sábado, 15 de março de 2025

IX- REFLEXÃO DOMINICAL III =CONVERTIDOS E TRANSFORMADOS PELA PRESENÇA DE CRISTO Pe. Paulo Sérgio Silva- Diocese de Crato “Este é o meu Filho, o Escolhido. Escutai o que ele diz!” (Lc 9, 35

 

 

I-             REFLEXÃO DOMINICAL III

 

CONVERTIDOS E TRANSFORMADOS PELA PRESENÇA DE CRISTO

Pe. Paulo Sérgio Silva- Diocese de Crato

Este é o meu Filho, o Escolhido. Escutai o que ele diz!” (Lc 9, 35)

Quaresma é sempre um tempo oportuno para iniciar nossa conversão, por isto, a Palavra deste domingo convida-nos a subir ao Monte, e iluminados por Jesus Cristo, abandonarmos as vestes maculadas do homem velho (pecado) e receber de Deus as vestes esplendentes do homem novo, identificando-nos com Cristo e sua ressurreição. Somos convidados a contemplar o mistério mais profundo de Jesus, reconhecer sua identidade de Filho e nos comprometermos a escutá-lo.

primeira leitura (Gn. 15,5-12.17-18) nos coloca diante da primeira aliança realizada entre Deus e Abraão, o pai daqueles que tem fé. A promessa feita a Abraão é humana e aparentemente irrealizável, afinal ele já é por demais idoso e não gerou filhos com Sara, sua esposa. Deus lhe propõe um rito de Aliança para atestar a fidelidade da palavra divina. Todavia em meio ao rito, Deus atrasa sua manifestação para provar a sua fé. Abraão não desiste e persevera. E eis que no cair da escuridão da noite, Deus se manifesta para aquele que se mantinha firme e fiel na sua palavra. Com Abraão, somos convidados a “acreditar”, mesmo quando humanamente pareça ser vã a nossa esperança (Rm 4,18-22). Ter a uma atitude de confiança total e de entrega plena aos desígnios de Deus que é sempre fiel às promessas, será sempre a meta de vida de todo cristão.

Na segunda leitura (Fl 3,17-4,1) São Paulo convida aos cristãos a seguir seu exemplo sendo imitadores de Cristo e renunciando a atitude de orgulho, prepotência, autossuficiência e egoísmo que podem nos tornar “inimigos da Cruz de Cristo” (Fl 3,18). Em sua sabedoria, o Apóstolo afirma que os ritos externos devem ser acompanhados por uma vida de fé coerente e fiel. Pois, enquanto buscamos a pátria celeste, permanecemos chamados a cumprir e exercer os nossos deveres de cidadãos da pátria terrestre. Afinal a nossa transfiguração acontece através de uma verdadeira conversão do coração, construída no viver cotidiano enquanto seguimos o caminho da Cruz, isto é, numa vida de amor e de doação em favor dos irmãos e irmãs.

No Evangelho (Lc 9,28b-36), antes de iniciar sua subida a Jerusalém, Jesus reúne seus discípulos, sobe com eles ao Monte e lá os prepara para viver os momentos finais de sua missão: a Paixão, a Morte e Ressurreição. Neste evangelho a transfiguração é apresentada como uma experiência pessoal de oração de Jesus (Mt 14,26; Lc 4,42; Lc 5,16; Mc 1,35-36Lc 6, 12; Mc 6, 46, Jo 6,15) e manifestação de sua divindade.

Como aconteceu com Abraão no momento de sua aliança com Deus (na primeira leitura, Gn 15,12), os apóstolos também sofrem com sono insistente e um terror diante do acontecimento (Lc 9,32.34). O sono representa o risco de não conseguir esperar pelos atos divinos e deste modo perder a presença de Deus que vem ao nosso encontro. O medo ou terror mencionados não devem ser interpretados como receio de algum malefício, mas sim como ato de reverencial respeito que é próprio daqueles que tem fé diante da manifestação divina. Pois aqui, neste singular momento, “apareceu toda a Trindade, o Pai na voz, o Filho no homem, o Espírito na nuvem luminosa” (São Tomás de Aquino – Sum. Th. 3, 45, 4, ad 2). A nuvem gloriosa que no A. T. é sempre apresentada como sinal da plena presença de Deus, aqui é usada pelo evangelista para representar também a mudança significativa e definitiva que a Encarnação do Verbo realiza no modo de Deus se relacionar com o ser humano e vice-versa. Se a Moisés foi vetada a entrada na nuvem da glória no dia da inauguração da Tenda do Encontro (Ex 40, 34-35), na transfiguração, os apóstolos são envolvidos e cobertos com a sombra da nuvem. Neste momento, a humanidade tem acesso ao mistério da glória de Deus.

