sexta-feira, 20 de outubro de 2023

"DOS MELHORES, O MELHOR: PENSAMENTOS E REFLEXÕES PARA TEMPOS DE GUERRA E PAZ"

 

"DOS MELHORES, O MELHOR: PENSAMENTOS E REFLEXÕES PARA TEMPOS DE GUERRA E PAZ"

Lindolivo Soares Moura(*)

          "O lobo e o cordeiro  pastarão  juntos,  e  o leão comerá  palha com o boi;    será  a comida  da  serpente.  Não se fará mal ou dano algum em todo o meu santo monte, diz o Senhor” (Isaías, 26,25).

Dizia Kant - Immanuel Kant - que a única coisa absolutamente boa é a boa intenção. Ainda assim a pretensão bem intencionada e voluntariosa de se acabar de uma vez por todas com todas as guerras talvez seja a mais inútil e supérflua de todas as pretensões. "Vanitas vanitatum, et omnia vanitas", já ensinava Coélet no chamado Livro do Eclesiastes. O próprio Jesus já deixara bem claro a esse respeito: "pobres e escândalos, sempre tereis no meio de vós". E haverá escândalo e miséria maiores do que uma guerra? Sabe-se que, afora o original, puramente mítico e fictício mas nem por isso mais, ou menos inspirado, o primeiro grande pecado humano teria sido fruto da sede e da volúpia de sangue; e o que é pior: por motivo absolutamente fútil, banal. Hannah Arendt diria: banalidade explícita do mal. Vegetariano, Deus teria aceitado a oferta de Abel - frutos do campo e das colheitas - e rejeitado as de  Caim - criador de ovelhas, bois e animais do gênero. Ao invés de se irar contra Deus e instá-lo a uma explicação por minima que fosse - o que seria perfeitamente justo e razoável - Caim resolve descarregar todo seu fel e seu ódio sobre Abel, que nada tinha na verdade a ver com o pato. Que culpa tinha o pobre coitado se o Criador possuía lá suas preferências? Para poder se aquilatar bem o quantitativo do absurdo que envolve o infortúnio, vale lembrar que não se tratava de um homicídio qualquer ocorrido entre dois desconhecidos ou dois inimigos declarados, e sim entre dois irmãos; de sangue, alma e coração. "Se um adversário me insultasse eu poderia compreender - exclama o salmista surpreso e lamuriento - se um inimigo tramasse contra mim eu poderia defender-me. Mas és tu um companheiro, um amigo íntimo, com quem mantinha afável companhia na casa de meu Deus!". Inimigos a gente teme, às vezes até odeia, mas irmão a gente ama, quer bem; não é alguém, supõe -se, de quem se precise defender.

Claro que há exceções: existem aqueles que amam e idolatram seus inimigos enquanto odeiam e espezinham impiedosamente seus irmãos, vá-se lá Deus saber por qual razão. Russos e ucranianos, por razões e interesses reconhecidamente divergentes, na pior das hipóteses podem até se considerar e se tratar como inimigos declarados, mas entre judeus, cristãos e islamitas - estes últimos também chamados de mulçumanos - há uma série de razões para que não seja assim. Dentre elas o fato de que todos eles acreditam num mesmo e único Deus, apenas invocado com nomes diferentes - Javé para os judeus, Pai filho e Espírito Santo para os cristãos, e Alá para os islamitas - além de possuírem um único e mesmo  patriarca origem de suas respectivas linhagens, apenas identificado por nomes diferentes - Abraão para judeus e cristãos, Ibrahim para os islamitas. A única diferença histórica e significativa entre eles - todas as demais deixam entrever motivos ideológicos e de interesses escusos -  é que Pai Abraão - uma espécie de "paim ou painho" - teria dormido com sua escrava, Hagar, da qual acabou vindo à luz Ismael - Ismail para os islamitas - tendo esse filho espúreo e de segunda categoria - tipo os "dalits" ou "intocáveis" para os indianos - dado à luz árabes e mulçumanos. Da União do mesmo Pai Abraão com Sara, sua esposa legítima e agradável aos olhos de Deus, nasceria Isaque, e de Isaque todo o povo judeu -  também legítimo e agradável aos olhos de Deus e por essa razão autoproclamado "povo eleito". Os cristãos, como se sabe, são os judeus que aceitaram certo Jesus como messias, tendo por isso mesmo sido tratados  por longo tempo  como uma "seita herética" pelos judeus que recusaram o mesmo messias e continuam ainda até hoje esperando pelo seu messias próprio; os cristãos, como é sabido, esperam pela sua volta ou, como se preferir, segunda vinda.

