A
PASTORAL DA PALAVRA (VII)
c) ELEMENTO LITÚRGICO
A este
terceiro elemento (a ordem de apresentação é secundária) damos o nome de
«litúrgico», mas poderíamos também chamá-lo «elemento celebrativo». Com
efeito, a homilia está num contexto de celebração ou, melhor, em função e
dentro de uma celebração litúrgica. Não se faz uma homilia a
propósito de uma celebração ou aproveitando o fato de termos
os fiéis reunidos para a liturgia (embora seja a única oportunidade em
que os temos!), mas com vistas à celebração e para dar maior sentido à
celebração litúrgica.
Assim,
pois, a homilia não está acima da liturgia, mas ao
serviço da liturgia. A homilia é uma “ancilla” da
celebração. Aqui poderíamos deter-nos a refletir sobre um ponto
sintomático: o pregador (já que não o bom homiliasta) considera consciente ou
subconscientemente que sua parte (a que lhe permite maior criatividade pessoal
na liturgia) é a mais importante dentro da liturgia, e assim não se importa nem
se preocupa muito com prolongamentos excessivos, despachando o resto (especialmente
a liturgia eucarística) a toda velocidade e de forma mecânica ou mais ou menos
prosaica.
Outro
ponto: a única arte da liturgia que o sacerdote costuma preparar (se é que
prepara alguma coisa) é a homilia; e por isso mesmo ao resto da celebração não
dá, conseqüentemente, nenhum realce, nenhuma variedade, criatividade nem
beleza (como poderia ser a do santo apropriado, preparado, bem
executado). Ele sabe que os fiéis têm dificuldades em penetrar na
liturgia da Palavra e em viver com intensidade a ação sacramental; e soluciona
o problema esquivando-o: relegando o mais importante da liturgia para um
segundo plano. Com isso só consegue aumentar a dificuldade e fazer com
que a mesma homilia seja cada vez mais inútil como homilia e que passe a ser um
colóquio subjetivado, racionalizado ou, quando muito, um bom tipo de catequese
alitúrgica.
Da mesma
forma, os fiéis perdem a riqueza da celebração, afastam-se cada vez mais dos
mistérios litúrgicos e freqüentemente também do sermão. Assim, se a atual
liturgia peca talvez por excesso de cerebralismo, de falta de sentimento, de
simbolismo e de ação, o pregador acaba levando isso tudo às suas últimas
conseqüências.
Não, a
homilia tem uma função mistagógica, isto é, deve conduzir aos
mistérios da fé (sacramentos, sacrifício eucarístico), a partir da Palavra dada
e acolhida até a ação sacramental, sinal e cumprimento de tal Palavra hoje e
aqui nesta assembléia concreta.
A esta
função mistagógica se deu o nome de passagem ao rito, isto é,
passagem da palavra ao rito, passagem do profetizado ao cumprido no sacramento
ou, segundo os casos, passagem do acontecido ao celebrado
sacramentalmente. Palavra e rito não
são duas coisas totalmente diferentes nem contrapostas, como alguns
superficialmente quiseram ainda hoje fazer-nos crer. São os momentos de
um mesmo acontecimento salvífico. O que a Palavra anuncia, o rito o
realiza (além disso, numa análise profunda chegaríamos à conclusão de que
também o rito é palavra e anúncio, e a palavra é ação).
Mas, como
fazer com que a homilia seja GONZO, DOBRADIÇA, ENTRONCAMENTO? Como
conseguir que realize dentro da estrutura litúrgica sua função CONJUNTIVA?
Aqui estão algumas indicações:
1) Quem
prepara ou pronuncia a homilia deve levar em consideração que sua homilia não
pode limitar-se a explicar o texto ou os textos proclamados anteriormente nem
sequer a fazer uma conjunção com a vida, e isso porque a palavra se aplica à
celebração sacramental e isso como cumprimento. Mais
ainda, deve ter presente que a própria liturgia da Palavra já é celebração da
Aliança, mensagem atual e gozosa de Deus a seu povo e resposta deste povo a
Deus pela fé, pela aclamação e pelo canto (cf. Ne 8,1-12). Demos um
exemplo simples. Estamos lendo no evangelho a parábola do banquete nupcial
e dos convidados ao banquete (Mt 22,1-14). É aberrante comentar esta parábola
esquecendo de relacioná-la com a celebração. Se exegeticamente falando o
banquete é figura da felicidade messiânica e os que são chamados dos caminhos
são os pecadores e os pagãos (nós!), a reunião eucarística é, ao mesmo tempo,
cumprimento e antecipação desta felicidade e deste chamado. Como não vão
soar com acento eucarístico frases como “vejam, meu banquete está
preparado”, ou “amigo, como entraste aqui sem traje nupcial?” Em
outras palavras, Deus não só anuncia coisas, mas também as
realiza e essa realização já é realidade e promessa ou penhor no
sacramento.
