domingo, 28 de março de 2021

SEXTA-FEIRA SANTA

CELEBRAÇÃO DA PAIXÃO DO SENHOR

 

Hoje e amanhã, segundo uma tradição antiquíssima, a Igreja não celebra a Eucaristia.

 

O altar deve estar totalmente despido: sem cruz, sem candelabros, sem toalhas.

Na tarde deste dia, por volta das três horas (a não ser que razões de ordem pastoral aconselhem outra hora mais tardia), faz-se a celebração da Paixão do Senhor, que consta de três partes: liturgia da palavra, adoração da cruz e sagrada comunhão.

 

Neste dia, a sagrada comunhão só pode ser distribuída aos fiéis dentro da celebração da Paixão do Senhor. Aos doentes que não podem tomar parte nesta celebração pode levar-se a comunhão a qualquer hora.

 

O sacerdote e os ministros sagrados, revestidos de paramentos vermelhos como para a Missa, dirigem-se ao altar e, feita a devida reverência, prostram-se de rosto por terra, ou, se parecer mais conveniente, põem-se de joelhos; e todos oram em silêncio durante um breve espaço de tempo.

 

1ª Leitura: Is 52,13-53,12
Sl 30 (31)
2ª Leitura: Hb 4,14-16;5,7-9
Evangelho: Jo 18,1-19,42

Ó cruz, do mundo bênção,
Ó divinal troféu:
Da morte foste a portaE agora és do céu.[1]

 

Celebramos hoje esta Solene Ação Litúrgica da Paixão do Senhor. Hoje não celebramos a Eucaristia, mas adoramos aquilo o que a Eucaristia significa: o mistério de um amor sem limites que se entrega na cruz por nós, a fim de que tenhamos vida e vida em abundância.

 

A nossa celebração de hoje é constituída por quatro partes. Primeiro, a liturgia da Palavra. Depois a Oração Universal, onde, como Igreja, pedimos pelas necessidades do mundo inteiro. Na terceira parte da nossa ação litúrgica teremos a Adoração[2] da Santa Cruz, onde beijaremos o Santo Lenho expressando assim a nossa adoração do mistério do amor de Cristo que se entrega por nós todos. Enfim, a última parte da nossa Ação Litúrgica é a comunhão eucarística, onde comemos o Corpo de Cristo, Sacramento Visível do seu amor crucificado pelos homens.

 

A Palavra do Senhor encerra para nós hoje um tesouro abundante. A primeira leitura é o assim chamado Canto do Servo Sofredor de Isaías. O profeta nos descreve um personagem misterioso que tomará sobre si as dores do povo: “Meu servo, o Justo, fará justos inúmeros homens, carregando sobre si nossas culpas”. Esse servo sofredor anunciado pelo profeta é o Cristo. No madeiro da cruz Cristo assumiu por amor as nossas culpas. Aquele que não tem pecado, fez-se pecado e sentiu-se pecado por nós no madeiro da cruz. Cristo assumiu por nós uma morte humilhante e vergonhosa, a fim de que tivéssemos vida e vida em abundância.

 

A cruz encerra para nós grandes bens. Foi da cruz, do lado aberto de Cristo, que brotou sangue e água. Segundo São João Crisóstomo, o sangue e a água que brotaram do lado aberto de Cristo são sinais sacramentais dos sacramentos do batismo e da eucaristia. Assim como do lado de Adão que dormia no paraíso Deus fez surgir a Virgem Eva. Do lado aberto de Cristo que morre na cruz o Pai faz nascer a nova Virgem, a Igreja, que se renova continuamente por estes dois sacramentos. Foi da cruz ainda que o Cristo nos deu o seu Espírito. São João nos diz que Ele entregou o espírito. Cristo não somente entregou o seu espírito ao Pai, mas Ele nos entregou o seu Espírito, isto é, o Espírito Santo. Cristo é um vaso de eleição do Pai. Cristo está cheio do Espírito. Quando Ele é quebrado na cruz, porque assumiu a fragilidade de uma existência segundo os homens, Ele derrama sobre aquilo do que Ele está cheio, isto é, o seu Espírito.

 

A cruz é, assim, a causa da nossa salvação. Na segunda leitura da carta aos Hebreus o autor sagrado nos diz que foi “na consumação da sua vida (que Cristo) tornou-se causa de salvação eterna para todos os que lhe obedecem”. A cruz é a nossa salvação. No meio das tempestades da vida, quando nós pensamos que vamos naufragar, devemos nos atar à cruz de Cristo, Ela é a nossa salvação.

 

Conta-se que Ulisses havia se atado ao mastro do navio, para não sucumbir ao canto das sereias, seres monstruosos, mas de um canto encantador. Nós também devemos nos atar ao madeiro da cruz, para não sucumbirmos ao canto do mundo, que é um canto encantador sem dúvida, mas é um canto de morte, porque o mundo nos mata, e só Cristo nos dá a vida.

 

A cruz é a árvore da vida. Nós cantamos em nossas assembleias: “a sombra dos teus braços a Igreja viverá”. A cruz é Aquela árvore que João viu na Jerusalém Celeste, que dá frutos doze vezes ao ano e cujas folhas servem para curar as nações. A cruz é o sinal da vida e S. Gregório nos seus diálogos expressa isso com muita firmeza quando diz que Bento, o homem de Deus, ao traçar sobre a taça que continha veneno o sinal da cruz esta não pode resistir ao sinal da vida.

 

Devemos nos unir ao sacrifício de Cristo. O nosso sofrimento deve estar unido ao mistério do sofrimento de Cristo. Aquele sofrimento para o qual não encontramos razão devemos lança-lo ao pés da cruz. Devemos saber que se na nossa vida existe uma Sexta-Feira da Paixão, existirá também uma manhã de Ressurreição. Ainda que toda a nossa vida seja uma Sexta-Feira da Paixão, isto é pouco diante da Eternidade de Ressurreição que Cristo nos promete.


[1] Hino da Oração das Doze Horas do Ofício Divino Romano

[2] Seria interessante recordar aos fiéis que este termo “adoração” tem origem no termo latino “ad-orare”, ou seja, “encostar os lábios” ou “beijar”. Neste sentido, este rito é “adoração” porque todos “beijam” a representação do santo lenho onde Cristo, o único e verdadeiro adorável, entregou sua vida por nós.

Pe. Fábio Siqueira

http://arqrio.org/formacao/detalhes/409/homilia-da-sexta-feira-da-paixao-do-senhor

 

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