VII-
REFLEXÃO DOMINICAL I
CONHECEMOS
JESUS
O Evangelho
deste 12º Domingo do Tempo Comum nos apresenta as opiniões dos apóstolos e das
pessoas sobre a identidade de Jesus, o ser de Jesus. Nenhuma dessas opiniões o
define como o Cristo, o Messias. Todos o relacionam com um profeta do passado,
que voltou à vida. A razão para tudo isso está na vida de Jesus: seus gestos,
em sua escolha de pobreza, em suas palavras sobre a conversão. Vale observar
que ele não é interpretado como um novo profeta, mas como um que já foi. Na
opinião daqueles que dizem ser Ele um dos profetas, se assim fosse, poderia ter
trazido novidades de Deus. Para Israel, ele deveria ser poderoso, rico, como um
líder armado para a libertação de Roma. Entretanto, Pedro, por sua vez faz sua
profissão de fé: Jesus é o Messias, é o Cristo de Deus. Jesus apresentou
imediatamente este itinerário, como ouvimos do Evangelho, mas tal ideia não
entrou imediatamente na mente dos discípulos. Ele é o Filho de Deus, o Salvador
da humanidade, o Chefe da Igreja, o Único Mediador junto ao Pai, O Verbo
Encarnado, o Revelador da face do Pai, o Testemunho do amor, o Rei do céu e da
terra, o Criador do universo na unidade de essência com o Pai e o Espírito
Santo, o Juiz da história, o Noivo da Igreja, a Vítima que nos faz agradar ao
Pai, o Caminho para o céu, a Vida que eleva a nossa vida, a Verdade que nos
livra da mentira e nos revela Deus, a nossa paz, aquele que é o alfa e o ômega,
o princípio e o fim; aquele em que a caducidade colocada pelos homens no mundo
é removida, aquele para quem os céus estão abertos para nós, aquele que é o
primogênito dos ressuscitados, aquele que é a única esperança de uma terra
reconciliada com Deus e consigo mesma. Não só sabemos quem é Jesus, mas
conhecemos Jesus, e o conhecemos porque o vimos no coração, nos gestos daqueles
que o anunciaram, e porque o Espírito Santo nos uniu a Ele e experimentamos seu
amor e fidelidade. Nós o conhecemos porque Ele se dá nos Sacramentos e na
palavra dos Evangelhos. Nós o conhecemos porque acreditamos. Nós, na fé, o
conhecemos. Nós, irmãos e irmãs, “conhecemos Jesus”, e daí decorre o nosso
desejo de nos amarmos como ele nos amou (cf. Jo 15,12). “Nós conhecemos Jesus”,
e sabemos que o conhecemos se observarmos os seus mandamentos, que são
mandamentos de amor; Entretanto, a verdade é que quem quiser seguir Jesus e
saber quem de fato Ele é, deve negar a si mesmo, pegar sua própria cruz todos
os dias e segui-lo ao longo do caminho que ele percorreu. Por isso, a pergunta
do evangelho trazida à nossa realidade, na verdade, é: “Quem sou Eu pra você?”
“Que lugar ocupo na sua vida?” Devemos levar nossa cruz todos os dias e,
depois, segui-lo. Assim, seguindo-o, teremos as gloriosas cruzes que o mundo
coloca sobre os ombros daqueles que testemunham Cristo, e então a humanidade
verá que “conhecemos Jesus” e que lugar Ele ocupa em nossa vida.
