CELEBRAÇÃO DA PAIXÃO DO SENHOR
Hoje
e amanhã, segundo uma tradição antiquíssima, a Igreja não celebra a Eucaristia.
O
altar deve estar totalmente despido: sem cruz, sem candelabros, sem toalhas.
Na
tarde deste dia, por volta das três horas (a não ser que razões de ordem
pastoral aconselhem outra hora mais tardia), faz-se a celebração da Paixão do
Senhor, que consta de três partes: liturgia da palavra, adoração da cruz e
sagrada comunhão.
Neste
dia, a sagrada comunhão só pode ser distribuída aos fiéis dentro da celebração
da Paixão do Senhor. Aos doentes que não podem tomar parte nesta celebração
pode levar-se a comunhão a qualquer hora.
O
sacerdote e os ministros sagrados, revestidos de paramentos vermelhos como para
a Missa, dirigem-se ao altar e, feita a devida reverência, prostram-se de rosto
por terra, ou, se parecer mais conveniente, põem-se de joelhos; e todos oram em
silêncio durante um breve espaço de tempo.
1ª Leitura: Is 52,13-53,12
Sl 30 (31)
2ª Leitura: Hb 4,14-16;5,7-9
Evangelho: Jo 18,1-19,42
Ó cruz, do mundo bênção,
Ó divinal troféu:
Da morte foste a portaE agora
és do céu.[1]
Celebramos hoje esta Solene Ação Litúrgica da
Paixão do Senhor. Hoje não celebramos a Eucaristia, mas adoramos aquilo o que a
Eucaristia significa: o mistério de um amor sem limites que se entrega na cruz
por nós, a fim de que tenhamos vida e vida em abundância.
A nossa celebração de hoje é constituída
por quatro partes. Primeiro, a liturgia da Palavra. Depois a Oração Universal,
onde, como Igreja, pedimos pelas necessidades do mundo inteiro. Na terceira
parte da nossa ação litúrgica teremos a Adoração[2] da Santa Cruz,
onde beijaremos o Santo Lenho expressando assim a nossa adoração do mistério do
amor de Cristo que se entrega por nós todos. Enfim, a última parte da nossa
Ação Litúrgica é a comunhão eucarística, onde comemos o Corpo de Cristo,
Sacramento Visível do seu amor crucificado pelos homens.
A Palavra do Senhor encerra para nós
hoje um tesouro abundante. A primeira leitura é o assim chamado Canto do Servo
Sofredor de Isaías. O profeta nos descreve um personagem misterioso que tomará
sobre si as dores do povo: “Meu servo, o Justo, fará justos inúmeros homens,
carregando sobre si nossas culpas”. Esse servo sofredor anunciado pelo profeta
é o Cristo. No madeiro da cruz Cristo assumiu por amor as nossas culpas. Aquele
que não tem pecado, fez-se pecado e sentiu-se pecado por nós no madeiro da
cruz. Cristo assumiu por nós uma morte humilhante e vergonhosa, a fim de que
tivéssemos vida e vida em abundância.
A cruz encerra para nós grandes bens.
Foi da cruz, do lado aberto de Cristo, que brotou sangue e água. Segundo São
João Crisóstomo, o sangue e a água que brotaram do lado aberto de Cristo são
sinais sacramentais dos sacramentos do batismo e da eucaristia. Assim como do
lado de Adão que dormia no paraíso Deus fez surgir a Virgem Eva. Do lado aberto
de Cristo que morre na cruz o Pai faz nascer a nova Virgem, a Igreja, que se
renova continuamente por estes dois sacramentos. Foi da cruz ainda que o Cristo
nos deu o seu Espírito. São João nos diz que Ele entregou o espírito. Cristo não
somente entregou o seu espírito ao Pai, mas Ele nos entregou o seu Espírito,
isto é, o Espírito Santo. Cristo é um vaso de eleição do Pai. Cristo está cheio
do Espírito. Quando Ele é quebrado na cruz, porque assumiu a fragilidade de uma
existência segundo os homens, Ele derrama sobre aquilo do que Ele está cheio,
isto é, o seu Espírito.
A cruz é, assim, a causa da nossa
salvação. Na segunda leitura da carta aos Hebreus o autor sagrado nos diz que
foi “na consumação da sua vida (que Cristo) tornou-se causa de salvação eterna
para todos os que lhe obedecem”. A cruz é a nossa salvação. No meio das
tempestades da vida, quando nós pensamos que vamos naufragar, devemos nos atar
à cruz de Cristo, Ela é a nossa salvação.
Conta-se que Ulisses havia se atado ao
mastro do navio, para não sucumbir ao canto das sereias, seres monstruosos, mas
de um canto encantador. Nós também devemos nos atar ao madeiro da cruz, para
não sucumbirmos ao canto do mundo, que é um canto encantador sem dúvida, mas é
um canto de morte, porque o mundo nos mata, e só Cristo nos dá a vida.
A cruz é a árvore da vida. Nós cantamos
em nossas assembleias: “a
sombra dos teus braços a Igreja viverá”. A cruz é Aquela árvore que
João viu na Jerusalém Celeste, que dá frutos doze vezes ao ano e cujas folhas
servem para curar as nações. A cruz é o sinal da vida e S. Gregório nos seus
diálogos expressa isso com muita firmeza quando diz que Bento, o homem de Deus,
ao traçar sobre a taça que continha veneno o sinal da cruz esta não pode
resistir ao sinal da vida.
Devemos nos unir ao sacrifício de
Cristo. O nosso sofrimento deve estar unido ao mistério do sofrimento de
Cristo. Aquele sofrimento para o qual não encontramos razão devemos lança-lo ao
pés da cruz. Devemos saber que se na nossa vida existe uma Sexta-Feira da
Paixão, existirá também uma manhã de Ressurreição. Ainda que toda a nossa vida
seja uma Sexta-Feira da Paixão, isto é pouco diante da Eternidade de
Ressurreição que Cristo nos promete.
[1] Hino da Oração das Doze Horas do Ofício Divino Romano
[2] Seria interessante recordar aos
fiéis que este termo “adoração” tem origem no termo latino “ad-orare”, ou seja,
“encostar os lábios” ou “beijar”. Neste sentido, este rito é “adoração” porque
todos “beijam” a representação do santo lenho onde Cristo, o único e verdadeiro
adorável, entregou sua vida por nós.
Pe. Fábio Siqueira
http://arqrio.org/formacao/detalhes/409/homilia-da-sexta-feira-da-paixao-do-senhor
Nenhum comentário:
Postar um comentário