V- REFLEXÃO DOMINICAL II:
Homilia
do Pe. André Luís Buchmann de Andrade – XIX Domingo do Tempo Comum – Ano B
“Eu
sou o Pão Vivo Descido do Céu” (Jo 6,51).
“…estais
me procurando não porque vistes sinais, mas porque comestes pão e ficastes
satisfeitos” (Jo
6,26)
I.
Interesse disfarçado de Fé.
Não faz
muito tempo, ouvimos no Evangelho da Santa Missa Dominical a narração de uma
das multiplicações de pães operada por Jesus, Nosso Senhor.
No domingo
passado, ouvimos que a multidão correu para o outro lado do mar a fim de
procurar, às pressas, a Jesus depois daquela multiplicação e ouviu d’Ele uma
constatação um tanto triste: “…estais me procurando não porque vistes sinais,
mas porque comestes pão e ficastes satisfeitos” (Jo, 6,26).
A
multiplicação em apreço ocasionou um imediato interesse nas pessoas: ficaram
maravilhadas não somente com o pão multiplicado, mas com a possibilidade de
seguir um líder religioso que operava prodígios em seu benefício direto e
indireto, e também proporcionava-lhes um certo status psicológico.
Hoje em
dia acontece a mesma coisa com as pessoas que seguem certas igrejas – que,
diga-se de passagem, pouco ou nada de cristão têm – propagadoras de pretensos
sinais portentosos.
Qual é a
pessoa com necessidade de afirmação que não gostaria de dizer que a sua igreja
é o lugar da cura de todos os males?
Qual o
freqüentador, com interesse em resolver seus problemas pessoais, não gostaria –
se recebesse um favor, uma melhora em sua situação, um carinho proporcionado
pela acolhida – de dizer que o seu pastor faz milagres?
Muitos da
multidão que seguia Jesus naquela multiplicação de pães não O reconheceram como
o Filho de Deus, o Deus verdadeiro vindo até eles, mas projetaram n’Ele apenas
a visão de um líder que correspondia a seus anseios não somente
espirituais, como também materiais e psicológicos.
Nós, os
católicos, também corremos este risco. Se os fiéis buscassem na Igreja somente
o apoio às suas intenções comerciais ou se encontrassem nela somente um álibi
para uma suposta boa fama, estariam muito errados. Se, ainda, fôssemos
freqüentadores da Igreja, se rezássemos, mas somente para obtermos favores de
Deus, para termos nossos pedidos atendidos, estaríamos também fazendo algo
muito errado.
A fé é dom
de Deus, todavia não deixa de ser uma obrigação e uma necessidade nossa no
sentido de que é Deus quem nô-la concede, porém, nós temos o dever de
corresponder a este carinho de Deus por um único motivo: amor a Ele.
Santidade
é algo objetivo: é corresponder ao amor de Deus com amor dirigido a Ele e ao
próximo com oração, boas obras, virtudes, etc.
Não posso
endeusar a ninguém apenas pelo fato de que me fez um ou vários favores. O
reconhecimento da santidade vai muito além disso.
Os
beneficiados pela multiplicação dos pães – pelo menos grande parte deles – não
reconheceram a divindade de Cristo por aquele sinal grandioso, mas tiveram seus
olhos brilhando perante a possibilidade de seus anseios serem satisfeitos.
Os
milagres podem levar à fé – objetivo dos sinais prodigiosos realizados por
Nosso Senhor – ou a uma interpretação distorcida por parte de quem o experiencia,
que conduz à perda da fé.
Vivemos
numa época da proliferação de milagres, ou melhor, de pretensos milagres. Basta
ligar a televisão ou o rádio! Prometem-se milagres a torto e a direito que vão
desde a obtenção da casa própria até a cura da catarata, passando por conseguir
um emprego ideal até o casamento dos sonhos. Esta, na realidade, não foi a
atuação de Jesus. Ele não curou todas as pessoas que o procuravam. O Evangelho
afirma que, em determinadas ocasiões ou lugares, Ele não fez muitos ou nenhum milagre.
Jesus, quando passou pela Terra Santa, “fez
bem todas as coisas” (Mc. 7,37), no entanto, com o devido
respeito, podemos afirmar que não fazia milagres vinte e quatro horas por dia.
II.
Seguir a Jesus de Verdade.
Como
podemos seguir Nosso Mestre e Senhor de verdade?
Santa
Teresa d´Ávila diz, num poema, que não devemos amar a Deus nem pelo interesse
de irmos para o Céu, nem por medo de ir para o inferno. Devemos amá-Lo porque o
amamos e pronto.
