sábado, 10 de dezembro de 2022

A PASTORAL DA PALAVRA (VII) c) ELEMENTO LITÚRGICO

 

A  PASTORAL DA PALAVRA (VII)

c) ELEMENTO LITÚRGICO

A este terceiro elemento (a ordem de apresentação é secundária) damos o nome de «litúrgico», mas podería­mos também chamá-lo «elemento celebrativo».  Com efeito, a homilia está num contexto de celebração ou, melhor, em função e dentro de uma celebração litúr­gica.  Não se faz uma homilia a propósito de uma cele­bração ou aproveitando o fato de termos os fiéis reunidos para a liturgia (embora seja a única oportunidade em que os temos!), mas com vistas à celebração e para dar maior sentido à celebração litúrgica.

Assim, pois, a homilia não está acima da liturgia, mas ao serviço da liturgia.  A homilia é uma “ancilla” da celebração.  Aqui poderíamos deter-nos a refletir sobre um ponto sintomático: o pregador (já que não o bom homiliasta) considera consciente ou subconscientemente que sua parte (a que lhe permite maior criatividade pes­soal na liturgia) é a mais importante dentro da liturgia, e assim não se importa nem se preocupa muito com prolongamentos excessivos, despachando o resto (espe­cialmente a liturgia eucarística) a toda velocidade e de forma mecânica ou mais ou menos prosaica.

Outro ponto: a única arte da liturgia que o sacer­dote costuma preparar (se é que prepara alguma coisa) é a homilia; e por isso mesmo ao resto da celebração não dá, conseqüentemente, nenhum realce, nenhuma varie­dade, criatividade nem beleza (como poderia ser a do santo apropriado, preparado, bem executado).  Ele sabe que os fiéis têm dificuldades em penetrar na liturgia da Palavra e em viver com intensidade a ação sacramental; e soluciona o problema esquivando-o: relegando o mais importante da liturgia para um segundo plano.  Com isso só consegue aumentar a dificuldade e fazer com que a mesma homilia seja cada vez mais inútil como homilia e que passe a ser um colóquio subjetivado, racionalizado ou, quando muito, um bom tipo de catequese alitúrgica.

Da mesma forma, os fiéis perdem a riqueza da cele­bração, afastam-se cada vez mais dos mistérios litúrgicos e freqüentemente também do sermão.  Assim, se a atual liturgia peca talvez por excesso de cerebralismo, de falta de sentimento, de simbolismo e de ação, o pregador acaba levando isso tudo às suas últimas conseqüências.

Não, a homilia tem uma função mistagógica, isto é, deve conduzir aos mistérios da fé (sacramentos, sacrifício eucarístico), a partir da Palavra dada e acolhida até a ação sacramental, sinal e cumprimento de tal Palavra hoje e aqui nesta assembléia concreta.

A esta função mistagógica se deu o nome de passagem ao rito, isto é, passagem da palavra ao rito, passagem do profetizado ao cumprido no sacramento ou, segundo os casos, passagem do acon­tecido ao celebrado sacramentalmente.  Palavra rito não são duas coisas totalmente diferentes nem contrapostas, como alguns superficialmente quiseram ainda hoje fazer­-nos crer.  São os momentos de um mesmo acontecimento salvífico.  O que a Palavra anuncia, o rito o realiza (além disso, numa análise profunda chegaríamos à conclusão de que também o rito é palavra e anúncio, e a pala­vra é ação).

Mas, como fazer com que a homilia seja GONZO, DOBRADIÇA, ENTRONCAMENTO?  Como conseguir que realize dentro da estrutura litúrgica sua função CON­JUNTIVA?  Aqui estão algumas indicações:

