quinta-feira, 8 de setembro de 2022

"MORO, NUM PAÍS TROPICAL: ABENÇOADO POR DEUS OU NEMTANTO?"

 "MORO, NUM  PAÍS  TROPICAL: ABENÇOADO POR DEUS OU NEMTANTO?"

Por Lindolivo Soares Moura(*)

     "Disse um dos nossos estadistas: a  maldição  deste país são as pessoas    eloquentes (Ralpf W. Emerson).

 

Eis que chega Setembro: com ele, não apenas a primavera, estação das flores, do belo e da beleza; em nosso país chega também o "7": o sete de Setembro. O ano era 1822. Foi às margens de um pequeno riacho, hoje totalmente poluído e engolido por uma metrópole de aproximadamente doze milhões de pessoas, que a história assegura ter o fato se passado. Montado em uma mula - e não sobre um majestoso "manga larga", como retrata o famoso quadro com a histórica pintura "Independência ou Morte", de Pedro Américo, conhecida também como "Grito do Ipiranga", coube ao então Príncipe Regente Dom Pedro I a proclamação das célebres palavras: "Independência ou Morte'!". Estava dado o recado. O ato, porém, não estava de todo consumado. A colônia continuaria ainda como colônia até 15 de Novembro de 1889, quando o então Marechal Deodoro da Fonseca proferiu um "ultimatum" exigindo que a família real abandonasse o país. Dali em diante, para o bem ou para o mal, seria por nossa conta. Afinal, como diz o ditado popular, "quem senta na ponta - no presente caso, quem 'toma' a ponta - paga a conta".

 

E cá estamos nós: exatamente dois séculos depois daquele fatídico -  sem retórica; quando muito, figura de linguagem - e memorável grito  às margens do riachuelo do Ipiranga (não confundir com a igualmente famosa Batalha do Riachuelo em 1865). "Por que fatídico?", talvez você tenha perguntado. Ora, se não como causa, ao menos como marco, quem poderá dizer que aquele famoso grito não terá sido o prenúncio dos tantos desarranjos e infortúnios que, juntamente com as bênçãos, nos acompanhariam durante esses duzentos anos? Afinal, que vivemos em um "país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza" - mas que beleza! - não há como negar; mas que não só essas belezas da natureza, como também as da humana natureza, estejam se transformando em miséria, sofrimento e pobreza, não há como deixar de admitir. O coração de Dom Pedro, que ora se encontra no meio de nós, certamente estará respondendo com espanto e estupefação a tanto do que tem visto e ouvido.Talvez sequer tenha sido boa idéia convidá-lo para voltar "à sua pátria amada, idolatrada e mãe gentil", justo em tempos de pré-eleição e outras comemorações. O clima nesses momentos costuma ficar quente; quente, polarizado, e por vezes excessivamente pesado.

 

Se isso não bastasse, ainda tem a pandemia: o que de fome, desemprego e miséria, a ela tem sido atribuído, é realmente de causar espanto; mais que isso, uma verdadeira injustiça. Se vivo fosse, Beccaria certamente estaria se envolvendo com a segunda parte de seus "delitos e penas", espantado com a desproporcionalidade das imputações e penas aplicadas à pandemia. Se formos falar das imputações de "culpa com dolo" atribuídas à guerra "Rússia X Ulcrânia", então, pouca coisa restaria para se atribuir a Deus, como sempre o maior dos culpados. Sim, porque isento de culpa é que Ele não pode ficar. Onde já se viu um Deus inocente, sem responsabilidade no cartório, "ficha limpa", e sem nada do que se justificar! Ainda mais quando se sabe que "Deus é brasileiro": seria o cúmulo da omissão e da falta de atenção.

 

Tempos de eleições e tempos de comemorações são tempos mágicos! Pobre de nós, simples mortais, se não fossem eles! São tempos  verdadeiramente "midiáticos". Sim, "midiáticos" também, sem dúvida; mas a intenção foi me referir a Midas, o rei que tudo em ouro transformava. Em tempos de comemorações e eleições a eloquência e a retórica ostentam beleza, a miséria se transforma em riqueza, os números sustentam proezas, e a democracia só não é completa por uma única razão: a mentira, claro, é impedida de participar e entrar em ação. Essa é a mais pura verdade. Talvez seja esse o principal motivo pelo qual o período das eleições tenha sido "sequestrado" para os meses finais do ano: impedir que ele abarcasse o mês de Abril, e com ele o dia primeiro, dia do direito adquirido à mentira, às lorotas e enganações. Eleições e datas comemorativas recheadas com mentiras seriam com certeza uma farsa, uma grande "fake news". E se as urnas pudessem mentir, então, como acusam alguns, seria o fim da picada e o início da derrocada: lá se ia nossa debutante e pujante democracia. Ninguém mais acreditaria em nada: nem em "supremos", nem em pequenos, nem tampouco em medianos. A vaca certamente iria para o brejo!

