sexta-feira, 19 de maio de 2023

"HOMBRE! POR QUÉ NO TE CALLAS?: O PODER MÁGICO DO SILÊNCIO EXTERIOR E INTERIOR!"( Parte I)

 

 

"HOMBRE! POR QUÉ NO TE CALLAS?: O PODER MÁGICO DO SILÊNCIO EXTERIOR E INTERIOR!"( Parte I)

Por Lindolivo Soares Moura(*)

   "Não  confunda  silêncio com falta de atitude. Às vezes  a  melhor atitude  é  manter-se  em  silêncio"   [Karine Santiago]

 

Quando na cúpula dos líderes latino-americanos de 2007, o Rei da Espanha Juan Carlos I deixou por não mais que um segundo a compostura e o politicamente correto de lado, e sugeriu ao líder Venezuelano Hugo Chávez que se calasse, o impacto daquelas cinco palavras foi tão forte e inesperado, que Chávez alegaria mais tarde não as haver escutado. Caso isso houvesse ocorrido, ele disse, teria respondido à altura. Não respondeu! Mas o mundo todo se encarregaria de repercutir aquele "puxão de orelhas" dado na hora certa, no lugar certo, da forma certa, na intensidade certa, para com a pessoa certa. Teria o Líder Espanhol frequentado  "clases" ministradas pelo mestre Francis Seeburger? Afinal os cinco quesitos mencionados constituem o eixo de sua obra "Como Educar suas Emoções", uma espécie de ressonância da Inteligência Emocional de Goleman nos campos da Psicologia, da Educação e da Comunicação. Se Chávez não ouvira de fato, ou se simplesmente ficara "sem palavras" diante do imperativo que lhe havia sido dirigido, jamais se soube e provavelmente jamais saberemos. Tampouco isso parece ter feito muita diferença para o resto do mundo e para a mídia mundial, sempre atenta a tudo que ocorre pelos quatro cantos do planeta. A beleza das palavras - e não apenas a do corpo - tem também seus "paparazzi" e seus admiradores próprios. Notoriamente conhecido por sua polidez e cavalheirismo, Juan Carlos I passava a ser conhecido também por sua destemida e até então desconhecida ousadia.

As palavras têm um poder mágico -  tanto para o bem como para o mal, é bem verdade - mas certamente que têm. Poucos como Lacan - Jacques Lacan - compreenderam isso, e sobre isso discorreram em seus escritos. Sabemos também que toda comunicação genuína e autêntica requer um misto de "ciência e arte",  como ensinava o mestre do Direito Miguel Reale, ao se referir a ela - a comunicação - no campo da prática jurídica. Sacrificar ou cair em desatenção para com um desses dois quesitos básicos pode significar até mesmo uma guerra, não só de palavras mas de fato. E que ninguém duvide disso! O preço a se pagar poderia vir a ser muito alto. Nesse sentido, saber silenciar pode ser, numa série de situações diferenciadas, vida afora, tão importante ou até mais que saber fazer uso da palavra certa; sempre, claro, acompanhada dos quesitos apontados por Seeburger. Quando estratégica e sabiamente utilizado, o silêncio tem o condão de produzir resultados imprevisíveis e até improváveis. A sabedoria oriental parece ter mais experiência e melhores lições a nos ensinar, sobre o assunto. Como se sabe, nós ocidentais somos herdeiros da clássica filosofia grega, e com ela, da famosa lógica  aristotélica, que sem dúvida alguma muito têm contribuído e nos capacitado para a aquisição da ciência e da arte do "falar bem", persuadir, convencer e outros atributos mais. Afinal, não podemos nos esquecer que também a "pólis" e a "política" são legados gregos. Mas quando se trata do silenciar e do saber calar-se, tanto externa como sobretudo "internamente" -  disposições essenciais para a meditação e o conhecimento de si mesmo - os orientais têm a palavra! Palavra esta que não hesitam em dispensar muito prontamente, visto que sua sabedoria encontra-se muito mais na busca do silenciar-se e do "esvaziar-se". E se entre nós o ditado reza que "um exemplo vale mais que mil palavras", para os orientais certamente o silêncio não fica atrás.

