11- LINDOLIVO
SOARES MOURA ESTÁ DE VOLTA COM SUAS REFLEXÕES (* )
"HISTÓRIA, ESTÓRIA, OU UM SIMPLES CONTO DE NATAL?
VOCÊ DECIDE!"
"Na
ausência da certeza, nada há de
errado com a esperança"
[Carl Simonton]
Dizem que aquilo que chamamos de casualidade não é
senão a alternativa escolhida por Deus para permanecer no anonimato. Pelo sim e
pelo não, Pascal dizia que a fé é uma espécie de aposta na existência do
divino, enquanto Unamuno, filósofo espanhol, na mesma linha de pensamento
afirmava que acreditar em Deus não é senão desejar que Ele exista. Quanto mais
a intenso o desejo, e quanto maior o risco desse investimento, mais profunda a
sensação de sua presença e da experiência. Ao contrário, porém, do que pensam e
afirmam certos fanáticos fundamentalistas, Deus está longe de ser uma
unanimidade. Certos fatos entretanto, há que se reconhecer, se revelam
desafiadores quando confrontados com a tarefa de se analisá-los e sobretudo de
interpretá-los: fatos realmente? "fakes"? Ou simplesmente ficção?
Ouça e analise com atenção essa pequena história - ou "estória", você
decide - e tire você mesmo suas próprias conclusões.
Conta-se que numa pequena cidade do sul do Brasil,
chamada Gramado, sempre foi um tanto incomum e inusitada a forma de se
comemorar e celebrar o Natal - viria daí a notoriedade e a grande procura pelo
"Natal de Gramado"? Tais relatos asseguram que em várias comunidades
dessa pequena cidade, o ponto culminante das celebrações se resume no seguinte:
em lugar da pequena imagem do Jesus recém-nascido, crianças com o mesmo nome do
aniversariante - meninos e meninas - são previamente convidadas para atuar como
integrantes do presépio construído em uma das laterais do interior de cada
Igreja. Ao final do ato litúrgico todos os presentes são convidados a se
aproximar e saudar os recém-nascidos "Jesuses", reverenciá-los e
entoar-lhes cânticos solenes.
Outro fato curioso, segundo tais relatos, é que ato
continuo à cantata da tradicional "Noite Feliz", entoa-se outra bela
canção que diz: "tudo seria bem melhor, se o Natal não fosse um dia, se as
mães fossem Marias e se os pais fossem Josés, e se a gente parecesse com Jesus
de Nazaré". Geradora inicialmente
de muitos protestos, sobretudo por parte dos menos adeptos a mudanças -
"guardiães dos bons costumes e das tradições", como eles próprios se
auto-denominam - essa espécie de transposição foi pouco a pouco caindo na tolerância
e finalmente na graça da grande maioria. A Igreja parece "vir abaixo"
quando as vozes dos diversos Jesuses se juntam às de todos os demais presentes,
fazendo chegar aos céus esse refrão: "tudo seria bem melhor, se o Natal
não fosse um dia, se as mães fossem Marias e se os pais fossem Josés, e se a
gente parecesse com Jesus de Nazaré!".
Certas versões, entretanto, asseguram que num
determinado ano e numa determinada ocasião algo diferente e inusitado
aconteceu. Antes que esse momento culminante tivesse lugar na Catedral
principal da cidade, um cego incrédulo, que à porta sempre se postava, e ao
final das celebrações se punha a recolher as moedas que lhe eram deixadas,
adentrou a igreja em verdadeira disparada gritando: "parem! Parem! Suspendam
as homenagens! Há lá fora um Jesus cadeirante que não conseguiu subir a escada,
mas insiste em entrar para ocupar o seu lugar junto aos demais Jesuses!".
Orientados pelo Celebrante, dois dos Ministros presentes se dirigiram
rapidamente à porta de entrada, e se depararam com o tal Jesus sentado numa
cadeira de rodas, implorando ajuda e insistindo em fazer parte do grupo dos
recém-nascidos Jesuses. Mas havia um impasse a ser resolvido: não se tratava de
um Jesus criança, e sim de um Jesus ancião, barba branca e de idade já bastante
avançada. Consultado o Celebrante, que há bom tempo vinha ouvindo não poucos
comentários desfavoráveis pelo fato de a Igreja jamais haver facilitado o
acesso a tais pessoas, a ordem foi clara e taxativa: "Jesus criança ou
não, tragam-no imediatamente à minha presença!".
