SANTO
AGOSTINHO
1-
Santo
Agostinho ensina a dar catequese
Livro e
Revista “A Instrução dos Catecúmenos”, de Santo Agostinho, é um clássico,
uma obra-prima da catequese, da teologia e da pedagogia.
Por volta de 405, em Cartago (Norte de
África), o diácono Deo-gratias tem um problema. É o responsável por ensinar as
bases da fé aos candidatos adultos ao catecumenato (percurso de iniciação
catequética e litúrgica que conduz ao batismo), tem boa reputação, tem talento
para falar, mas sente-se “diminuído e cheio de desgosto”, porque não sabe a
verdadeira maneira de catequizar. Por onde começar? Como captar a atenção dos
ouvintes? O que fazer para não maçar?
Decide, por isso, escrever ao seu
amigo Agostinho, bispo de Hipona. “Confessas e lamentas – escreve Agostinho – o
que te sucede com frequência, quando, em sermão longo e monótono, não apenas
aquele que instruis pela palavra e os demais ouvintes, mas tu mesmo te sentes
diminuído e cheio de desgosto de ti. Obriga-te assim a necessidade a exigir de
mim; em nome da caridade que te devo, apesar das minhas ocupações, eu não me
recuse a escrever-te algo sobre o assunto”. E o que Agostinho escreve é um
livrinho em 27 capítulos, em que revela o seu “gênio teológico” e a sua “aguda
penetração psicológica”. O mestre ensina a teoria e dá-se ao trabalho de
aplicar o que ensina, fornecendo um exemplo de preleção catequética, no caso,
uma catequese bíblica sobre o verdadeiro descanso (isto é, a verdadeira
felicidade), que “não deve ser procurado nos bens instáveis, nem nas riquezas
nem nas honras”.
Antes disso, Agostinho responde, uma a
uma, às “seis causas de enfado” no ato catequético. Uma delas resolve-se com
uma linguagem acessível: “Somos obrigados a descer, de alguma forma, das
alturas do pensamento e demorar-nos na lentidão das sílabas…”. Outra, com
adaptação ao ouvinte e criatividade: “Ora, se realmente nos desagrada repetir
muitas vezes estórias comuns e próprias para crianças, adaptemo-las aos nossos
ouvintes com amor fraterno, paterno e materno e, unidos a eles pelo coração,
também a nós nos parecerão novas”.
O espaço não permite referir cada uma
das seis causas, mas não deve ser difícil notar que não há muita diferença
entre as causas de aborrecimento (“seca!”) na catequese de há 1500 anos e nas
actuais. E a solução continua a ser a mesma: o trabalho e preparação do/a
catequista.
Hoje, para aprender a dar catequese,
poucos ou nenhuns lêem esta obra de Santo Agostinho, que escreveu a pensar nos
adultos, mas a verdade é que está lá tudo. Esta “Instrução” lê-se com imenso
agrado. É impressionante como o bispo de Hipona continua a ter capacidade de
atrair o leitor actual (a tal penetração psicológica). É notável a modernidade
de Agostinho de Hipona.
Se Agostinho escreveu uma teoria e
prática da catequese, hoje existem revistas que ajudam nessa tarefa fundamental
da Igreja. Vai já no número 16 a “Catequistas”, revista dos salesianos. Para se
ter uma ideia do seu conteúdo, vejamos os principais artigos do número 15:
“Rute [figura bíblica]: experimentar Deus na fidelidade”; “O grupo leva a
Jesus”; “Acompanhamento na catequese”; “Usar o retroprojetor na catequese”;
“Educar o coração”; “Preparar (bem) um encontro de catequese”.
Os artigos leves, profusamente
ilustrados, com o essencial da informação em destaques, fazem desta revista uma
instrumento muito útil para a missão do catequista, que, como muitos dirão, é
aliciante, fundamental, mas não sem dificuldades.
https://sites.ecclesia.pt/cv/santo-agostinho-ensina-a-dar-catequese/
2- "Agostinho e a primeira
Catequese aos não Cristãos"
Santo Agostinho nos presenteou com uma obra rara,
possivelmente única em seu gênero, o De Catechizandis Rudibus, traduzido e
publicado no Brasil como Primeira Catequese aos não Cristãos. É o primeiro
manual para catequistas que chegou até nós. O nosso interesse por ele é mais
que justificado. É uma primeira catequese a quem pensa em se fazer cristão.
Anterior, portanto, ao catecumenato, e nos dá uma boa ideia de como se
ingressava nele, no século IV, no Norte da África. Pode ser datada entre 399 e
405.
O primeiro desafio desta obra já está na tradução de seu
título. Literalmente, poderia ser Catequese aos rudes. Mas isso poderia nos
fazer pensar em pessoas ignorantes ou grosseiras. Agostinho usa, no entanto,
este termo para indicar aos pagãos que se aproximam pela primeira vez de
catequistas cristãos para se informarem sobre o cristianismo, e recebem, assim,
os primeiros rudimentos da fé cristã. Em outras palavras, recebem as
informações essenciais sobre o cristianismo, para saber se de fato querem se
tornar membros da Igreja. Daí a opção por traduzir como primeira catequese, uma
espécie de pré-catecumenato.
