REFLEXÃO
DOMINICAL I
Homilética: 16º Domingo do Tempo Comum
- Ano A: "Por que Deus permite tanto mal no campo do mundo?"
A essa pergunta
nos responde a primeira leitura de hoje: “Ao pecador lhe dás tempo para que se
arrependa”. E para isso, Deus nos manda o seu Espírito que nos ajuda na nossa
debilidade (segunda leitura). Mas também temos que colocar a nossa parte:
vigilância, porque o inimigo da nossa alma não dorme e quer semear o seu joio
nos momentos de sonolência e distração da nossa parte (evangelho).
A Palavra de Deus,
em Mt 13, 24-43, nos apresenta três parábolas: O trigo e o joio, o grão de
mostarda e o fermento na massa. Na volta da Missão, nota-se a impaciência dos
Apóstolos para com aqueles que não os acolheram: “Queres que mandemos que desça
o fogo do céu para destruí-los?” Jesus critica a pressa dos Apóstolos contando
as três parábolas citadas. As parábolas evangélicas são breves narrações que
Jesus utilizava para anunciar os mistérios do Reino dos Céus. Utilizando
imagens e situações da vida cotidiana, o Senhor “deseja indicar-nos o
verdadeiro fundamento de todas as coisas. Ele mostra-nos o Deus que age, que
entra na nossa vida e quer guiar-nos pela mão” ( Bento XVl, Jesus de Nazaré,
2007). Com este tipo de discursos, o Mestre divino convida a reconhecer antes
de tudo a primazia de Deus Pai: onde Ele não está, nada pode ser bom. Trata-se
de uma prioridade decisiva para tudo. Reino dos Céus significa, precisamente,
Senhorio de Deus, e isto quer dizer que a sua Vontade deve ser assumida como o
critério-guia da nossa existência.
O tema contido no
texto do Evangelho (Mt 13, 24 – 43) é precisamente o Reino dos Céus. O “Céu” não
deve ser entendido unicamente no sentido da altura que nos ultrapassa, porque
tal espaço infinito possui também a forma da interioridade do homem. Jesus
compara o Reino dos Céus com um campo de trigo, para nos levar a compreender
que dentro de nós foi semeado algo de pequeno e escondido que, no entanto,
possui uma força vital insuprimível. Não obstante todos os obstáculos, a
semente desenvolver-se-á e o fruto amadurecerá. Este fruto só será bom, se o
terreno da vida for cultivado em conformidade com a vontade divina. Por isso,
na parábola do trigo bom e do joio, Jesus admoesta-nos que, depois da
sementeira realizada pelo dono, “enquanto todos dormiam”, interveio “o seu
inimigo”, que semeou a erva daninha. Isto significa que devemos estar prontos
para conservar a graça recebida desde o dia do Batismo, continuando a alimentar
a fé no Senhor, a qual impede que o mal ganhe raízes. Santo Agostinho,
comentando esta parábola, observa que “muitos, primeiro são joio e depois
tornam-se trigo bom”, e acrescenta: “Se eles, quando são malvados, não fossem
tolerados com paciência, não chegariam à mudança louvável” ( Quest. Sobre Ev.
Mateus, 12, 4 ).
A Igreja Católica,
sendo Santa, sempre fugiu dos diversos puritanismos, rigorismos e da
mentalidade de seita, ou seja, duma visão estreita e separatista. Ela deseja
que os seus filhos estejam no meio do mundo, convivendo com os seus iguais,
como o bom trigo, e no mesmo campo que o joio. No entanto, o trigo não se sente
mal, não se sente estranho no seu próprio ambiente. Se tivesse consciência, o
trigo saberia que aquele é o seu lugar natural, deve estar aí, nem deseja que o
plantem nos ares, aí não sobreviveria. Ainda que o joio, esta planta que
engloba os vegetais e cresce às suas custas, lhe subtraia algumas energias,
deve continuar aí no mesmo lugar.