A cena que se seguiu foi um tanto hilariante,
provocando risos e cochichos entre os presentes. Um misto de papai Noel, Pai de
Santo, Painho e Orixá - fosse lá o que fosse, ninguém saberia explicar -
desfilou triunfalmente pelo corredor principal da Igreja sentado em sua cadeira
de rodas, com um sorriso tão maroto e contagiante, que fazia dele menos um
velho e muito mais uma criança. Seguiu firme igreja adentro, escoltado e
empurrado por dois Ministros que mais pareciam dois seguranças. Só faltou que
os sinos repicassem naquela hora para que o ritual de entronização fosse
completo.
"Abram
alas, vamos, abram alas!" - ordenou o
Celebrante, buscando recobrar certa autoridade que por alguns instantes
imaginara haver perdido. "Dêem passagem ao Jesus menino mais velho que já
tivemos e que acaba de chegar. Vejam quanto brilho nesse olhar!". Enquanto
ouvia tais palavras Jesus ancião dizia baixinho, de si para si mesmo: "mal
sabe ele o que está por acontecer! Jerusalém - melhor dizendo, Gramado - que o
diga!". Apenas pensou... Não chegou a pronunciar palavra alguma. E lá
seguiu Jesus ancião, conduzido numa espécie de desfile aberto pelo corredor
principal, até chegar e ser colocado em meio aos demais Jesuses. Os olhares de
todos, incluindo o do Celebrante, repousaram sobre ele, acompanhados de um
silêncio profundo e respeitoso. Menos o olhar tristonho de uma Jesus-menina,
que insistia em permanecer olhando para baixo, como se ignorasse o sentido ou o
significado daquela cena. Jesus ancião se aproximou, depositou com delicadeza
suas mãos sobre seus ombros, enquanto todo seu corpo e seu rosto se
transfiguravam e cediam lugar a um semblante condoído e cheio de compaixão.
"Podes me ver?", Ele perguntou. "Não, Senhor, não posso!",
respondeu monossilabicamente a menina. "Então como sabes que sou um
senhor?". "Não sei, Senhor!". "Há quanto tempo não
vês?", Jesus ancião perguntou. "Desde sempre, Senhor!".
"Que tal fazermos um trato? Dou-te meus olhos por um tempo e tu vens te
sentar nessa bendita cadeira pelo mesmo espaço de tempo; já estou cansado de
ficar sentado". "Como assim, Senhor, como vamos fazer isso!? Sei que
te chamas Jesus, mas pelo que sei não podes fazer milagres como o verdadeiro
Jesus fazia. Se pudesses, com certeza já há muito te terias livrado de tua
própria cadeira".
Nenhum dos presentes parecia entender bem o que
estava se passando entre aqueles dois personagens, mas ninguém ousava
repreender Jesus ancião e menos ainda exigir que Ele se calasse. Até mesmo
o Presidente da Celebração parecia haver
se esquecido do seu lugar e de sua função. Surpreso, permaneceu atento e
calado, permitindo assim que aquele estranho e comovente diálogo continuasse.
"Todos podemos operar milagres - continuou
Jesus ancião - não é preciso ser um Deus para isso! Basta que a gente se pareça
com Jesus de Nazaré! Não é isso que diz a canção que vocês repetem ano após ano
na noite de Natal?". "Sim, Senhor, e eu creio nisso; creio de todo
meu coração!". "Ora, ora - retrucou Jesus ancião - mas se tu crês que
se parecermos com Jesus de Nazaré tudo pode acontecer, não é melhor poder ver
que continuar sem enxergar para sempre?". "Sim, Senhor, e foi com
isso que sempre sonhei; com Jesus me curando e me deixando ver. E continuaria
desejando, mesmo que para isso tivesse que viver a vida inteira sentada numa
cadeira de rodas!". "Ei, ei, um milagre de cada vez", replicou
Jesus ancião, "um milagre de cada vez! Quem sabe com o tempo consigas
outro milagre e então vais poder ver e andar sem a ajuda de ninguém! E então, o
que me dizes? Aceitas minha proposta?". "Seria maravilhoso, Senhor,
mas falando sério, achas mesmo que te pareces tanto com Jesus de Nazaré, a
ponto de poderes operar esse e outros milagres, e quem sabe tornar a mim e o
mundo melhores, como disseste?". "Acho, não, tenho certeza! Mas isso
só é possível àquele que crê; sejas tu, sejam os demais que a Deus recorrem. E
tu já me deste provas de tua fé. Portanto, que tal rezarmos juntos?".