“Não me
move, meu Deus, para querer-te
O céu que
me hás um dia prometido:
E nem me
move o inferno tão temido
Para
deixar por isso de ofender-te.
Tu me
moves, Senhor, move-me o ver-te
Cravado
nessa cruz e escarnecido.
Move-me no
teu corpo tão ferido
Ver o suor
de agonia que ele verte.
Moves-me
ao teu amor de tal maneira,
Que a não
haver o céu, ainda te amara
E a não
haver o inferno te temera.
Nada me
tens que dar porque te queira;
Que se o
que ouso esperar não esperara,
O mesmo
que te quero te quisera”.[note] Santa Teresa d´Ávila, Verdadeiro amor a Deus.
[/note]
A mesma
coisa se aplique à Religião. Vivemos na Igreja, somos parte da Igreja porque
amamos a Deus.
É óbvio
que ninguém é obrigado a procurar desvantagens em sua vida, entretanto é bom
refletirmos a respeito de como buscamos as vantagens. Há católicos que participam
de instituições contrárias à Igreja, ou ao Evangelho, ou à doutrina católica
por status. Um dia prestarão contas a Deus. Jesus, verdadeiro Deus, sabe das
coisas e as nota e anota: “…estais me procurando não porque vistes sinais, mas
porque comestes pão e ficastes satisfeitos” (Jo, 6,26).
O que
pensamos que seja vantagem para nós nem sempre o é. Um dia, um sábio passando
por uma pequena propriedade rural viu uma casinha simples, habitada por uma
família humilde, composta de pessoas magras que tinham como única fonte de
alimento uma vaca também magra que lhes fornecia alguns poucos litros de leite
por dia. Despedindo-se da família tomou a estrada morro acima e ficou surpreso
ao encontrar no alto do monte a vaca. De lá de cima ele enxergava a casa que
visitara e pensou naquela família tão pobre e no futuro daquelas pessoas. Não
teve dúvida. Empurrou a vaca que rolou morro abaixo morrendo imediatamente.
Alguns anos depois, passando pelo mesmo lugar, avistou uma casa bonita no lugar
do casebre de então, habitado por pessoas bem nutridas. Conversando notou que
eram as mesmas pessoas que lhe contaram uma história interessante dizendo-lhe
que eram pobres, só tinham uma vaca que garantia sua pobre alimentação, mas que
um dia esta vaca morreu e eles acordaram para a necessidade de se virar, se de
esforçar mais e conseguiram melhorar muito a sua vida. Moral da história: nem
tudo que parece vantagem o é. Temos de sempre consultar a sabedoria de Deus
para que ele nos faça entender quais são as verdadeiras vantagens nesta vida.
Às vezes, a vaca ir para o brejo ou rolar morro abaixo é uma grande vantagem
para nós.
III.
Não Escandalizar-se do que Jesus nos Ensina e Quer de Nós.
Enquanto
multiplicava os pães Jesus era querido e admirado. Quando disse que era o Pão
da Vida, que Sua Carne deveria ser comida e Seu Sangue bebido, os ouvintes se
escandalizaram e deixaram de seguir o Senhor.
Seguir o
Senhor nas facilidades é cômodo e prazeroso. Seguir a Igreja nas coisas fáceis
não tem muito segredo. Seguir o Papa em temas hoje politicamente corretos é uma
honra. Mas e as questões difíceis.
Desde
jovem notava que o Papa São João Paulo II era muito aplaudido quando falava
sobre a paz mundial, sobre os pobres e duramente criticado quando tratava de
condenar o aborto, quando defendia o celibato sacerdotal, quando falava da
seriedade da liturgia e da doutrina da Igreja. Ao mesmo Papa chamavam de
inovador e, curiosamente, de conservador. O mesmo se deu e se dá com os Papas
Bento e Francisco.
Não
podemos escolher os artigos da fé como quem escolhe artigos na prateleira do
mercado. Ou seguimos o Cristo e a Igreja, ou não os seguimos.
Aproveitemos
o Evangelho e a reflexão deste domingo para fazermos um bom exame de
consciência perguntando-nos: por que sigo a Cristo e à Igreja? Qual o verdadeiro
motivo? O que posso fazer para segui-los com intenção mais reta? O que devo
deixar, abandonar de vez na minha conduta, que está me atrapalhando de
pertencer totalmente a Cristo e à Sua Igreja?
Que cada
um conte com a assistência do Divino Espírito Santo e a materna intercessão de
Maria Santíssima para ser bem feliz nas respostas a estes questionamentos e bem
feliz também nas suas escolhas para melhorar e converter-se.
Louvado
seja Nosso Senhor Jesus Cristo!
Pe.
André Luís Buchmann de Andrade
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