"DOS
MELHORES, O MELHOR: PENSAMENTOS E REFLEXÕES PARA TEMPOS DE GUERRA E PAZ"
Lindolivo Soares Moura(*)
"O lobo e o cordeiro pastarão
juntos, e o leão comerá
palha com o boi; pó será a
comida da serpente.
Não se fará mal ou dano algum em todo o meu santo monte, diz o Senhor”
(Isaías, 26,25).
Dizia Kant - Immanuel Kant - que a
única coisa absolutamente boa é a boa intenção. Ainda assim a pretensão bem
intencionada e voluntariosa de se acabar de uma vez por todas com todas as
guerras talvez seja a mais inútil e supérflua de todas as pretensões.
"Vanitas vanitatum, et omnia vanitas", já ensinava Coélet no chamado
Livro do Eclesiastes. O próprio Jesus já deixara bem claro a esse respeito:
"pobres e escândalos, sempre tereis no meio de vós". E haverá
escândalo e miséria maiores do que uma guerra? Sabe-se que, afora o original,
puramente mítico e fictício mas nem por isso mais, ou menos inspirado, o
primeiro grande pecado humano teria sido fruto da sede e da volúpia de sangue;
e o que é pior: por motivo absolutamente fútil, banal. Hannah Arendt diria:
banalidade explícita do mal. Vegetariano, Deus teria aceitado a oferta de Abel
- frutos do campo e das colheitas - e rejeitado as de Caim - criador de ovelhas, bois e animais do
gênero. Ao invés de se irar contra Deus e instá-lo a uma explicação por minima
que fosse - o que seria perfeitamente justo e razoável - Caim resolve
descarregar todo seu fel e seu ódio sobre Abel, que nada tinha na verdade a ver
com o pato. Que culpa tinha o pobre coitado se o Criador possuía lá suas
preferências? Para poder se aquilatar bem o quantitativo do absurdo que envolve
o infortúnio, vale lembrar que não se tratava de um homicídio qualquer ocorrido
entre dois desconhecidos ou dois inimigos declarados, e sim entre dois irmãos;
de sangue, alma e coração. "Se um adversário me insultasse eu poderia
compreender - exclama o salmista surpreso e lamuriento - se um inimigo tramasse
contra mim eu poderia defender-me. Mas és tu um companheiro, um amigo íntimo,
com quem mantinha afável companhia na casa de meu Deus!". Inimigos a gente
teme, às vezes até odeia, mas irmão a gente ama, quer bem; não é alguém, supõe
-se, de quem se precise defender.
Claro que há exceções: existem aqueles
que amam e idolatram seus inimigos enquanto odeiam e espezinham impiedosamente
seus irmãos, vá-se lá Deus saber por qual razão. Russos e ucranianos, por
razões e interesses reconhecidamente divergentes, na pior das hipóteses podem
até se considerar e se tratar como inimigos declarados, mas entre judeus,
cristãos e islamitas - estes últimos também chamados de mulçumanos - há uma
série de razões para que não seja assim. Dentre elas o fato de que todos eles
acreditam num mesmo e único Deus, apenas invocado com nomes diferentes - Javé
para os judeus, Pai filho e Espírito Santo para os cristãos, e Alá para os
islamitas - além de possuírem um único e mesmo
patriarca origem de suas respectivas linhagens, apenas identificado por
nomes diferentes - Abraão para judeus e cristãos, Ibrahim para os islamitas. A
única diferença histórica e significativa entre eles - todas as demais deixam
entrever motivos ideológicos e de interesses escusos - é que Pai Abraão - uma espécie de "paim
ou painho" - teria dormido com sua escrava, Hagar, da qual acabou vindo à
luz Ismael - Ismail para os islamitas - tendo esse filho espúreo e de segunda
categoria - tipo os "dalits" ou "intocáveis" para os indianos
- dado à luz árabes e mulçumanos. Da União do mesmo Pai Abraão com Sara, sua
esposa legítima e agradável aos olhos de Deus, nasceria Isaque, e de Isaque
todo o povo judeu - também legítimo e
agradável aos olhos de Deus e por essa razão autoproclamado "povo
eleito". Os cristãos, como se sabe, são os judeus que aceitaram certo
Jesus como messias, tendo por isso mesmo sido tratados por longo tempo como uma "seita herética" pelos
judeus que recusaram o mesmo messias e continuam ainda até hoje esperando pelo
seu messias próprio; os cristãos, como é sabido, esperam pela sua volta ou,
como se preferir, segunda vinda.
