XVI Base de apoio, economia, votos de
homens e de latinos: por que Trump venceu a eleição
Saiba quais os fatores que levaram o candidato republicano a
superar Kamala Harris em número de delegados e no voto popular.
Por Daniel Médici
Apoiadores
de Donald Trump comemoram vitória do republicano
Após previsões que mostravam uma corrida eleitoral
disputada voto a voto entre Kamala
Harris e Donald Trump, a vitória do republicano veio
de forma acachapante.
Trump abocanhou cinco dos sete estados-chave, aqueles
decisivos para o resultado da eleição, segundo projeção da agência de notícias
Associated Press, e ainda avançou em redutos tradicionalmente democratas. Nos
outros dois, Nevada e Arizona, o republicano lidera com folga —e a apuração não
terminou.
Trump obteve tanto a vitória no Colégio Eleitoral quanto
no total de votos, algo que um candidato republicano não havia obtido desde a
reeleição de George W. Bush, em 2004. E o fez apesar de condenações na Justiça
e de ter incentivado a invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021, inflamando
seus apoiadores com falsas acusações de fraude eleitoral.
O que explica a eleição de
Trump? Veja cinco dos principais motivos, a seguir:
Plano de governo
Analistas políticos dos EUA ressaltam que, apesar dos
erros dos democratas e da gestão Biden, há uma base forte de apoiadores que
votou com convicção no seu plano de governo.
Trump fez uma campanha prometendo
realizar uma deportação massiva de imigrantes ilegais, no protecionismo, contra
agenda liberal nos costumes e contra o aumento do custo de vida.
O republicano também possui uma forte base de seguidores,
conhecidos como MAGA (em
referência ao slogan de sua primeira campanha, Faça a América Grande Outra Vez,
ou Make America Great Again). Estes são majoritariamente brancos de regiões
empobrecidas que veem Trump, embora um bilionário nascido em Nova York, como
uma figura anti-establishment.
“Uma grande parte da história é que um número suficiente
de americanos quer o que Trump está vendendo”, diz um artigo de Edward Luce ao
“Financial Times”. “Deportação em massa de imigrantes ilegais, o fim da
globalização e um dedo médio para a abordagem muitas vezes autoparódica da
elite liberal à identidade, mais conhecida como ‘wokeness’. Tudo isto superou
quaisquer dúvidas que os eleitores tivessem sobre o caráter de Trump.”
Professor
de economia da USP analisa impacto da vitória de Trump na região de Ribeirão
Economia
Embora o presidente americano Joe Biden tenha bons
números a apresentar nos índices de desemprego, no crescimento do PIB e nos
índices da bolsa de valores, muitos americanos não sentiram
no próprio bolso a bonança econômica que os democratas imaginaram que o país
estava vivendo.
Biden realizou a liberação de US$ 1,9 trilhão (R$ 10,9 trilhões
na conversão atual) como parte de um plano de recuperação da economia
pós-pandemia logo após assumir o cargo. Na sequência, a inflação disparou no
país, chegando a 9,1% em 12 meses em junho de 2022, maior patamar em quatro
décadas. A cifra é exorbitante para os padrões dos EUA.
O salto no custo de vida obrigou a alta nos juros, que
encareceu o crédito no país.
Boa parte das pesquisas eleitorais mostrava os eleitores
americanos preocupados com a economia. Durante sua campanha, Trump
frequentemente abria seus comícios perguntando ao público: “Vocês acham que sua vida está melhor ou pior do que há quatro
anos?”, e passava a comentar a alta dos preços de itens básicos, como comida.
Guerra em Gaza e na Ucrânia
Antes das eleições, especulava-se que, no caso de uma
eleição apertada, Trump poderia se beneficiar com eleitores descontentes com
Kamala que votariam em Jill Stein, do Partido Verde, a única na disputa a
condenar abertamente as ações de Israel em Gaza. Isso não chegou a ocorrer: as
vitórias de Trump nos estados-chave se deram por margens maiores do que os
votos recebidos pela candidata minoritária.
Isto posto, porém, Kamala e o Partido Democrata se
distanciaram de eleitores que constituíam sua
base de apoio, como muçulmanos e jovens de esquerda, ao apoiar as ações de
Israel na guerra contra o Hamas e o Hezbollah, mesmo com o alto número de mortes de civis.
Estudantes acampados protestam contra as
ações de Israel em Gaza em frente ao campus da Universidade de Columbia, em
Nova York — Foto: Caitlin Ochs/Arquivo/Reuters
As guerras no Oriente Médio e na Ucrânia também foram
vistas pelo eleitorado em geral como um mau uso do dinheiro de seus impostos em
um momento no qual a população americana tinha necessidades mais urgentes.
Trump, por outro lado, embora abertamente pró-Israel,
usou o fato de não ter iniciado nenhuma guerra no seu mandato anterior – em que
pese a desestabilização nas relações internacionais – para prometer encerrar os
dois conflitos rapidamente.