Escrever algo sobre o silêncio e o  saber silenciar, pode a princípio até parecer contraditório. Mas escrever também pode, paradoxalmente, ser uma forma de silenciar. Afinal, para que se possa escrever é preciso que se pare, se pense, se escute, tanto a si mesmo como os demais! É preciso ainda silenciar a mente, o espírito e todo o nosso ser! E é a isso que os orientais chamam de "meditar"! Uma espécie de "silêncio da alma", alma que se cala, se volta e se debruça sobre si mesma! Com muita propriedade, é a isso que eles chamam de "o despertar"! "Despertar da consciência", claro, despertar do espírito"! Curioso é que eles também a isso chamem de "libertação"! Se há ou haverá também uma "salvação"...! Bem, isso já é lá uma outra história! O certo é que "libertar-se, é preciso"! E libertar-se é levar a consciência ao seu grau máximo de "despertar"! Feito isso, em havendo também uma "salvação", com certeza ela estará ainda mais próxima, e não tão longe e distante como nós ocidentais costumamos imaginar! Saber falar é importante? Claro! Como não!? Mas saber calar-se e saber silenciar o espírito, talvez o sejam ainda mais. A presente reflexão não representa senão isso: um convite ao silêncio e ao saber silenciar, dirigido sobretudo àqueles que tendem a falar mais, " falar muito", "falar às vezes até demais". Das palavras colhem-se sem dúvida muitos frutos! Como afirma Lacan, "as palavras possuem um poder mágico"! Do silêncio, muitos e melhores frutos, indubitavelmente! Provavelmente até mais!

A seguir são sugeridas algumas situações em que silenciar e saber ouvir podem ser infinitamente mais eficaz e produtivo que saber falar e ensinar. Em apenas uma delas - "o silêncio dos inocentes" - a denúncia de silêncio coercitivo imposto a mentes indefesas e vulneráveis rompe o silêncio.  Não importa a fase de vida em que você se encontre: a mais importante é e será sempre aquela em que se está. Sempre é tempo oportuno - "KAIRÓS" - para se aprender e ensinar, e só a morte pode por um fim a tudo isso! Ainda assim, a interrogação de Unamuno - "não seria a vida inteira um sonho, e a morte um despertar!?" -  sempre estará no horizonte, como um lembrete e um convite, pairando no ar!

01. Ricos por fora e miseráveis por dentro: falam "grosso" com frequência, silenciam e ouvem pouco! Essa pressuposição não é minha! Eu a tomei por empréstimo de Augusto Cury, em "Revolucione sua Qualidade de Vida". Ela parte da constatação de que muitas pessoas, apesar de se declararem "livres" por fora, sobretudo econômica e financeiramente, se sentem miseráveis afetiva e emocionalmente por dentro. Vou acrescentar "espiritualmente", por minha conta e risco. Com um detalhe: diferentemente das atitudes e ações, os afetos e as emoções  não aceitam feitos heróicos ou "conversões paulinas", isto é, frutos de um só ato ou de uma mudança repentina! A espiritualidade genuína e autêntica tampouco. "Só treinando e educando nossos afetos e nossas emoções seremos capazes de revolucionar nossa qualidade de vida", afirma Augusto Cury. Acrescente aí a qualidade e o nível de espiritualidade. O livro já citado de Francis Seeburger, "Como Educar suas emoções", parte desse mesmo princípio e nele se sustenta. "Sim, tudo bem, mas o que isso tem a ver com empreendimento de sucesso e êxito financeiro", você pergunta! Se não tudo, com certeza muita coisa! Talvez o mais significativo desse "vínculo curioso", vamos chamá-lo assim, curioso e esse estranho, seja o fato de que as pessoas bem sucedidas na vida, notadamente no campo econômico-financeiro, tendem a adquirir uma notória tendência em falar muito, silenciar e ouvir pouco! Se essa correlação não ocorre com você, agradeça mas permaneça atento! Você certamente faz parte de um grupo bem pequeno que constitui a exceção, e não a regra! Com frequência expressões do tipo "você sabe com quem está falando?", ou "não se meta comigo ou vai se arrepender!", ou ainda, "de quanto mesmo estamos falando!?", estão presentes na comunicação e na fala de pessoas desse tipo ou desse "quilate". Sobretudo em um país politicamente pouco comprometido com a "orthós", como é o nosso! Em grego essa palavrinha mágica - "orthós" - significa alinhado, justo, direito, correto e exato! E não é só isso: o tom de voz de pessoas abastadas e endinheiradas costuma ser "mais elevado", digamos assim,  que o dos demais,  a humildade quase sempre sendo substituída pela arrogância, e por aí segue o andar da carruagem. O mesmo se diga em relação ao grau de "ousadia" por um lado e de "ameaça" por outro, característico de tais pessoas, que pensam "poder comprar" Deus e todo mundo! "Fala grossa", como costumamos dizer, de quem costuma ter "bala na agulha", ainda que pouca sabedoria e escasso bom senso na cabeça! No coração...bem, aí as coisas ficam ainda mais complicadas: são os chamados "miseráveis de emoções", dos quais Augusto Cury nos fala. Ao confundir "qualidade de vida" com riqueza, posses e bem materiais, tais pessoas costumam ter grande dificuldade em interagir com quem não faça parte do "grupo"! "Cosa Nostra" é um exemplo desse tipo de grupo! Costumam ter bala tanto na agulha como fora dela! Alguns podem até "sofrer" um pouco com esse "modus vivendi", no sentido de perceberem tanta desigualdade, e tanto sofrimento dela decorrente. Mas como já foi dito, acabam reféns de seu próprio modo de "ser", "ver" e "se posicionar" na sociedade e no mundo. "Comprariam" de bom grado esse tipo de "pérola preciosa", que chamamos de serenidade e paz de espírito, mas quando se dispõem a fazê-lo  acabam descobrindo que certas coisas o dinheiro não compra: ou você "planta" e "colhe" ou terá que invejar sempre, nos outros! Aqui o servo vira senhor, e o senhor "miseravelmente" vira servo.