Sem absolutamente pretender ofender quem quer que seja, tudo leva a crer que o motivo mencionado anteriormente seja a razão maior - quiçá um tanto inconsciente e destituída portanto de má intenção - para que judeus e cristãos continuem ainda hoje se olhando e se tratando uns aos outros com um olhar vesgo e  enviezado - ainda que respeitoso -  enquanto para com seus "irmãos" espúreos e renegados - árabes e mulçumanos - se põem em conluio e de comum acordo em não querer vê-los preferencialmente nem pintados. Mais justo seria dizer "meio-irmãos", já que nascidos de um único e mesmo pai, porém não de uma única e mesma mãe. Mas disso, convenhamos, assim como Abel nada teve absolutamente a ver com a opção de Deus pelos seus legumes e hortaliças, e não ter dado a mínima pelas ovelhas e bois de seu irmão Caim, seria no mínimo injusto para não dizer suspeitoso considerar que árabes e mulçumanos devam ser responsabilizados por sua origem espúrea e supostamente desaprovada pelo Criador. Sempre considerei um tanto estranha, para não dizer incompreensivelmente injusta, essa coisa de que Deus continua castigando seus filhos até a segunda, terceira ou quarta geração. Será que uma geração só já não seria suficiente? Seria a ira de Deus ainda mais terrível e cruel que a dos homens? Toda uma descendência, e por todo o sempre, então, parece uma atitude absurdamente inconcebível. Ademais, se o Pai Abraão pulou a cerca - ou quando não, o cercado - ele que pague o pato. E as que consequentemente, por uma questão de lógica e de justiça, com as devidas consequências.

Se você pensa que estou brincando com coisa séria, está redondamente certo. A verdade franca e sincera é que literalmente não consigo falar de coisas do tipo sem incorporar certa dose de humor, riso e em certos casos até de comicidade. Os gregos talvez preferissem "tragicidade". Agora, se você concluiu que em assim fazendo, minha intenção é zombar ou escarnecer da fé ou da crença de quem quer que seja, aí sim, você está redondamente enganado. Parafraseando Rubem Alves, quando escrevo ou transcrevo tiradas e aforismos "político -teológicos" minha intenção não é fazer rir, e sim pensar. Ainda assim, se o riso ou mesmo a gargalhada se insinuam nas entrelinhas do meu discurso, conservando porém o condão de fazer pensar e refletir, que assim seja! Dizia OSHO que o verdadeiro sábio é, na maior parte do tempo, uma pessoa alegre e sorridente, e não um homem sério e sisudo como se pensa. Da pretensão de me apresentar e ser tratado como sábio, dispenso; do direito de ser alegre, festivo e celebrativo, não.

A seguir apresento pensamentos diversos que não são meus, são de outros e outras - exceção feita a um único parágrafo - alguns dos quais de autoria desconhecida. Não nutro nenhuma pretensão de sugerir e menos ainda orientar tendência alguma no sentido de uma melhor interpretação dos tempos difíceis que estamos vivendo. Pensar e refletir, sim, pois foi exatamente a isso que também a mim  eles instigaram. Se é certo que guerras, fome e escândalos sempre os teremos no meio de nós, não é menos verdade que todo esforço precisa ser envidado para erradicá-los. Ideais e utopias não se definem apenas como algo irrealizável, mas também como algo inesgotável. "Quando se diz basta - afirma Santo Agostinho - aí tem início o fracasso".