Por meio do diálogo de Jesus com Moisés e Elias, os apóstolos devem compreender como será a consumada/realizada a sua vida e missão. Os atos de Jesus realizados em sua missão reproduzem os passos da história da salvação realizados na história de Israel. Assim como o povo escolhido teve que atravessar o deserto para alcançar a Terra Prometida (Ex 15,22), Jesus atravessa a região da Galileia até Jerusalém para sua glorificar Deus com sua vida (Lc 4,14). Se no A.T. Moisés sobe sozinho ao monte para encontrar-se com Deus e receber os mandamentos (Ex 24,12); aqui é o próprio Deus, física e espiritualmente, que sobe ao monte caminhando na companhia dos apóstolos (imagem do novo povo eleito), não para escrever palavras em placas de pedras, mas para revelar-se a eles e lhes falar-lhes diretamente ao coração.

Os apóstolos enxergam e ouvem os sinais fabulosos: a luz, a mudança no rosto e nas vestes, as duas ilustres figuras (Elias e Moisés), a nuvem e a voz divina. São sinais da presença de Deus no meio do seu povo. Embora fiquem deslumbrados, as palavras de Pedro revelam que eles não compreendem que aquela experiência embevecedora é na verdade a preparação para a desoladora realidade que se aproxima: a incompreensão, a traição, o abandono, sofrimentos e morte (Cruz). Todavia em face da provação, a ressurreição será a resposta de Deus à entrega confiante do Filho amado. Os apóstolos que foram agraciados com esta revelação não devem conceber este momento com um privilégio que os distingue dos demais discípulos em superioridade. Pelo contrário. Seguindo o princípio de “a quem muito foi dado, muito será cobrado” (Lc 12,48), aqueles que contemplaram a transfiguração, deverão fortalecer a fé para suportar as provações da Paixão e Morte do Mestre e mediante a fé na Ressurreição, “confirmar os seus irmãos” (Lc 22,31-32).

Os apóstolos enfrentam a tentação de querer permanecer nesse momento de revelação gloriosa, desviando o coração do caminho de sofrimento de Jesus. Como discípulos atuais, necessitamos compreender a mensagem fundamental: Jesus é o Filho amado de Deus, através de quem o Pai oferece a humanidade uma proposta definitiva de aliança, libertação e salvação.

Todavia é preciso ter consciência de que no caminho de Jesus não existem atalhos e que o plano salvador de Deus em Jesus Cristo não se realiza através de esquemas de poder, guerra, injustiça e violência, mas através da doação da vida no amor que se oferta até à morte. Aqueles que almejam a glória da ressurreição necessitam evitar cair na tentação de querer “contornar” o Calvário e a Cruz. É esse o caminho que nos conduz, à transfiguração em Humanidade Nova.

A transfiguração de Jesus é um sinal que anuncia e aponta para a futura transfiguração da humanidade que foi realizada inicialmente pela Ressurreição do Senhor. Como disse São Paulo aos cristãos de Corinto: “Todos nós, porém com rosto descoberto, refletimos com um espelho a glória do Senhor e, na mesma imagem, somos transformados, de glória em glória, pelo Espírito do Senhor” (2Cor 3,18). Portanto, ser discípulos nos obriga a continuar a obra Dele, descer o monte e “regressar ao mundo” para fazer da vida um dom e uma entrega aos irmãos e irmãs. A religião não é e não deve ser “ópio” que nos entorpece, mas uma aliança com Deus que tornamos compromisso de amor com a criação e com a humanidade inteira.

Correspondamos a voz divina que clama. Escutemos o seu Eleito, o seu Filho Unigênito (Lc 9,35).

https://diocesedecrato.org/homilia-do-2o-domingo-da-quaresma-ano-c/

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