domingo, 2 de maio de 2021

REFLEXÃO DOMINICAL II

5º DOMINGO DA PÁSCOA

JESUS, “A VERDADEIRA VIDEIRA”

A liturgia do 5º Domingo da Páscoa convida-nos a refletir sobre a nossa união a Cristo; e diz-nos que só unidos a Cristo temos acesso à vida verdadeira.

O Evangelho apresenta Jesus como “a verdadeira videira” que dá os frutos bons que Deus espera. Convida os discípulos a permanecerem unidos a Cristo, pois é d’Ele que eles recebem a vida plena. Se permanecerem em Cristo, os discípulos serão verdadeiras testemunhas no meio dos homens da vida e do amor de Deus.

A primeira leitura diz-nos que o cristão é membro de um corpo – o Corpo de Cristo. A sua vocação é seguir Cristo, integrado numa família de irmãos que partilha a mesma fé, percorrendo em conjunto o caminho do amor. É no diálogo e na partilha com os irmãos que a nossa fé nasce, cresce e amadurece e é na comunidade, unida por laços de amor e de fraternidade, que a nossa vocação se realiza plenamente.

A segunda leitura define o ser cristão como “acreditar em Jesus” e “amar-nos uns aos outros como Ele nos amou”. São esses os “frutos” que Deus espera de todos aqueles que estão unidos a Cristo, a “verdadeira videira”. Se praticarmos as obras do amor, temos a certeza de que estamos unidos a Cristo e que a vida de Cristo circula em nós.

O Evangelho do 5º domingo da Páscoa situa-nos em Jerusalém, numa noite de quinta-feira, um dia antes da festa da Páscoa do ano 30. Jesus está reunido com os seus discípulos à volta de uma mesa, numa ceia de despedida. Ele está consciente de que os dirigentes judaicos decidiram dar-Lhe a morte e que a cruz está no seu horizonte próximo.

Os gestos e as palavras de Jesus, neste contexto, representam as suas últimas indicações, o seu “testamento”. Os discípulos recebem aqui as coordenadas para poderem continuar no mundo a missão de Jesus. Nasce, assim, a comunidade da Nova Aliança, alicerçada no serviço (cf. Jo 13,1-17) e no amor (cf. Jo 13,33-35), que pratica as obras de Jesus animada pelo Espírito Santo (cf. Jo 14,15-26). O “discurso de despedida” de Jesus vai de 13,1 a 17,26.
O texto que a liturgia deste domingo nos propõe apresenta-nos uma instrução de Jesus sobre a identidade e a situação da comunidade dos discípulos no meio do mundo.

Para definir a situação dos discípulos face a Jesus e face ao mundo, Jesus usa a sugestiva metáfora da videira, dos ramos e dos frutos… É uma imagem com profundas conotações vétero-testamentárias e com um significado especial no universo religioso judaico.

No Antigo Testamento (e de forma especial na mensagem profética), a “videira” e a “vinha” eram símbolos do Povo de Deus. Israel era apresentado como uma “videira” que Jahwéh arrancou do Egito, que transplantou para a Terra Prometida e da qual cuidou sempre com amor (cf. Sal 80,9.15); era também apresentado como “a vinha”, que Deus plantou com cepas escolhidas, que Ele cuidou e da qual esperava frutos abundantes, mas que só produziu frutos amargos e impróprios (cf. Is 5,1.7; Jer 2,21; Ez 17,5-10; 19,10-12; Os 10,1). A antiga “videira” ou “vinha” de Jahwéh revelou-se como uma verdadeira desilusão. Israel nunca produziu os frutos que Deus esperava.

Agora, Jesus apresenta-Se como a verdadeira “videira” plantada por Deus (vers. 1). É Jesus que irá produzir os frutos que Deus espera. E, de Jesus, a verdadeira “videira”, irá nascer um novo Povo de Deus. Hoje, como ontem, Deus continua a ser o agricultor que escolhe as cepas, que as planta e que cuida da sua vinha.

