IX-REFLEXÃO DOMINICAL III: DOMINGO GAUDETE, DA ALEGRIA
A
Alegria é o tema fundamental deste Terceiro Domingo do Advento, que a antiga
liturgia latina chamava de Domingo Gaudete. Quando
a esperada vinda está finalmente para se realizar e todos os sinais a
confirmam, a esperança e a preparação se transformam em alegria e júbilo. A
curto prazo, a perspectiva da vinda transforma-se em antecipação da presença.
Por isso o espírito deste domingo é de Alegria, que vem de “Gaudete”, ou
seja, “Alegrai-vos”(cf.
Fl. 4,4-7). A Alegria que brota do sentimento de viver sempre na presença do
Senhor e que assim produz em todos os cristãos não só o sentimento que por si
só já deve dizer muito, mas deve produz um novo efeito de vida: o epieikes, ou seja, o
bom grado – o cristão não apenas tem alegria, mas é uma
alegria para quem o encontra. Isso seria verdade?
Por
isso, o Santo Evangelho(Lc 3,10-18), nos ensina que aqueles que acolhem a
pregação de João, o Batista, lhe pedem normas de comportamento em vista da
vinda do Messias. Essas normas se resumem em uma só palavra: ser
gente. O profeta João Batista faz uma pregação muito direta,
muito simples e muito objetiva: repartir aquilo que temos. Adverte aos fiscais
do governo que devem ser honestos. Para os homens das forças de segurança e do
exército de então ensina que não devem molestar as pessoas e contentar-se com o
seu soldo. Ser gente para a Sagrada Escritura é viver o Reino de Deus, que deve
se realizar no dia a dia de nossas realizações, no chamado cotidiano.
O
Profeta João Batista diz que viver o seu código de fé, os seus “sacramentos”,
que iluminam a vida de um Profeta mais importante do que ele está no batismo. É
um sinal do verdadeiro batismo, que um mais forte do que ele vem administrar: o
batismo no Espírito e no fogo: no
Espírito, para os justos, que serão impelidos pelo
espírito de Deus, transformados em profetas(cf. Jl 3) e santos; no fogo, para os
ímpios, que queimarão como o refugo na hora da ceifa. Para o “mais forte” já
está a pá na mão para limpar o grão no terreiro.
Meus caros irmãos,
O Evangelho de hoje responde à pergunta que normalmente nasce de
um coração arrependido e com boa vontade: “O que devo fazer?” Todos devem
fazer-se essa pergunta. Mas cabe a cada um corrigir seu próprio caminho para
que se encontre pessoalmente com o caminho do Senhor.
Somos chamados a conversão. Conversão profunda, dinâmica,
renovadora, como deu pistas e ensinou João Batista. Reconhecer-se pecador e
querer a conversão é reconhecer em Jesus de Nazaré o Messias, que vem na força
do Espírito de Deus, repartindo com o convertido o mesmo Espírito Santo.
Por isso Jesus vem no Natal e virá no Juízo final. Durante a
primeira vinda, Jesus derrama seu Espírito sobre quantos creram nele. Na
segunda vinda, separará o trigo da palha, recolherá o trigo – os bons, que se
deixaram fecundar pelo Espírito Santo e produziram frutos de santidade, e
queimará a palha – os maus, que se encheram com a própria vontade, estéril para
o balanço final. As duas vindas, Natal e Juízo final, são motivo de alegria,
tema fortemente presente na Missa de hoje, particularmente nas duas primeiras
leituras e no Salmo Responsorial.
Meus irmãos,
Na balança da vida devemos colocar as boas obras e as más
inclinações, que são chamados de pecados. Jesus veio para todos. Jesus não quer
excluir ninguém, assim veio para os bons, veio para os maus, veio para os
justos e veio, também para os pecadores. Não é por acaso que, no Evangelho
Lucas cita duas classes sociais desprezadas e tidas como pecadoras, que deviam
ser evitadas pelos “bons”, embora estivessem presentes na vida de cada dia de
toda a sociedade. A primeira classe é a dos publicanos, que são os cobradores
de impostos. Os publicanos cobravam os impostos para os romanos e ganhavam
sobre a quantidade arrecadada. Eram odiados pelo povo. Fariseus e saduceus não
mantinham nenhuma convivência com eles. A segunda classe é a dos soldados. Eram
mercenários, considerados permanentemente impuros pela possibilidade de haverem
derramado sangue e de estarem a serviço do poder estrangeiro. Como no tempo de
Jesus era proibido aos judeus o serviço militar, esses soldados que foram
escutar João Batista deviam ser pagãos a serviço de Herodes Antipas. A todos,
indistintamente, João pregava a chegada do Senhor: “Todos, verão a salvação de
Deus”. (cf. Lc. 3,6).
Assim, João Batista nos ensina a corrigir nossos defeitos e
vícios: apego aos bens materiais, simbolizados na posse de duas túnicas ou no
armazenamento de comida. A conversão exige o desapego, que se expressa muitas
vezes no repartir o que se tem e o que se é com os necessitados. Nossa fé
cristã é uma fé da partilha, por isso o apego generalizado que se fé é um
contra-testemunho.
A ganância é combatida porque ela provoca a fraude e o roubo.
Devemos mudar de mentalidade, de caminho, e rumar para a justiça, que nunca
explora nem extorque, mas prepara a consciência para a caridade fraterna.
O abuso da força é um grave pecado a ser extirpado, como
condição para receber o Messias que vem. A violência do tempo de Jesus é a
mesma que, infelizmente, nós contemplamos em nossos dias. Violência política,
econômica, estrangeira, familiar, abuso de toda a violência que não gera a paz
e a concórdia tão necessária no seio da sociedade injusta que se instala o
capital em vez da solidariedade, da partilha e do amor.