1) Quem prepara ou pronuncia a homilia deve levar em consideração que sua homilia não pode limitar-se a explicar o texto ou os textos proclamados anteriormente nem sequer a fazer uma conjunção com a vida, e isso porque a palavra se aplica à celebração sacramental e isso como cumprimento. Mais ainda, deve ter presente que a própria liturgia da Palavra já é celebração da Aliança, mensagem atual e gozosa de Deus a seu povo e resposta deste povo a Deus pela fé, pela aclamação e pelo canto (cf.  Ne 8,1-12).  Demos um exemplo simples.  Estamos lendo no evangelho a parábola do banquete nup­cial e dos convidados ao banquete (Mt 22,1-14). É aber­rante comentar esta parábola esquecendo de relacioná-la com a celebração.  Se exegeticamente falando o banquete é figura da felicidade messiânica e os que são chamados dos caminhos são os pecadores e os pagãos (nós!), a reunião eucarística é, ao mesmo tempo, cumprimento e antecipação desta felicidade e deste chamado.  Como não vão soar com acento eucarístico frases como “vejam, meu banquete está preparado”, ou “amigo, como entras­te aqui sem traje nupcial?” Em outras palavras, Deus não só anuncia coisas, mas também as realiza e essa realização já é realidade e promessa ou penhor no sacramento.

2) Quem prepara a homilia deve ter presente que o texto é por si mesmo algumas vezes (mais do que à primeira vista parece) litúrgico-sacramental-alegorizante.  Por exemplo, muitos dos textos do evangelho de São João têm uma estrutura típica de profecia, acontecimento e sacramento.  Em outras palavras, alguns acontecimentos, discursos e milagres foram escritos a partir de uma refle­xão sacramental (sem por isso deixar de serem históricos).  Um exemplo: O relato do discurso dos pães (Jo 6,22-71) pode ser lido a partir de três perspectivas: como anúncio da eucaristia, como acontecimento histórico da presença de Jesus pão de vida (recorde-se o relato da multipli­cação dos pães) e como reflexão sacramental feita por João e a partir da Igreja (tomando as palavras de Jesus). O mesmo se diga da cura do cego de nascimento, onde se encontra uma reflexão eclesial sobre o batismo.

3) Os textos bíblicos podem ressoar de diferente maneira segundo a celebração litúrgica, festa ou tempo do ano litúrgico.  O texto contém em muitos casos dife­rentes virtualidades já que, além de sua riqueza, não é somente texto escrito, mas também Palavra viva, acon­tecimento sempre novo.  Assim, o texto como o das Bodas de Caná permite diferentes aplicações litúrgicas, segundo seja lido num domingo ordinário, na Páscoa, num casa­mento ou numa festividade da Virgem Maria.  O mesmo se diga da parábola do filho pródigo, dependendo de ser lida e comentada numa celebração eucarística ou numa celebração da penitência.  Em cada caso o acento variará e as aplicações litúrgicas (e vitais) terão um colorido e matiz diferentes.

4) Convém estarmos atentos para a possível rela­ção entre o texto lido e as atitudes, os gestos e as pala­vras da mesma celebração litúrgica (p. ex. esperança e aclamação “Vem, Senhor Jesus”; atitude de louvor e prefácio eucarístico; reconciliação e abraço de paz; gene­rosidade e oferenda eucarística etc.). Esta conexão pode ser aplicada especialmente quando há dificuldade de encon­trar uma relação mais apropriada; tem a qualidade de dar novidade e sentido a elementos litúrgicos pouco explicados, assim como de libertar a assembléia litúrgica de um certo automatismo ou rotina impossíveis de eli­minar completamente.  Quando a homilia emprega este recurso, uma admoestação em seu lugar adequado poderá recordar que tal gesto ou oração litúrgica estão relacio­nados com a Palavra de Deus.

Tomemos o caso em que no Advento se leia um texto referente à escatologia e, por qualquer motivo, aquele que prepara a homilia sinta dificuldade em encon­trar a aplicação à liturgia.  Ainda é possível que na lei­tura descubra uma palavra ou frase de esperança (p. ex., “vigiai, pois o Senhor vem”).  Um olhar atento para o ordinário da missa lhe recordará que cada dia dizemos na aclamação eucarística: “Vem, Senhor Jesus”; que na comunhão Jesus vem; um olhar atento lhe recordará que o presidente sempre saúda com um desejo: “O Senhor esteja convosco”.  Nesta homilia pode-se sublinhar se espe­ramos o Senhor; se ao recebê-lo suspiramos com o desejo de contemplá-lo na glória; se nos preocupamos em estar com o Senhor ou se cremos que o possuímos, que o controlamos, que o podemos dominar… Em tal missa será necessário sublinhar o texto ou ação que tivermos esco­lhido e comentado na homilia.

