São Jerônimo e o trabalho de tradução da Sagrada Escritura
Gustavo Ramos
Neste 30 de setembro, a Igreja celebra a memória litúrgica do Santo que viabilizou a Bíblia Vulgata, a edição comum a todo o Ocidente dos textos bíblicos.
Estátua de São Jerônimo em Belém
São
Jerônimo nasceu na região da Dalmácia no começo do século IV. Seu pai, um homem
de posses, mandou seu filho a Roma, depois de completados os estudos básicos,
para estudar Retórica e Gramática, o que seria a base de seu trabalho para a
tradução dos textos sagrados. Na Cidade Eterna, Jerônimo estudou sob a direção
do famoso gramático chamado Donato.
Batizado
em 366 d.C. pelo Papa Libério, Jerônimo dedicou-se aos estudos e à oração. No
ano seguinte, em 367 d.C., o Santo viajou para a corte do Imperador
Valentiniano I (364-375), em Tréveris. Lá ele travou conhecimento do legado de
Santo Atanásio de Alexandria, que viveu na cidade em exílio e nela introduziu a
vida monástica no Ocidente.
Jerônimo,
então, abraçou a vida monástica e se interessou pelos estudos teológicos.
Mudou-se para Aquileia e, com alguns amigos, viveu uma vida de oração e estudo.
Em 374 d.C., São Jerônimo dirigia-se com alguns companheiros para Jerusalém,
mas foi obrigado a permanecer em Antioquia devido a uma doença que lhe atingiu.
Na cidade, conheceu Apolinário de Laodiceia, amigo íntimo de Santo Atanásio,
fato que o incentivou a viver uma vida de ermitão no deserto de Cálcis.
No
deserto, começou a copiar livros, a aperfeiçoar-se no grego e a aprender
hebraico com um judeu convertido. Após três anos de vida eremítica, Jerônimo
voltou à cidade para resolver uma controvérsia teológica que havia surgido
entre seus amigos monges. Em Antioquia, foi ordenado bispo. Viajou para
Constantinopla, sede à época do Império Romano, e depois se dirigiu para Roma.
Em Roma,
a pedido do Papa Dâmaso, Jerônimo começou a revisar as traduções latinas dos
textos bíblicos que existiam na época, o que foi o começo do trabalho hercúleo
de tradução de toda a Sagrada Escritura para o latim.
A
Vulgata
O termo
vulgata tem origem na palavra latina vulgus,
que significa “multidão” ou “público”. A Bíblia Vulgata, portanto, foi feita
com a intenção de ser a edição comum a todo o Ocidente dos textos bíblicos.
Variadas
e carentes de autoridade e cientificidade, as traduções anteriores para o latim
eram realizadas a partir de provincialismos de cada região e de esforços
individuais. As traduções eram tantas, que Santo Agostinho dizia que qualquer
um que tivesse um manuscrito grego e soubesse latim se aventurava a traduzir os
textos.
Os esforços de tradução de São Jerônimo ocorreram em três etapas. Na primeira, ele se preocupou em revisar a tradução latina dos quatro Evangelhos a partir dos manuscritos gregos. Em um segundo momento, em 387, quando estava em Belém, Jerônimo começou a revisão dos textos latinos do Antigo Testamento a partir de uma versão grega da Septuaginta.
A terceira etapa, a mais trabalhosa, foi a
tradução para o latim dos textos hebraicos do Antigo Testamento. Seu objetivo
em realizar a tradução era evitar a alegação de judeus da época de que os
cristãos não tinham acesso ao texto verdadeiro das Escrituras.
O texto
de São Jerônimo apresentava três qualidades marcantes, que logo fizeram dessa
versão a mais usada pela Igreja latina:
1. A primeira e principal característica é a clareza de exposição. De maneira geral, pode-se afirmar que nenhum dos tradutores anteriores a Jerônimo expressava o real sentido dos textos como ele, mesmo se, às vezes, o Santo cometesse um pequeno deslize. Para tornar o sentido do texto claro, ele, algumas vezes, adicionava uma palavra, traduzia os nomes hebraicos pelo seu sentido etimológico e usava expressões populares ou mitológicas.
· A segunda característica é a fidelidade da tradução. Para obter o sentido real do texto original, frequentemente São Jerônimo consultava várias versões, para traduzir com fidelidade para o latim.
· A terceira característica é a elegância. Frases hebraicas, que, se traduzidas literalmente, soariam mal em latim, eram escritas por Jerônimo com uma sintaxe elegante. Frases hebraicas e longas eram quebradas, para que o texto latino corresse com naturalidade.
O Concílio de Trento, em 1546, declarou a Vulgata de Jerônimo o texto oficial da Igreja Católica, pois era o texto mais usado há mil anos pela tradição. O decreto Insuper do Concílio declarou que a “Vulgata, que tem sido aprovada pelo seu longo uso por muitos séculos pela Igreja, deve ser considerada autêntica em leituras públicas, discussões, pregações e exposição, e que ninguém pode rejeitá-la sob nenhuma circunstância”.
Entretanto,
a intenção do Concílio era afirmar a autenticidade da Vulgata em relação às
verdades de fé e da moral, e não que ela pudesse substituir os textos originais
ou não contivesse imprecisões e erros de tradução em algumas passagens.
Com o
desenvolvimento dos estudos bíblicos, principalmente a partir do começo do
século XX, foi sendo preparada uma revisão da Vulgata. Apenas em 1979 ela foi
substituída pela Nova Vulgata, que é uma tradução mais acurada, entretanto, sem
deixar de ter como base a tradução de São Jerônimo.
Fontes: The
History of the Latin Vulgate – Jonh E. Steinmmeuller; The Vulgate– Samuel Angus
https://osaopaulo.org.br/mundo/sao-jeronimo-e-o-trabalho-de-traducao-da-sagrada-escritura/
Nenhum comentário:
Postar um comentário