V-Liturgia da Solenidade de Nosso
Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, Ano B
Dn 7,13-14; Sl 94;
Ap 1,5-8; Jo 18, 33b-37.
“O Cordeiro que foi imolado é
digno de receber o poder, a divindade, a sabedoria, a força e a honra. A Ele a
glória e poder através dos séculos” (Ap 5,12; 1,6). Estas palavras são da
Antífona de Entrada da Solenidade de hoje e dão o sentido profundo desta
celebração de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo.
Uma pergunta que pode vir –
deveria vir! – ao nosso coração é esta: Jesus é Rei? Como pode ser Rei, num
mundo paganizado, num mundo pós-cristão, num mundo que esqueceu Deus, num mundo
que ridiculariza a Igreja por pregar o Evangelho e suas exigências? Pelo menos,
de Deus e Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo o mundo não quer saber… Como, então,
Jesus pode ser Rei de um mundo que não aceita ser o seu reinado? E, no entanto,
hoje, no último domingo deste ano litúrgico de 2024, ao final de um ciclo de
tempo, voltamo-nos para o Cristo, e o proclamamos Rei: Rei de nossas vidas, Rei
da história, Rei do cosmo, Rei do universo. A Igreja canta, neste dia, na sua
oração: “Cristo Rei, sois dos séculos Príncipe,/ Soberano e Senhor das nações!/
Ó Juiz, só a Vós é devido/ julgar mentes, julgar corações”. O texto do
Apocalipse citado no início desta meditação dá o sentido da realeza de Jesus:
Ele é o Cordeiro que foi imolado. É Rei não porque é prepotente, não porque
manda em tudo, até suprimir nossa liberdade e nossa consciência. É Rei porque
nos ama, Rei porque se fez um de nós, Rei porque por nós sofreu, morreu e
ressuscitou, Rei porque nos dá a vida. Ele é aquele Filho do Homem da primeira
leitura: “Foram-lhe dados poder, glória e realeza, e todos os povos, nações e
línguas o serviam: seu poder é um poder eterno que não lhe será tirado, e seu
reino, um reino que não se dissolverá”. Com efeito, o reinado de Cristo não tem
as características dos reinados do mundo:
(1) Ele é Rei não porque se distancia
de nós, mas, precisamente porque se fez “Filho do homem”, solidário conosco em
tudo. Ele experimentou nossas pobrezas e limitações; Ele caminhou pelas nossas
estradas, derramou o nosso suor, angustiou-se com nossas angústias e
experimentou tantos dos nossos medos. Ele morreu como nós, de morte humana, tão
igual à nossa. Ele reina pela solidariedade.
(2) Ele é Rei porque nos serviu:
“O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em
resgate por muitos” (Mc 10,45). Serviu com toda a sua existência, serviu dando
sempre e em tudo a vida por nós, por amor de nós. Ele reina pelo amor.
(3) Ele é Rei porque tudo foi
criado pelo Pai “através dele e para ele” (Cl 1,15); tudo caminha para Ele e,
nele, tudo aparecerá na sua verdade: “Quem é da verdade, ouve a minha voz”. É
nele que o mundo será julgado. A televisão, os modismos, os sabichões de
plantão podem dizer o que quiserem, ensinar a verdade que lhes for conveniente…
mas, ao final, somente o que passar pelo teste de Cruz do Senhor resistirá. O
resto, é resto: não passa de palha. Ele reina pela verdade.
(4) Ele é Rei porque é o único
que pode garantir nossa vida; pode fazer-nos felizes agora e pode nos dar a
vitória sobre a morte por toda a eternidade: “Jesus Cristo é a testemunha fiel e
verdadeira, o primeiro a ressuscitar dentre os mortos, o soberano dos reis da
terra”. Ele reina pela vida.
Sim, Jesus é Rei: “Eu sou Rei!
Para isto nasci, para isto vim ao mundo!” Mas seu Reino nada tem a ver com o
triunfalismo dos reinos humanos – de direita ou de esquerda! Nunca nos
esqueçamos que aquele que entrou em Jerusalém como Rei, veio num burrico,
símbolo de mansidão e serviço. Como coroa teve os espinhos; como cetro, uma
cana; como manto, um farrapo escarlate; como trono, a Cruz. Se quisermos compreender
a realeza de Cristo, é necessário não esquecer isso! A marca e o critério da
realeza de Cristo é e será sempre, a Cruz!
Hoje, assistimos, impressionados,
a paganização do mundo, e perguntamos: onde está a realeza do Cristo? – Onde
sempre esteve: na Cruz: “O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse
deste mundo, os meus guardas lutariam para que eu não fosse entregue aos
judeus. Mas o meu reino não é daqui”. O Reino de Jesus não é segundo o modelo
deste mundo, não se impõe por guardas, pela força, pelas armas: meu Reino não é
daqui! É um Reino que vem do mundo do amor e da misericórdia de Deus, não das
loucuras megalomaníacas dos seres humanos. E, no entanto, o Reino está no
mundo: “Cumpriu-se o tempo; o Reino de Deus está próximo” (Mc 1,15); “Se é pelo
dedo de Deus que eu expulso os demônios, então o Reino de Deus já chegou para
vós” (Lc 11,20). O Reino que Jesus trouxe deve expandir-se no mundo! Onde ele
está? Onde estiverem o amor, a verdade, a piedade, a justiça, a solidariedade,
a paz. O Reino do Cristo deve penetrar todos os âmbitos de nossa existência: a
economia, as relações comerciais, os mercados financeiros, as relações entre
pessoas e povos, nossa vida afetiva, nossa moral pessoal e comunitária.
Celebrar Jesus Cristo Rei do
Universo é proclamar diante do mundo que somente Cristo é o sentido último de
tudo e de todos, que somente Cristo é definitivo e absoluto. Proclamá-lo Rei é
dizer que não nos submetemos a nada nem a ninguém, a não ser ao Cristo; é
afirmar que tudo o mais é relativo e menos importante quando confrontado com o
único necessário, que é o Reino que Jesus veio trazer. Num mundo que deseja
esvaziar o Evangelho, tornando Jesus alguém inofensivo e insípido, um deus de
barro, vazio e sem utilidade, proclamar Jesus como Rei é rejeitar o projeto
pagão do mundo atual e proclamar: “O Cordeiro que foi imolado é digno de
receber o poder, a divindade, a sabedoria, a força e a honra. A ele a glória e
poder através dos séculos”. Amém (Ap 5,12; 1,6).
Henrique Soares da Costa
https://presbiteros.org.br/homilia-do-d-henrique-soares-da-costa-solenidade-de-cristo-rei-ano-b/
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