VIII-REFLEXÃO DOMINICAL IV
FEZ OUVIR OS SURDOS E
FALAR OS MUDOS
A liturgia da
Missa deste domingo é um apelo à esperança, à plena confiança no Senhor. Num
momento de tribulação, o profeta Isaías levanta-se para reconfortar o Povo
eleito que vive no desterro e anuncia o alegre retorno à pátria e os prodígios
que terão o seu pleno cumprimento com a chegada do Messias. Descerrar-se- -ão
os olhos dos cegos e abrir-se-ão os ouvidos dos surdos; os coxos saltarão como
os cervos, e desatar-se-á a língua dos mudos; as águas jorrarão no deserto e as
torrentes na estepe. Com Cristo, todos os homens são curados, e as fontes da
graça, sempre inesgotáveis, convertem o mundo numa nova criação. O Evangelho da
Missa narra a cura de um surdo-mudo. O Senhor levou- -o a um lugar à parte, pôs
os dedos nos seus ouvidos e tocou-lhe a língua com saliva. Depois olhou para o
céu e disse: “Effatha”, que quer dizer, “abre- -te”. E imediatamente se lhe
abriram os ouvidos e se lhe soltou a prisão da língua, e falava claramente. Os
dedos significam a poderosa ação divina, e a saliva evoca a eficácia que lhe
era atribuída para aliviar as feridas. Ainda que a cura tenha resultado das
palavras de Cristo, o Senhor quis utilizar nesta ocasião, como aliás em outras,
elementos materiais visíveis, para dar a entender de alguma maneira a ação mais
profunda que os sacramentos iriam efetuar nas almas. Desde os primeiros séculos
e durante muitas gerações, a Igreja serviu-se desses mesmos gestos do Senhor
para administrar o Batismo, enquanto orava sobre a criança que era batizada:
"O Senhor Jesus, que fez ouvir os surdos e falar os mudos, te conceda que
a seu tempo possas escutar a sua Palavra e proclamar a fé" (cf. Ritual do
Batismo, Batismo das crianças). Nesta cura que o Senhor realizou, podemos ver
uma imagem da sua ação nas almas: ela livra o homem do pecado, abre-lhe os
ouvidos para escutar a Palavra de Deus e solta-lhe a língua para que louve e
proclame as maravilhas divinas. É uma ação que tem início no momento do Batismo
e se prolonga pelo resto da nossa vida. Santo Agostinho, ao comentar esta
passagem do Evangelho, diz que a língua de quem está unido a Deus “falará do
bem, porá de acordo os que estão desavindos, consolará os que choram... Deus
será louvado, Cristo será anunciado” (Sermão 311, 11). É o que nós faremos se
tivermos o ouvido atento às contínuas moções do Espírito Santo e a língua
preparada para falar de Deus sem respeitos humanos. Não podemos ficar mudos
quando devemos falar de Deus e da sua mensagem sem constrangimento algum, antes
vendo nisso um título de glória: os pais aos seus filhos, desde a primeira
infância e continuando depois, com dom de línguas, na puberdade e na juventude;
o amigo ao amigo, com sentido de oportunidade, mas sem receios; o colega de
escritório aos que trabalham ao seu lado, com o seu comportamento exemplar e
alegre, e com a palavra que estimula a sair da apatia; o estudante aos colegas
de Universidade com quem convive tantas horas por dia... Os motivos para falar
da beleza da fé, da alegria incomparável de possuir a verdade de Cristo são
muitos. Mas dentre eles destaca-se a responsabilidade recebida no Batismo de
não deixar que ninguém perca a fé ante a avalanche de ideias e de erros
doutrinais e morais que inundam o mundo e perante os quais muitos se sentem
indefesos (cfr. Francisco Carvajal, Falar com Deus, Vol. 4). Deveríamos
perguntar-nos todos os domingos: “a quem eu falei de Deus nesta semana?” Ou
também: “a quem eu falarei de Deus na próxima semana?”
Dom Carlos Lema Garcia Bispo Auxiliar
de São Paulo
https://arquisp.org.br/sites/default/files/folheto_povo_deus/ano-46b-50-23-domingo-tempo-comum.pdf
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