5) É relativamente fácil ou ao menos não tão difícil encontrar conexões entre a Escritura proclamada e a celebração litúrgica nas homilias de sacramentos: os tex­tos escolhidos em tais casos costumam ter uma relação mais ou menos explícita e direta com o sacramento.  Mais difícil é, de modo geral, encontrar estas conexões no caso da eucaristia: os textos bíblicos do lecionário da mesma não podem, cada vez, estar relacionados explícita e dire­tamente com a eucaristia em seu sentido restrito (nem têm por que estar).  Mas estão relacionados com a his­tória da salvação da qual a eucaristia é o núcleo central e o centro sacramental.

Para isso (para encontrar essa relação), é necessário ampliar e refrescar nossa compreensão bíblico-dogmática da eucaristia, a fim de encontrar a conexão.  A eucaristia não tem uma só dimensão. Refere-se, por exemplo, ao êxodo pascal, à terra prometida, à libertação, à aliança, à pátria, à autodoação de Cristo, ao sacrifício pelo pecado, ao perdão dos pecados, à transformação do cosmos, à ação do Espírito Santo que une, transforma e santifica. Eucaristia é louvor perfeito, ação de graças pelas “mirabilia Dei”, memorial de Cristo e de sua páscoa, alimento sacramental, banquete dos pecadores remidos, presença do Ressuscitado na comunidade eclesial, unidade do Corpo de Cristo, viático, penhor e antecipação do Banquete do Reino, confissão de fé no Senhor, anúncio e denúncia diante do mundo etc.

São os textos que não têm relação com a eucaristiaou somos nós que não descobrimos a relação?

6) Quando, apesar de tudo o que ficou dito, nos parecer desnecessária esta relação dos textos escriturís­ticos com a celebração eucarística, façamos a seguinte reflexão: Que diríamos de um pregador que, depois das leituras próprias de uma celebração sacramental (p. ex., batismo, confirmação, matrimônio) omitisse na homilia toda referência ao sacramento que vai ser celebrado?  Sem dúvida não veríamos isso com bons olhos e considera­ríamos que há um menosprezo pela ação sacramental.  O mesmo acontece na eucaristia, embora sejamos incapazes de perceber a omissão pela rotina.

4. Como se prepara a homilia

Uma boa homilia e, a fortiori, a pregação homilética de cada domingo não se improvisa.  Poder-se-ia logica­mente falar de uma preparação gradual: geral, remota e próxima.

A preparação geral não pode ser outra senão o estudo e o aprofundamento da Sagrada Escritura, da Sagrada Liturgia, dos Santos Padres, da teologia, dos documentos da Igreja, dos problemas sociais etc.  O fato de não estar em dia é um obstáculo sério na hora de pregar.  Há quem pregue com uma bagagem cultural e teológica que cheira a ranço e os fiéis, mesmo os de cultura simples, são os primeiros a se darem conta.

A preparação remota deveria ser feita alguns dias antes.  O bom homiliasta não espera a última hora para preparar sua homilia.  Ele a vai ruminando.  Fá-la ger­minar ao contato com o travesseiro.  Esta preparação di­fusa, ao longo da semana, engloba vários pontos: a lei­tura do texto ou dos textos escriturísticos, a meditação dos mesmos durante a oração, o esboço geral dos ele­mentos exegéticos, litúrgicos e vitais, a consulta tendente a eliminar certas dúvidas e dificuldades em dicionários bíblicos, como de passagem e entre uma ocupação e outra.  Esta preparação é mais importante do que parece e tem a vantagem de quase não tomar tempo.  Pode-se fazer isso nos momentos livres.

A preparação próxima (tempo dedicado a preparar a homilia) inclui vários pontos que, embora variem de pessoa para pessoa, poderiam resumir-se assim:

1) Concretizar bem os pontos ou idéias mais importantes que foram surgindo na exegese, liturgia e vida, independentemente do que se aproveitará de tudo isso no final e independentemente da maneira como se expo­rá. Preocupar-se primordialmente com a maneira como se proporá uma homilia, da forma, etc.; sem ter idéias claras é um grave erro, muito típico de principiantes.  Aquele que tem algo a dizer, o diz.  Quem nada tem a comunicar, aborrece por mais que use belas palavras. Isso não quer dizer que não se deva preparar a forma, como logo veremos.

