NATAL: CELEBRAÇÃO DE FÉ E
ESPERANÇA
Padre Wagner
Augusto Portugal.
Estamos, neste domingo, chegando aos
umbrais do tempo do Natal. Percorremos todo este itinerário de reflexão e de
espera pela vinda do Senhor pela celebração jubilosa do Santo e Venturoso
Natal.
A figura litúrgica que vai centrar a
celebração de hoje é a mulher grávida. Maria e Isabel se encontram, grávidas e
na expectativa de um novo parto da Salvação de Deus. A salvação prometida a
Israel está próxima. A chegada do Emanuel, que quer significar Deus Conosco,
descortina a verdade sobre o Pai. Maria é a portadora viva do Salvador, a arca
da nova e eterna aliança, e com alegria proclama o mistério da encarnação que
nela se concretizou. Por Maria, Nosso Senhor Jesus Cristo assume a humanidade,
ao mesmo tempo que é Deus.
O que é o Natal? O NATAL é a festa da
visita de Jesus que vem estar conosco, que vem visitar a nossa casa, que vem
visitar a nossa família, que vem visitar o nosso trabalho, que vem visitar a
nossa vida de fé comunitária e eclesial.
Agora para receber qualquer visita
sempre há uma ingente preparação. A Liturgia de hoje nos propõe um roteiro para
receber Jesus que vem nos visitar. Lucas (cf. Lc. 1,39-45) descortina o
encontro entre Maria, uma jovem que traz no ventre Jesus, o Salvador; e Isabel,
sua prima velha que concebeu, como Maria, por milagre de Deus, João Batista, o
precursor da salvação. História celestial, mas totalmente premiada pela
humanidade.
Isabel recebe Maria e Jesus que está em
seu ventre em exultante alegria. Alegria que contagiou o ventre da Virgem
Maria.
Tudo isso para que tenhamos a convicção
de que a celebração do Natal é uma celebração eminentemente de Fé e de
Esperança cristã.
Maria, tomando conhecimento de que sua
parenta Isabel, já na velhice iria dar a luz a um Menino, notícia recebida do
Arcanjo, demonstrando que para Deus nada era impossível, não teve respeito
humano. Arrumou suas malas, andou numa viagem de 150km, o que demoraria uns
três dias, e foi estar com sua prima Isabel. Qual o significado da visita de
Nossa Senhora a sua prima Isabel? Pura e simplesmente para servir a Isabel, já
idosa e grávida, nos afazeres domésticos nos últimos três meses de gestação de
Isabel. Depois Nossa Senhora serviria de companhia para a sua prima Isabel, bem
como estaria ali para demonstrar que a graça e ação de Deus transforma a vida
das pessoas e fazem destas pessoas instrumentos da salvação.
Isabel elogia a fé no cumprimento das
palavras do Senhor. Este espírito de fé – que não dispensa as razões e os
sinais da verdade – é uma das condições para bem se receber a chegada de Jesus
no Natal. Natal somente se entende com fé. Com espírito de fé, de esperança e
de caridade. Assim sendo o Natal de Jesus é antes de tudo um dia de fé na
pessoa e na missão divina e salvadora do Redentor Jesus.
A primeira dimensão do Natal é a fé em
Jesus e em sua Missão. E isso fica claro hoje com a exaltação de Isabel para
com Nossa Senhora: “Bendita
és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre!”. Mas
a segunda dimensão do Natal é a incessante e radiosa alegria. O Natal é a festa
da alegria. Alegria que é anunciada por Isabel, pelo Menino que pula no Seio de
Isabel.
Mas, porque a alegria? A alegria é
fundamental neste momento de recepção de Jesus, como o próprio anjo chama os
pastores e anuncia: “uma
grande alegria: o nascimento do Cristo Senhor”. (cf. Lc 2,10-11).
Isabel enumera as alegrias que
celebramos: Jesus se torna carne humana no seio da Virgem Maria; Deus escolheu
uma Mulher da terra para ser mãe do seu Divino Filho. O que significa este
gesto? Com a escolha de Maria para ser a mãe de Jesus Deus fez uma aliança com
toda a humanidade, se uniu a toda a humanidade. Hoje Deus cumpre a promessa da
salvação. E como sempre age com superabundante misericórdia: não só estende a mão
para salvar-nos, não só assume nossa humanidade, não só passa a morar conosco,
mas reparte conosco sua divindade. Fazendo um de nós Jesus torna possível o
doce sonho da imortalidade para todos os nascidos de mulher.
Isabel prefigura a alegria que hoje nos
contagia: tornamo-nos, com o Natal, participantes da natureza divina.
Somos “imagem do Deus
invisível!”.
A terceira dimensão da liturgia de hoje
é o respeito pelo mistério de Deus. No encontro entre o mistério divino e o
mistério humano na pessoa de Jesus une a nossa fé na vida eterna. Mistério que
não precisa ser explicado, mas vivenciado pela nossa fé católica, apostólica e
romana. Deus é, sobretudo mistério! Não o alcançamos de muitas maneiras e, ao
mesmo tempo, é sempre inacessível em seu ser e em muitos de seus atos. A
encarnação de Jesus é um desses atos que, apesar de ter acontecido
historicamente, escapa à nossa intelecção. O comportamento de Isabel hoje,
diante do mistério da encarnação de Jesus, é o melhor exemplo de como devemos
encarar o Natal. Acredita na encarnação de seu Senhor no seio da Virgem Maria,
rejubila em sua fé e proclama-a em alta voz. Assim deve ser o grande momento de
celebrarmos a espera do Natal.
