REFLEXÃO
DOMINICAL II
Evangelho:
Mt 2,1-12
Padre
Fábio Siqueira
O Domingo, dia da nova criação, é o
centro e o ápice da nossa semana. Ainda neste clima que o tempo do Natal do
Senhor nos proporciona, celebramos hoje a Solenidade da Epifania do Senhor. O
que vem a ser esta festa? A palavra Epifania, de origem grega, significa “manifestação”. Era uma
palavra usada no mundo grego para designar a vinda do soberano à determinada
cidade. Esta se tornou a palavra que os cristãos começaram a usar então para
designar a vinda do Verdadeiro Soberano, do Desejado das Nações, a vinda do
Cristo, nosso Senhor e Salvador, que “manifestou–se” a todas as nações na
simplicidade da gruta de Belém.
Cristo é aquele que veio para realizar
a palavra da profecia que acabamos de ouvir. Isaías hoje nos diz “Levanta-te, acende as luzes,
Jerusalém, porque chegou a tua luz, apareceu sobre ti a glória do Senhor. Eis
que está a terra envolvida em trevas, e nuvens escuras cobrem os povos; mas
sobre ti apareceu o Senhor, e sua glória já se manifesta sobre ti.” Cristo
é a luz que ilumina Jerusalém. Ele é o rei cantado pelo Salmo 71 que também
hoje a Igreja coloca em nossos lábios. Ele é o rei que vem governar os povos
com justiça e julgar com equidade os pobres. Cristo é aquele ao qual “todas as nações da terra hão de
adorar”.
Na festa da Epifania nós celebramos o
mistério da salvação de Deus. Esse mistério – ou seja, o plano salvífico de
Deus a respeito da humanidade, oculto às nações passadas, segundo nos diz o
apóstolo na segunda leitura, mas revelado agora pelo Espírito aos santos
apóstolos e aos profetas – consiste no fato de que a salvação é aberta a todos
os povos. Na figura dos magos vindos do oriente nós contemplamos o que já
Isaías havia anunciado, que os filhos e as filhas de Deus virão de longe, e
todos os povos acorrerão para Jerusalém. A salvação não está restrita aos
judeus, mas ela se abre a todos aqueles que se fazem filhos de Abraão pela fé.
Muitas vezes, o povo de Israel, escolhido para ser um sinal entre os povos,
acreditou num exclusivismo da salvação. Todavia, eles se esqueciam, que todos
podem se tornar filhos de Abraão pela fé. E é justamente isto o que Cristo veio
nos revelar e que nós celebramos hoje: a
salvação é aberta a todos os que aderem ao Cristo pela fé; pela fé todos podem
se tornar filhos de Abraão.
Poderíamos nos deter um pouco mais na
cena do Evangelho que hoje é proclamado na liturgia. Os magos vêem no céu um
sinal do Rei-Divino que acaba de nascer. Guiados pela estrela os magos vão até
Jerusalém e indagam ao rei a respeito do novo rei que acabara de nascer. “Nós vimos a sua estrela no oriente e
viemos adorá-lo.” Esse é o desejo que está no coração dos
magos do oriente: adorar o Novo Rei. Herodes teme perder o seu reinado.
Consulta seus escribas e aponta o caminho até onde deve nascer o novo rei. A
estrela continua a conduzir os magos até a gruta de Belém. Ao verem de novo a
luz da estrela o coração dos magos se encheu “de uma alegria muito grande”. Ao entrarem na
casa e ao verem o menino com Maria, sua mãe, ajoelharam-se diante dele “e o adoraram”. Os povos
pagãos, representados na figura destes três magos, adoram o Deus Único e
Verdadeiro. Os reis abrem seus tesouros e oferecem místicos presentes: ouro,
para o rei; incenso, porque esse menino é Deus; mirra, porque Ele vai morrer
pelos nossos pecados.
“Vimos a sua estrela no oriente e
viemos adorá-lo”. O
evangelista nos narra que esse desejo dos magos se transformou numa atitude de
verdadeira de adoração: “Viram
o menino com Maria, sua mãe. Ajoelharam-se diante dele, e o adoraram.” Precisamos
aprender com estes magos a adorar o Senhor. A oração cristã é, sobretudo,
adoração. Vemos, na Escritura, que os samaritanos e os judeus discutem entre si
sobre onde devem “adorar”
a Deus. Jesus diz à Samaritana que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em
Espírito e em Verdade. Nós devemos estar voltados para o Cristo em adoração
para recebermos a sua luz e para refletirmos essa luz para o mundo. Devemos
pedir ao Espírito Santo que nos ensine a adoração. A nossa oração é muitas
vezes caracterizada pelo pedir ou pelo suplicar perdão. Essas são também formas
de oração. Mas a mais sublime delas é a adoração; é o prostrar-se diante de
Deus para adorá-lo por aquilo o que Ele é. Na adoração nós não condicionamos a
nossa oração. A adoração não está movida por uma finalidade, nem pelo desejo de
alcançar algo. A adoração é um movimento que nasce na alma humana; é um místico
conhecimento de que estamos diante de uma presença que nos supera, de um
mistério que não podemos abarcar todo ele com nossa inteligência e, por isso, a
atitude que cabe ao homem é a adoração, é o dobrar-se diante do mistério em
contemplação e se deixar ser inundado pela sua luz deífica.
Tertuliano, um autor cristão dos
primeiros séculos entendeu bem isso. No seu De Oratione, no seu Tratado sobre a Oração,
ele nos diz: “(…) os
israelitas, (…) não ousam levantar as mãos para o Senhor (…) Quanto a nós,
porém, não só as levantamos, mas as estendemos e, assim, imitando o Senhor na
sua paixão, confessamos o Cristo com a nossa oração.” Tertuliano
caracteriza a oração cristã como uma imitação da paixão do Senhor. O que foi a
paixão de Cristo senão o mais sublime e eloquente gesto de adoração ao Pai? Na
sua paixão Cristo ofereceu a si próprio, fez do seu corpo e da sua alma um
sacrifício de louvor ao Pai das Luzes. Tertuliano diz que devemos imitar esse
gesto do Cristo na nossa oração. Ele diz que devemos “confessar o Cristo com a nossa
oração.” Aqui é interessante notar o sentido do verbo “confiteor” em latim.
Confessar é, em primeiro lugar, reconhecer a glória de Deus. Nós confessamos a
glória de Deus com a nossa oração.
Abramos
ao Senhor o místico presente da nossa adoração. Que grande graça, podermos
oferecer a Deus nosso presente! Não deixemos de fazê-lo! Abramos o tesouro do
nosso coração e como os magos vindos do oriente, ofereçamos em Espírito e em
Verdade a nossa adoração, a fim de sermos inundados pela luz d’Aquele que
nasceu para iluminar a todos quanto andavam nas trevas.
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