2) Quem
prepara a homilia deve ter presente que o texto é por si mesmo algumas vezes
(mais do que à primeira vista parece) litúrgico-sacramental-alegorizante.
Por exemplo, muitos dos textos do evangelho de São João têm uma estrutura
típica de profecia, acontecimento e sacramento. Em outras palavras,
alguns acontecimentos, discursos e milagres foram escritos a partir de uma
reflexão sacramental (sem por isso deixar de serem históricos). Um
exemplo: O relato do discurso dos pães (Jo 6,22-71) pode ser lido a
partir de três perspectivas: como anúncio da eucaristia, como acontecimento
histórico da presença de Jesus pão de vida (recorde-se o relato da multiplicação
dos pães) e como reflexão sacramental feita por João e a partir da Igreja
(tomando as palavras de Jesus). O mesmo se diga da cura do cego de nascimento,
onde se encontra uma reflexão eclesial sobre o batismo.
3) Os
textos bíblicos podem ressoar de diferente maneira segundo a celebração
litúrgica, festa ou tempo do ano litúrgico. O texto contém em muitos
casos diferentes virtualidades já que, além de sua riqueza, não é somente
texto escrito, mas também Palavra viva, acontecimento sempre novo.
Assim, o texto como o das Bodas de Caná permite diferentes aplicações
litúrgicas, segundo seja lido num domingo ordinário, na Páscoa, num casamento
ou numa festividade da Virgem Maria. O mesmo se diga da parábola do filho
pródigo, dependendo de ser lida e comentada numa celebração eucarística ou numa
celebração da penitência. Em cada caso o acento variará e as aplicações
litúrgicas (e vitais) terão um colorido e matiz diferentes.
4) Convém
estarmos atentos para a possível relação entre o texto lido e as atitudes, os
gestos e as palavras da mesma celebração litúrgica (p. ex. esperança e
aclamação “Vem, Senhor Jesus”; atitude de louvor e prefácio eucarístico;
reconciliação e abraço de paz; generosidade e oferenda eucarística etc.). Esta
conexão pode ser aplicada especialmente quando há dificuldade de encontrar uma
relação mais apropriada; tem a qualidade de dar novidade e sentido a elementos
litúrgicos pouco explicados, assim como de libertar a assembléia litúrgica de
um certo automatismo ou rotina impossíveis de eliminar completamente.
Quando a homilia emprega este recurso, uma admoestação em seu lugar adequado
poderá recordar que tal gesto ou oração litúrgica estão relacionados com a
Palavra de Deus.
Tomemos o
caso em que no Advento se leia um texto referente à escatologia e, por qualquer
motivo, aquele que prepara a homilia sinta dificuldade em encontrar a
aplicação à liturgia. Ainda é possível que na leitura descubra uma
palavra ou frase de esperança (p. ex., “vigiai, pois o Senhor vem”). Um
olhar atento para o ordinário da missa lhe recordará que cada dia dizemos na
aclamação eucarística: “Vem, Senhor Jesus”; que na comunhão Jesus vem; um olhar
atento lhe recordará que o presidente sempre saúda com um desejo: “O Senhor
esteja convosco”. Nesta homilia pode-se sublinhar se esperamos o Senhor;
se ao recebê-lo suspiramos com o desejo de contemplá-lo na glória; se nos
preocupamos em estar com o Senhor ou se cremos que o possuímos, que o
controlamos, que o podemos dominar… Em tal missa será necessário sublinhar o
texto ou ação que tivermos escolhido e comentado na homilia.