Serviço e grandeza, duas faces
inseparáveis do Mistério de Deus cuja manifestação celebramos dentro de poucos
dias. Mistério de amor. Claro amor é uma palavra humana. Deus é sempre mais do
que conseguimos dizer. Dizem os filósofos que o amor movimenta o mundo, mas é
preciso ver de que amor se trata. O amor autêntico recebe sua força da doação e
da misericórdia. Num sentido infinitamente superior, se pode dizer isso de Deus
também. O que aconteceu em Jesus no-lo revela. Este amor de Deus para os homens
ultrapassa o que entendemos pelo amor, mas é um amor verdadeiro, comparável
quase com o amor dos esposos, quando autêntico: os céus que fecundam a terra,
Deus que cobre uma humilde criatura com sua sombra. A liturgia não tem medo
destas imagens. Fecundada pelo orvalho do Céu, a terra se abe para que brote o
Salvador.
Na primeira
Leitura (Mq 5,1-4) nos constatamos que de Belém sairá o Salvador de Israel.
Miquéias não coloca Jerusalém no centro da profecia, mas Belém, terra de origem
de Davi. De sua dinastia deverá um dia brotar o verdadeiro Rei de Israel
conforme o coração de Deus. A Primeira Leitura evoca o paradoxo do minúsculo
município de Belém, que, porém, é grande por causa de Javé, que cumprirá sua
promessa de chamar novamente um “pastor” da casa de Jessé (pai de Davi). A
pequena cidade torna-se sinal do plano inicial de Deus (suas origens remontam a
tempos antigos – Mq 5,1). Aqui fica claro não a grandeza segundo os critérios
humanos, ao contrário a grandeza da santidade dos pequenos que conta para Deus
e se manifesta em Maria.
A primeira
leitura retoma as promessas messiânicas. Num quadro de injustiça e de
sofrimento – e, portanto, de frustração e de desânimo – o profeta anuncia a
chegada de um personagem, no futuro, que reinará sobre o Povo de Deus. Esse
personagem, enviado por Deus, será da descendência davídica, supondo-se,
portanto, que poderá restaurar esse tempo de paz, de justiça e de abundância
que o Povo de Deus conheceu na época ideal do rei David. A última frase desta
leitura (“Ele será a Paz”) define o conteúdo concreto desta esperança: a
palavra “shalom” aqui utilizada significa tranquilidade, ausência de violência
e de conflito, mas também bem-estar, abundância de vida, numa palavra,
felicidade plena. A releitura cristã vê nesta promessa de Deus veiculada por
Miqueias uma referência a Jesus, o descendente de David, nascido em Belém. A
missão de Jesus não passa, no entanto, pela instauração do trono político de
David (um reino que se impõe pela força, pela riqueza, pelas jogadas políticas
e diplomáticas), mas sim pela proposta de um reino de paz e de amor no coração
dos homens. Os cristãos, seguidores de Jesus, são a comunidade que aceitou o
convite para integrar esse “reino” de paz e de amor que Jesus veio propor.
A segunda
Leitura (Hb 10,5-10) nos fala que “Eis que venho para fazer tua vontade!”.
Hebreus compreende a morte de Cristo como a plenificação do culto sacrifical do
Antigo Testamento. Todos os antigos sacrifícios prefiguram o sacrifício de
Cristo, que nos santifica uma vez para sempre. Interpreta o Salmo 40,7-9 no
sentido da obediência de Jesus para cumprir esta missão, para a salvação de
todos nós. Jesus, que vem ao mundo para tornar supérfluos todos os sacrifícios
e holocaustos, já que ele mesmo imola de modo insuperável sua existência em
prol dos seus irmãos.
Colocando na boca de Jesus as palavras
de um salmista (cf. Sl 40,7-9), o autor da “Carta aos Hebreus” afirma que, no
mundo da nova “aliança”, não é já o sacrifício de animais que realiza a
comunhão com Deus, a entrega absoluta do crente a Deus, o perdão dos pecados; é
a encarnação de Jesus, a entrega total da vida do próprio Cristo, o seu
respeito absoluto pelo projeto e pela vontade do Pai que permitem a aproximação
e a relação do homem com Deus. Quem quiser descobrir o Pai e aproximar-se
d’Ele, olhe para Jesus; porque Jesus ensinou-nos, com a sua obediência ao projeto
do Pai, como deve ser essa relação de filiação com Deus.
A proposta libertadora de Deus para os
homens alcança o mundo através da fragilidade de uma mulher (recordar o
contexto social de uma sociedade patriarcal, onde a mulher pertence à classe
dos que não gozam de todos os direitos civis e religiosos) que aceita dizer
“sim” a Deus. É necessário ter consciência de que é através dos nossos limites
e da nossa fragilidade que Deus alcança os homens e propõe o seu projeto ao
mundo.
O Natal está próximo! Nos preparemos! Em
cada Santa Missa tornamo-nos, em Cristo, corpo dado, dispostos a colocar-nos a
serviço dos necessitados, a exemplo de Maria. Por Maria, o Senhor nos visita,
trazendo a salvação. Motivo de alegria e de ação de graças! Como gesto concreto
nesta preparação mais próxima ao Natal, vamos repetir o gesto de Maria, gesto
de caminho de salvação. Que cada um de nós visitemos os mais necessitados de
nossa comunidade, levando em nós o Cristo, para que também estes irmãos
preferidos de Deus exultem de alegria no Senhor. Assim é Natal, amém!
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