A riqueza em si não impede a qualidade de vida em seu pleno sentido e integralidade, mas pode sim, dificultá-la. Dificulta por exemplo silenciar vícios que nos perseguem a vida inteira, sem nos dar trégua, tais como o orgulho, a arrogância, a ganância, a luxúria, assim como o instinto de mentir, a impaciência, o desespero, o vazio interior, a falta de sentido verdadeiro da vida, e outros tantos mais. Não admira que muitas pessoas, ao alcançar grandes riquezas, foram de tal forma por elas "possuídos" e sufocados, que acabaram optando por deixar de viver a vida. Quando o jovem rico interpelou o Mestre, no sentido de ajudá-lo a encontrar "o caminho", o Mestre não excomungou suas posses ou o trabalho que o levara a adquirir o que possuía! Mas deixou claro que cada um deveria avaliar bem qual o tipo e "o quanto" de felicidade desejava possuir. Qualquer discurso ou homilia, que sobre a riqueza e os bens materiais se faça, será falso e inadequado se os condenar "absoluta e aprioristicamente",  ou se os inocentar e justificar "apriorística e absolutamente"! Três perguntas precisam ser feitas, quando se desejar saber se ela é um bem ou um mal! Primeiro, qual a sua origem; segundo, como a administra quem a possui; e por fim, quantos e quem dela se beneficiam. Mas sem dúvida é o "apego", a maior tentação que ela traz consigo, e a arrogância um dos grandes males difícil de ser silenciado. Que a riqueza e os ricos costumam reivindicar o direito de "falar mais alto", sobretudo nas repartições públicas e nos tribunais, isso é um fato que seria insensatez pretender negar! Admitido o fato, e descartados os discursos e homilias inadequados, cada um que examine a si mesmo e à sua consciência, e veja se está ou não "falando alto" demais, e se não seria o caso de "silenciar e ouvir" mais, sobretudo em questões envolvendo o próximo, o direito e a justiça!

02. "Um passado que se compartilha "é um sacramento de solidariedade"! Eis aí uma das pérolas, que nos deixou Rubem Alves, ao falar do que ele chama de "tristeza crepuscular"! Mas como se sabe, para que uns possam contar, relatar e revelar seu passado, é preciso que outros estejam disponíveis e dispostos a ouvir e escutar com atenção! Atenção diferenciada!

Na velhice - e somente nela - nos reencontramos com a nossa infância, a infância de cada um de nós.

"A alma dos velhos e das crianças vivem e brincam no mesmo diapasão", é também de Rubem esta afirmação. Mas com conteúdos e experiências bem diferentes! Nos mais velhos são lembranças, memórias e recordações, isto é, "marcas do que se foi, sonhos que se teve, fantasias do "já passado", que lamentavelmente não voltam mais, mas que podem ser recordadas! E "recordar é [re]viver", como sabiamente reza o ditado! Nas crianças, sobram fantasias também, como não! Mas não do que foi e virou passado, do que já se viveu e virou lembranças e recordações, e sim do que se está vivendo, do que há de vir e do que eventualmente será possível de ser experienciado. Assim, para com as crianças compartilhamos estórias, contos, lendas e fábulas, cujo conteúdo é quase sempre o que não é, o que não existe, e não existindo tem o condão de poder existir para sempre! Coisas da imaginação e do "faz-de-conta" que povoam a mente e o coração de quem ainda "não é"mas está se fazendo e se tornando "gente"! Com os mais velhos é diferente: grande parte ou a maior parte da vida já foi vivida, rios e mais rios de experiências "experienciadas"; boas ou ruins, isso agora importa pouco! "O importante é que emoções eu vivi!", como diz a canção! Vida de quem já viveu bastante, e enquanto vive o restante, aproveita para reviver também inesquecíveis memórias e recordações!