A parábola (do
trigo e do joio) nos revela duas atitudes: a impaciência dos homens: “Senhor,
queres que arranquemos o joio?” – A paciência de Deus: “Deixai crescer junto
até a colheita…” A paciência de Deus não é simples paciência, isto é, ficar
aguardando o dia do juízo para depois punir com maior satisfação. Esta é,
muitas vezes, a falsa paciência do homem. A de Deus é longanimidade, é
misericórdia, é vontade de salvar. Ou desprezas as riquezas da sua bondade,
tolerância e longanimidade, desconhecendo que a bondade de Deus te convida ao
arrependimento? (Rm 2, 4 ). Ele é, de verdade, como cantou o salmo 85(86), um
Deus de piedade, cheio de compaixão, lento para a cólera e cheio de amor, um
Deus fiel.
O mundo é o campo
em que o Senhor semeia continuamente a semente da sua graça: semente divina
que, ao arraigar nas almas, produz frutos de santidade. Com que amor Jesus nos
dá a sua graça! Para Ele, cada homem é único, e, para redimi-lo, não vacilou em
assumir a nossa natureza humana.
O campo é, sim, o
mundo, mas é também a Igreja: lugar em que há espaço para crescer, converter-se
e, sobretudo, para imitar a paciência de Deus. “Os maus existem no mundo ou
para que se convertam, ou para que por eles os bons exercitem a paciência”
(Santo Agostinho).
A parábola não
perdeu atualidade: muitos cristãos dormiram e permitiram que o inimigo semeasse
a má semente na mais completa impunidade; surgiram erros sobre quase todas as
verdades da fé e da moral. “Está claro: o campo é fértil e a semente é boa; o
Senhor do campo lançou às mãos cheias a semente no momento propício e com arte
consumada; além disso, preparou toda uma vigilância para proteger a recente
sementeira. Se depois apareceu o joio, é porque não houve correspondência, já
que os homens – os cristãos especialmente – adormeceram e permitiram que o
inimigo se aproximasse” (São Josemaria Escrivá, Cristo que passa, 123 ).
É necessário que
vigiemos dia e noite, e não nos deixemos surpreender; que vigiemos para
podermos ser fiéis a todas as exigências da vocação cristã, para não deixarmos
prosperar o erro, que leva rapidamente à esterilidade e ao afastamento de Deus.
É necessário que vigiemos sobretudo o nosso coração, sem falsas desculpas de
idade ou de experiência, pois “ o coração é um traidor, e tem que estar fechado
a sete chaves” (Caminho, 188).
Diz Jesus: “o joio
são os filhos do Maligno, e o inimigo, que o semeou, é o demônio” (Mt 13, 39).
O inimigo de Deus e das almas sempre lançou mão de todos os meios humanos
possíveis. Vemos, por exemplo, que ora se desfiguram umas notícias, ora se
silenciam outras; ora se propagam ideias demolidoras sobre o casamento, por meio
dos seriados de televisão de grande alcance, ora se ridiculariza o valor da
castidade e do celibato; defende-se o aborto ou a eutanásia, ou semeia-se a
desconfiança em relação aos sacramentos e se dá uma visão pagã da vida, como se
Cristo não tivesse vindo redimir-nos e lembrar-nos que o Céu nos espera. E tudo
isto com uma constância e um empenho incríveis. O inimigo não descansa!
A parábola
constitui, pois, um convite universal à vigilância, a não deixar passar em vão
a hora da graça e a estar preparados para a ceifa, porque tal como o joio é
apanhado e queimado no fogo, assim será no fim do mundo”. Então, “todos os que
fazem outros pecar e os que praticam o mal, serão lançados na fornalha de fogo,
enquanto os justos brilharão como o sol no Reino de Seu Pai” (Mt 13, 40-43).
A abundância do
joio só pode ser enfrentada com maior abundância de boa doutrina: vencer o mal
com o bem (Rm 12, 21), com o exemplo da vida e a coerência da conduta. O Senhor
nos chama para que procuremos a santidade no meio do mundo, no cumprimento dos
deveres cotidianos.
