REFLEXÃO
DOMINICAL III
Meus caminhos não são os vossos (Is 55,8)
Por Aíla Luzia
Pinheiro Andrade, nj
I.
INTRODUÇÃO
GERAL
As
leituras de hoje exortam-nos a tomar cuidado para não reduzir Deus aos
critérios humanos, por melhor que sejam. Deus ultrapassa tudo o que se pode
pensar ou dizer sobre ele. Muitas vezes, seus planos se tornam incompreensíveis
ao ser humano. Quando isso acontece, resta-nos perseverar na fidelidade sem
mudar de caminho, a exemplo de Jesus, que disse: “Pai, afasta de mim este
cálice, contudo não se faça a minha vontade, mas, sim, a tua” (cf. Mt 26,39).
II.
COMENTÁRIO
DOS TEXTOS BÍBLICOS
1.
Evangelho
(Mt 20,1-16a): “Os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos”
O texto situa-se no “sermão sobre a
comunidade”. Jesus continua instruindo seus seguidores sobre como se comportar
no mundo.
O Reino dos Céus é aqui comparado ao
proprietário que contratou vários trabalhadores para sua vinha, em horários
diferentes. No final, paga a todos igualmente, começando pelos últimos,
contratados à tardinha, até os primeiros, contratados de manhã.
A maneira como o patrão trata seus
operários nos chama a atenção para a gratuidade com que Deus nos acolhe em seu
reino. Não é segundo os critérios humanos que Deus age em favor da humanidade.
A estranheza das palavras de Jesus nessa parábola deve nos chamar a atenção
para nossa maneira de julgar a Deus ou de atribuir-lhe atitudes especificamente
humanas.
Geralmente o ser humano quer
recompensa por suas boas ações. E, quando não se sente recompensado, acha que
Deus é injusto, ou não o ama, ou esqueceu-se dele. Costuma-se até dizer: “Por
que Deus não atende às minhas preces? Sou tão dedicado, tenho tanta fé!”
Mas a maneira de Deus agir não se
iguala à nossa. Ele é absolutamente livre para agir como quiser. E essa
liberdade é pontuada por seu amor incondicional e sua generosidade inestimável.
Deus nos ama e deu-nos mais do que ousamos pedir. Deu-nos a vida. Deu-nos a si
mesmo no seu Filho. Deu-nos a eternidade ao seu lado.
Por isso, o Reino dos Céus não se
apresenta como recompensa por nossos méritos pessoais. É puro dom de Deus, que
nos chama gratuitamente a participar da vida plena. Cabe-nos acolhê-lo como dom
ou ficar numa atitude mesquinha de sempre esperar recompensas por méritos
prévios. Isso não é cristianismo, não é gratuidade. Isso não é resposta amorosa
a Deus.
1.
I
leitura (Is 55,6-9): Que o perverso deixe o seu caminho
O texto da primeira leitura é uma
oferta de perdão, paz e felicidade aos pecadores. Em primeiro lugar, assegura
que as orações e o arrependimento serão acolhidos por Deus: “buscai o Senhor…
invocai-o… deixe o mau caminho… converta-se… que o Senhor se compadecerá” (v.
6-7).
Deus não é como o ser humano, seus
pensamentos são totalmente diferentes. Ele é infinitamente fiel: não desiste de
seus filhos, não cessa de ofertar-lhes sua misericórdia sem limites. Ao
contrário, o ser humano desiste de Deus, trilha outros caminhos, bem diferentes
daqueles propostos pelo Senhor.
“Deixe o perverso o seu caminho, o
iníquo, os seus pensamentos; converta-se ao Senhor… volte-se para o nosso Deus”
(v. 7). Em primeiro lugar, arrepender-se é mudar de caminho, de atitudes, é
tomar outros tipos de decisões, fazer outras escolhas. Mas não é só isso: há
que mudar também os pensamentos, ou seja, transformar-se internamente, mudando
de mentalidade em relação ao mundo, às pessoas e às situações; mudar de ideia a
respeito de si mesmo, mudar até mesmo as concepções sobre Deus e sobre seus
caminhos, porque o Senhor sempre estará muito além do que se pode dizer e
pensar a respeito dele.
Converter-se é mudar de mente e voltar
aos caminhos do Senhor. Mas voltar a ele não porque houve total compreensão do
seu projeto, e sim porque ele é soberano e misericordioso. A vida humana só tem
sentido no relacionamento com Deus, e quando seus caminhos são difíceis de
entender e trilhar, resta, acima de tudo, perseverar na fidelidade.
2.
II
leitura (Fl 1,20c-24.27a): Meu viver é Cristo
Grande exemplo de perseverança, mesmo
que os planos de Deus se tornem incompreensíveis, é-nos dado na leitura da
epístola aos Filipenses. O cristão vive unicamente para Deus, não em função de
recompensas por méritos pessoais. Qualquer que seja a situação, boa ou ruim,
deve perseverar no bem e na busca de agradar unicamente a Deus, seguindo em
frente sem hesitar.
O cristão não deve desanimar nunca,
mesmo se, depois de repetidos esforços, sentir-se fracassado ou mesmo perseguido,
como o apóstolo Paulo. É necessário confiar somente em Deus, pois só ele pode
dar eficácia à atividade humana. Mesmo sem entender o que acontece consigo, o
cristão deve viver de modo digno do evangelho (v. 27).
III.
PISTAS
PARA REFLEXÃO
Não considerar a parábola no plano da
justiça social, mas respeitar a estranheza das palavras de Jesus, que tem por
objetivo nos conscientizar de que o Reino de Deus não se baseia em
mérito-recompensa, mas é puro dom. O próximo domingo será o dia da Bíblia; é
bom destacar a importância do itinerário do povo de Deus, comparando-o ao
daqueles trabalhadores das primeiras horas. Os hebreus foram os primeiros a
responder “sim” ao apelo do dono da vinha. As demais nações herdaram desse povo
as alianças, as promessas, a história e, principalmente, o Messias. Sejamos
gratos a Deus e a Israel, nosso irmão mais velho, fatigado pelo dia inteiro de
trabalho.
Aíla Luzia
Pinheiro Andrade, nj
Graduada em Filosofia pela
Universidade Estadual do Ceará e em Teologia pela Faculdade Jesuíta de
Filosofia e Teologia (Faje – BH), onde também cursou mestrado e doutorado em
Teologia Bíblica e lecionou por alguns anos. Atualmente, leciona na Faculdade
Católica de Fortaleza. É autora do livro Eis que faço novas todas as coisas –
teologia apocalíptica (Paulinas). E-mail: aylanj@gmail.com
https://www.vidapastoral.com.br/roteiros/21-de-setembro-25o-domingo-comum/
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