Qual é o lugar e o papel dos discípulos de Jesus, neste contexto? Os discípulos são os “ramos” que estão unidos à “videira” (Jesus) e que dela recebem vida. Estes “ramos”, no entanto, não têm vida própria e não podem produzir frutos por si próprios; necessitam da seiva que lhes é comunicada por Jesus. Por isso, são convidados a permanecer em Jesus (vers. 4). O verbo permanecer (“ménô”) é a palavra-chave do nosso texto (do vers. 4 ao vers. 8, aparece sete vezes). Expressa a confirmação ou renovação de uma atitude já anteriormente assumida. Supõe que o discípulo tenha já aderido anteriormente a Jesus e que essa adesão adquira agora estatuto de solidez, de estabilidade, de constância, de continuidade. É um convite a que o discípulo mantenha a sua adesão a Jesus, a sua identificação com Ele, a sua comunhão com ele… Se o discípulo mantiver a sua adesão, Jesus, por sua vez, permanece no discípulo – isto é, continuará fielmente a oferecer ao discípulo a sua vida.

O que é, para o discípulo, estar unido a Jesus? Em Jo 6,56 Jesus avisou: “Quem realmente come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em Mim e Eu nele”… A “carne” de Jesus é a sua vida; o “sangue” de Jesus é a sua entrega por amor até à morte; assim, “comer a carne e beber o sangue” de Jesus é assimilar a existência de Jesus, feita serviço e entrega por amor, até ao dom total de si mesmo. Está unido a Jesus e permanece n’Ele quem acolhe no coração essa proposta de vida e se compromete com uma existência feita entrega a Deus e aos irmãos, até à doação completa da vida por amor. A união com Jesus não é, no entanto, algo automático, que de forma automática atingiu o homem e que foi adquirida de uma vez e para sempre; mas é algo que depende da decisão livre e consciente do discípulo – uma decisão que tem de ser, aliás, continuamente renovada (vers. 4).

Para os discípulos (“os ramos”), interromper a relação com Jesus significa cortar a relação com a fonte de vida e condenar-se à esterilidade. Quem se recusa a acolher essa vida que Jesus propõe e prefere conduzir a sua existência por caminhos de egoísmo, de auto-suficiência, de fechamento, é um ramo seco que não responde à vida que recebe da “videira”. Não produz frutos de amor, mas frutos de morte.

Ora, a comunidade de Jesus (os “ramos”) não pode condenar-se à esterilidade. A sua missão é dar frutos. Por isso, o “agricultor” (Deus) atua no sentido de que o “ramo” (o discípulo) se identifique cada vez mais com a “videira” (Jesus Cristo) e produza frutos de amor, de doação, de serviço, de libertação dos irmãos. A ação de Deus vai no sentido de “limpar” o “ramo” a fim de que ele dê mais fruto. “Limpar” significa chamá-lo a um processo de conversão contínua que o leve a recusar caminhos de egoísmo e de fechamento, para se abrir ao amor. Dito de outra forma: a limpeza dos “ramos” faz-se através de uma adesão cada vez mais fiel a Jesus e à sua proposta de amor (vers. 2b). Os discípulos de Jesus estão “limpos” (vers. 3), pois aderiram a Jesus, são a cada instante confrontados com a sua proposta de vida e respondem positivamente ao desafio que lhes é feito.

Se, apesar do esforço de Deus e do seu contínuo chamamento à conversão, o “ramo” se obstina em não produzir frutos condizentes com a vida que lhe é comunicada, ficará à margem da comunidade de Jesus, da comunidade da salvação. É um “ramo” que não pertence a essa “videira” (vers. 2a).

 Jesus é “a verdadeira videira”, de onde brotam os frutos da justiça, do amor, da verdade e da paz; é n’Ele e nas suas propostas que os homens podem encontrar a vida verdadeira. Muitas vezes os homens, seguindo lógicas humanas, buscam a verdadeira vida noutras “árvores”; mas, com frequência, essas “árvores” só produzem insatisfação, frustração, egoísmo e morte… João garante-nos: na nossa busca de uma vida com sentido, é para Cristo que devemos olhar. Temos consciência de que é em Cristo que podemos encontrar uma proposta de vida autêntica? Ele é, para nós, a verdadeira “árvore da vida”, ou preferimos trilhar caminhos de autossuficiência e colocamos a nossa confiança e a nossa esperança noutras “árvores”?

