XII- "NEM TODA BOA INTENÇÃO É GARANTIA DE MELHOR
PROGNÓSTICO: A FRACASSADA TENTATIVA DE DIÁLOGO ENTRE UM TEÍSTA, UM ATEÍSTA E UM
AGNÓSTICO"
Lindolivo
Soares Moura (*) (**)
Três
"crentes" - um teísta, um agnóstico e um ateísta - conversavam
animada e amigavelmente entre si sobre as razões de
suas respectivas crenças. Disse o teísta: nas andanças por esse mundão
de Deus, foi tanto bem e tanta bondade que vi, que pronto me convenci de que
Deus não pode não existir. O ateísta replicou: e eu, em minhas próprias
andanças, encontrei tanto mal e tanta maldade, que logo me convenci justamente
do contrário: é impossível que Deus exista. De minha parte, explicou o
agnóstico, minhas andanças até aqui me convenceram de que um e outro, teísta e
ateísta, por motivos e experiências totalmente diversas, podem perfeitamente
ter razões pessoais e inconciliáveis para crer no que acreditam. O teísta
discordou: ficar em cima do muro, não; ou uma coisa ou outra. Deus não pode
existir e não existir ao mesmo tempo. Em relação a isso o ateísta concordou com
o teísta, discordou do agnóstico, mas tratou logo de puxar a sardinha para seu
próprio braseiro: isso mostra que, em estando eu com a razão, vocês dois estão
automática e consequentemente sem ela. O teísta, por sua vez, tratou logo de
recolocar a sardinha no lugar de onde, de acordo com ele, ela jamais deveria
ter saído: mas estando vocês dois sem ela - afirmou ele - a razão volta a ficar
comigo. O agnóstico acabou sendo ainda mais taxativo e conclusivo: caso nenhum
de vocês dois esteja totalmente com ela, a verdade fica com quem sempre deveria
ter ficado e de onde nunca deveria ter saído: comigo.
Com a clara
intenção de reduzir o número de competidores, tornando assim a disputa menos
acirrada e menos competitiva, o teísta e o ateísta decidiram - disfarçadamente,
claro - conjugar forças e eliminar o agnóstico da conversa. Disse o teísta:
você agnóstico, na verdade não acredita nem desacredita em p...nem numa coisa
nem noutra, conseguiu corrigir-se a tempo. Melhor portanto calar-se e abster-se
dessa conversa. Imediatamente o ateísta concordou com o teísta acenando com a
cabeça. O agnóstico protestou: se tem alguém aqui, que deve abster-se desse
diálogo, esse alguém é você, ateísta, que nega categoricamente a existência de
Deus, coisa que em nenhum momento eu fiz, jamais o farei, e com a qual jamais
concordei ou concordarei. Agora quem protestou foi o teísta: mas ele pelo menos
acredita em alguma coisa, ao passo que você não acredita em coisa alguma. O
agnóstico protestou novamente: muito pelo contrário: acredito que ambas as
crenças de cada um de vocês podem ser verdadeiras, presumida uma e excluída a
outra, e não estando nem eu e nem ninguém, em condições de saber com certeza
qual seja, me abstenho de acreditar nas duas; portanto sou mais sensato e
coerente que vocês dois.
O ateísta,
por sua vez, convicto também ele de que o agnóstico era o primeiro
"crente" a ser eliminado da conversa - isso feito, chegaria a vez de
eliminar o teísta - voltou à carga contra o agnóstico: sua crença nada
acrescenta, seu pervertido, pois você está convicto de que dois contraditórios
- tanto um como o outro - podem ambos ser verdadeiros. Quer maior absurdo do
que esse!? Agora quem concordou com o ateísta, acenando com a cabeça, foi o
teísta. Uma vez mais o agnóstico discordou: nada mais faço que lançar mão do
"benefício da dúvida": é mais sensato e mais coerente permanecer com
ela, quando nem de uma coisa nem de outra se tem certeza. Disso estou
absolutamente convencido!
Percebendo
que o agnóstico estava sendo difícil de ser convencido e eliminado da conversa,
tanto o teísta quanto o ateísta, sem que um e outro percebessem obviamente,
resolveram um eliminar o outro. Sem dó nem piedade o deísta disparou contra o
ateísta: cúmulo do absurdo é você acreditar convictamente que Deus não existe -
falou isso olhando fixamente para o ateísta - já que em momento algum você para
nada, por mais absurda que a desgraça seja, poderá invocar a ajuda de Deus.
Desta vez foi o agnóstico a manifestar sua concordância com o teísta, acenando
com a cabeça.
Percebendo a
mudança de estratégia do teísta o ateísta não perdoou e disparou impiedosamente
à queima-roupa: prefiro levar uma vida mais difícil aqui embaixo, a levar uma
mais fácil lá em cima mas com igual probabilidade de ser deportado para o fogo
do inferno por toda a eternidade após minha morte; não é justamente nisso que
você acredita? Novamente aqui o agnóstico fez uso da cabeça para manifestar sua
concordância com o que acabava de ser dito pelo ateísta. Além do mais - falava
agora o agnóstico com a intenção de corroborar a afirmação feita pelo ateísta -
já nascer em pecado original originante, sendo por esse motivo "'ex'-comungado"
e lançado para fora do paraíso sem dó nem piedade, não é algo que se espera que
um Deus de puro amor possa fazer com seus filhos! "Deuzinho"
complicado, esse seu! Falou isso, claro, com um olhar de pura reprovação
direcionado para o teísta. E concluiu tentando enterrar por completo a intenção
do mesmo em convencê-lo a mudar de crença: caso venha a deixar de ser agnóstico
um dia, com certeza optaria por ser ateísta; teísta, Deus que me livre!
Como a
conversa começava a elevar a temperatura para além do que cada um seria capaz
de suportar sem grandes perdas, e estando os três "crentes"
absolutamente convictos de suas respectivas crenças - o que não equivale de
forma alguma a estarem absolutamente "certos" de cada convicção
propriamente dita - decidiram cada um deles abrir mão de tentar convencer os
outros dois a mudar de ideia. Apertaram-se mutuamente as mãos e continuaram a
pescaria em perfeita paz, assovios e harmonia.
Súbito,
pareceu-lhes ouvir, vinda de algum recôndito lugar do espaço sideral, uma estranha
voz que somente o deísta estaria em condições de imaginar de quem seria: GLÓRIA
A DEUS NAS ALTURAS, E PAZ NA TERRA AOS HOMENS E MULHERES DE BOA VONTADE! PELO
MENOS DESTA VEZ NÃO HOUVE MORTE LÁ EMBAIXO! Ouviram isso? Ouviram o que eu
ouvi? - perguntou o teísta. Eu não ouvi absolutamente nada - respondeu o
ateísta. O agnóstico por sua vez tratou de desconversar: estava tão distraído -
justificou-se - que não posso dizer absolutamente nada a respeito de coisa
alguma!
Peixe mesmo,
que era bom, ficou para a pescaria seguinte. Mas pelo menos não houve
desentendimento sério entre os três, naquele dia. O diálogo inter-religioso em
favor de um Ecumenismo mais humano acabara uma vez mais prevalecendo. Graças a
Deus, ou talvez sem a co-participação d'Ele, ou, em última instância, de acordo
com a crença de cada um!
(*) Reflexão
enviada por whatsapp, de Vitória(ES)
(**)Psicólogo e Professor Universitário no
Consultório de Psicologia- Universidade Federal do Espírito Santo- Vila Velha, Espírito Santo, Brasil.
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