 

Desculpem! Foi sem querer! O "brejo" foi coisa do inconsciente! Sei que já estamos todos um tanto paranóicos com tanta lama, lodo, barro, argila, limo e lamaçal. Reconheço que falar de brejo pode fazer vir à tona  todo esse emaranhado de "poluentes" que graças a Deus, felizmente -  "Deus seja louvado!" - não existe mais. Faz parte de um passado já distante, que se foi, virou conteúdo dos anais. O "horário político", que de tão grande relevância deveria nos acompanhar o ano inteiro e não somente em tempos de eleições, está aí para me corrigir. Corrigir e atualizar: corrupção, brejo, mar de lama, tudo isso "já era", absolutamente não existe mais! Até canção de ocasião já fizeram para homenagear o fato: "meu Deus do céu, o que fizeram com a gente....eu tenho que chorar, eu tenho que desabafar...Ai, doeu, doeu, doeu, doeu..." , coisas de sorriso maroto de Jorge e Mateus. O nome da canção, caso tenha por  hábito pesquisar, é esse mesmo: "Aí já era".

 

Tempos de comemorações e tempos de eleições são tempos de partir o coração. Discursos doces, melosos e melados, de falas "embriagadas" e paixões inebriantes. Tanta retórica, eloquência e contundência, cujo intento é seduzir, engambelar, e se possível, de quebra, sorrateiramente fraudar a razão. Haverá talvez outro tempo em que o nome de Deus seja tão usado em vão? Deus e o seu oposto, diga-se de passagem; tanto faz! O importante, claro, é persuadir pela ilusão. Símbolos viram "fetiche", imagens idolatria, conchavos hipocrisia, dinheiro feitiçaria, e qualquer coisa um amuleto: o cenário parece perfeito! Se a história de vida não convence, para isso se dá um jeito: compra-se o pai, a mãe, o filho, o afilhado e o padrinho, o faminto e seu vizinho, e segue a procissão. São tantas promessas, padres-nossos e ave-marias, que ao final de tudo até o santo desconfia. Ateu vira convertido, malvado samaritano, piedoso qualquer ciclano, e até os turistas de igreja - aqueles que só as visita em viagens de turismo e Missa de Sétimo Dia - se transformam em verdadeiros adoradores e "papa-hóstias" de ocasião. E cuidado aí com o Andor. Em tempos como estes - glória a Deus! - "somos todos irmãos!".

 

Em tempos de comemorações e de eleições o repicar dos sinos costuma fazer eco simultâneo ao rufar dos tambores. Se isso é pura coincidência ou não, não se sabe bem; fica a critério de cada um decidir. Historicamente não foi. E isso, claro, tem deixado uma e outro, a religião e o Estado, um tanto sob suspeita. Num tempo em que o segundo se declara "laico" - não estamos falando de "ato de fé", e sim de "ato Constitucional" - e a primeira se professa "a-partidária" - "se você tomou partido pela justiça, não esqueça que a justiça está acima do seu partido" - o mínimo que de tais compromissos se pode esperar é que nenhuma das partes "faça uso do nome de Deus em vão". A lei jurídica, e com ela seus representantes e promotores, devem estar sempre atentos em defender e, claro, praticar o estabelecido; a lei que chamamos "divina", em sua versão "religiões e igrejas organizadas", assim como seus legítimos "ministros" e representantes, têm evidentemente o dever - divino e humano - de fazer o mesmo. O bom senso e a razão assim esperam e gentilmente agradecem.

 

(*)Possui graduação em teologia pelo Instituto teológico pio XI (1983), graduação em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo (1997), graduação em Filosofia pela Faculdade Salesiana de Filosofia, ciências e letras (1986) e mestrado em Filosofia pela Pontificia Universidade Gregoriana ,Roma - Itália(1988) . Foi por 11 anos consecutivos professor de filosofia jurídica e psicologia Jurídica do Centro Universitário de Vila Velha, ES.Durante esses 11 anos foi Coordenador Pedagógico por 05 anos e de Ensino por 1 ano e meio do mesmo Curso de Direito. Atualmente é terapeuta de grupo, individual, vocacional, Consultório Clínico Psicológico particular. Formou-se recentemente em Psicodrama (02 anos) pelo Instituto Pegasus de Vitória, ES. Atualmente, cursa a pós graduação TCC - Terapia Cognitivo Comportamental.

 

https://www.escavador.com/sobre/3708588/lindolivo-soares-moura

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