• Hoje, Jesus, “a verdadeira videira”, continua a oferecer ao mundo e aos homens os seus frutos; e fá-lo através dos seus discípulos. A missão da comunidade de Jesus, que hoje caminha pela história, é produzir esses mesmos frutos de justiça, de amor, de verdade e de paz que Jesus produziu. Trata-se de uma tremenda responsabilidade que nos é confiada, a nós, os seguidores de Jesus. Jesus não criou um gueto fechado onde os seus discípulos podem viver tranquilamente sem “incomodarem” os outros homens; mas criou uma comunidade viva e dinâmica, que tem como missão testemunhar em gestos concretos o amor e a salvação de Deus. Se os nossos gestos não derramam amor sobre os irmãos que caminham ao nosso lado, se não lutamos pela justiça, pelos direitos e pela dignidade dos outros homens e mulheres, se não construímos a paz e não somos arautos da reconciliação, se não defendemos a verdade, estamos a trair Jesus e a missão que Ele nos confiou. A vida de Jesus tem de transparecer nos nossos gestos e, a partir de nós, atingir o mundo e os homens.

• No entanto, o discípulo só pode produzir bons frutos se permanecer unido a Jesus. No dia do nosso Baptismo, optámos por Jesus e assumimos o compromisso de O seguir no caminho do amor e da entrega; quando celebramos a Eucaristia, acolhemos e assimilamos a vida de Jesus – vida partilhada com os homens, feita entrega e doação total por amor, até à morte. O cristão tem em Jesus a sua referência, identifica-se com Ele, vive em comunhão com Ele, segue-O a cada instante no amor a Deus e na entrega aos irmãos. O cristão vive de Cristo, vive com Cristo e vive para Cristo.

• O que é que pode interromper a nossa união com Cristo e tornar-nos ramos secos e estéreis? Tudo aquilo que nos impede de responder positivamente ao desafio de Jesus no sentido do O seguir provoca em nós esterilidade e privação de vida… Quando conduzimos a nossa vida por caminhos de egoísmo, de ódio, de injustiça, estamos a dizer não a Jesus e a renunciar a essa vida verdadeira que Ele nos oferece; quando nos fechamos em esquemas de autossuficiência, de comodismo e de instalação, estamos a recusar o convite de Jesus e a cortar a nossa relação com a vida plena que Jesus oferece; quando para nós o dinheiro, o êxito, a moda, o poder, os aplausos, o orgulho, o amor próprio, são mais importantes do que os valores de Jesus, estamos a secar essa corrente de vida eterna que deveria correr entre Jesus e nós… Para que não nos tornemos “ramos” secos, é preciso renovarmos cada dia o nosso “sim” a Jesus e às suas propostas.

• A comunidade cristã é o lugar privilegiado para o encontro com Cristo, “a verdadeira videira” da qual somos os “ramos”. É no âmbito da comunidade que celebramos e experimentamos – no Baptismo, na Eucaristia, na Reconciliação – a vida nova que brota de Cristo. A comunidade cristã é o Corpo de Cristo; e um membro amputado do Corpo é um membro condenado à morte… Por vezes, a comunidade cristã, com as suas misérias, fragilidades e incompreensões, decepciona-nos e magoa-nos; por vezes sentimos que a comunidade segue caminhos onde não nos revemos… Sentimos, então, a tentação de nos afastarmos e de vivermos a nossa relação com Cristo à margem da comunidade. Contudo, não é possível continuar unido a Cristo e a receber vida de Cristo, em ruptura com os nossos irmãos na fé.

• O que são os “ramos secos”? São, evidentemente, aqueles discípulos que um dia se comprometeram com Cristo, mas depois desistiram de O seguir… Mas os “ramos secos” podem também ser aquelas pequenas misérias e fragilidades que existem na vida de cada um de nós. Atenção: é preciso “limpar” esses pequenos obstáculos que impedem que a vida de Cristo circule abundantemente em nós. Chama-se a isso “conversão”.

• Como podemos “limpar” os “ramos secos”? Fundamentalmente, confrontando a nossa vida com Jesus e com a sua Palavra. Precisamos de escutar a Palavra de Jesus, de a meditar, de confrontar a nossa vida com ela… Então, por contraste, vão tornar-se nítidas as nossas opções erradas, os valores falsos e essas mil e uma pequenas infidelidades que nos impedem de ter acesso pleno à vida que Jesus oferece.

Fonte: https://www.dehonianos.org/portal/05o-domingo-da-pascoa-ano-b/

 

 

 

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