“Conhecer
para amar”
“E vós, quem dizeis que eu sou?” (Mc
8,29). Seríamos, nós, capazes de responder com exatidão essa pergunta? Concedo
que respondê-la com exatidão não é tão fácil, pois trata-se de ir aprofundando
no conhecimento de Cristo a tal ponto de podermos dizer com o Apóstolo: “julgo
como perda todas as coisas, em comparação com esse bem supremo: o conhecimento
de Jesus Cristo, meu Senhor. Por ele tudo desprezei e tenho em conta de
esterco, a fim de ganhar Cristo e estar com ele” (Fl 3,8-9).
Contudo, com o conhecimento que já temos
podemos dar uma resposta verdadeira de quem é Cristo? Caso a resposta seja
positiva, graças a Deus; caso seja negativa, eu só posso dizer que é preciso
conhecer mais o Salvador. Tanto num caso como noutro, aproveito aqui para dar
aquele conselho tão cheio de sabedoria que alguma vez São Josemaria Escrivá
colocou num livro como dedicatória: “Que procures Cristo. Que encontres Cristo.
Que ames a Cristo”. Trata-se de viver três etapas: PROCURAR, ENCONTRAR, AMAR.
Ao mesmo tempo, e sem dúvida, essas três etapas vão acontecendo simultaneamente
em nossas vidas: nós vamos procurando, encontrando e amando o Senhor. Trata-se
de um processo, de um dinamismo, do dinamismo da vida cristã.
Jesus, mais do que com fazer milagres,
queria pregar, anunciar o reino de Deus: “Vamos a outros lugares, às aldeias da
vizinhança, a fim de pregar também ali, pois foi para isso que eu saí”(Mc
1,38). Jesus desejava anunciar-se a todos. E nós, desejamos ouvi-lo? Estamos
interessados na nossa formação cristã, em conhecer as Sagradas Escrituras, o
Catecismo da Igreja, preocupamo-nos em ler bons livros?
Num tempo de relativismo como nosso, é
preciso que tenhamos critérios verdadeiros na cabeça, que estejamos bem
ancorados na verdade. Guardemo-nos de novidades nocivas: “pois virá um tempo em
que alguns não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, segundo os seus
próprios desejos, como que sentindo comichão nos ouvidos se rodearão de
mestres. Desviarão os seus ouvidos da verdade, orientando-se para as fábulas”
(2 Tim 4,3-4). Entre as várias maneiras de explicar o que é “comichão”, gostei
muito daquela que diz que é uma “coceira”, ter comichão nos ouvidos é ter uma
espécie de coceira, de inquietação em buscar novidades. É preciso que sejamos
prudentes, para que não sejamos enganados pelos falsos mestres que tanto
prometem; geralmente prometem coisas que agradam os nossos sentidos, mas que
não preenchem os nossos corações desejosos de Deus e das coisas eternas.
São Vicente de Lerins dizia que “mal
começa a espalhar-se a podridão de um novo erro e este, para justificar-se,
apodera-se de alguns versículos da Sagrada Escritura, que, além do mais,
interpreta com falsidade e fraudulentamente; é preciso imediatamente usar as
passagens dos Padres da Igreja para interpretar as passagens em questão” – ou
seja, atenhamo-nos à Bíblia e à Tradição viva da Igreja, pois são os veículos
através dos quais nos chega a Revelação divina, a Palavra de Deus; esta, por
sua vez, é interpretada pelo Magistério da Igreja. Assim teremos certeza de que
estamos na verdade.
Outra coisa: cuidado com os maus livros!
Fazem muito dano, muitas pessoas podem perder-se por causa da leitura de um
livro mal, com má doutrina. São Francisco de Sales era taxativo neste ponto,
dizia: “Guarda-te, sobretudo, dos maus livros; por nada do mundo cheguem a
seduzir-te certas obras muito admiradas pelos cérebros fracos que orgulham-se
de colocar tudo em dúvida, de menosprezar tudo e de burlar-se de toda norma
tradicional. Busca, ao contrário, livros de sólida doutrina”. Para quê ler
livros que falam mal da Igreja, do Papa, de Nossa Senhora? Além de causar-nos
desgostos, poderiam seduzir-nos.
Todo ser humano tem a obrigação de
buscar a verdade. Todo ser humano precisa conhecer a lei natural. Para o
cristão, além da lei natural, a lei divina positiva (os mandamentos da lei de
Deus) e os mandamentos da Igreja. Este é o mínimo necessário. Temos também a
obrigação de formar um critério seguro que compreende a de manter uma adequada
luta ascética para combater os próprios pecados. Não nos esqueçamos de que
“vida do homem sobre a terra é uma luta” (Jó 7,1). E a luta para evitar o
pecado faz com que mantenhamos a sensibilidade para as coisas espirituais e a
juventude no amor de Deus.
O pecado faz com que distorçamos o
sentido da realidade. Preocupemo-nos todos e de verdade com a nossa formação
doutrinal, com a formação da nossa consciência. O cristão que não se preocupa
com a própria formação vai se afastando da verdade de Deus, acontece com ele
algo semelhante ao que acontecia com aquele homem triste. Aquele pobre homem
entrava frequentemente no boteco para pedir um pinga com limão, ou melhor,
várias pingas com limões. Enquanto isso, aproveitava para desabafar as suas
penas com o paciente proprietário do boteco que escutava em silêncio enquanto
limpava o balcão e atendia os outros fregueses. Mas certo dia, aconteceu uma
coisa inusitada: aquele homem triste pediu um pinga com suco de laranja.
“Cachaça com suco de laranja?!” – perguntou admirado o dono do bar. “É que
estou sentindo o estômago arder um pouco” – explicou o pobre pinguço. Nos dias
seguintes, o homem triste foi mudando os pedidos: pinga com suco de abacaxi… a
dor não passou. Pinga com suco de pêssego… a dor só aumentava. Pinga com suco
de maçã… a dor persistia. Os pedidos foram sucedendo-se durante vários dias:
cachaça com suco de uva, de maracujá etc. Contudo, o homem triste estava mais
abalado e a dor no estômago ficava mais intensa. Finalmente, num determinado
dia, chegou no boteco e não pediu nada, mas queria fazer uma confidência ao
proprietário do boteco: “sabe de uma coisa, amigo! Acho que eu descobri o
motivo da minha doença”. O dono do bar perguntou curioso: “qual?”. Então o
homem triste, enquanto apoiava o cotovelo no balcão e segurava o queixo magro:
“as frutas me fazem mal. Todas elas”.
Quem não vive como pensa, acaba pensando
como vive e… deformando a própria consciência. Acaso não é isso que
infelizmente temos visto entre aqueles que se dizem modernos e envelhecem-se
nos próprios vícios e pecados.
Maria Santíssima é “sedes sapientiae –
sede da sabedoria”, peçamos a ela que nos ajude a procurar, a encontrar e a amar
mais e mais o seu Filho Jesus e Nosso Senhor. Que nunca deformemos na nossa
mente o rosto amável do Senhor por causa da nossa visão deformada. Que a nossa
formação nos ajude a conhecer o Cristo do Evangelho, o Cristo da Igreja, o
Cristo da nossa fé.
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa
Nenhum comentário:
Postar um comentário