Voto masculino e voto latino
Entre os diferentes eleitores,
Trump teve um desempenho muito melhor entre homens latinos. Em 2024, ele obteve 45% dos votos
desses eleitores, contra 32% em 2020 e 28% em 2016, segundo a boca de urna.
Além disso, em relação às duas eleições em que ele havia participado
anteriormente, Trump avançou no voto entre negros, segundo as primeiras
pesquisas após a votação.
Esse movimento já era visível em pesquisas de opinião
antes do pleito.
Segundo Nate Cohn, analista do “New York Times”, apesar
das falas abertamente xenofóbicas do republicano, boa parte dos eleitores
latinos legalizados concorda com propostas como deportação de ilegais e a
construção de um muro na fronteira com o México. Outras preocupações, como a
economia e a criminalidade, também eram consideradas mais importantes para essa
fatia da população, que achavam Trump mais competente para lidar com elas.
Em relação aos homens, há a percepção de que Trump se
coloca há anos como uma figura masculina em contraposição a pautas
"feministas" que ameaçariam a posição destes na sociedade.
“Em 2016, Trump apresentou-se como alternativa ao
insatisfeito homem branco da classe trabalhadora. Ele conduziu uma campanha
ofensas explícitas de gênero e raça. Seus comícios foram caracterizados por uma
misoginia grosseira e quase caricatural”, lembra um artigo da revista “Slate”.
Pesquisas de boca de urna
mostram também que Trump avançou entre jovens e católicos.
Troca da candidatura democrata
Trump, apesar de ter saído enfraquecido do 6 de Janeiro e
de condenações por abuso sexual, galvanizou de tal forma o Partido Republicano
que se colocou como candidato natural da sigla à Presidência.
Do outro lado da disputa, Biden foi escolhido como
candidato dos democratas à reeleição, mas um desempenho péssimo no primeiro
debate, em junho, acendeu alertas sobre a sua idade e as suas condições de
cumprir mais um mandato. Após
muita pressão de apoiadores, o presidente anunciou em 21 de julho a sua
desistência da disputa, e Kamala teve apenas 16 semanas de campanha.
Apesar de um início animador da democrata, a campanha de
Trump bateu na tecla da troca de oponentes em cima da hora como um sinal de
fraqueza dos adversários. O republicano conseguiu colar a imagem de Harris à de
Biden em seus comícios, aproveitando-se da hesitação dos democratas. A mensagem
de Harris, de renovação geracional na política americana, foi prejudicada por
ela não ter sido a primeira opção de sua chapa, preterida pelo octogenário
Biden.
Saiba quais os fatores que levaram o candidato republicano a
superar Kamala Harris em número de delegados e no voto popular.
Por Daniel Médici
Apoiadores
de Donald Trump comemoram vitória do republicano
Após previsões que mostravam uma corrida eleitoral
disputada voto a voto entre Kamala
Harris e Donald Trump, a vitória do republicano veio
de forma acachapante.
Trump abocanhou cinco dos sete estados-chave, aqueles
decisivos para o resultado da eleição, segundo projeção da agência de notícias
Associated Press, e ainda avançou em redutos tradicionalmente democratas. Nos
outros dois, Nevada e Arizona, o republicano lidera com folga —e a apuração não
terminou.
Trump obteve tanto a vitória no Colégio Eleitoral quanto
no total de votos, algo que um candidato republicano não havia obtido desde a
reeleição de George W. Bush, em 2004. E o fez apesar de condenações na Justiça
e de ter incentivado a invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021, inflamando
seus apoiadores com falsas acusações de fraude eleitoral.
O que explica a eleição de
Trump? Veja cinco dos principais motivos, a seguir:
Plano de governo
Analistas políticos dos EUA ressaltam que, apesar dos
erros dos democratas e da gestão Biden, há uma base forte de apoiadores que
votou com convicção no seu plano de governo.
Trump fez uma campanha prometendo
realizar uma deportação massiva de imigrantes ilegais, no protecionismo, contra
agenda liberal nos costumes e contra o aumento do custo de vida.
O republicano também possui uma forte base de seguidores,
conhecidos como MAGA (em
referência ao slogan de sua primeira campanha, Faça a América Grande Outra Vez,
ou Make America Great Again). Estes são majoritariamente brancos de regiões
empobrecidas que veem Trump, embora um bilionário nascido em Nova York, como
uma figura anti-establishment.
“Uma grande parte da história é que um número suficiente
de americanos quer o que Trump está vendendo”, diz um artigo de Edward Luce ao
“Financial Times”. “Deportação em massa de imigrantes ilegais, o fim da
globalização e um dedo médio para a abordagem muitas vezes autoparódica da
elite liberal à identidade, mais conhecida como ‘wokeness’. Tudo isto superou
quaisquer dúvidas que os eleitores tivessem sobre o caráter de Trump.”
