REFLEXÃO
DOMINICAL III
16º DOMINGO DO TEMPO COMUM – 23 de julho
Por Aíla L. Pinheiro de Andrade, nj (*)
O Senhor é bom, clemente e
fiel! (Sl 85,5)
- Introdução geral
O evangelho de domingo passado
apresentou o reino de Deus como uma semeadura. O evangelho de hoje desenvolve
mais profundamente esse tema por meio de outras parábolas. O mundo é um campo
misto, em que o trigo e o joio crescem; e é impossível discernir, neste mundo,
onde está o trigo e onde está o joio, uma vez que estão bem misturados.
Portanto, Deus nos chama à paciência enquanto nos esforçamos para ser o bom
trigo que alimenta o mundo sedento de Deus. Deus nos convida a perdoar, a não
julgar, a não querer cortar o joio antes que a obra divina se plenifique no fim
dos tempos. Cortar o joio é uma ação divina, não cabe a nós. Rejeitar pessoas,
não as acolher porque são consideradas joio, é um disparate, pois o joio também
está em nós.
II – Comentário dos textos bíblicos
- Evangelho (Mt 13,24-43):
“Sois amor, paciência e perdão” (Sl 85,15)
Jesus nos pede paciência. Ele nos
ensina, com a própria vida, que somos capazes de existir e de dar frutos num
mundo plural, numa época em que o bem e o mal estão misturados. Portanto, não
devemos julgar prematuramente. Não devemos transformar o mundo num campo de
batalha, cada um querendo eliminar o seu adversário. Certamente existe o joio,
mas não é possível traçar uma linha no chão e dizer “deste lado está o bem e do
lado de lá está o mal”. O joio está tão misturado com o trigo, que se encontra
também em nós. Somente no fim dos tempos Cristo poderá separar o joio do trigo.
Por enquanto, permanece o mundo
paradoxal. O texto mostra que há uma oposição entre duas sementes, dois
semeadores, entre o tamanho da semente e o tamanho da hortaliça e entre a
quantidade de fermento e a quantidade da massa. As oposições convivem no mundo.
Os servos do dono da casa querem antecipar o juízo dentro da história,
destruindo o joio à força. Esta é a tentação de nosso momento histórico,
queremos eliminar as oposições pela força da violência contra o outro que temos
por adversário.
Cristo, ao contrário, não entende o
mundo como um campo de batalha e deixa a sua semente crescer e amadurecer no
meio do joio. O joio deve ser respeitado. Um mundo onde só existe o trigo é
outro tipo de mundo, no qual se vive plenamente o amor. Se formos intolerantes
com as pessoas, se não as acolhermos, isso mostra que o joio está em nós,
porque não estamos produzindo frutos de amor, mas de violência velada e sutil.
E violência é fruto do joio semeado no coração.
Os verdadeiros cristãos são um número
pequeno, são como a mostarda e o fermento, mas como a força do trigo é o amor,
esses poucos e verdadeiros cristãos fazem com que este mundo caminhe para uma
plenitude. Enquanto não chega o fim dos tempos, devemos agir como Deus age,
sendo “amor, paciência e perdão” nas nossas convivências cotidianas, esperando
a hora em que a separação entre o trigo e o joio finalmente aconteça.
- I leitura (Sb
12,13.16-19): o Senhor concede o perdão aos pecadores
Deus é o Senhor absoluto de todas as
criaturas e não há outro Deus: essa é a afirmação bíblica do monoteísmo. Apesar
de sua onipotência, ele prefere agir com misericórdia em relação às suas
criaturas. O domínio de Deus sobre as criaturas estende o amor dele sobre todos
os seres, com especial atenção ao ser humano, mais digno de misericórdia porque
é o único que peca. Isso não significa que Deus não é justo, mas que nele se harmonizam
misericórdia e justiça.
Todas as ações dos seres humanos são
transparentes aos olhos de Deus, por isso ele não se engana quando age em
relação a eles. E em todas as ações divinas estão presentes a justiça e a
misericórdia.
O modo como Deus age em relação aos
incrédulos e aos pecadores leva o autor do livro da Sabedoria a tirar uma dupla
conclusão. Primeiramente, se Deus agiu com misericórdia para com aqueles que o
rejeitam, tanto mais fará um julgamento misericordioso para com o povo
escolhido. Em segundo lugar, Israel deve agir para com todos os povos,
igualmente, com misericórdia, a exemplo de Deus, misericordioso e compassivo.