5) É
relativamente fácil ou ao menos não tão difícil encontrar conexões entre a
Escritura proclamada e a celebração litúrgica nas homilias de sacramentos: os
textos escolhidos em tais casos costumam ter uma relação mais ou menos
explícita e direta com o sacramento. Mais difícil é, de modo geral,
encontrar estas conexões no caso da eucaristia: os textos bíblicos do
lecionário da mesma não podem, cada vez, estar relacionados explícita e diretamente
com a eucaristia em seu sentido restrito (nem têm por que estar). Mas
estão relacionados com a história da salvação da qual a eucaristia é o
núcleo central e o centro sacramental.
Para isso
(para encontrar essa relação), é necessário ampliar e refrescar nossa
compreensão bíblico-dogmática da eucaristia, a fim de encontrar a
conexão. A eucaristia não tem uma só dimensão. Refere-se,
por exemplo, ao êxodo pascal, à terra prometida, à libertação, à aliança, à
pátria, à autodoação de Cristo, ao sacrifício pelo pecado, ao perdão dos
pecados, à transformação do cosmos, à ação do Espírito Santo que une,
transforma e santifica. Eucaristia é louvor perfeito, ação de graças
pelas “mirabilia Dei”, memorial de Cristo e de sua páscoa, alimento
sacramental, banquete dos pecadores remidos, presença do Ressuscitado na
comunidade eclesial, unidade do Corpo de Cristo, viático, penhor e antecipação
do Banquete do Reino, confissão de fé no Senhor, anúncio e denúncia diante do
mundo etc.
São os
textos que não têm relação com a eucaristiaou somos nós que não descobrimos a
relação?
6)
Quando, apesar de tudo o que ficou dito, nos parecer desnecessária esta relação
dos textos escriturísticos com a celebração eucarística, façamos a seguinte
reflexão: Que diríamos de um pregador que, depois das leituras próprias de uma
celebração sacramental (p. ex., batismo, confirmação, matrimônio) omitisse na
homilia toda referência ao sacramento que vai ser celebrado? Sem dúvida
não veríamos isso com bons olhos e consideraríamos que há um menosprezo pela
ação sacramental. O mesmo acontece na eucaristia, embora sejamos
incapazes de perceber a omissão pela rotina.
4. Como
se prepara a homilia
Uma boa
homilia e, a fortiori, a pregação homilética de cada domingo
não se improvisa. Poder-se-ia logicamente falar de uma preparação
gradual: geral, remota e próxima.
A
preparação geral não pode ser outra senão o estudo e o
aprofundamento da Sagrada Escritura, da Sagrada Liturgia, dos Santos Padres, da
teologia, dos documentos da Igreja, dos problemas sociais etc. O fato de
não estar em dia é um obstáculo sério na hora de pregar. Há quem pregue
com uma bagagem cultural e teológica que cheira a ranço e os fiéis, mesmo os de
cultura simples, são os primeiros a se darem conta.
A
preparação remota deveria ser feita alguns dias antes. O
bom homiliasta não espera a última hora para preparar sua homilia. Ele a
vai ruminando. Fá-la germinar ao contato com o travesseiro. Esta
preparação difusa, ao longo da semana, engloba vários pontos: a leitura do
texto ou dos textos escriturísticos, a meditação dos mesmos durante a oração, o
esboço geral dos elementos exegéticos, litúrgicos e vitais, a consulta
tendente a eliminar certas dúvidas e dificuldades em dicionários bíblicos, como
de passagem e entre uma ocupação e outra. Esta preparação é mais importante
do que parece e tem a vantagem de quase não tomar tempo. Pode-se fazer
isso nos momentos livres.
A
preparação próxima (tempo dedicado a preparar a homilia)
inclui vários pontos que, embora variem de pessoa para pessoa, poderiam
resumir-se assim:
1) Concretizar bem
os pontos ou idéias mais importantes que foram surgindo na
exegese, liturgia e vida, independentemente do que se aproveitará de tudo isso
no final e independentemente da maneira como se exporá. Preocupar-se
primordialmente com a maneira como se proporá uma homilia, da forma, etc.; sem
ter idéias claras é um grave erro, muito típico de principiantes. Aquele
que tem algo a dizer, o diz. Quem nada tem a comunicar, aborrece por mais
que use belas palavras. Isso não quer dizer que não se deva preparar a forma,
como logo veremos.