Quem fica e vive nesse "meio do caminho", entre a infância e a velhice, ou seja, quem é jovem ou adulto, muitas vezes fica também meio perdido, alguns "perdido e meio", buscando sabedoria, tato e talento para saber lidar com uns e outros, idosos e crianças! Claro que é difícil! Afinal não se é mais criança e tampouco se é ainda idoso! Tempo da "metamorfose", que para muitos não é nada fácil! Lidar bem consigo mesmo nesse período já não é fácil, ter que lidar com quem vive fases de vida tão diferentes, aí já é desafio para gigantes! "Peixe fora d'água", a pessoa se sente! E peixe fora d'água, como se sabe, sente falta de ar, fica sufocado, a toda hora pulando de um lado para o outro, tentando voltar pra água! É razoável e compreensível portanto que jovens e adultos falem mais, reclamem mais, "gritem com Deus e todo mundo", de vez em em quando, ou até percam lá alguma vez a paciência! Faz parte! Melhor não se afligir muito, quando isso acontece! Com crianças e idosos, então, a comunicação costuma ficar parecida com a agulha sobre um disco que teima em não sair do lugar, e  que fica repetindo, repetindo sempre a mesma "lenga lenga", e nada parece funcionar! Essa linguagem é meio antiga, eu sei disso! Nem discos de agulhas existem mais! E quando existem, é raridade! Idosos e crianças é diferente, existem e existirão sempre! Mas tudo bem! O fato é que, sem muito esforço, muita empatia - "empatia" é pouco, diria Jacob Levy Moreno, é preciso "telepatia"! - e sobretudo muito boa vontade, amor e paciência, é difícil que haja, na convivência entre diferentes gerações, qualidade de vida! Menos ainda, "vida em plenitude", como certo Mestre dizia! Dizia, ensinava, praticava e nela insistia!

Ocupar esse espaço intermediário, entre crianças de um lado e idosos do outro, exige um misto de ciência e arte, verdadeira maestria, mas sem dúvida exige muito mais arte do que ciência! Por isso é preciso ter certa reserva com qualquer terapia ou ajuda que se busque! Ajuda é sempre bem vinda, mas não há como se ensinar a "praticar a virtude"! Pode-se até falar do que elas sejam ou devam ser! Mas "disposição e atitude", isso não, não tem como! Não há como ensinar ou ser ensinado, exceto pelo exemplo dado! Nessas duas fases da vida, a infância e a velhice, falar muito, pouco adianta! Com a criança o melhor mesmo é "compartilhar momentos" e acima de tudo "estar disposto a gastar muita energia"! Com o idoso a coisa muda de figura, totalmente: a energia já não é tanta, e os momentos são bem outros, diferentes! Dificilmente precisam de bons conselhos, raramente! Isso eles é que  podem nos ensinar, desde que saibamos solicitá-los com interesse e com afeição sincera! Precisam  mais, isso sim, é de quem os ouça e os escute com atenção generosa e disponibilidade preciosa! Nada de simulacro ou simulação, pois percebem nossas reais intenções em questão de segundos, e nada lhes parece menos digno, para com eles, do que "sentir pena"! Não viveram toda uma vida, boa ou má, fácil ou difícil, para no fim serem tratados como alguém que só merece isso: restos e migalhas! Têm o direito de serem tratados com dignidade e respeito, bem como poder perceber no coração e na alma de quem deles cuida, ouve e escuta, emoções e sentimentos semelhantes aos que eles sentem quando falam e relatam suas memórias e recordações! "Empatia", é esse o nome! Querem se sentir dignos e merecedores disso! E se não o são, contam, como não poderia ser diferente, com nossa compaixão, nossa misericórdia, e se necessário nosso perdão, além, claro, de nossa capacidade de compreensão! Também nós temos alguma coisa a lhes ensinar, quando eles mesmos, por motivos que não cabe a nós julgar, foram descuidados ou incapazes de plantar o que mais tarde gostariam de colher! Diz a Escritura considerada sagrada que aquele que honra seu pai e sua mãe - e por extensão, seus avós e antepassados - torna-se merecedor de que seus muitos erros e faltas lhe sejam perdoados, pois errar todo nós erramos, mas é "a quem muito ama, que muito se perdoa"! Eis por que, no dizer de Rubem Alves, "um passado que se compartilha é um sacramento de solidariedade"! Tanto da parte de quem revela e conta, como da parte de quem ouve e escuta com atenção diferenciada! Na velhice, uma ajuda para a tristeza crepuscular será sempre o conversar! Nisso Ana O tinha mais que razão, ao definir a Psicanálise como "a cura pela fala"! Mas para isso é preciso que haja quem escute e saiba silenciar! E sobretudo quem esteja disposto a aprender algo daquilo que também se há de viver e experienciar um dia: a tristeza crepuscular! Com as crianças, nem é preciso falar! É só alegria! Ou... será que não!? Melhor parar um pouco para pensar!

 

(*) Reflexão enviada de Vitória(ES) por whasapp

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