Os três pecados apontados por João costumam andar juntos. O
egoísmo não deixa repartir, a ganância, que exige sempre, mais pedem a violência
para a sua defesa. Os três tornam o coração humano impermeável à graça
santificante de Deus.
Caros irmãos,
A Primeira Leitura(Sf 3,14-18a) nos apresenta uma mensagem
central: “O Senhor está no meio de ti”(Sf 1) exorta à alegria, consola. Deus
revogou sua “sentença” – a ameaça dos assírios contra Judá, no final do século
VII a.C). Agora é preciso ter coragem. O profeta pede alegria por causa da
presença de Javé, Rei de Israel. Em Jesus, Messias, é que esta realidade chega
à plenitude. A primeira leitura é um convite à alegria, porque foi revogada a
sentença que condenava Judá. O amor de Deus pelo seu Povo venceu. A partir de
agora, Deus residirá no meio do seu Povo; e essa nova comunhão entre Deus e
Judá é uma garantia de segurança, de felicidade e de vida em plenitude. Mais: o
amor de Deus – esse amor que nada consegue desmentir nem apagar – vai renovar o
coração do Povo e fazer com que Judá volte para os caminhos da “aliança”; e o
próprio Deus Se alegrará com essa transformação. O que renova o mundo e o transforma
não é o medo, mas o amor. O medo provoca insegurança, pessimismo, angústia,
sofrimento, bloqueamento. O amor é que faz crescer, é que cria dinamismos de
superação, é que nos torna mais humanos, é que nos faz confiar, é que nos
coloca no encontro e na comunhão. Devemos ter isto bem presente quando formos
chamados a anunciar o Evangelho e a proclamar a proposta de salvação que o
nosso Deus faz aos homens.
Caros irmãos,
A Segunda Leitura(Fl 4,4-7) nos aponta a proximidade de Deus:
“Alegrai-vos sempre no Senhor: ele está perto”. A proximidade de Deus é razão
de alegria e de carinho para com todos os homens e mulheres. Enviado para levar
a Boa Nova aos pobres e oprimidos, o apóstolo Paulo, acorrentado, alegra-se com
o s seus pela proximidade do Senhor. A certeza de estar em Cristo o torna
realmente livre. A alegria é fundamental, que São Paulo repete duas vezes no
espaço de um versículo: “alegrai-vos”. A palavra aqui utilizada (o verbo
“khairô”) que nos leva a essa “alegria” (“khara”) que os anjos anunciam aos
pastores, a propósito do nascimento de Jesus em Belém. É, portanto, uma alegria
que resulta da presença salvadora do Senhor Jesus no meio dos homens. Depois,
São Paulo acrescenta outras recomendações: a bondade, a confiança, a oração (de
súplica e de ação de graças). São estas algumas das atitudes que devem
acompanhar o cristão que espera a vinda próxima do Senhor: alegria, porque a
sua libertação plena está a chegar; tolerância e mansidão para com os irmãos;
serena confiança em Deus; diálogo com Deus, agradecendo-Lhe os dons e
apresentando-Lhe as suas dores e dificuldades.
Lembremos que é da essência do advento a vigilância e a acolhida
do Menino Deus. Por isso para celebrar o Natal o advento é tempo de bondade que
se transforma em indulgência com que acolhemos os que nos rodeiam têm de ser,
também, distintivos de quem espera o Senhor. A espera do Senhor faz-se,
também, num diálogo contínuo com Ele. Não é possível estar disponível para O
acolher, quando estamos indiferentes e não partilhamos com Ele, a cada
instante, as nossas alegrias e as nossas dificuldades, os nossos sonhos e as
nossas esperanças. Não é possível acolher alguém com quem não comunicamos e de
quem não nos sentimos próximos.
Meus irmãos,
Qual é a diferença fundamental entre João Batista e Jesus? Ela
está na diferença entre o Batismo com água e o Batismo com o Espírito Santo.
João é um profeta. Jesus é o Filho de Deus. João recebe tudo de Deus. Jesus é
tudo, porque é Deus. Santo Agostinho nos ensinou que João é a voz no tempo,
Jesus é a Palavra eterna, que existe desde o princípio. Se tiramos a palavra,
prossegue Agostinho, que sentido teria a voz? O batismo com água era o símbolo
de conversão, o símbolo de purificação. O batismo com o Espírito Santo é a
santificação, a divinização, a participação na vida nova de Deus.
O Batismo com o fogo significa o calor e a luz, simbolizando a
majestade e a força divina, limpando o coração humano, separando o ouro da
graça das muitas impurezas. Jesus é o Juiz Supremo que dá o céu aos bons e o
inferno aos maus. Jesus vem com a força divina para purificar e para salvar. A
criatura humana aceita a salvação, se quiser.
A
salvação vem para todos. Bela a palavra de João Batista que disse que ele não
era digno de “desamarrar
a correia das sandálias” daquele que viria depois dele.
Jesus é, claramente, Salvador e Juiz, Juiz benigno e misericordioso, acolhedor
e paterno. A esperança/esperança do Advento alimenta a nossa fé.
Que o
Domingo Gaudete,
seja o momento de conversão, justiça, amor, paz e alegria, para constituir como
sinais concretos de renovação em nossa vida para esperarmos pelo Cristo,
colocando-nos do jeito que Jesus quer que nós esperemos por Ele: servindo ao
irmão e nos amando-nos na diversidade. Amém!
Homilia
por: Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda criatura.
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