Mt 28,16-20
Caros irmãos
e irmãs
Celebramos
neste domingo a solenidade litúrgica da Santíssima Trindade, na qual somos chamados
a contemplar o mistério da identidade de Deus Uno e Trino. A Liturgia da Palavra
que a Igreja indica para este dia nos convida a aprofundar a nossa fé trinitária,
colocando em evidência que Deus veio falar de si mesmo ao homem, revelando quem
Ele é.
Na primeira
Leitura, extraída do Livro do Deuteronômio (cf. Dt 4,32-34.39-40), escutamos as
palavras de Deus a Moisés, que lembram como Deus escolheu um povo e a ele se manifestou
de modo particular. Com isso, Israel se torna o destinatário da sua manifestação.
E, através de Moisés, falou ao povo eleito: “Interroga os tempos antigos que te
precederam, desde o dia em que Deus criou o homem sobre a terra… se houve jamais
um acontecimento tão grande, ou se ouviu algo semelhante. Existe, porventura, algum
povo que tenha ouvido a voz de Deus falando-lhe do meio do fogo, como tu ouviste,
e tenha permanecido vivo?” (cf. Dt 4,32-33).
Com estas
palavras, Moisés recorda a manifestação de Deus no Monte Sinai e a entrega dos dez
mandamentos, como também a sua experiência pessoal no Monte Horeb. Naquela ocasião,
Deus se revelou por meio de uma sarça ardente
e confiou a esse mensageiro a missão de libertar Israel da escravidão do Egito,
e lhe revelou o próprio nome: “Eu sou Aquele que sou!” (cf. Ex 3,1ss). O texto oferece
uma rica meditação sobre a história salvífica, que consolida a fé no único Deus,
e recorda a sua misericórdia para com seu povo.
Na segunda
leitura, vemos que São Paulo ensina a dimensão trinitária da existência cristã (Rm
8,14-17). O primeiro aspecto desta existência
é nossa condição filial. O Apóstolo proclama que recebemos no Batismo o Espírito
Santo, que de tal modo nos une a Cristo e nos liga ao Pai como filhos e, por isto,
podemos dizer “Abá, ó Pai!” (v. 15). Com esse Sacramento da iniciação somos inseridos
na comunhão trinitária. Cada cristão é batizado em nome do Pai e do Filho e do Espírito
Santo sendo, assim, imerso na vida de Deus. Um grande dom e um grande mistério!
Em consequência
disso, compreendemos nossa filiação divina: “Se somos filhos, somos também herdeiros
de Deus e co-herdeiros de Cristo” (v. 17). Isto é, como filho, o cristão participa
da vida divina, usufruindo dos bens oferecidos. Observa-se que o termo herdeiro
não tem a concepção moderna de dispor dos bens após a morte do proprietário, mas
tem o sentido de tomar posse. Aliás, a herança que Deus concede a Israel é precisamente
a posse de uma nova terra (cf. Is 60,21). Somos co-herdeiros da glorificação de
Cristo, na medida em que também sofremos com Ele. E como filhos de Deus, haveremos
de herdar a glória divina, esplendor da vida de Deus na pessoa de Cristo.
A partir do
batismo, o cristão estabelece uma relação específica com Deus, em cada uma das pessoas
divinas. A propósito, é possível fazer uma ligação desta segunda leitura com o texto
evangélico, no encontro entre Jesus e os seus Apóstolos. A eles Jesus afirma que
lhe foi dado todo o poder no céu e na terra (v. 18). Esta expressão “céu e terra”,
para os antigos, englobava a criação inteira. Como de fato, a Sagrada Escritura
começa dizendo que “no começo Deus criou o céu e a terra” (Gn 1,1-2). Portanto,
isto indica que Jesus recebeu de Deus um poder que abrange todo o universo. Mas
Jesus não guarda para si este poder que o Pai lhe confiou; comunica-o aos seus discípulos,
aos quais cabe a missão de dar continuidade à sua obra, fazendo chegar a salvação
a todos, pela pregação evangélica e pelo batismo. E, neste momento, os envia para
evangelizar os povos e batizar “em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo” (Mt
28, 18-19).
Na teologia
paulina Deus se manifesta como aquele que dá a vida por meio de Cristo, único Mediador.
