fé, que aquela feliz exultação de quem tem sempre Jesus
diante dos olhos? Sabem o motivo disso, meus caros? Falta de comunhão viva com
o Senhor na sua Palavra, na oração e, sobretudo, nos sacramentos! Muitos de nós
temos uma fé fria, formal, burocrática, teórica. Não é a ideia, mas o amor que
dá sentido e gosto à vida!
Caros
meus, aprendamos a nos reaproximar de Jesus! Ele está vivo aqui, na Palavra, na
Eucaristia, nos irmãos, na vida. Se aprendermos a vê-lo, mais uma vez, cheios
de pasmos, exclamaremos como o duro Tomé: “Meu Senhor e meu Deus!” Que ele
no-lo conceda por sua graça. Amém.
Dom Henrique Soares da Costa
https://presbiteros.org.br/homilia-de-d-henrique-soares-da-costa-ii-domingo-de-pascoa-ano-b/
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