ALBERT EINSTEIN - [I]

"Carta a Sigmund Freud:

Muy caro Sr. Freud: sempre admirei sua paixão para descobrir a verdade. Ela o arrebata acima de tudo. O senhor explica com irresistível clareza o quanto na alma humana os instintos de luta, aniquilamento e  guerra estão estreitamente relacionados com os instintos de amor, afirmação pela vida e anseios de paz. Ao mesmo tempo, suas exposições rigorosas revelam o desejo profundo e nobre do ideal do homem que quer libertar-se completamente da guerra. Por esta profunda paixão se reconhecem todos aqueles que, superando seu tempo e sua nação, foram julgados mestres, espirituais ou morais. Descobrimos o mesmo ideal em Jesus Cristo, em Goethe ou em Kant! Não é bastante significativo ver que estes homens foram reconhecidos universalmente como mestres apesar de terem fracassado em sua vontade e em sua determinação de estruturar as relações humanas? Estou persuadido de que os homens excepcionais que ocupam a posição de mestres graças a seu trabalho, mesmo em círculo bem restrito, participam deste mesmo nobre ideal. Não têm grande influência sobre o mundo político. Em compensação, a sorte das nações depende inevitavelmente, ao que parece, de homens políticos sem nenhum escrúpulo e sem qualquer senso de responsabilidade. Submeto-lhe estas ideias, ao senhor mais do que a qualquer outro, porque o senhor é menos vulnerável do que qualquer um às quimeras, e seu espírito crítico se baseia em um sentimento muito profundo da  responsabilidade"

MELANIE MIEHL

"O que Abraão tem a ver com o Islã? Muita coisa! É verdade que no Alcorão ele é chamado de 'Ibrahim', mas se trata do mesmo personagem ao qual se refere a Bíblia. O Alcorão narra a história da busca de Deus por Abraão da seguinte maneira: Abraão dá-se conta de que seu pai Azar adorava ídolos. Ele não consegue compartilhar dessa fé, e Deus lhe revela o seu senhorio sobre o céu e a terra. Naquela noite, Abraão avista uma estrela e lhe presta 'adoração'. Mas a estrela não permanece no céu, e Abraão reconhece que se enganou. Então ele se volta para a lua, mas também a lua se põe. Ao romper a aurora ele declara o sol como seu 'senhor'. Porém, ao anoitecer, ele é obrigado a admitir que também esse desaparece. Então ele reconhece que o único ser digno de adoração é aquele que está acima de todas as coisas criadas: 'voltei meu rosto para Aquele que criou os céus e a terra'! Essa fé o torna, nas palavras do Alcorão, um Hanifa. O Alcorão também deixa transparecer que a nova fé de Abraão não teve aceitação entre seus conterrâneos. Ele lhes responde: 'argumentais comigo acerca de Deus que me iluminou?'. O Islã atribui a Abraão e a seu filho Ismael a construção da Caaba como o templo mais antigo da história da humanidade. Algumas tradições chegam a considerar Adão o construtor e encaram Abraão como o restaurador da construção. O Alcorão não chega a revelar se Abraão estava disposto a sacrificar também Ismael ou apenas Isaque, como consta no relato bíblico, mas muitos islamitas tendem a crer que o mais provável é que tenha sido Ismael. Abraão é um modelo de fé, oração, boas obras e da peregrinação a Meca, observando portanto os elementos básicos do Islã. A figura de Abraão naturalmente também representa para o Islã um ponto de conexão importante para o diálogo com judeus e cristãos. Os islamitas sentem-se ligados a ele porque é o patriarca que deu origem aos árabes. Sua mulher Sara gerou Isaque. Da relação com sua serva Hagar nasceu Ismael [Ismail]. Isaque, é o ancestral de toda uma série de profetas, que vai até Jesus. De Ismael descende um único profeta, que no entanto, ocupa uma posição especialmente destacada: Maomé [Muhammad]. Em especial, três eventos são associados ao nome de Abraão: a adoração do Deus único, chamado Alá[Allah], a construção da Caaba em Meca, e a disposição de Abraão para sacrificar um de seus filhos"