O termo catequese procede do grego katechein, que
comumente indicava fazer ressoar, instruir alguém oralmente sobre alguma coisa.
Entre os cristãos, este termo foi aplicado em um contexto religioso e assumiu,
muito cedo, um sentido técnico. Já o encontramos em Gal 6,6. Enquanto tal,
katechesis (catequese) indica uma instrução feita a quem manifestou a intenção
de saber mais sobre o cristianismo e quer receber o batismo, distinguindo-se do
Kerigma (primeiro anúncio), apresentado a quem quer que seja, sem mesmo ter
pedido.
A ocasião para este escrito foi o pedido de um diácono da
Igreja de Cartago, Deogratias, que andava insatisfeito com suas catequeses:
“Deogratias, meu irmão, tu me pediste que escrevesse
alguma coisa que te servisse para a primeira catequese a não cristãos. De fato,
contaste que, em Cartago, onde exerces o diaconado, muitas vezes, conduzem a ti
pessoas a serem iniciadas na fé cristã (...) te questionas sobre a maneira mais
fácil de transmitir aquilo que nos torna cristãos pela fé (...) admitiste
também já ter acontecido, muitas vezes, que tu mesmo ficaste abatido e
entediado com teu discurso longo e sem vida... “ (I,1)
Agostinho irá analisar seis razões que podem causar a
insatisfação tanto do catequista quanto do seu ouvinte e para cada uma delas
apresenta uma solução. É uma verdadeira pedagogia catequética, mas que não vem
ao caso para nós nesse momento.
“Uma coisa é verdade: os outros nos ouvem com muito mais
prazer quando nós mesmos estamos contentes com o que fazemos. Pois a nossa
alegria afeta a própria qualidade da nossa fala, que sai mais fácil e
aceitável. (...) O mais importante é que a pessoa catequize com alegria, seja
qual for a maneira que usar (de fato, quanto mais alegre ela for, mais será
agradável). O máximo de empenho deve ser colocado nisso. A regra está aí: ‘Deus
ama quem dá com alegria’; se isso vale para os bens materiais, mais ainda vale
para os bens espirituais” (II,4)
Essa primeira catequese é personalizada e deve partir das
expectativas e circunstâncias de quem está sendo instruído. Já estamos
distantes daquele clima de perseguição imperial, quando se faziam cristãos os
verdadeiramente convertidos. Agora o cristianismo é a religião oficial e única
permitida. Muitos querem se fazer cristãos por motivos nem sempre justos: “Se
alguém quer ser cristão, visando alcançar vantagens das pessoas que pensa
desagradar se não o fizer, ou pretendendo evitar prejuízos daqueles de cuja
ofensa ou inimizade têm medo, de fato, não está querendo ser cristão, mas
somente fingir ser cristão. Pois a fé não é uma questão de ter uma aparência
que agrade aos outros, mas de um coração que crê” (V,9). Daí a importância de
uma investigação prévia sobre o candidato. Aparece aqui o papel do “introdutor”
que era bem delimitado nos séculos anteriores e que agora nem sempre está
presente.
“Na verdade, seria útil, se fosse possível, aqueles que o
conhecessem informar-nos antes, em que estado de ânimo ele se encontra ou quais
os motivos que o levaram a aceitar a religião. Se não houver ninguém que nos
informe, ele mesmo deve ser interrogado, a fim de podermos começar a instrução
a partir daquilo que ele responder” (V,9)
Agostinho sabe que se o candidato se apresentou com falsa
intenção, buscando vantagens humanas, ele irá mentir. Não deverá, no entanto,
ser rejeitado, neste momento, por isso: “... devemos assumir a regra de não
rejeitar a mentira como se já fosse coisa certa, mas fazer com que ele goste de
ser aquilo que deseja parecer. (...) De tua parte, te esforçarás para que ele
acabe por desejar, de própria vontade, aquilo que ainda não estava querendo por
engano ou por fingimento” (V,9). Não é demais lembrarmos que este exame prévio
é apenas para o ingresso no grupo dos catecúmenos. Para receber os sacramentos
da iniciação cristã ainda terá uma longa caminhada e outros exames.
“É verdade que, muitas vezes, a misericórdia de Deus
interfere, através do ministério do catequista, fazendo com que, tocada pela
palavra, a pessoa queira se tornar aquilo que tinha decidido fingir. Quando, de
verdade, começar a querer ser cristão, consideremo-lo como admitido à
catequese. Nunca sabemos quando aquele que já vemos presente de corpo, estará
deveras de coração; mas devemos tratá-lo de tal maneira que nasça nele essa
vontade, se é que ainda não existe” (V,9)
Alegria e
persistência! Eis as duas grandes virtudes que, juntas à fé e à prática de
vida, animam o/a catequista e o/a ajudam na conversão do catequizando.
Pe. Luiz Antônio Belini
Colunista do Jornal Servindo
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