2) Escolher uma das três leituras como núcleo refe­rencial da pregação.  Não querer comentar as três (em­bora se possa e convenha fazer alusão às três).  Geral­mente se deverá comentar o Evangelho ou – por que não? – a leitura do Apóstolo.  Conviria ter um plano para vários domingos, sobretudo se se comenta a segunda leitura, a do Apóstolo.  Isso é muito frutuoso, mas supõe uma assembléia relativamente estável e, é claro, um mes­mo pregador.  Quem escolhe sempre o mais fácil (com a desculpa da falta de tempo ou da simplicidade de seus ouvintes) é aquele que nunca diz nada de novo e abor­rece seus ouvintes.  O povo é mais capaz do que pensa­mos, desde que lhe preparemos bem o manjar, sem pro­vocar indigestões.

3) Das várias mensagens, idéias ou temas encontrados na exegese convém escolher UMA E SOMENTE UMA. Não se deve sair deste ponto escolhido, mas sim desenvolvê-lo.  O público não suporta mais do que um ponto e, além disso, querer dar vários pontos complica a homilia e prolonga-se indevidamente.

4) Uma vez escolhido e desenvolvido um ponto exegético, busca-se uma aplicação à vida uma apli­cação à liturgia.  O pregador deve poder sintetizar isso em três frases. (Por exemplo, nas bodas de Caná comen­tadas para o sacramento do matrimônio, os três pontos poderiam ser os seguintes: Cristo esteve presente numa festa; agora está presente também aqui; e estará pre­sente ao longo de nossa vida.  Com isso temos o esque­leto da homilia; será necessário revesti-lo de carne; mas o esqueleto é o que dá consistência.

Conheço pregadores que em lugar de ter um esque­ma claro daquilo que vão dizer, começam a divagar de tal modo que, mais do que uma exposição, sua homilia se assemelha a um exercício de associação de idéias (de  Jesus se passa a Maria, de Maria ao mês do rosário, mês de outubro ao mês de novembro em que se inicia um plano de pastoral, do plano de pastoral se passa a uma crítica dos sacerdotes que não o porão em prática; continua-se falando da obediência e da obediência passa­-se aos teólogos desobedientes; este último ponto dá pé a que se fale da limitação da inteligência humana frente à imensidade do universo e grandeza das estrelas…). É algo deplorável que condena uma homilia e uma cele­bração ao tédio e à rejeição dos ouvintes.

5) Em princípio é melhor que não apareça o esque­ma tripartido da exegese, liturgia e vida; em todo caso, o público não deve notá-lo. Já vimos que se trata de elementos e não de partes da homilia.  Seguir sempre este esquema eliminaria a originalidade e converteria a homilia numa peça oratória excessivamente racional e fria.  A homilia, não o esqueçamos, é mistagógica e é simples quanto à sua construção e exposição.

6) Quanto à forma de apresentação, o mais impor­tante é encontrar um ponto sugestivo, estruturante e aglutinador que centralize a exposição. É possível encontrá-lo em:

– uma palavra chave (a “totalidade” na oferenda a Deus, no evangelho da esmola da viúva: não o muito nem o poucomas o todo, frente à parte, frente ao que sobra etc.);

– uma frase (“não têm vinho”; “somente entre os seus é desprezado um profeta”; “queremos ver Jesus” etc.);

– um exemplo atual (insensibilidade de muitos motoristas e transeuntes diante de uma pessoa atropelada, no caso do Bom Samaritano);

– uma pergunta feita aos ouvintes (“que pretendia Za­queu ao subir na árvore?”, especialmente no caso de um grupo infantil);

– uma atitude de vida (fé, desconfiança, agradecimento, conversão);

– uma interrogação (somos cristãos de nome? que é ser cristão hoje? será que somos inimigos da cruz de Cristo?  Note-se que esta interrogação não tem por que ser respondida e que pode ser repetida em forma de leitmotiv ao longo da homilia);

– uma preocupação do pastor (real, mas sem cair em subjetivismo: “Muitas vezes me perguntei e poderíamos perguntar-nos…”)

Estes são alguns exemplos.  Ao longo da homilia é preciso      ser coerente com este ponto central, sem sair dele.

7) Alguns gostam de ter um resumo escrito com esquema geral daquilo que vão dizer. É uma ajuda para a memória.  Deve ser simples e legível à primeira vista.  Levar um sermão escrito em longos parágrafos se não se vai ler a homilia-coisa desaconselhável na maioria dos ambientes-não costuma ser prático nem eficaz no terreno real.  A experiência indica que somente o escrito em forma esquemática e pela própria pessoa tem real utilidade no momento da pregação.