Da mesma forma o fazemos na nossa profissão de fé, ao confessar que o Espírito Santo
é Senhor e dá a vida. Por obra do Espírito Santo os crentes são constituídos filhos
no Filho, como escreve São João no seu Evangelho (cf. Jo 1,13). Por isto, com o
batismo, somos inseridos na comunhão trinitária. Cada cristão é batizado no nome
do Pai e do Filho e do Espírito Santo; é imerso na vida de Deus. Que grande dom
e grande mistério! Estes textos bíblicos
nos guiam para aprofundar o mistério trinitário, que conduz desde Moisés até Cristo.
O mistério manifestado a Moisés junto da sarça ardente foi revelado plenamente em
Cristo na sua referência trinitária. Por meio dele, de fato, nós descobrimos a unidade
da divindade, a trindade das Pessoas.
O mistério
da Santíssima Trindade é o mistério central da fé e da vida cristã. É o mistério de Deus em si mesmo, portanto, fonte
de todos os outros mistérios da fé, é a luz que nos ilumina. Deus deixou vestígios
do seu ser trinitário na sua obra de Criação e na sua Revelação ao longo do Antigo
Testamento. Mas a intimidade do seu ser,
contemplado em três pessoas, constitui um mistério inacessível à pura razão e até
mesmo à fé de Israel antes da Encarnação do Filho de Deus e da missão do Espírito
Santo.
São Paulo,
em suas cartas, faz referência à Santíssima Trindade: “A graça do Senhor Jesus Cristo,
o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós!” (2Cor 13,12).
Também o Evangelista São João: “O Pai e eu somos um” (Jo 14,9-10). O Apóstolo Filipe certa vez pediu a Jesus para
lhe mostrar o Pai e Jesus lhe respondeu: “Tu não me conheces, Filipe? Quem me vê,
vê o Pai… Não crês que estou no Pai e o Pai está em mim?” (Jo 14,8ss). Quanto ao
Espírito, Ele é o sopro mesmo de Deus, a realidade pela qual Deus se comunica pela
mediação eterna do Filho.
A Igreja repete
incessantemente este louvor à Santíssima Trindade. A oração cristã inicia com o
sinal da Cruz, ao mesmo tempo em que dizemos: “Em nome do Pai, do Filho e do Espírito
Santo”, e conclui-se, com frequência, com a doxologia trinitária: “Por nosso Senhor
Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo, por todos os séculos dos
séculos”. Quando professamos a nossa fé, dizemos: “Creio no Espírito Santo, Senhor
que dá a vida, e procede do Pai; e com o Pai e o Filho é adorado e glorificado:
Ele que falou pelos profetas” (Credo Niceno-Constantinopolitano).
Por várias
vezes os monges, após a recitação de cada Salmo, inclinam em sinal de adoração à
Santíssima Trindade dizendo: “Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo”. Também
quando começamos a Santa Missa, fazemos o Sinal da Cruz dizendo: “Em nome do Pai,
do Filho e do Espírito Santo”; e com frequência o sacerdote saúda os fiéis lembrando
as três pessoas da Santíssima Trindade: “A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, o
amor do Pai e a comunhão do Espírito Santo estejam convosco”. E, mais uma vez, ao
concluir a Santa Missa, o sacerdote abençoa os fiéis invocando a Santíssima Trindade.
As últimas
palavras do texto evangélico deste domingo são confortadoras, pois Jesus promete
aos seus discípulos a sua assistência: “Eis que estou convosco todos os dias até
o fim do mundo” (v. 20). No começo ele fora
anunciado como o “Emanuel”, isto é, como o “Deus conosco” (Mt 1,23) e agora, após
a ressurreição, ele continua sendo o “Deus conosco!”. Ele continua presente pela
sua Palavra e pela Eucaristia.
Neste último
domingo do mês de maio, o mês mariano, uma vez mais peçamos a intercessão da Virgem
Maria por cada um de nós. Nela, Deus preparou para si uma morada digna, para que
fosse completado o mistério da salvação e foi no seu seio que o Salvador do mundo
se fez homem e veio habitar entre nós. Maria,
a humilde serva do Senhor, acolheu a vontade do Pai e concebeu o Filho por obra
do Espírito Santo. Que o seu exemplo de santidade e vida nos ajude a crescer sempre
mais na fé e na santidade. Assim seja.
Dom Anselmo Chagas de Paiva, OSB
Mosteiro de São Bento/RJ
https://saojudastadeucgrj.org.br/2018/05/25/solenidade-da-santissima-trindade-ano-b/
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