Ao levar a sério o monoteísmo, Israel
teve uma lição de humanismo, teve de ir além da lei do “olho por olho”. Isso
preparou o povo para a revelação do Novo Testamento sobre o amor aos inimigos.
O texto do livro da Sabedoria também sugere que a salvação é para todos os
povos, e isso prepara o anúncio da salvação universal feita pela Igreja
primitiva.
Contudo, o mais importante nesse texto
da segunda leitura é a noção sobre o agir de Deus na história, não apenas em
favor de Israel, mas também dos povos incrédulos e pecadores. A ação divina
visa à integração do pecador na comunidade dos que estão sendo santificados.
Mesmo quando as pessoas praticam o mal, a indulgência de Deus não as trata como
merecem. Pois a justiça de Deus é pedagógica, não visa à condenação eterna, mas
à correção do ser humano, para que viva a plenitude para a qual foi criado com
amor.
- II leitura (Rm 8,26-27):
“O Espírito vem em socorro da nossa fraqueza” (v. 26)
A segunda leitura objetiva,
primeiramente, assegurar que a salvação não é obra humana; é um dom de Deus por
amor aos pecadores. A salvação nos vem por intermédio de Jesus Cristo, e a
santificação, pelo Espírito Santo. A santificação é realizada ao longo de nossa
existência numa configuração de nossa vida ao modo como Cristo viveu, ou seja,
fazendo a vontade de Deus.
Mas é difícil ajustarmo-nos à vontade
divina; em muitos momentos da vida, nem mesmo a sabemos discernir. Não sabemos
sequer o que pedir a Deus, e muitas vezes, sem saber, insistimos com ele para
que nos conceda algo que poderá ser prejudicial a nós ou aos outros. Somos como
bebês que tentam se comunicar sem ainda poder articular palavras compreensíveis,
que fazem sons sem sentido como reação às palavras, olhares e carinhos dos
adultos. O Espírito Santo, em nós, faz a mediação, transmitindo ao Pai o que
não conseguimos expressar devido à nossa pequenez, à nossa fragilidade.
No domingo passado, Paulo havia
afirmado que a criação inteira geme. Na leitura de hoje, afirma que os cristãos
gemem e que também o Espírito Santo geme. Isso significa que os cristãos são
tão frágeis quanto o restante da criação. O Espírito se faz solidário a nós,
não tira a nossa fraqueza, mas nos ajuda em nossa debilidade. Sem a ajuda do
Espírito Santo, não saberíamos sequer o que dizer a Deus em nossas orações.
Mesmo quando pensamos que sabemos o que devemos pedir, podemos estar totalmente
equivocados.
O dom do Espírito Santo é a prova de
que Deus cuida de nós em todos os sentidos. Em tudo ele quer nos auxiliar, até
mesmo em nos ajudar a acolher o dom da salvação que nos é oferecido. Pois é o
Espírito Santo que permite ao ser humano receber o dom da salvação e o ajuda a viver
na fidelidade à tão grande graça que lhe é ofertada.
III.
Pistas para reflexão
Enfocar na homilia que o reino de Deus
não vem de modo esplêndido, extraordinário, com fenômenos apocalípticos. Em
sintonia com a mensagem de Jesus, o Reino vai sendo edificado de maneira
oculta, como um grão de mostarda, quase invisível no meio da terra, em meio a
uma pequena horta, ou como um pouco de fermento na massa do bolo. Imagens do
cotidiano são usadas por Jesus para simbolizar o Reino que se edifica a partir
de ações do nosso dia a dia, no amor, na misericórdia, na paciência e no perdão
para com os semelhantes, na intercessão pelos pecadores, no cuidado
disponibilizado a quem precisa. E, principalmente, na docilidade ao Espírito
Santo, que nos auxilia a ter uma vida de oração e a orar corretamente.
Aíla L.
Pinheiro de Andrade, nj (*)
Aíla L. Pinheiro de
Andrade, nj, é graduada em Filosofia e em Teologia. Cursou mestrado e doutorado
em Teologia Bíblica pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, FAJE (MG).
Atualmente, leciona na pós-graduação em Teologia na Universidade Católica de
Pernambuco, UNICAP. É autora do livro Eis que faço novas todas as coisas –
teologia apocalíptica (Paulinas). E-mail: aylanj@gmail.com
https://www.vidapastoral.com.br/roteiros/16o-domingo-do-tempo-comum-23-de-julho/
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