2)
Escolher uma das três leituras como núcleo referencial da
pregação. Não querer comentar as três (embora se possa e convenha fazer
alusão às três). Geralmente se deverá comentar o Evangelho ou – por que
não? – a leitura do Apóstolo. Conviria ter um plano para vários
domingos, sobretudo se se comenta a segunda leitura, a do Apóstolo.
Isso é muito frutuoso, mas supõe uma assembléia relativamente
estável e, é claro, um mesmo pregador. Quem escolhe sempre o
mais fácil (com a desculpa da falta de tempo ou da simplicidade de seus
ouvintes) é aquele que nunca diz nada de novo e aborrece seus ouvintes.
O povo é mais capaz do que pensamos, desde que lhe preparemos bem o manjar,
sem provocar indigestões.
3) Das
várias mensagens, idéias ou temas encontrados na exegese convém escolher UMA E
SOMENTE UMA. Não se deve sair deste ponto escolhido, mas sim
desenvolvê-lo. O público não suporta mais do que um ponto e,
além disso, querer dar vários pontos complica a homilia e prolonga-se
indevidamente.
4) Uma
vez escolhido e desenvolvido um ponto exegético, busca-se uma aplicação
à vida e uma aplicação à liturgia.
O pregador deve poder sintetizar isso em três frases. (Por exemplo, nas bodas
de Caná comentadas para o sacramento do matrimônio, os três pontos poderiam
ser os seguintes: Cristo esteve presente numa festa; agora está presente também
aqui; e estará presente ao longo de nossa vida. Com isso temos o esqueleto
da homilia; será necessário revesti-lo de carne; mas o esqueleto é o que dá
consistência.
Conheço
pregadores que em lugar de ter um esquema claro daquilo que vão dizer, começam
a divagar de tal modo que, mais do que uma exposição, sua homilia se assemelha
a um exercício de associação de idéias (de Jesus se passa a Maria, de
Maria ao mês do rosário, mês de outubro ao mês de novembro em que se inicia um
plano de pastoral, do plano de pastoral se passa a uma crítica dos sacerdotes
que não o porão em prática; continua-se falando da obediência e da obediência
passa-se aos teólogos desobedientes; este último ponto dá pé a que se fale da
limitação da inteligência humana frente à imensidade do universo e grandeza das
estrelas…). É algo deplorável que condena uma homilia e uma celebração ao
tédio e à rejeição dos ouvintes.
5) Em
princípio é melhor que não apareça o esquema tripartido da exegese,
liturgia e vida; em todo caso, o público não deve notá-lo. Já vimos que se
trata de elementos e não de partes da homilia. Seguir sempre este esquema
eliminaria a originalidade e converteria a homilia numa peça oratória
excessivamente racional e fria. A homilia, não o esqueçamos, é
mistagógica e é simples quanto à sua construção e exposição.
6) Quanto
à forma de apresentação, o mais importante é encontrar um ponto
sugestivo, estruturante e aglutinador que centralize a exposição. É
possível encontrá-lo em:
– uma
palavra chave (a “totalidade” na oferenda a Deus, no evangelho da
esmola da viúva: não o muito nem o pouco, mas o todo, frente à
parte, frente ao que sobra etc.);
– uma
frase (“não têm vinho”; “somente entre os seus é desprezado um
profeta”; “queremos ver Jesus” etc.);
– um
exemplo atual (insensibilidade de muitos motoristas e transeuntes
diante de uma pessoa atropelada, no caso do Bom Samaritano);
– uma
pergunta feita aos ouvintes (“que pretendia Zaqueu ao subir na
árvore?”, especialmente no caso de um grupo infantil);
– uma
atitude de vida (fé, desconfiança, agradecimento, conversão);
– uma
interrogação (somos cristãos de nome? que é ser cristão hoje? será que
somos inimigos da cruz de Cristo? Note-se que esta interrogação não tem
por que ser respondida e que pode ser repetida em forma de
leitmotiv ao longo da homilia);
– uma
preocupação do pastor (real, mas sem cair em subjetivismo: “Muitas
vezes me perguntei e poderíamos perguntar-nos…”)
Estes são
alguns exemplos. Ao longo da homilia é
preciso ser coerente com este ponto central, sem
sair dele.