Sem absolutamente pretender ofender
quem quer que seja, tudo leva a crer que o motivo mencionado anteriormente seja
a razão maior - quiçá um tanto inconsciente e destituída portanto de má
intenção - para que judeus e cristãos continuem ainda hoje se olhando e se
tratando uns aos outros com um olhar vesgo e
enviezado - ainda que respeitoso -
enquanto para com seus "irmãos" espúreos e renegados - árabes
e mulçumanos - se põem em conluio e de comum acordo em não querer vê-los
preferencialmente nem pintados. Mais justo seria dizer "meio-irmãos",
já que nascidos de um único e mesmo pai, porém não de uma única e mesma mãe.
Mas disso, convenhamos, assim como Abel nada teve absolutamente a ver com a
opção de Deus pelos seus legumes e hortaliças, e não ter dado a mínima pelas
ovelhas e bois de seu irmão Caim, seria no mínimo injusto para não dizer
suspeitoso considerar que árabes e mulçumanos devam ser responsabilizados por
sua origem espúrea e supostamente desaprovada pelo Criador. Sempre considerei
um tanto estranha, para não dizer incompreensivelmente injusta, essa coisa de
que Deus continua castigando seus filhos até a segunda, terceira ou quarta
geração. Será que uma geração só já não seria suficiente? Seria a ira de Deus
ainda mais terrível e cruel que a dos homens? Toda uma descendência, e por todo
o sempre, então, parece uma atitude absurdamente inconcebível. Ademais, se o
Pai Abraão pulou a cerca - ou quando não, o cercado - ele que pague o pato. E
as que consequentemente, por uma questão de lógica e de justiça, com as devidas
consequências.
Se você pensa que estou brincando com
coisa séria, está redondamente certo. A verdade franca e sincera é que
literalmente não consigo falar de coisas do tipo sem incorporar certa dose de
humor, riso e em certos casos até de comicidade. Os gregos talvez preferissem
"tragicidade". Agora, se você concluiu que em assim fazendo, minha
intenção é zombar ou escarnecer da fé ou da crença de quem quer que seja, aí
sim, você está redondamente enganado. Parafraseando Rubem Alves, quando escrevo
ou transcrevo tiradas e aforismos "político -teológicos" minha
intenção não é fazer rir, e sim pensar. Ainda assim, se o riso ou mesmo a
gargalhada se insinuam nas entrelinhas do meu discurso, conservando porém o
condão de fazer pensar e refletir, que assim seja! Dizia OSHO que o verdadeiro
sábio é, na maior parte do tempo, uma pessoa alegre e sorridente, e não um
homem sério e sisudo como se pensa. Da pretensão de me apresentar e ser tratado
como sábio, dispenso; do direito de ser alegre, festivo e celebrativo, não.
A seguir apresento pensamentos
diversos que não são meus, são de outros e outras - exceção feita a um único
parágrafo - alguns dos quais de autoria desconhecida. Não nutro nenhuma
pretensão de sugerir e menos ainda orientar tendência alguma no sentido de uma
melhor interpretação dos tempos difíceis que estamos vivendo. Pensar e
refletir, sim, pois foi exatamente a isso que também a mim eles instigaram. Se é certo que guerras, fome
e escândalos sempre os teremos no meio de nós, não é menos verdade que todo
esforço precisa ser envidado para erradicá-los. Ideais e utopias não se definem
apenas como algo irrealizável, mas também como algo inesgotável. "Quando
se diz basta - afirma Santo Agostinho - aí tem início o fracasso".