Dom Cícero Alves de França Bispo Auxiliar de São Paulo
Vigário Episcopal para a Região Belém
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REFLEXÃO DOMINICAL II - Confessar Jesus para segui-lo e revestir-se do seu amor
22 de
junho – 12º DOMINGO DO TEMPO COMUM
Por Pe. Francisco Cornélio*
I. Introdução geral
O centro da liturgia deste domingo é o
reconhecimento da identidade de Jesus como o Cristo de Deus, ou seja, o
Messias, com as implicações concretas que seu seguimento exige. É disso que
trata precisamente o Evangelho, com o episódio da confissão de Pedro. Na
primeira leitura, a misteriosa figura messiânica, marcada pelo sofrimento até a
morte e apresentada pela profecia de Zacarias, prefigura a identidade de
Messias sofredor que o próprio Jesus revela de si. Na segunda, o apóstolo Paulo
recorda a condição do cristão a partir do batismo: revestido de Cristo, todo
batizado compartilha da sua mesma identidade e missão. Por sua vez, o Evangelho
ensina que isso implica trilhar um caminho semelhante ao de Cristo, com a
disposição de amar sem medidas, com a coragem de carregar a cruz. Confessar
Jesus, portanto, é comprometer-se com seu projeto e tornar-se sujeito ativo na
construção do seu Reino.
II. Comentários dos textos
bíblicos
1. I leitura (Zc 12,10-11;
13,1)
Na obra atribuída ao profeta Zacarias,
estudiosos identificaram um fenômeno semelhante ao observado no livro de
Isaías: a presença de mais de um livro dentro do texto que leva o nome do
profeta. Enquanto, porém, em Isaías foram identificadas três seções autônomas,
consideradas verdadeiros livros, a obra de Zacarias apresenta apenas duas,
chamadas respectivamente de Primeiro Zacarias (Zc 1-8) e Segundo Zacarias (Zc
9-14), o que é compreensível, dada sua menor extensão. De acordo com essa
divisão, o trecho empregado na liturgia deste domingo pertence ao Segundo
Zacarias, obra de um autor desconhecido, que viveu provavelmente entre o final
do século IV e o início do III a.C., período que coincide com o começo da
dominação grega na Palestina. Isso justifica o forte acento messiânico e
apocalíptico que permeia o escrito.
A leitura compreende uma das passagens mais
difíceis do livro, tanto do ponto de vista gramatical quanto teológico. Faz
parte de uma seção literária marcada pela expectativa messiânica (12,1-14,21).
O texto traz um anúncio de salvação e libertação, cujo protagonista é
apresentado de forma ambígua: ora como o próprio Deus, ora como um enviado seu,
como sugere a mudança repentina da primeira para a terceira pessoa, logo no
início (12,10a). O mais importante, no entanto, é a promessa de mudança no
destino do povo que sofria sob o jugo da dominação estrangeira, sendo a
primeira mudança necessária a conversão interior. Para isso, é anunciado o
derramamento, pelo Senhor, de um espírito de graça e oração, a fim de que o
povo olhe para Ele, o que pode ser compreendido como um “voltar-se”, sinal de
arrependimento e renovação.
Na sequência, o texto fala de uma figura
misteriosa, tão enigmática quanto o Servo sofredor do Segundo Isaías (Is
42,1-7; 49,1-6; 50,4-9; 52,13-53,12). A morte desse personagem provoca uma
comoção geral (12,10b). O mesmo povo que o traspassou, ferindo-o de morte,
chora profundamente pelo ocorrido, o que indica um princípio de conversão.
Mesmo sem haver consenso, a maioria dos estudiosos identifica o acontecimento
com o qual a morte desse personagem é comparada, em 12,11, com a trágica morte
do rei Josias (2Rs 23,29), ocorrida em Meguido (Magedo), a qual também gerou
grande comoção na população de Jerusalém. O resultado do sofrimento e morte do
desconhecido personagem é a renovação do povo e a inauguração de nova relação
com Deus, que se torna acessível a todos (13,1).
Desde o início do
cristianismo, essa passagem de Zacarias é lida como prefiguração da paixão de
Jesus, a ponto de parte dela ser citada explicitamente pelo evangelista João,
na cena da crucifixão (Jo 19,37). O emprego dessa leitura na liturgia deste
domingo funciona como preparação ao Evangelho, no qual Jesus antecipa aos
discípulos seu destino de sofrimento, contrariando as expectativas
triunfalistas deles.