7) Alguns
gostam de ter um resumo escrito com esquema geral daquilo que
vão dizer. É uma ajuda para a memória. Deve ser simples e legível à
primeira vista. Levar um sermão escrito em longos parágrafos se não se
vai ler a homilia-coisa desaconselhável na maioria dos ambientes-não costuma
ser prático nem eficaz no terreno real. A experiência indica que somente
o escrito em forma esquemática e pela própria pessoa tem real utilidade no
momento da pregação.
5. Como
se expõe uma homilia
Ainda que
a maneira de pregar uma homilia só se aprenda na prática oratória, algumas
indicações podem ajudar:
1) Por
tratar-se de uma conversa familiar, espiritual, comentadora e
exortativa, deve primar pela simplicidade, sinceridade, clareza,
comunicação e certa unção. Em nossos dias, dificilmente se aceita o
pregador que diz coisas esotéricas à massa ou numa linguagem rebuscada ou num
tom grandiloqüente. O pregador deve buscar e encontrar um estilo
mais pastoral e funcional dentro de um modo de ser e de
expressar-se. Por isso mesmo também deve colocar-se perto das
pessoas e procurar que o emprego do microfone (ou, em sua ausência, a
elevação da voz) não rompa o estilo simples e coloquial.
2) É
preciso tratar de pregar não a um público, mas a si mesmo
dentro de um público, ou melhor, dentro de uma assembléia da qual
alguém faz parte. É mister falar com as pessoas e não
diante das pessoas. Não basta a “simpatia”, mas é necessária
também a “empatia”. O tom que se adota é de grande
importância; deve ser moderado, íntimo. Ninguém diz a si
mesmo coisas aos gritos ou autoritariamente. Quando, por um motivo ou por
outro, é preciso gritar, é difícil dar a impressão de empatia. O
microfone bem usado é de grande importância. Deve-se evitar o tom
clerical, doutoral e conseguir um tom de discípulo (discípulo
da Palavra), de amigo, de irmão (ainda que alguém ocupe uma
posição eclesiástica importante ou talvez por isso mesmo).
3) Falar
com o público não significa necessariamente introduzir um diálogo ou
intervenções que em certos ambientes, especialmente grandes ou de
gente não acostumada a isso, podem até parecer forçados. Certamente,
deve haver comunicação, mas não necessariamente por palavras de ambos os lados
(embora não se exclua de todo esta reciprocidade, como logo diremos).
Consegue-se a comunicação quando não se dá a impressão de falar “ex cathedra”,
mas coloquialmente com irmãos e amigos. Em termos de comunicação
poder-se-ia exprimir assim: “É preciso falar em público, a partir do
público e fazendo parte do público e de seu mundo”.
4) Não se
deve renunciar, apesar do que foi dito anteriormente, a ser original, novo,
atraente, impactante, questionador e interrogador. Estas qualidades
oratórias podem fazer com que nossas maçantes homilias despertem mais
interesse para o povo. E por isso mesmo o pregador deve cultivá-las, sem
fazer delas o centro, pois o central é o que se comunica. Não é fácil a
originalidade e a novidade. Parecemos cansados ao pregar e pregamos uma
mensagem velha, por mais que preguemos a Boa Notícia e a Novidade radical que
é Cristo. Saber encontrar a novidade do fundo nos ajudará a encontrar a
originalidade na forma.
5) É
preciso fazer-se ouvir e entender (é necessário dizê-lo?
Parece que sim). Uma elevada porcentagem de pregadores não se deixam
entender. Suas palavras se perdem no ruído de uma sonorização
deficiente, pelo mau uso do microfone, pela má vocalização, pela afluência de
crianças em tenra idade ou pelo ruído da rua (não há motivo para que as portas
fiquem abertas a não ser antes e depois da celebração litúrgica). É preciso ter
presente tudo isso na hora de pregar, do contrário podemos estar pregando em
vão. Por outro lado, o lugar da pregação sera aquele onde o pregador for
visto melhor. Mas é preciso procurar que a sede da palavra, o púlpito, tenha
estas características.
6) A
homilia não deve ser longa. Não deve cansar o auditório e,
por isso mesmo, nunca deveria passar de dez minutos aproximadamente, embora
sendo mais curta, desde que substanciosa, os fiéis até agradecerão. É claro que
nisto a norma não pode ser taxativa: há pregadores que cansam o auditório já no
primeiro minuto, ao passo que outros conseguem manter a assembléia atenta por
uns bons 15 minutos. Mas mesmo assim é preciso lembrar que a homilia é
parte de um todo e que é melhor deixar tempo abundante para a liturgia da palavra
e a liturgia eucarística (ambas exigem tempo para os cânticos, as monições, a
oração e os silêncios). Na prática vemos que a introdução do princípio da
missa (onde se acumulam muitos cânticos) e a homilia ocupam uma parte excessiva
do tempo com prejuízo das partes principais da celebração.
