REFLEXÃO
DOMINICAL I
III Domingo do Tempo
Comum – Ano B
Jn 3,1-5.10
Sl 24
1Cor 7,29-31
Mc 1,14-20
Nestes
inícios do Tempo Comum, a Liturgia apresenta-nos também os inícios do Evangelho
segundo Marcos. Hoje Jesus aparece inaugurando seu ministério público. Suas
palavras são consoladoras: “O tempo já se completou e o Reino de Deus
está próximo!” Eis! A esperança de Israel até que enfim iria
realizar-se: o Messias, o Salvador esperado estava chegando para instaurar o
Reino! Com Jesus, com sua Pessoa, seus gestos e sua pregação, o Reinado de
Deus, a proximidade do Santo de Israel, seria realmente tocada pelo povo de
Deus. É isso o Reino de Deus: em Jesus, Deus fez-se próximo, Deus veio acolher,
consolar, indicar o caminho, salvar! Em Jesus, o Filho amado, Deus veio revelar
sua paternidade, debruçando-se sobre o aflito, o pobre, o pecador. Chegou o
Reino: Deus veio consolar o seu povo!
Mas,
há algo surpreendente nesse alegre anúncio de Jesus: logo após afirmar que o
Reino chegou, o Senhor intima o povo: “Convertei-vos e crede no
Evangelho!” Por que Jesus dá esta ordem? Os israelitas não estavam
esperando o Reino? Por que precisam se converter? Caríssimos: o Reino que Jesus
veio trazer não é de encomenda, não é sob medida, como gostaríamos. O Senhor
não vem nos trazer um Deus à nossa medida, à medida do mundo, um deus
moderninho para consumo das nossas necessidades, interesses e expectativas. No
mundo do fácil, do prático e do descartável, gostaríamos de um deusinho assim…
Jesus nos grita: “Convertei-vos! Crede no Evangelho!” O Reino
somente será Boa-Notícia para quem abrir-se à surpresa inquietante do Deus que
Jesus anuncia. Acolher a novidade, a Boa-notícia, o Evangelho, acolher esse
Deus que chega, exige que saiamos de nós mesmos, como os ninivitas que,
escutando o apelo de Jonas, converteram-se! Mais tarde, Jesus irá criticar
duramente o seu povo: “Os habitantes de Nínive se levantarão no
Julgamento, juntamente com esta geração, e a condenarão, porque eles se
converteram pela pregação de Jonas. Mas aqui está algo mais do que Jonas!” (Mt
12,41). Como é atual a Palavra deste Domingo! Cheios de nós, adormecidos e
satisfeitos com nossos pensamentos, com nossa lógica cômoda e pagã, jamais
poderemos acolher o Reino em nós e experimentar sua alegria e sua paz! Não
esqueçamos, caros em Cristo: a primeira palavra do Senhor no Evangelho é
“convertei-vos!” Não é possível domar Jesus, não é possível um cristianismo sob
medida! Não é por acaso que o Evangelho de hoje começa falando da prisão de
João Batista, aquele santo profeta que preparou a vinda do Reino. O Reino sofre
violência; violência do mundo, violência do nosso coração envelhecido pelo
pecado, da nossa razão tanta vez fechada para a luz do Cristo. Por isso mesmo,
logo após apresentar o apelo de Jesus, são Marcos nos fala da vocação dos
quatro primeiros discípulos. Certamente, esse chamado deve ser compreendido de
modo muito particular como referindo-se à vocação sacerdotal, que faz dos
chamados “pescadores de homens”. Mas, esse chamamento indica também
a vocação de todo cristão: seguir Jesus no caminho da vida. Nesse sentido, a
lição é clara: seguir Jesus exige deixar tudo, deixar-se e colocar a vida em
relação com o Senhor! Somente assim poderemos acolher o Reino!
Nunca
esqueçamos, irmãos: diante da urgência de estar com Jesus, de viver unido a
ele, de acolher sua pessoa, tudo o mais é relativo! Daí a advertência de São
Paulo na segunda leitura de hoje: “O tempo está abreviado. Então que,
doravante os que têm mulher vivam como se não tivessem, os que choram, como se
não chorassem e os que estão alegres, como se não estivessem; os que fazem compras
como se não possuíssem; e os que usam do mundo, como se dele não estivessem
gozando. Pois passa a figura deste mundo”. Aqui, não se trata de
desvalorizar o mundo e o que de belo e de bom há nele. Trata-se, sim, de
colocar as coisas na sua real perspectiva, na perspectiva do Infinito de Deus e
da urgência do Reino. O mundo atual, com sua cultura pagã, deseja que
esqueçamos os verdadeiros valores, que absolutizemos aquelas coisas que são
relativas, que deixemos de lado aquilo que realmente importa. E o que importa?
Escutai, caríssimos: “Buscai, em primeiro lugar, o Reino de Deus e a
sua justiça, e tudo mais vos será acrescentado!” (Mt 6,33). Somos chamados
a abrir nossa existência, abrir nosso coração, nossa vida, nossos valores para
o Cristo que nos traz o Reino do Pai do Céu! Mas somente poderemos acolhê-lo de
fato se nos colocarmos diante dele com um coração de pobre, com a consciência
de que precisamos realmente do Senhor, que, sozinhos, não nos realizaremos, não
seremos felizes, não alcançaremos a verdadeira vida!
É
triste perceber hoje quantos cristãos se sentem tão à vontade nessa sociedade
consumista, secularizada, pagã e satisfeita consigo própria. Esses,
infelizmente, jamais experimentarão a doçura do Reino, que somente poderá ser
compreendido por quem chorou, quem teve fome e sede de justiça (isto é, de
amizade com Deus), quem foi puro, que foi perseguido… É por isso que tantas
vezes ouviremos, nos domingos deste ano, o Senhor afirmar que somente poderá
compreender e acolher o Reino quem tiver um coração de pobre.
Caríssimos,
convertamo-nos! Levemos a sério que o modo de pensar e sentir de Deus não são o
nosso! Tenhamos a coragem de nos deixar por Cristo. São Jerônimo, comentando a
atitude dos quatro primeiros discípulos chamados pelo Senhor, afirma: “A
verdadeira fé não conhece hesitação: imediatamente ouve, imediatamente crê,
imediatamente segue…” Seja assim a nossa fé no Senhor, seja assim
nossa adesão ao nosso Salvador! Então, seremos felizes de verdade, porque
perceberemos que o que Cristo nos trouxe é uma Boa Notícia, a melhor de todas:
Deus nos ama, caminha conosco e, no seu bendito Filho, nos convida à amizade
íntima com ele, nesta vida e por toda eternidade! Amém.
D. Henrique Soares da Costa
https://presbiteros.org.br/homilia-do-d-henrique-soares-da-costa-iii-domingo-do-tempo-comum-ano-b/
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