5. Como se expõe uma homilia

Ainda que a maneira de pregar uma homilia só se aprenda na prática oratória, algumas indicações podem ajudar:

1) Por tratar-se de uma conversa familiar, espiri­tual, comentadora e exortativa, deve primar pela simpli­cidade, sinceridade, clareza, comunicação e certa unção.  Em nossos dias, dificilmente se aceita o pregador que diz coisas esotéricas à massa ou numa linguagem rebus­cada ou num tom grandiloqüente.  O pregador deve buscar e encontrar um estilo mais pastoral e funcional dentro de um modo de ser e de expressar-se.  Por isso mesmo também deve colocar-se perto das pessoas e procurar que o emprego do microfone (ou, em sua ausência, a eleva­ção da voz) não rompa o estilo simples e coloquial.

2) É preciso tratar de pregar não a um públicomas a si mesmo dentro de um público, ou melhor, den­tro de uma assembléia da qual alguém faz parte. É mis­ter falar com as pessoas e não diante das pessoas.  Não basta a “simpatia”, mas é necessária também a “empatia”.  O tom que se adota é de grande importância; deve ser moderado, íntimo.  Ninguém diz a si mesmo coisas aos gritos ou autoritariamente.  Quando, por um motivo ou por outro, é preciso gritar, é difícil dar a impressão de empatia.  O microfone bem usado é de grande impor­tância.  Deve-se evitar o tom clerical, doutoral e conseguir um tom de discípulo (discípulo da Palavra), de ami­go, de irmão (ainda que alguém ocupe uma posição ecle­siástica importante ou talvez por isso mesmo).

3) Falar com o público não significa necessaria­mente introduzir um diálogo ou intervenções que em certos ambientes, especialmente grandes ou de gente não acostumada a isso, podem até parecer forçados.  Certa­mente, deve haver comunicação, mas não necessariamente por palavras de ambos os lados (embora não se exclua de todo esta reciprocidade, como logo diremos).  Conse­gue-se a comunicação quando não se dá a impressão de falar “ex cathedra”, mas coloquialmente com irmãos e amigos.  Em termos de comunicação poder-se-ia exprimir assim: “É preciso falar em público, a partir do público e fazendo parte do público e de seu mundo”.

4) Não se deve renunciar, apesar do que foi dito anteriormente, a ser original, novo, atraente, impactante, questionador e interrogador.  Estas qualidades oratórias podem fazer com que nossas maçantes homilias desper­tem mais interesse para o povo.  E por isso mesmo o pre­gador deve cultivá-las, sem fazer delas o centro, pois o central é o que se comunica.  Não é fácil a originalidade e a novidade.  Parecemos cansados ao pregar e pregamos uma mensagem velha, por mais que preguemos a Boa ­Notícia e a Novidade radical que é Cristo.  Saber encontrar a novidade do fundo nos ajudará a encontrar a originalidade na forma.

5) É preciso fazer-se ouvir e entender (é necessário dizê-lo? Parece que sim). Uma elevada porcentagem de pregadores não se deixam entender.  Suas palavras se per­dem no ruído de uma sonorização deficiente, pelo mau uso do microfone, pela má vocalização, pela afluência de crianças em tenra idade ou pelo ruído da rua (não há motivo para que as portas fiquem abertas a não ser antes e depois da celebração litúrgica). É preciso ter presente tudo isso na hora de pregar, do contrário podemos estar pregando em vão.  Por outro lado, o lugar da pregação sera aquele onde o pregador for visto melhor. Mas é preciso procurar que a sede da palavra, o púlpito, tenha estas características.

6) A homilia não deve ser longa.  Não deve cansar o auditório e, por isso mesmo, nunca deveria passar de dez minutos aproximadamente, embora sendo mais curta, desde que substanciosa, os fiéis até agradecerão. É claro que nisto a norma não pode ser taxativa: há pregadores que cansam o auditório já no primeiro minuto, ao passo que outros conseguem manter a assem­bléia atenta por uns bons 15 minutos.  Mas mesmo assim é preciso lembrar que a homilia é parte de um todo e que é melhor deixar tempo abundante para a liturgia da pala­vra e a liturgia eucarística (ambas exigem tempo para os cânticos, as monições, a oração e os silêncios).  Na prática vemos que a introdução do princípio da missa (onde se acumulam muitos cânticos) e a homilia ocupam uma parte excessiva do tempo com prejuízo das partes principais da celebração.