O joio e o trigo
estão presentes em toda parte: Mesmo em nossas comunidades cristãs vemos
presente tanto joio de desunião, de inveja, de fofocas…
Fiquemos atentos
pois, dentro de cada um de nós, há trigo e joio! Peçamos ao Senhor para que
sejamos trigo de amor, dedicação e colaboração. Que seja afastado de nós o joio
do ódio, da discórdia, da calúnia, da vontade de ser grande, das disputas, do
ciúme, da falta de oração. De onde vem esse joio? O Senhor nos alerta que veio
do inimigo. O inimigo é o pai da mentira, da separação, da discórdia. São em
momentos assim que precisamos “voltar ao primeiro amor”, recordar o nosso
primeiro chamado, aquele chamado simples e confiante em Deus.
Existe o bem e o
mal dentro de cada um, de cada coração dividido. Separar então o joio é um
movimento cirúrgico, pois se trata de tirar de cada coração humano aquilo que é
mentira, que é orgulho, para que fique só a Cristo. Deus tem sido paciente
conosco, sejamos também com o próximo, até que todo joio seja extirpado nas
nossas vidas.
Que elementos de
“joio” encontro em mim? Tenho sido um instrumento paciente para ajudar na
separação do joio e do trigo?
É preciso saber
valorizar a semente de trigo presente no coração de cada pessoa; cultivá-la com
paciência e profundo respeito. Respeitar o processo de amadurecimento de cada
pessoa, usando de paciência.
Procuremos ser a
semente de mostarda, pequena, insignificante, mas que cresce até aninhar os
pássaros em seus ramos. Devemos ser o fermento, que leveda toda a massa da
farinha, o mundo em que vivemos…
O fermento é
também figura do cristão! Vivendo no meio do mundo, sem se desnaturalizar, o
cristão conquista com o seu exemplo e com a sua palavra as almas para o
Senhor. “A nossa vocação de filhos de Deus, no meio do mundo, exige-nos
que não procuremos apenas a nossa santidade pessoal, mas que vamos pelos
caminhos da Terra, para convertê-los em atalhos que, através dos obstáculos,
levem as almas ao Senhor; que participemos, como cidadãos normais e correntes,
em todas as atividades temporais, para sermos levedura que há de fermentar toda
a massa” (Cristo que passa, nº 120).
Somos convidados a
imitar a misericórdia do Pai celeste, aceitando pacientemente as dificuldades
provenientes da convivência com os inimigos do bem e tratá-los com bondade
fraterna na esperança de que, vencidos pelo amor, mudem de comportamento.
Deve-se recorrer também à oração, para que o Senhor defenda os seus filhos de
serem contagiados. “Que o Espírito Santo venha em auxílio de nossa fraqueza,
pois não sabemos o que pedir… É que o Espírito intercede pelos cristãos de
acordo com a vontade de Deus” (Rm 8, 26-27). Há que deixar em Suas mãos a causa
do bem!
Diz o Livro da
Sabedoria: “Não há fora de Vós um Deus que se ocupa de tudo… Porque a vossa
força é o fundamento da vossa justiça e o fato de serdes Senhor de todos
torna-vos indulgente para com todos” (Sb 12, 13.16); e o Salmo 85 confirma-o:
“Porque Vós sois clemente e bom, Senhor, cheio de misericórdia para com aqueles
que Vos invocam” (v. 5). Portanto, se somos filhos de um Pai tão grande e bom,
procuremos assemelhar-nos a Ele! Esta era a finalidade que Jesus se propunha
com a sua pregação; com efeito, a quantos O ouviam, Ele dizia: “Sede perfeitos,
como o vosso Pai que está nos Céus é perfeito” (Mt 5, 48). Dirijamo-nos com
confiança a Maria, que no dia 16 pudemos invocar com o título de Nossa Senhora
do Carmo, a fim de que nos ajude a seguir fielmente Jesus e, deste modo, a
viver como verdadeiros filhos de Deus.
https://www.icatolica.com/2017/07/homiletica-16-domingo-do-tempo-comum.html
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