sábado, 8 de janeiro de 2022

FILOSOFIA

A POLÍTICA EM ARISTÓTELES

O alcance da filosofia política de Aristóteles é extremamente vasto e complexo. Aristóteles abordou questões relativas ao Estado, a justiça, as constituições, as formas de governo, a escravidão, e muitas outras.

Dentre as características da natureza política humana a partir do pensamento de Aristóteles encontramos o conceito de animal político (Zoon Politikon), um animal racional que fala, pensa e que, além disso, tem necessidade natural de conviver em sociedade. Pode-se afirmar que a política aristotélica rejeita a tese liberal moderna de que o indivíduo é mais importante do que a família ou a sociedade. Aristóteles entende que a cidade tem precedência sobre cada um dos indivíduos, pois, isoladamente, o indivíduo não é autossuficiente, já a falta de um indivíduo não é determinante para a vida da pólis (cidade). Ademais o indivíduo só pode se desenvolver em sua capacidade racional plena em meio a vida em sociedade. Por isso Aristóteles afirma que o todo deve necessariamente ter precedência sobre as partes e o Estado deve ser superior ao indivíduo.

Dessa forma, não só o fundamento da existência do homem só pode ser pensado na sociedade como, na ordem natural das coisas, uma vez que o todo deve ser colocado, forçosamente, antes das partes, o Estado se coloca antes da família e antes de cada indivíduo, pois o bem comum é superior ao bem individual, a coletividade suplanta o particular. Com efeito, a “[...] família é o núcleo do Estado e precede-o cronologicamente, porém na ordem lógica acha-se primeiro o Estado” (MONDOLFO, 1967, p. 270).

O Estado tem, por natureza, mais importância do que a família e o indivíduo, uma vez que o conjunto é necessariamente mais importante do que as partes. Separem-se do corpo os pés e as mãos e eles não serão mais nem pés nem mãos (...) a prova de que o Estado é uma criação da natureza e tem prioridade sobre o indivíduo é que o indivíduo, quando isolado, não é autossuficiente, no entanto, ele o é como parte relacionada com o conjunto (POLÍTICA – Livro I, I, 11).

Aristóteles propõe também uma análise de como o Estado é constituído, ele parte da análise das partes em direção a um todo que é propriamente o estado, a vida social realizada em sua forma mais plena. Para se constituir o estado são necessárias corretas distinções, sejam elas entre o estadista e o estado, entre um rei e seus súditos, entre um chefe de família e sua casa, entre senhores e escravos.

É de Aristóteles a clássica divisão dos governos em três principais: a monarquia (governo de um só); a aristocracia (governo de poucos); a república (governo de muitos); sendo que para cada forma justa de governo existe uma forma degenerada: a monarquia pode degenerar-se em tirania; a aristocracia em oligarquia; a república em demagogia (DEL VECCHIO, 2010).

Partindo do princípio de que o fim do Estado é facilitar o alcance do bem comum, tanto Platão quanto Aristóteles dividem as constituições possíveis (ou seja, as possíveis formas de governo) em duas categorias: justas e injustas. Afirmam que ocorrem três formas de constituições justas e outras tantas injustas. Constituições justas são aquelas que servem ao bem comum e não só aos interesses dos governantes. Estas são a monarquia, isto é, o comando de um só que cuida do bem de todos; a aristocracia, isto é, o comando dos virtuosos, dos melhores, que cuidam do bem de todos sem se atribuir nenhum privilégio; a república ou politia, isto é, o governo popular que cuida do bem de toda a cidade. Ao contrário, constituições injustas são aquelas que servem aos interesses dos governantes e não ao bem comum. São elas: a tirania, ou seja, o comando de um só chefe que persegue o próprio interesse; a oligarquia, ou seja, o comando dos ricos que procuram o bem econômico pessoal; a demagogia a toda a diferença social em nome da igualdade (MONDIN, 1980, p. 121).

Esta é a base da classificação que irá nos oferecer também Políbio (200-120 a.C.): formas de governo monárquica, aristocrática e popular, as quais podem degenerar-se em outras três formas perniciosas de governo como o despotismo, a oligarquia e permissividade, respectivamente (POLÍBIO, 1985).

Para Aristóteles a política visa um fim que é útil e bom para o homem e para a sociedade pois, conforme a concepção aristotélica que vê o mundo como uma ordem cosmológica e teleológica, não há nada que a natureza crie e não vise o fim, uma finalidade, e cuja finalidade da vida humana se dá na pólis, ou seja, na cidade. Vale ressaltar as diferenças entre os habitantes da pólis (cidade) que segundo Aristóteles dividiam-se em duas espécies de seres humanos: os que vegetam em tribos amorfas e selvagens ou formam imensos rebanhos em monarquias de proporção monstruosas, e os que se encontram harmoniosamente associados em cidades (pólis); os primeiros nasceram para ser escravos, de sorte que os últimos pudessem dar-se ao luxo de gozar um modo mais nobre de vida.