2. II leitura (Gl 3,26-29)
A carta aos Gálatas, da qual é tirada a
leitura, destaca-se pela tonalidade polêmica e, ao mesmo tempo, pela
profundidade teológica. Acredita-se que tenha sido escrita na cidade de Éfeso,
em meados dos anos 50 d.C., com a finalidade de corrigir sério problema
teológico instaurado nas comunidades da Galácia pela ação de cristãos judaizantes,
que estavam impondo as obras da Lei, principalmente a circuncisão, como
requisitos necessários à salvação. Essa posição contradizia profundamente a
pregação de Paulo, que defendia a fé em Jesus Cristo como único meio de acesso
à salvação. Por isso, a carta ficou conhecida como a “carta da liberdade
cristã”, sendo considerada o mais revolucionário de todos os escritos de Paulo.
Por certo, a passagem lida neste domingo atesta isso. Trata-se do hino
batismal, frequentemente reconhecido como a síntese e o coração de toda a
carta.
Nesse texto, Paulo
ensina que o batismo transforma radicalmente a pessoa. A fé em Jesus Cristo já
é suficiente para tornar qualquer ser humano filho de Deus (v. 26). Ao ser
batizada, a pessoa é toda revestida de Cristo (v. 27), o que significa ser
impregnada dele, passando a compartilhar sua mesma identidade, dignidade e
missão. Esse privilégio, contudo, traz consequências muito concretas para o
cristão, pois implica assumir seu estilo de vida, com a disposição de amar sem
medidas e a coragem de carregar a cruz. O resultado disso é uma nova
humanidade, um mundo sem divisões, nem barreiras, nem preconceitos, uma vez que
o revestimento de Cristo torna todos iguais (v. 28), na condição de irmãos uns
dos outros, o que não significa cancelamento da diversidade, mas valorização
das diferenças sob nova perspectiva.
É do conjunto de tudo
isso que se constitui o verdadeiro povo de Deus (v. 29), pois a humanidade
inteira é destinatária de suas promessas, cujo cumprimento se dá no amor de
Jesus, derramado sobre todo o mundo, do qual a cruz é a confirmação.
3. Evangelho (Lc 9,18-24)
O Evangelho traz o
clássico relato da confissão de Pedro sobre a identidade de Jesus, seguido do
primeiro anúncio da paixão e o reforço das exigências para o discipulado. Esse
episódio é comum aos três Evangelhos sinóticos, embora seja retratado em cada
um de maneira diversa, de acordo com as respectivas intenções teológicas e as
necessidades das comunidades destinatárias. Não obstante, em todos eles,
trata-se de um acontecimento central da vida de Jesus e, consequentemente, dos
seus discípulos, sendo considerado verdadeiro divisor de águas para a trama de
cada Evangelho. De fato, nos três sinóticos, esse episódio está inserido na
conclusão do ministério de Jesus na Galileia, muito próximo de iniciar seu
caminho para Jerusalém.
A liturgia nos oferece a versão de Lucas, que
apresenta contornos próprios desde o primeiro versículo: ele ignora a
localização do episódio em Cesareia de Filipe e, de maneira única, afirma que
Jesus se encontrava em oração, num lugar retirado, junto aos seus discípulos
(v. 18a). A oração, como se sabe, é um dos temas mais caros a Lucas. Ele faz
questão de apresentar Jesus em oração nos momentos mais importantes da sua
vida, desde o batismo (3,21) até a paixão (22,39-46). Por meio da oração, Jesus
cultivava a intimidade com o Pai e, assim, fortalecia-se para seguir sua missão
com fidelidade. Portanto, foi em clima orante que ele perguntou aos discípulos
sobre a opinião do povo a respeito da sua identidade (v. 18b). As respostas
indicam uma imagem positiva de Jesus junto ao povo, mas insuficientes, pois ele
era mais do que um profeta (v. 19).
