sábado, 2 de abril de 2022

QUARESMA E SEMANA SANTA

UMA VISÃO LITÚRGICO-CATEQUÉTICA

Por Victor Souza

Nossa vida é marcada por algo passageiro e efêmero conhecido como tempo. Vivemos pautados nos diferentes ritmos do tempo. Contudo, podemos pensá-lo por meio de dois conceitos distintos. O tempo do relógio (o Kronos), que é aquele tempo passageiro, e o tempo oportuno (Kairós), o tempo da graça. Pela Igreja vivenciamos uma união de ambos os conceitos. As celebrações são “kairológicas”, mas sem perder a conexão com o tempo cronológico. Nesse sentido, a Liturgia da Igreja propõe ritmos diferentes do que vivemos no dia a dia. Podemos falar em ano civil, ano agrícola, ano escolar... e ano litúrgico. O Ano Litúrgico trata-se do mistério sacramental celebrado ao longo do tempo, em um ciclo anual, fazendo memória das ações de Deus na história da criação, “transformando Chronos em Kairós, transfigurando o tempo”. Nessa didática do Ano Litúrgico, vivenciamos, durante o Ciclo Pascal, um momento muito importante e atual, chamado quaresma. É sobre este momento particular do ano litúrgico que propomos refletir. A Igreja nos propõe a vivência de um tempo voltado especialmente para as práticas da oração, do jejum e da caridade. Um período chamado de quaresma, por se tratar de uma caminhada de aproximadamente 40 dias. Um número simbólico de grande importância ao longo da história da humanidade que experiencia o amor de Deus. O número 40, na Bíblia, indica um tempo necessário de preparação para algo novo que vai acontecer. Uma preparação que sempre antecede fatos importantes. Recordamos, por exemplo, os 40 dias e as 40 noites do dilúvio; os 40 anos do povo de Israel caminhando rumo a Terra Prometida (Exôdo); os 40 dias de Moisés no Monte Sinai e de Elias, no Monte Horeb. Por fim, recordamos que Jesus, antes de iniciar sua vida pública, jejuou e foi tentado por 40 dias, no deserto. Tendo consciência da importância e do valor simbólico, a Igreja Católica, por meio do calendário litúrgico, estabelece um período de tempo nomeado Quaresma. Mantendo a tradição, este período nos prepara para a vivência da festa ápice do cristianismo: a Páscoa. O tempo da quaresma tem início na Quarta-feira de Cinzas e se encerra na tarde da Quinta-feira da Semana Santa. Esse tempo é repleto de gestos, símbolos e celebrações litúrgicas e paralitúrgicas que nos situam no mistério vivido por Jesus cristo. A cor roxa, o costume de se cobrirem os santos, em algumas igrejas particulares, a omissão do canto do Glória e do Aleluia nas celebrações, a realização das Vias Sacras, a reflexão mais aprofundada da Campanha da Fraternidade e a piedade popular acompanhando as procissões são exemplos marcantes. A Semana Santa é um momento muito especial por se tratar da última etapa de preparação para a vivência da Páscoa. Chegando ao fim dessa caminhada quaresmal, a Semana Santa detalha, mais claramente, a riqueza do mistério pascal em vários dias, em que se inicia no Domingo de Ramos, o último domingo da quaresma. Nesse domingo vivemos a abertura solene da grande semana que tem como centralidade a Páscoa de Jesus Cristo. Ainda no contexto da Semana Santa, vivenciamos o Tríduo Pascal, que consiste no centro de toda a vida da Igreja. É o ápice da liturgia e de todo o acontecimento da redenção. É o cume da história da Igreja. Como o próprio nome nos induz a pensar, trata-se de três dias. Apesar de serem três dias, nesse período vivenciamos uma única celebração em momentos distintos. Daí a importância do cristão participar de todos os momentos. Não se celebra o mistério pela metade. A Quinta-feira da Semana Santa marca o fim da Quaresma e o início do Tríduo Pascal. Esse dia, portanto, faz parte de tempos litúrgicos diferenciados. Encerra a quaresma até a hora das vésperas e abre o tríduo com a missa na Ceia do Senhor, na qual a Igreja repete a Ceia para perpetuar a Páscoa. O segundo momento do tríduo é a Paixão do Senhor, celebrada na Sexta-feira Santa. Este é o único dia do ano em que a Igreja não celebra missas e sacramentos. O fundamental nesse dia, mais do que participar das procissões e da Via Sacra, é a celebração da Palavra, composta pela liturgia da Palavra, o rito da comunhão e a adoração da cruz. O último momento acontece no Sábado Santo. O Sábado da Semana Santa é marcado pela celebração da Vigília Pascal. Trata-se da celebração mais importante do ano. É a missa das missas. A “mãe de todas as celebrações”, pois é a partir desta que nós celebramos a Páscoa semanal aos domingos e os sacramentos. Nessa noite, a Igreja celebra toda a história da humanidade e a obra da redenção e da perfeita glorificação de Deus como memória, presença e espera. O sentido deste dia é vivermos a Páscoa que celebramos ritualmente para que opere em nós a espera da Páscoa eterna. A Vigília Pascal apresenta ritos diferenciados, que formam um conjunto unitário. Ela é marcada por quatro partes: a liturgia da Luz, a liturgia da Palavra, liturgia Batismal e Liturgia Eucarística. Na liturgia da Luz recebemos o fogo novo, a luz que brilha novamente para nós. Com esse mesmo fogo que guiou o povo rumo à Terra Prometida, acende-se o Círio Pascal. Em seguida, tem-se a liturgia da Palavra, marcada por nove leituras e oito salmos. São 7 leituras do Antigo Testamento e 2 leituras do Novo Testamento. A proclamação desses textos é um relato de toda a história da salvação. Inicia-se com a criação, passando pela caminhada do povo de Israel rumo à libertação, chegando à Ressurreição de Jesus Cristo e ao nascimento da Igreja. Esse momento também é marcado pelo canto do Glória e do Aleluia, até então omitidos. Em seguida vive-se a liturgia Batismal, momento em que somos convidados a renovarmos nossas promessas batismais e assumirmos o compromisso de professar a nossa fé. Além disso, invocamos os santos e santas para interceder por todos. O rito se encerra com a liturgia Eucarística, onde o Cristo Ressuscitado nos é dado como alimento, que nos sustenta na caminhada. Por fim, após o Tríduo Pascal, que se encerra no Domingo de Páscoa, passamos a viver o Tempo Pascal. Trata-se de uma extensão da celebração da Páscoa. O Concílio Vaticano II determinou que a Páscoa houvesse um prolongamento festivo por oito dias (oitavas de Páscoa), durante o qual a liturgia se volta para a solenidade principal. Os cinquenta dias que se prolongam desde o Domingo da Ressurreição até ao Domingo do Pentecostes, que marca o fim do Tempo Pascal, celebram-se na alegria e exultação como um único dia de festa, melhor, como «um grande Domingo». São os dias em que de modo especial glorificamos a Deus e cantamos o Aleluia.

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