I-
SXIII-ANTO AGOSTINHO : O
PERDÃO É O HOMEM EM RELAÇÃO
O mundo atual é feito de relações que, muitas vezes, não possuem
respaldo concreto na solidariedade que deve haver entre os seres humanos. As
marcas destes desafetos gerados por estas relações podem ser vistas em nossa
sociedade através de doenças, guerras, falta de trabalho, fome e tantas outras
mazelas sociais. Na verdade, é a dignidade humana que se encontra ferida pela
falta de um sentimento coletivo, muitas vezes lembrado, mas poucas vezes
praticado, que é o perdão.
Agostinho de Hipona nos lembra muito bem que “Aquele que ofendeu
a uma pessoa atraiu para si a sua perdição, pois não escutou a voz do teu
Senhor.” (Sermão 114, 2). A raiz das nossas relações está no amor. Amor que
devemos nutrir por todos e que verdadeiramente o temos se colocamos o
mandamento de Deus em prática, através de nossas ações para com os nossos
semelhantes. A falta de perdão é um sinal de que não conseguimos colocar esta
verdade em prática. A falta de perdão se sobrepõe à nossa oração, pois desta
forma o que falamos em nosso íntimo com Deus não conseguimos vivê-lo com o
nosso próximo. “Perdoame como eu perdôo. É isto que diz na oração do Pai Nosso.
Esta é a regra. Se queres que teu pedido de perdão seja acolhido por Deus,
perdoa tu ao que te pede perdão.” (Carta 171 A, 1). Este descompasso entre a
teoria e a prática de nossa fé causa todo o tipo de desarmonia em nossas
relações interpessoais e que atingem as nossas famílias, comunidades e
sociedades.
Em sua atividade pastoral como Bispo, Agostinho, já percebia que
a dimensão do perdão é colocada como algo pequeno e justificável, ou seja, se
põe um grande relevo sobre a ofensa muito mais do que a conseqüência do ato de
não perdoar no seio da comunidade dos homens. “Não digas: ‘É uma coisa pequena,
e logo se remedia’. Sem perdão nada e ninguém se remediarão sozinhos” (Sermão
114, 5). O perdão não vivenciado gera contenda. O desafeto entre irmãos produz
mal estar no meio da comunidade e faz com que todo o corpo de Cristo, que é a
Igreja, também fique enfermo. Esperar que o outro venha pedir perdão, também,
não deixa de ser uma forma de banalizar os efeitos da falta de perdão. As
inimizades e os rancores machucam o coração do cristão, paralisam a suas ações
no mundo e não o deixam testemunhar a ressurreição de Cristo, que nada mais é
do que transformar os momentos de morte em vida em plenitude a toda humanidade.
“Não retenha em teu interior inimizade contra ninguém, porque maior é o mal que
estes rancores causam em teu coração.” (Comentário a São João 1, 9).
O perdão é o homem em relação. Em relação com os outros, com a
natureza e com Deus. “Eu te peço perdão de meus pecados e Tu queres que haja
alguém a quem eu possa perdoar.” (Sermão 82, 4). Agostinho já intuía esta
verdade em seu coração. Que além do perdão ajudar a libertar o coração do
cristão, sanava o corpo da Igreja e restabelecia a harmonia das relações no
mundo, porque a dinâmica do perdão evoca a presença de Deus àqueles que são atingidos
pela graça do perdão. Basta, a cada um de nós tomar a iniciativa do perdão. Por
que esperar que o outro venha pedir perdão? Por que se fazer de vítimas ou de
indiferentes nas relações com os demais? Por que adiar a graça que Deus quer
derramar sobre nós? “Eu quero ser perdoado. Então perdoarei. Esquecerei as
ofensas que me foram proferidas e serão esquecidos os meus delitos. Quero
receber. Então, darei. Somente assim, me será dado.” (Sermão 83, 2)
*Frei Arthur Vianna
Ferreira, osa.
https://agostinianos.org.br/artigo/o-perdao-e-o-homem-em-relacao/
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