REFLEXÃO
IV
SOBRE A BUSCA DE DEUS COM TODAS AS FORÇAS
Conheço pessoas que gostam de enviar mensagens
de otimismo pelas redes sociais; e têm extensa lista de destinatários. Os
livros de autoajuda são os mais vendidos, pois todos precisamos de colo.
Mensagens açucaradas, porém, têm um limite cruel: a realidade do dia a dia, que
teima em não concordar com o mundo que idealizamos. Uma hora a dor chega sem
aviso prévio. Tiro conclusões: o conforto não é a solução suprema para tudo;
não existe almoço grátis; e, infelizmente, nem sempre o bem triunfa. Recados
que chegam através das palavras precisam ser interpretados. Alguns confirmam o
quê acreditamos. Outros, nos contrariam frontalmente. Alguns nos dão razão, e
outros nos denunciam sem dó. A Bíblia também é assim. Muitas passagens nos
enchem de consolação. Outras, serão eternamente incômodas, ferem nossos
interesses. Hoje celebramos o Dia Nacional da Bíblia. Aproveito para lembrar
que ela é o livro do Deus vivo e não simplesmente um livro de autoajuda. A
“parábola dos trabalhadores da última hora” responde à pergunta feita por Pedro
no final do capítulo 19 de Mateus: “Eis que deixamos tudo e te seguimos. O que
haverá para nós?” Ora, quem deixa tudo por Jesus, recebe Jesus! Quem busca
Deus, encontra Deus! Haverá recompensa maior? Quem encontra Deus não precisa de
nada mais, pois encontrou tudo o que lhe basta. Infelizmente, nem sempre é
assim. Há muita disputa por reconhecimento. Quem se doa muito quer ser
recompensado mais que os outros. Há quem se considere mais importante porque
tem mais tempo de caminhada cristã. Há também quem fica indignado porque guarda
os mandamentos e deve partilhar o pão eucarístico com pessoas menos fieis.
Quando percebo essas disputas, vejo a parábola se concretizando: a tristeza do
primeiro operário não é pelo salário. Ele estava satisfeito: foi este o acordo
com o patrão. O problema era aturar a alegria do próximo. Não é fácil
alegrar-se com os que se alegram! É mais fácil chorar com os que choram. Foi
por esse motivo que o filho mais velho não quis entrar na festa do filho
pródigo. O poeta gaúcho Sérgio Napp escreveu: “Levantar-se a tempo de acordar o
sol, preparar a erva para o chimarrão; leite para os guachos, roupa no varal;
água na cacimba e varrer o chão. Bate a roupa, torce o corpo, enreda o campo.
Bebe o sonho, esfrega a vida, enxuga o tempo. Forja o riso, enrola os sonhos,
esfrega os olhos. Torce a vida, bate o medo, esfola as mãos...”. A ponderação é
esta: de que adianta uma vida de renúncias se os pecadores nos precederão no
Reino de Deus? E eu pergunto: você fica triste quando vê que o outro é melhor
sucedido? Quem recebe Jesus não precisa aspirar mais nada, pois seu cálice
transborda. Que Deus nos dê a graça de sorrir com a felicidade do irmão. Que
Deus nos livre dos conflitos e das vãs disputas pelas coisas fúteis deste
mundo.
Dom Jorge Pierozan
Bispo Auxiliar de São Paulo
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