Parece que a pergunta
sobre a opinião do povo a seu respeito era apenas um pretexto. O que realmente
interessava a Jesus, naquele momento, era a imagem que os discípulos tinham
dele e do seu projeto. Daí a pergunta dirigida a eles e prontamente respondida
por Pedro, na condição de porta-voz do grupo, em forma de confissão: “o Cristo
de Deus” (v. 20). Apesar de correta, a confissão de Pedro ainda refletia uma
visão limitada do messianismo de Jesus, que não era o Messias glorioso e
guerreiro esperado, mas o Messias Servo, destinado ao sofrimento, à rejeição, à
morte e à ressurreição. Por isso, Jesus ordenou que não contassem a ninguém (v.
21) e, logo em seguida, fez o primeiro anúncio da paixão, a fim de corrigir as
expectativas distorcidas que tinham dele e do seu messianismo (v. 22),
apresentando-se, implicitamente, como Messias sofredor, ao invés de glorioso,
como queriam os discípulos. O sofrimento anunciado por ele não era
predestinação, mas consequência de sua fidelidade ao Pai e seu projeto de
Reino.
Na sequência, Jesus
apresenta as exigências do discipulado: renunciar a si mesmo, tomar a cruz
cotidianamente e segui-lo (v. 23). Renunciar significa abandonar egoísmos e
projetos desalinhados com o Reino; tomar a cruz implica assumir os desafios e
rejeições que a vivência do Evangelho implica. Tudo isso exige fidelidade,
perseverança e, acima de tudo, uma mentalidade nova, para acolher e seguir um
Messias tão “às avessas”, comparado ao que previa a tradição. O texto conclui
com uma afirmação proverbial, que ressalta a lógica subversiva do Reino: “Quem
quiser salvar a sua vida vai perdê-la; e quem perder a sua vida por causa de
mim, esse a salvará” (v. 24). Essa inversão de valores destaca que, na visão de
Jesus, a verdadeira vida é encontrada na entrega e no compromisso com os
valores do Reino, como amor, justiça e igualdade, mesmo sabendo que o destino
de quem faz opção é a cruz. Com efeito, a salvação não é simplesmente a
preservação ou repouso eterno da alma, mas sobretudo a vida e a mensagem
libertadora de Jesus, o Salvador. Salva-se, portanto, quem assimila essa
mensagem e a transforma em vida.
Somos convidados hoje, de modo especial, a
procurar conhecer cada vez mais a identidade autêntica de Jesus, para podermos
continuar no seu seguimento. Segui-lo é confrontar-se com as estruturas do
mundo que impedem a realização, desde já, do Reino de Deus. O seguimento e o anúncio
devem ser frutos de uma relação de intimidade com ele e com o Pai. Sem
convicção e conhecimento da sua pessoa, o anúncio tende a ser distorcido.
III. Pistas para reflexão
A pergunta de Jesus aos
discípulos a respeito da sua identidade continua sendo feita, todos os dias, a
todos os cristãos. É pergunta decisiva, cuja resposta orienta a maneira de se
relacionar com ele, com Deus e com o próximo. Na homilia, é importante
estabelecer a relação entre os três textos, recordando, coerentemente, o
contexto de cada um, mostrando cuidadosamente o que os une e o que os separa. É
oportuno ressaltar as implicações concretas do seguimento de Jesus atualmente,
motivando as pessoas a identificar em si mesmas o que deve ser feito
cotidianamente para tornar o Reino de Deus cada vez mais presente na vida.
Pe. Francisco Cornélio*
*é presbítero da diocese de Mossoró-RN. Possui mestrado em
Teologia Bíblica pela Pontificia Università San Tommaso D’Aquino – Angelicum
(Roma). É licenciado em Filosofia pelo Instituto Salesiano de Filosofia – Insaf
(Recife) e bacharel em Teologia pela Universidade Católica de Salvador-BA. É
professor de Teologia no Centro Universitário UniCatólica do
RN. francornelio@gmail.com
https://www.vidapastoral.com.br/roteiros/22-de-junho-12o-domingo-do-tempo-comum-2/
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