ALBERT
EINSTEIN - [I]
"Carta
a Sigmund Freud:
Muy caro Sr. Freud: sempre admirei sua
paixão para descobrir a verdade. Ela o arrebata acima de tudo. O senhor explica
com irresistível clareza o quanto na alma humana os instintos de luta,
aniquilamento e guerra estão
estreitamente relacionados com os instintos de amor, afirmação pela vida e
anseios de paz. Ao mesmo tempo, suas exposições rigorosas revelam o desejo
profundo e nobre do ideal do homem que quer libertar-se completamente da
guerra. Por esta profunda paixão se reconhecem todos aqueles que, superando seu
tempo e sua nação, foram julgados mestres, espirituais ou morais. Descobrimos o
mesmo ideal em Jesus Cristo, em Goethe ou em Kant! Não é bastante significativo
ver que estes homens foram reconhecidos universalmente como mestres apesar de
terem fracassado em sua vontade e em sua determinação de estruturar as relações
humanas? Estou persuadido de que os homens excepcionais que ocupam a posição de
mestres graças a seu trabalho, mesmo em círculo bem restrito, participam deste
mesmo nobre ideal. Não têm grande influência sobre o mundo político. Em
compensação, a sorte das nações depende inevitavelmente, ao que parece, de
homens políticos sem nenhum escrúpulo e sem qualquer senso de responsabilidade.
Submeto-lhe estas ideias, ao senhor mais do que a qualquer outro, porque o
senhor é menos vulnerável do que qualquer um às quimeras, e seu espírito
crítico se baseia em um sentimento muito profundo da responsabilidade"
MELANIE
MIEHL
"O que Abraão tem a ver com o
Islã? Muita coisa! É verdade que no Alcorão ele é chamado de 'Ibrahim', mas se
trata do mesmo personagem ao qual se refere a Bíblia. O Alcorão narra a
história da busca de Deus por Abraão da seguinte maneira: Abraão dá-se conta de
que seu pai Azar adorava ídolos. Ele não consegue compartilhar dessa fé, e Deus
lhe revela o seu senhorio sobre o céu e a terra. Naquela noite, Abraão avista
uma estrela e lhe presta 'adoração'. Mas a estrela não permanece no céu, e
Abraão reconhece que se enganou. Então ele se volta para a lua, mas também a
lua se põe. Ao romper a aurora ele declara o sol como seu 'senhor'. Porém, ao
anoitecer, ele é obrigado a admitir que também esse desaparece. Então ele
reconhece que o único ser digno de adoração é aquele que está acima de todas as
coisas criadas: 'voltei meu rosto para Aquele que criou os céus e a terra'!
Essa fé o torna, nas palavras do Alcorão, um Hanifa. O Alcorão também deixa
transparecer que a nova fé de Abraão não teve aceitação entre seus conterrâneos.
Ele lhes responde: 'argumentais comigo acerca de Deus que me iluminou?'. O Islã
atribui a Abraão e a seu filho Ismael a construção da Caaba como o templo mais
antigo da história da humanidade. Algumas tradições chegam a considerar Adão o
construtor e encaram Abraão como o restaurador da construção. O Alcorão não
chega a revelar se Abraão estava disposto a sacrificar também Ismael ou apenas
Isaque, como consta no relato bíblico, mas muitos islamitas tendem a crer que o
mais provável é que tenha sido Ismael. Abraão é um modelo de fé, oração, boas
obras e da peregrinação a Meca, observando portanto os elementos básicos do
Islã. A figura de Abraão naturalmente também representa para o Islã um ponto de
conexão importante para o diálogo com judeus e cristãos. Os islamitas sentem-se
ligados a ele porque é o patriarca que deu origem aos árabes. Sua mulher Sara
gerou Isaque. Da relação com sua serva Hagar nasceu Ismael [Ismail]. Isaque, é
o ancestral de toda uma série de profetas, que vai até Jesus. De Ismael
descende um único profeta, que no entanto, ocupa uma posição especialmente
destacada: Maomé [Muhammad]. Em especial, três eventos são associados ao nome