7) Uma forma de comprovar a atenção dos fiéis é dar-se conta se durante as pausas da pregação há silêncio na Igreja.  Para isso é preciso olhar para todo o audi­tório e não pregar somente para os que estão na primeira fila, aos que estão de um lado ou simplesmente sem olhar.  Se não há silêncio provavelmente é porque o sermão não interessa… é preciso corrigir rapidamente o rumo e , não persistir na forma começada.  Se o sermão tiver sido inte­ressante para a assembléia, esta será capaz de guardar alguns minutos de silêncio reflexivo depois da homilia.  Em nossa liturgia da palavra e em nossa liturgia euca­rística faltam momentos de silêncio, não porque não estejam indicados nas rubricas, mas porque na prática não são observados.

8) O pregador deve produzir o sermão à medida que vai falando: modifica-o, constrói-o, reflete com o auditório, comporta-se como se fosse um deles, pergunta como pastor, compreende, admoesta, coloca-se na posição do estranho (o homem da rua, o não-crente), ques­tiona-se como um simples cristão.  Evita falar “tamquam auctoritatem habens” por mais que a tenha… Tudo isso exige uma atitude especial, indizível, que só a presença do auditório e a compenetração com ele pode criar.

9) O princípio e sobretudo o fim da homilia devem ser bem preparados. É preciso evitar os inícios demasia­damente batidos (frases estereotipadas, benzer-se cada vez: por que fazer o sinal da cruz se já foi feito no início da missa?  Não dá a impressão de que se vai começar um sermão clássico de missões, destes que não tinham outro jeito de deslanchar por ser o princípio da reunião?) Quanto ao final, uma aterrissagem segura, sem ir divagando ou, para continuar a metáfora, sem andar planando durante vários minutos em busca da pista (coisa bastante desagradável para todos), é de grande impacto. Às vezes uma interrogação sem resposta, urna pergunta que convide à reflexão é melhor do que algu­mas frases demasiadamente arredondadas.

_____________________________

 

DV 2.

DV 5.

Para toda essa parte cf. Ramos, J. A., Teología pastoral, BAC, Madrid  1995.

Jo 1,12.

Hb 1,1

Cf. Durrwell, F.X., La presencia de Jesucristo en la predicación, em Rahner, K – Häring, B., Palabra en el mundo (Salamanca  1972), 31-46.

Z. Alszeghy-M.Flick, Il problema teologico della predicazione, «Gregorianum», 1959, p. 742.

K. Rahner, La salvezza nella Chiesa, Roma-Brescia  1986, p.116.

D. Ruiz Bueno, Padres apologistas griegos, BAC, Madrid  1954

SC 2, 6 e 7.

Cf. R. Bohren, Predigtlehre, Munique, 1980,p. 82; A. Schwarz, Praxis und Predigtlehre, Viena, 1986, p. 50.

Cf. J. Rothermundt, Der Heiliege Geist  und die Rhetorik, Güterslh, 1985, p. 45. L. Maldonado, La comunidad cristiana, p.15-40.

Cf. CIC, cânon. 767.

K. H. Biertiz-Ch.  Bunners, Handbuch der Predigt, Berlim  1990, p. 100-135.

Para esta parte: MOESCH,O., O anúncio da Palavra de Deus. Reflexões sobre a teologia pastoral da pregação. Petrópolis: Vozes, 1980.

Cf. Evangelium nuntiandi, n. 41.

Idem, n. 79.

Cf. EN, 43.

Para toda esta parte estaremos utilizando as reflexões do Departamento de Liturgia do CELAM, Homilia, São Paulo: Paulinas, 1983, p. 13-55.

Sobre o lugar onde se deve proferir a homilia assim diz a Instr. Geral do Missal Romano no n.136: «O sacerdote, de pé junto à cadeira ou no próprio ambão, ou ainda, se for oportuno, em outro lugar adequado, profere a homilia; ao terminar, pode-se observar um tempo de silêncio».

https://presbiteros.org.br/manual-de-homiletica/

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário