Agir como cristão numa pandemia partidarizada
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Francisco Borba Ribeiro Neto
Diante da pandemia
e da polarização, a primeira característica do cristão maduro é a tranqüilidade,
que vem da confiança em Deus
Nesses
três meses iniciais de 2021, tanto a pandemia por Covid-19 quanto a polarização
partidária cresceram de forma assustadora no Brasil. A partidarização contamina
as ações em prol da saúde pública e parece que muitas pessoas estão mais interessadas
em fortalecer suas posições políticas do que em ver a população brasileira superar
a pandemia.
Muitas coisas
podem ajudar, nenhuma delas pode dar garantias
A Covid-19
é uma doença novíssima. A ciência realizou um feito maravilhoso produzindo em tão
pouco tempo vacinas viáveis contra o vírus, com todos os limites e incertezas que
ainda as cercam. Mas todas as iniciativas têm algo de experimental e só no futuro
teremos procedimentos realmente confiáveis e certificados contra o vírus. Muito
do que é feito agora nasceu da análise de erros e acertos verificados em epidemias
passadas.
As soluções
não dependem apenas do que é proposto, mas também de como a proposta é realizada.
Mesmo com medicamentos já bem conhecidos, sabemos que uma dosagem muito baixa não
ajudará a curar a doença e uma dosagem excessiva pode até matar. Grande quantidade
de fármacos está sendo testada no tratamento de pacientes com Covid-19.
É quase certo que teremos protocolos clínicos onde alguns desses produtos serão
incluídos, com grande benefício para os doentes. Contudo, por mais sucesso que tenham
ou venham a ter, esses medicamentos não estão suficientemente estudados e nem seus
tratamentos clínicos são suficientemente seguros para que possamos confiar exclusivamente
neles para enfrentarmos a pandemia. Nem podem ser absolutamente descartados. A armadilha
ideológica, que só traz mais mortes, está nas tentativas de respostas absolutas
– tudo ou nada – e na transformação de uma questão sanitária em questão partidária.
O distanciamento
social e as medidas de higiene são procedimentos clássicos na luta contra epidemias.
Médicos usando máscaras em hospitais, pacientes relativamente “isolados” em casa,
só usando utensílios destinados a eles, lavados à parte daqueles usados pelo restante
da família, são práticas comuns diante de doenças contagiosas. Os planos de saúde
pública contra Covid-19, que vão desde o simples incentivo ao uso de máscaras ao
lockdown mais extremado, são aplicações estendidas desses procedimentos tradicionais.
Têm um custo econômico e social elevado, dependendo muito de como são implementados para se mostrarem efetivos.
Medidas
de isolamento social podem ser ineficazes se a população não adere a um plano de
isolamento e continua se aglomerando de forma desnecessária; se os trabalhadores
de “serviços essenciais” continuam tendo de se aglomerar em transportes públicos
ou se expõem ao vírus sem proteção adequada; se em bairros de baixa renda não se
tem como isolar os infectados que convivem com familiares e vizinhos, espalhando
o vírus. O problema pode não ser a eficiência do isolamento social em si, mas sim
as limitações da forma pela qual está sendo implementado.
E os desempregados?
E os que perdem seus empreendimentos?
A relação
entre aumento do isolamento/distanciamento social, queda da economia e aumento da
pobreza é bastante complexa. Cada país tem sua própria estrutura econômica e social,
que responde a seu modo ao impacto da pandemia e das medidas restritivas. Além disso,
o fator cultural pesa muito. As perdas econômicas são tanto menores quanto mais
a população está preparada para enfrentar a pandemia, adotando medidas sanitárias
efetivas e bem praticadas, evitando contatos desnecessários e se protegendo nas
atividades necessárias.
Na Europa,
enquanto Alemanha, França e Espanha, que enfrentaram períodos de lockdown e grandes
restrições à economia, tiveram quedas no PIB entre 5 e 11% em 2020. A Suécia, que
não praticou essas medidas, teve queda do PIB de apenas 2,8% – muito menor do que
a dos países anteriormente citados.
Contudo,
os demais países nórdicos (Dinamarca, Noruega e Finlândia), tiveram resultados econômicos
similares e até melhores, com medidas restritivas e mortalidade por Covid-19 muito
menores, entre 60 e 90% da taxa sueca por habitante.
Mortes
e perdas econômicas são inevitáveis numa pandemia. Pior, costumam andar juntas:
quanto mais mortes, mais prejuízo para a economia. Uma suposta contraposição entre
salvar vidas ou salvar empregos não existe. A economia, para ser menos impactada,
precisa de segurança, atividades ordenadas e recuperação rápida da sociedade. Um
lockdown relativamente curto, seguido por um período com restrições severas, mas
seguidas por todos e bem orientadas, e medidas de incentivo e apoio aos setores
mais prejudicados, será muito menos prejudicial para a economia do que um longo
período de tentativas desastradas de conter a pandemia, população desorientada e
ações paternalistas para minimizar a pobreza (ainda que essas últimas possam ser
necessárias num momento de crise aguda).
Confiança,
fraternidade e solidariedade
Nossa
fé seria um adereço inútil se não nos desse luzes para atravessar um período como
esse. Para isso, temos de escutar os mais sábios na fé – e entre esses se sobressai,
nesse momento, o Papa Francisco – e nos acompanharmos mutuamente como comunidade.
Diante
da pandemia e da polarização, a primeira característica do cristão maduro é a tranqüilidade,
que vem da confiança em Deus. Não se trata de uma fé cega ou indiferente, que não vê os sofrimentos
do mundo. Trata-se de uma certeza, que vem da vivência de quem experimentou o amor
de Deus e sabe que um futuro bom sempre nos aguarda, por maiores que sejam as dificuldades.
Essa
tranqüilidade não gera apatia, mas sim interesse e compromisso com tudo que acontece.
Por isso, procuramos nos apoiar e nos orientarmos mutuamente num período de opiniões
tão extremas e apaixonadas. Nosso esforço, enquanto comunidade, não é a de “vencer
os outros” num debate. Não nos alegramos quando as propostas do outro se mostram
falhas. Pelo contrário, sofremos porque sabemos que isso significará mais mortes.
O tempo todo procuramos os argumentos a favor e contra todas as posições, pois não
debatemos para convencer os outros, mas para encontrarmos juntos a verdade.
A fraternidade
não é uma postura teórica (ainda que os debates conceituais sejam importantes nesse
momento). Ela se manifesta em gestos concretos de ajuda mútua. As grandes perguntas
ainda são: “posso ajudar em alguma coisa? de que forma?”.
Por fim,
somos chamados a viver a solidariedade para com todos. Precisamos praticar gestos
de ajuda material às obras e comunidades que atendem os mais desassistidos com essa
tragédia mundial. É importante seguirmos as regras de segurança sanitárias. Mesmo
que não concordemos com algumas, temos que perceber que, se alguns seguem e outros
não, os resultados serão incertos e acarretarão mais males no futuro. Pedir a vacina
para os mais fragilizados e para os profissionais que enfrentam maiores riscos,
não “furar filas” quando não estamos particularmente em risco, também são atitudes
fundamentais.
O exemplo
dos cristãos não é secundário nesse momento. Deus nos fala e nos solicita com essa
pandemia.
https://pt.aleteia.org/2021/03/21/agir-como-cristao-numa-pandemia-partidarizada/
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