A vida em uma comunidade política é uma tendência natural que as pessoas têm de se agruparem e ninguém pode ter garantido seu próprio bem sem a família e sem alguma forma de vida comunitária. Ademais Aristóteles diz que os indivíduos não se associam somente para viver, mas para viver bem: dos agrupamentos das famílias formam-se as aldeias e do agrupamento das aldeias forma a cidade cuja finalidade é a felicidade dos seus cidadãos.

Aristóteles pensa a comunidade como associação dos seres humanos, sendo a associação humana mais básica a família, e a comunidade tem que ser entendida como uma associação que os seres humanos possuem e que os mesmos fazem parte. Então, o animal político para Aristóteles é naturalmente o homem para além da sua condição animal, que existe para se dedicar a vida em comunidade, e nessa ideia Aristóteles está valorizando a coletividade o que nos conduz a três ideias iniciais do nosso ponto de partida: o centro da reflexão de Aristóteles é a comunidade e não o indivíduo; os seres humanos são sociáveis por natureza, isto é, são levados a viver em comunidade por sua própria natureza; e aqueles que não vivem em comunidade “ou são deuses ou são animais”, ou seja, ou estão acima ou abaixo do que é ser humano.

Se o homem existe naturalmente para a vida em comunidade, a consequência direta disto é que somos também criados para agir politicamente, ou seja, para participar sempre da vida que compartilhamos com os outros, com nosso mundo externo, na família, na escola, no bairro, na cidade, no país, enfim, em qualquer lugar no qual nos associamos e pertencemos. Mas se por um lado Aristóteles é um exímio pensador da natureza política do ser humano, por outro procurou encontrar meios de justificar a escravidão (saiba mais em: A Escravidão em Aristóteles).

A escravidão é considerada como algo necessário ao Estado visto que este precisa de uma classe de homens dedicada ao trabalho material, permitindo que a classe dos cidadãos possa se ocupar da vida pública e das formas superiores de atividade.

Aristóteles observa o fenômeno da escravidão, e também busca justificá-lo demonstrando como os homens que são incapazes de se governarem deviam ser dominados. Alguns homens, afirma ele - são nascidos para a liberdade; outros, para a escravidão. Tenta ainda provar com razões de índole prática a utilidade da escravidão (DEL VECCHIO, 2010, p. 28).

Aristóteles vincula ainda a política com a virtude e o bem, sendo a virtude algo que deve ser atingida pela organização e ação coletiva da comunidade, não sendo possível pensar em ser feliz sem ser virtuoso.


Referências Bibliográficas

AMARAL, Roberto A. P. do; SILVA, Deyse Amorim; GOMES, Luciene Izabel. eudaimonia aristotélica: a felicidade como fim ético. Revista Vozes dos Vales, n. 1, ano1, p. 1-20, mai., 2012. Acesso em 09/09/2017.

ARISTOTELES. A política. 15. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1988.

____. PolíticaTrad. por Mário da Gama Kury. Brasília: UnB, 1985.

____. Tópicos; Dos argumentos sofísticos. seleção de textos de José Américo Motta Pessanha ; tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de W.A. Pickard. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983. Vol. 1

DEL VECCHIO, Giorgio. História da Filosofia do Direito. Belo Horizonte, Ed. Líder, 2006.

FEITOSA, Charles. Explicando a Filosofia com Arte. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.

MONDIN, B. Introdução à Filosofia: problemas, sistemas, autores, obras. Tradução de J. Renard. São Paulo: Paulus, 1980.

MONDOLFO, Rodolfo. O pensamento antigo: historia da filosofia greco-romana. Tradução de Lycurgo Gomes da Mota. 2.ed. São Paulo: Mestre Jou, 1967. vol. II.

POLÍBIO. História. Brasília: UnB, 1985, Livro VI, §§ 299-300, pp. 328-331.

REALE, Giovanni. Aristóteles. História da filosofia grega e romana. Tradução de Henrique C. L. Vaz e Marcelo Perine. Nova edição corrigida. São Paulo: Loyola, 2007. vol. IV.

REALE, G.; ANTISERI, D. História da Filosofia. Filosofia pagã antiga, v. 1. São Paulo: Paulus, 2003.


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