Professor
de economia da USP analisa impacto da vitória de Trump na região de Ribeirão
Economia
Embora o presidente americano Joe Biden tenha bons
números a apresentar nos índices de desemprego, no crescimento do PIB e nos
índices da bolsa de valores, muitos americanos não sentiram
no próprio bolso a bonança econômica que os democratas imaginaram que o país
estava vivendo.
Biden realizou a liberação de US$ 1,9 trilhão (R$ 10,9 trilhões
na conversão atual) como parte de um plano de recuperação da economia
pós-pandemia logo após assumir o cargo. Na sequência, a inflação disparou no
país, chegando a 9,1% em 12 meses em junho de 2022, maior patamar em quatro
décadas. A cifra é exorbitante para os padrões dos EUA.
O salto no custo de vida obrigou a alta nos juros, que
encareceu o crédito no país.
Boa parte das pesquisas eleitorais mostrava os eleitores
americanos preocupados com a economia. Durante sua campanha, Trump
frequentemente abria seus comícios perguntando ao público: “Vocês acham que sua vida está melhor ou pior do que há quatro
anos?”, e passava a comentar a alta dos preços de itens básicos, como comida.
Guerra em Gaza e na Ucrânia
Antes das eleições, especulava-se que, no caso de uma
eleição apertada, Trump poderia se beneficiar com eleitores descontentes com
Kamala que votariam em Jill Stein, do Partido Verde, a única na disputa a
condenar abertamente as ações de Israel em Gaza. Isso não chegou a ocorrer: as
vitórias de Trump nos estados-chave se deram por margens maiores do que os
votos recebidos pela candidata minoritária.
Isto posto, porém, Kamala e o Partido Democrata se
distanciaram de eleitores que constituíam sua
base de apoio, como muçulmanos e jovens de esquerda, ao apoiar as ações de
Israel na guerra contra o Hamas e o Hezbollah, mesmo com o alto número de mortes de civis.
Estudantes acampados protestam contra as
ações de Israel em Gaza em frente ao campus da Universidade de Columbia, em
Nova York — Foto: Caitlin Ochs/Arquivo/Reuters
As guerras no Oriente Médio e na Ucrânia também foram
vistas pelo eleitorado em geral como um mau uso do dinheiro de seus impostos em
um momento no qual a população americana tinha necessidades mais urgentes.
Trump, por outro lado, embora abertamente pró-Israel,
usou o fato de não ter iniciado nenhuma guerra no seu mandato anterior – em que
pese a desestabilização nas relações internacionais – para prometer encerrar os
dois conflitos rapidamente.
Voto masculino e voto latino
Entre os diferentes eleitores,
Trump teve um desempenho muito melhor entre homens latinos. Em 2024, ele obteve 45% dos votos
desses eleitores, contra 32% em 2020 e 28% em 2016, segundo a boca de urna.
Além disso, em relação às duas eleições em que ele havia participado
anteriormente, Trump avançou no voto entre negros, segundo as primeiras
pesquisas após a votação.
Esse movimento já era visível em pesquisas de opinião
antes do pleito.
Segundo Nate Cohn, analista do “New York Times”, apesar
das falas abertamente xenofóbicas do republicano, boa parte dos eleitores
latinos legalizados concorda com propostas como deportação de ilegais e a
construção de um muro na fronteira com o México. Outras preocupações, como a
economia e a criminalidade, também eram consideradas mais importantes para essa
fatia da população, que achavam Trump mais competente para lidar com elas.
Em relação aos homens, há a percepção de que Trump se
coloca há anos como uma figura masculina em contraposição a pautas
"feministas" que ameaçariam a posição destes na sociedade.
“Em 2016, Trump apresentou-se como alternativa ao
insatisfeito homem branco da classe trabalhadora. Ele conduziu uma campanha
ofensas explícitas de gênero e raça. Seus comícios foram caracterizados por uma
misoginia grosseira e quase caricatural”, lembra um artigo da revista “Slate”.
Pesquisas de boca de urna
mostram também que Trump avançou entre jovens e católicos.
Troca da candidatura democrata
Trump, apesar de ter saído enfraquecido do 6 de Janeiro e
de condenações por abuso sexual, galvanizou de tal forma o Partido Republicano
que se colocou como candidato natural da sigla à Presidência.
Do outro lado da disputa, Biden foi escolhido como
candidato dos democratas à reeleição, mas um desempenho péssimo no primeiro
debate, em junho, acendeu alertas sobre a sua idade e as suas condições de
cumprir mais um mandato. Após
muita pressão de apoiadores, o presidente anunciou em 21 de julho a sua
desistência da disputa, e Kamala teve apenas 16 semanas de campanha.
Apesar de um início animador da democrata, a campanha de
Trump bateu na tecla da troca de oponentes em cima da hora como um sinal de
fraqueza dos adversários. O republicano conseguiu colar a imagem de Harris à de
Biden em seus comícios, aproveitando-se da hesitação dos democratas. A mensagem
de Harris, de renovação geracional na política americana, foi prejudicada por
ela não ter sido a primeira opção de sua chapa, preterida pelo octogenário
Biden.
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