IX-
REFLEXÃO
DOMINICAL II
Homilia
de Dom Henrique Soares da Costa – XVIII Domingo do Tempo Comum (Ano C)
Ecl 1,2;2,21-23; Sl 89
Cl 3,1-5.9-11Lc 12,13-21
Em que consiste a vida
do ser humano? O que faz realmente, de modo definitivo, uma existência humana
valer a pena? Como o homem pode, de verdade, ganhar a vida? Eis algumas
perguntas seríssimas para quem deseja viver de verdade e não fazer da
existência um tempo perdido, uma paixão inútil.
O Senhor Jesus nos adverte: “A vida do homem não consiste na abundância de
bens!” Esta frase recorda-nos uma outra: “O homem não vive somente de pão!” (Mt
4,4). Ao contrário do que o mundo nos quer colocar na cabeça e no coração, não
se pode medir o valor de uma vida pelos bens materiais ou pelo sucesso de
alguém.
Todos temos um desejo enorme de encontrar um porto seguro para nossa
existência. Buscamos segurança: segurança econômica, segurança quanto à saúde,
segurança afetiva, segurança profissional… sempre segurança. O problema é que
nesta vida e neste mundo nada é seguro e toda segurança não passa de uma
ilusão, que, cedo ou tarde, desaba. O Eclesiastes é de um realismo cortante:
“Vaidade das vaidades, tudo é vaidade”. – Em outras palavras: pó do pó, tudo é
pó; inconsistência da inconsistência, tudo é inconsistência, tudo passa, tudo é
transitório e fugaz… E o Salmista hoje faz coro a essa tremenda realidade: “Vós
fazeis voltar ao pó todo mortal, quando dizeis: ‘Voltai ao pó, filhos de Adão!’
Pois mil anos para vós são como ontem, qual vigília de uma noite que passou.
Eles passam como o sono da manhã, são iguais à erva verde pelos campos. De
manhã ela floresce vicejante, mas à tarde é cortada e logo seca”. O Autor do
Eclesiastes coloca a questão tão dramática: será que tudo quanto construímos,
será que nossos amores e sonhos, será que tudo isso caminha para o nada? “Toda
a sua vida é sofrimento, sua ocupação, um tormento. Nem mesmo de noite repousa
o seu coração!” São palavras duríssimas e, à primeira vista, de um pessimismo sem
remédio. Mas, não é assim! O Autor sagrado nos quer acordar do marasmo, nos
quer fazer compreender que não podemos enterrar a cabeça e o coração no simples
dia-a-dia, sem cuidar do sentido que estamos dando à nossa existência como um
todo!
Então, onde apostar nossa vida, para que ela realmente tenha um sentido? Como
fugir da angústia de uma vida que vai passando como o fio no tear – para usar
uma imagem da Escritura? É interessante observar como hoje se procura fazer a
vida valer a pena… Preocupação com a estética, com a saúde, com a satisfação
dos desejos… Preocupação em ser vip na sociedade, em ter prestígio e poder… em
se esbaldar no divertimento, nos esportes, nos eventos, no turismo… Pois bem, a
Palavra de Deus nos adverte de modo seco e solene: tudo passa, tudo é vaidade;
não consiste nisso a vida de uma pessoa! Com tudo isso, podemos ser infelizes;
com tudo isso, podemos danar para sempre nossa única existência.
Então, em que consiste a vida? Que caminho seguir para repousar nosso coração
naquilo que não passa? Como usar as coisas que passam de modo a abraçar as que
não passam? Os cristãos têm uma resposta, que para o mundo é incompreensível.
Escutemos o Apóstolo: “Se ressuscitastes com Cristo, esforçai-vos por alcançar
as coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus; aspirai às
coisas celestes e não às coisas terrestres. Pois vós morrestes, e a vossa vida
está escondida com Cristo em Deus”. Palavras fortes; palavras que o mundo não
poderá nunca compreender! Para o cristão, a vida verdadeira é Cristo, aquele
que morreu e ressuscitou, aquele que se encontra à direita do Pai. Nós cremos
que tudo quanto vivamos com ele e de modo coerente com o seu Evangelho, é vida
e nos faz felizes, livres e maduros. Cremos que viver de verdade a vida é apostar
nele a existência, pois somente nele, no Cristo Senhor, está a vida verdadeira.
Cremos que viver é viver como ele viveu. Ora, como foi a vida do Cristo? Foi
total doação ao Pai e aos outros, por amor do Pai. Total despojamento, numa
total liberdade – foi assim que o Cristo passou entre nós. Pois bem, é nisso
que consiste a vida verdadeira; é nisto que consiste o que Jesus chama no
Evangelho de ser “rico diante de Deus” e não ajuntar tesouros para si, apenas.
Pensemos bem: num mundo que já não mais sabe olhar para o alto, num mundo que
desaprendeu a ouvir aquele que tem palavra de vida eterna, não é fácil viver
este caminho de Jesus. E, no entanto, esta é a condição para ser cristão de
verdade e para encontrar a verdadeira vida. Não queiramos, portanto, reduzir o
Evangelho ao tamanho da nossa mediocridade; tenhamos a coragem de dilatar nosso
coração, de ampliar nossos horizontes à medida do apelo do Cristo Jesus e de
viver a vida de pessoas novas, ressuscitadas para uma vida nova.
Dom Henrique Soares da Costa
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