de Abraão: a adoração do Deus único, chamado Alá[Allah], a construção da Caaba
em Meca, e a disposição de Abraão para sacrificar um de seus filhos"
LOU
MARINOFF
"Pessoas obstinadas e fanáticas
só aumentam o sofrimento - de si mesmas e dos demais - por não conseguirem
perceber a humanidade que há nos outros e por cometer o triste erro de supor
que raça, sexo, orientação afetiva e sexual e etnia tornam algumas pessoas
'mais' humanas e outras 'menos'. Reconhecer a humanidade do outro é respeitar
sua liberdade e sua independência de pensamento e opinião. Do mesmo modo, os
fanáticos religiosos só aumentam o sofrimento, por deixarem de perceber a
humanidade daqueles que cultuam deuses diferentes de maneira diferente; e por
cometer o erro igualmente flagrante de supor que há 'infiéis' no mundo, os
quais se deve converter ou destruir. Um grande teste para qualquer pessoa ou
'nação religiosa' é se essa pessoa ou nação precisa de um inimigo, alguém ou
algum grupo para servir de bode expiatório ou de imagem do demônio. Se precisa,
não passou no teste, e só aumenta o sofrimento humano. Quem precisa de
inimigos, infiéis ou demônios para dar significado e objetivo à sua existência
cria para si mesmo e para os demais um estado de espírito infernal. Para eles,
e para todos, seria melhor que mudassem seu estado de espírito; pior para si
mesmos e para o resto do mundo caso repassem
esse inferno para os demais"
RUBEM
ALVES
"Todo mundo quer a paz. Mas, como
muito bem observou santo Agostinho, cada um deseja a paz que lhe seja
conveniente. A paz das galinhas é um mundo sem gambás. A paz dos gambás é um
galinheiro cheio de galinhas. O presidente Bush quer a paz, e para que a sua
paz seja alcançada, é preciso que o Irã seja destruído. O Irã deseja a paz, e
para que a sua paz seja alcançada, é preciso que os Estados Unidos sejam
destruídos. Os Israelenses querem a paz, e para que sua paz seja completa, os
Palestinos precisam ser destruídos. Os Palestinos também desejam a paz, e para
que possam alcançá-la o Estado Israelense precisa ser destruído. Não é
horrendamente imoral que o Estado tenha o direito de matar? Matam, na guerra, milhões.
Não são caçados como terroristas. São tidos como heróis. Como são bonitas as
fardas dos generais! A diferença entre os morticínios de Estado e os
morticínios dos terroristas está em que os primeiros são feitos em nome do
Estado e os segundos são feitos em nome de uma crença política ou religiosa. Os
morticínios são feitos por loucos. Mas a loucura do Estado é legítima. 'A
loucura é rara em indivíduos -- mas em grupos, partidos, nações e eras é a
regra'[Nietzsche]. Para atestar a profunda religiosidade do seu povo um guia
disse-me que a santa mãe de Deus, Maria Santíssima, tem a patente de 'generala'
do exército de seu país, o Chile. Para não ficar atrás, em 1967 o papa Paulo
VI, a pedidos, outorgou à Mãe do Filho de Deus o título de 'generalíssima do exército
brasileiro' [título renovado em 11/10/2023 pela Câmara dos Deputados -
acréscimo nosso]. Fiquei pasmo! Não encontro nos textos sagrados nenhuma
autorização para transformar a mãe de Cristo em patente militar. Há de se
perguntar, em primeiro lugar, quem foi que a agraciou com esse título? A
seguir, há de se perguntar se ela o aceitou. Se sim, duvido da santidade da
Virgem. Porque, pelo que conheço, a mãe de Jesus era uma mansa e pacífica
mulher. Não posso imaginá-la fardada, cavalgando um cavalo negro, com espada
desembainhada. Ou a virgem não é a mansa mulher que sempre imaginei ou esse
título é espúrio. Acho que vou denunciar a heresia ao papa para que ele trate
de excomungar os detratores da Mãe de Deus"
(CONTINUARÁ
NA PRÓXIMA SEMANA 29/10/2023)....
(*)
Enviado por whatsapp de Vitória(ES).
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