LOU MARINOFF

"Pessoas obstinadas e fanáticas só aumentam o sofrimento - de si mesmas e dos demais - por não conseguirem perceber a humanidade que há nos outros e por cometer o triste erro de supor que raça, sexo, orientação afetiva e sexual e etnia tornam algumas pessoas 'mais' humanas e outras 'menos'. Reconhecer a humanidade do outro é respeitar sua liberdade e sua independência de pensamento e opinião. Do mesmo modo, os fanáticos religiosos só aumentam o sofrimento, por deixarem de perceber a humanidade daqueles que cultuam deuses diferentes de maneira diferente; e por cometer o erro igualmente flagrante de supor que há 'infiéis' no mundo, os quais se deve converter ou destruir. Um grande teste para qualquer pessoa ou 'nação religiosa' é se essa pessoa ou nação precisa de um inimigo, alguém ou algum grupo para servir de bode expiatório ou de imagem do demônio. Se precisa, não passou no teste, e só aumenta o sofrimento humano. Quem precisa de inimigos, infiéis ou demônios para dar significado e objetivo à sua existência cria para si mesmo e para os demais um estado de espírito infernal. Para eles, e para todos, seria melhor que mudassem seu estado de espírito; pior para si mesmos e para o resto do  mundo caso repassem esse inferno para os demais"

RUBEM ALVES

"Todo mundo quer a paz. Mas, como muito bem observou santo Agostinho, cada um deseja a paz que lhe seja conveniente. A paz das galinhas é um mundo sem gambás. A paz dos gambás é um galinheiro cheio de galinhas. O presidente Bush quer a paz, e para que a sua paz seja alcançada, é preciso que o Irã seja destruído. O Irã deseja a paz, e para que a sua paz seja alcançada, é preciso que os Estados Unidos sejam destruídos. Os Israelenses querem a paz, e para que sua paz seja completa, os Palestinos precisam ser destruídos. Os Palestinos também desejam a paz, e para que possam alcançá-la o Estado Israelense precisa ser destruído. Não é horrendamente imoral que o Estado tenha o direito de matar? Matam, na guerra, milhões. Não são caçados como terroristas. São tidos como heróis. Como são bonitas as fardas dos generais! A diferença entre os morticínios de Estado e os morticínios dos terroristas está em que os primeiros são feitos em nome do Estado e os segundos são feitos em nome de uma crença política ou religiosa. Os morticínios são feitos por loucos. Mas a loucura do Estado é legítima. 'A loucura é rara em indivíduos -- mas em grupos, partidos, nações e eras é a regra'[Nietzsche]. Para atestar a profunda religiosidade do seu povo um guia disse-me que a santa mãe de Deus, Maria Santíssima, tem a patente de 'generala' do exército de seu país, o Chile. Para não ficar atrás, em 1967 o papa Paulo VI, a pedidos, outorgou à Mãe do Filho de Deus o título de 'generalíssima do exército brasileiro' [título renovado em 11/10/2023 pela Câmara dos Deputados - acréscimo nosso]. Fiquei pasmo! Não encontro nos textos sagrados nenhuma autorização para transformar a mãe de Cristo em patente militar. Há de se perguntar, em primeiro lugar, quem foi que a agraciou com esse título? A seguir, há de se perguntar se ela o aceitou. Se sim, duvido da santidade da Virgem. Porque, pelo que conheço, a mãe de Jesus era uma mansa e pacífica mulher. Não posso imaginá-la fardada, cavalgando um cavalo negro, com espada desembainhada. Ou a virgem não é a mansa mulher que sempre imaginei ou esse título é espúrio. Acho que vou denunciar a heresia ao papa para que ele trate de excomungar os detratores da Mãe de Deus"

(CONTINUARÁ NA PRÓXIMA SEMANA 29/10/2023)....

(*) Enviado por whatsapp de Vitória(ES).

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