7) Uma
forma de comprovar a atenção dos fiéis é dar-se conta se durante as pausas da
pregação há silêncio na Igreja. Para isso é preciso olhar para todo o
auditório e não pregar somente para os que estão na primeira fila, aos que
estão de um lado ou simplesmente sem olhar. Se não há silêncio
provavelmente é porque o sermão não interessa… é preciso corrigir rapidamente o
rumo e , não persistir na forma começada. Se o sermão tiver sido interessante
para a assembléia, esta será capaz de guardar alguns minutos de silêncio reflexivo
depois da homilia. Em nossa liturgia da palavra e em nossa liturgia eucarística
faltam momentos de silêncio, não porque não estejam indicados nas rubricas, mas
porque na prática não são observados.
8) O
pregador deve produzir o sermão à medida que vai falando: modifica-o,
constrói-o, reflete com o auditório, comporta-se como se fosse um deles,
pergunta como pastor, compreende, admoesta, coloca-se na posição do estranho (o
homem da rua, o não-crente), questiona-se como um simples cristão. Evita
falar “tamquam auctoritatem habens” por mais que a
tenha… Tudo isso exige uma atitude especial, indizível, que só a presença do
auditório e a compenetração com ele pode criar.
9) O
princípio e sobretudo o fim da homilia devem ser bem preparados. É preciso
evitar os inícios demasiadamente batidos (frases estereotipadas, benzer-se
cada vez: por que fazer o sinal da cruz se já foi feito no início da
missa? Não dá a impressão de que se vai começar um sermão clássico de
missões, destes que não tinham outro jeito de deslanchar por ser o princípio da
reunião?) Quanto ao final, uma aterrissagem segura, sem ir divagando ou, para
continuar a metáfora, sem andar planando durante vários minutos em busca da
pista (coisa bastante desagradável para todos), é de grande impacto. Às vezes
uma interrogação sem resposta, urna pergunta que convide à reflexão é melhor do
que algumas frases demasiadamente arredondadas.
_____________________________
Para toda
essa parte cf. Ramos, J. A., Teología pastoral, BAC, Madrid
1995.
Cf.
Durrwell, F.X., La presencia de Jesucristo en la predicación, em
Rahner, K – Häring, B., Palabra en el mundo (Salamanca
1972), 31-46.
Z.
Alszeghy-M.Flick, Il problema teologico della predicazione,
«Gregorianum», 1959, p. 742.
K.
Rahner, La salvezza nella Chiesa, Roma-Brescia 1986, p.116.
D. Ruiz
Bueno, Padres apologistas griegos, BAC, Madrid 1954
Cf. R. Bohren, Predigtlehre, Munique,
1980,p. 82; A. Schwarz, Praxis und Predigtlehre, Viena,
1986, p. 50.
Cf. J. Rothermundt, Der
Heiliege Geist und die Rhetorik, Güterslh, 1985, p. 45. L. Maldonado, La
comunidad cristiana, p.15-40.
K. H.
Biertiz-Ch. Bunners, Handbuch der Predigt, Berlim
1990, p. 100-135.
Para esta
parte: MOESCH,O., O anúncio da Palavra de Deus. Reflexões sobre a
teologia pastoral da pregação. Petrópolis: Vozes, 1980.
Cf. Evangelium
nuntiandi, n. 41.
Para toda
esta parte estaremos utilizando as reflexões do Departamento de Liturgia do
CELAM, Homilia, São Paulo: Paulinas, 1983, p. 13-55.
Sobre
o lugar onde se deve proferir a homilia assim diz a
Instr. Geral do Missal Romano no n.136: «O sacerdote, de pé junto à cadeira ou
no próprio ambão, ou ainda, se for oportuno, em outro lugar adequado, profere a
homilia; ao terminar, pode-se observar um tempo de silêncio».
https://presbiteros.org.br/manual-de-homiletica/
Nenhum comentário:
Postar um comentário