Nesse momento uma brisa fresca tomou conta do lugar
em que se encontravam. Uma espécie de pomba, cuja presença até aquele instante
havia sido ignorada, voava de um lado para outro por sobre os presentes.
Impulsionados por uma força estranha, todos dobraram simultaneamente os
joelhos, passando a ouvir vozes e cantos vindos de onde ninguém sabia dizer.
Luzes em forma de raios estonteantes penetravam de todos os lados e frestas. De
repente Jesus ancião se ergueu, elevou bem alto suas mãos, e se pôs a
pronunciar uma estranha e comovente oração: "Pai, Senhor do céu e da terra,
Eu sei que Tu me vês, Eu sei que Tu me amas, eu sei que Tu me ouves! Sei também
que a Ti tudo é possível! Tu sabes que Eu Te amo, Pai, bem como conheces o
desejo desta tua filha e o amor que ela tem por Ti! Por isso Eu Te suplico: que
venha sobre ela a Tua graça, e faças descer sobre ela o Teu Espírito! Espírito
de poder e de força! Que o Teu poder e a Tua glória se manifestem!: QUE ESTA TUA FILHA POSSA VER! Faça-se a Tua
vontade, assim na terra como no céu!".
Nada mais se ouviu falar ou contar do que ali
aconteceu. De forma estranha e curiosa, como se houvessem combinado entre si
por algum motivo ou razão maior, todos - inclusive aquela criança - decidiram
guardar unicamente para si mesmos o que ali havia se passado. E quando ainda
assim, alguém insistia em perguntar sobre Jesus, o ancião da cadeira de rodas,
ou saber notícias da menina cega que passara a enxergar, nada, absolutamente
nada ninguém se arriscava a dizer. Era como se pairasse sobre todos uma nítida
e vívida recordação de um Natal tão maravilhoso, e de fatos e coisas tão
grandiosas, que o inefável e o indescritível pareciam haver se apoderado das
pessoas. Ninguém ousava afirmar ou negar terem tais fatos realmente acontecido.
O que todavia estava ali, bem aos olhos de todos, e
ao alcance de quem desejasse ver e sentir, é que uma menina antes cega passara
a ver, um pedinte incrédulo a acreditar, e uma cidade inteira a celebrar o
Natal de uma maneira como jamais fizera antes. Se para "Jesus menina"
outros milagres teriam acontecido, ou estariam por acontecer, só ela e mais
ninguém poderia dizer. Também isso e tantas outras coisas ela decidira guardar
apenas para si. De Jesus ancião os relatos não poderiam ser mais
controvertidos. Uns afirmam que Ele sequer existiu; outros atestam que, numa
espécie de ascensão fantasmagórica, Ele simplesmente havia subido ao céu, de
onde Ele mesmo afirmara ter vindo; outros ainda, que Ele continua mais vivo do
que nunca, podendo ser facilmente encontrado no meio e em cada um de nós. O
certo é que ano após ano, única e exclusivamente no dia de Natal, essa história
- seria história, "estória" ou um simples conto de Natal? - é contada
e recontada. Não somente essa, mas também inúmeras outras: de papais e mamães
noéis, duendes, florestas encantadas e muitos outros personagens, reais ou não,
que pelo seu poder mágico e encantador continuam a despertar o melhor de cada
um de nós.
( * ) Meu amigo Lindolivo Soare Moura,
professor, psicólogo e escritor está de volta aqui no SB SABENDO BEM:Bem-Vindo!
Ele enviou o texto de Vitória(ES)via
Whatsaap.
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