A PARÁBOLA: 1ª PARTE: A DEFESA
OS DOIS FILHOS: Disse pois a eles esta parábola, contando(3):Certo
homem tinha dois filhos(11). Então disse o mais novo deles ao pai: Pai, dá-me a
parte do patrimônio que me corresponde. E dividiu entre eles a fortuna (12).
Et ait ad illos parabolam istam
dicens Homo quidam habuit duos filhos. Et dixit adulescentior ex illis patri pater
da mihi portionem substantiae quae me contingit et divisit illis substantiam.
O texto evangélico passa por alto as duas parábolas da ovelha tresmalhada e da dracma
perdida e se centra na parábola comumente chamada do filho pródigo. Consideramos
as circunstâncias que acompanham a saída do filho menor como forma literária e não
fundo alegórico, embora tenha uma base verdadeira na vida real. CERTO HOMEM indica um latifundiário judeu abastado e os dois
filhos preparam o ouvinte para a segunda parte da parábola, com a distinção entre
as duas condutas, mas com a unicidade do amor do pai, que, como o pastor ou a dona
da casa, procura o que estava perdido como objeto primário de sua afanosa angústia.
DIVIDIU A FORTUNA: Segundo costumes ancestrais,
o pai podia dispor de seus bens de duas maneiras: Ou por testamento que seria válido
na hora de sua morte, ou por meio de doação em vida (donatio inter vivos). Embora
esta prática fosse desaconselhada em Ecl 33, 19-23, parece ser a mais usual na época.
A herança do primogênito devia ser o duplo da soma correspondente a seus irmãos
(Dt 21, 17), ou seja, dois terços da herança total. Outros falam que o filho menor
nesse caso deveria receber dois nonos do
total. O filho recebia unicamente o título de propriedade, enquanto o pai retinha
o usufruto dos bens até a sua morte. Se o filho vendia sua parte, o comprador só
poderia tomar parte dos bens após a morte do pai, quando o filho vendedor perdia
todo direito. A divisão, pois da fortuna ou bens não significa a transferência da
propriedade, mas da uma parte da mesma ao filho. Por isso, no final da parábola,
o pai atua como verdadeiro proprietário dando ordens aos empregados, mandando matar
o melhor terneiro etc.
A FUGA: Assim, após não muitos dias, tendo reunido
todas as coisas, o filho mais novo se exilou a uma região distante, e ali dissipou
seus bens vivendo desregradamente (13). Et non post multos dies congregatis omnibus adulescentior filius
peregre profectus est in regionem longinquam et ibi dissipavit substantiam suam
vivendo luxuriose. O genitivo
absolutode REUNIR TODOS OS BENS, significa
converter os mesmos em dinheiro vivo ou cash. Temos traduzido por EXILAR-SE um verbo que pode ter o significado de emigrar especialmente
quando temos que a região almejada é distante. Provavelmente um território da diáspora.
Considerava-se que na diáspora havia 4 milhões de judeus e que na Palestina eram
um pouco mais de 500 mil. Havia um judeu por cada seis habitantes nesse mundo que
se conhece como oikoumene.
A emigração era devida não tanto às oportunidades comerciais que oferecia a diáspora,
pois os judeus podiam trabalhar no comércio, na banca e como artesãos e entre os
romanos só os escravos o faziam. Segundo os costumes judaicos, o mais jovem teria
entre 18 e 20 anos, pois não estava casado e aquela era a idade normal do casamento.
E lá ESBANJOU SUA FORTUNA [substância segundo
texto grego que o latino traduz literalmente]. A maneira de fazê-lo foi uma vida
dissoluta, que geralmente é associada ao vinho, jogo e mulheres, como um crápula
e da qual o irmão dirá foi dissipada com meretrizes.
A FOME: Depois, pois, dele ter esbanjado tudo, surgiu
uma forte fome naquela região e ele começou a passar necessidade (14). Et postquam
omnia consummasset facta est fames valida in regione illa et ipse coepit egere.
A FOME era uma epidemia frequente
na antiguidade. Foi a causa pela qual Jacó enviasse seus filhos ao Egito em busca
de provisões (Gn cap 42). Sabemos como Herodes, o Magno, vendeu até sua vasilha
de prata para obter trigo num período de fome. Como Paulo trouxe esmolas para Jerusalém
para aliviar a fome dos irmãos, provavelmente nos tempos do imperador Cláudio (41-54)
que foi testemunhada por Josefo em suas antiguidades.
CUIDADOR DE PORCOS:
E tendo saído, se associou a um
dos cidadãos daquela região e o enviou a seus campos apascentar porcos(15). Et abiit
et adhesit uni civium regionis illius et misit illum in villam suam ut pasceret
porcos. O caso é dos mais
humilhantes: um jovem judeu, de boa família, se transformando em PORQUEIRO, cuidando de animais que eram considerados entre
os mais impuros e degradantes pela Lei (Lv 11, 7). Sabemos da atitude dos sete irmãos
aos quais obrigavam a tocar carne de porco ou comer da mesma como outros traduzem
(1 Mc 7,1). A atitude rabínica sobre o cuidador de porcos, está magnificamente expressa
nesta imprecação: Maldito o criador
de porcos e maldito quem instrui a seu filho na sabedoria grega. Além
disso, não poderia santificar o sábado e estava disposto a renegar de sua religião
por causa da impureza constante.
A REALIDADE: E
desejava encher o seu ventre das glandes [bolotas]
que comiam os porcos e ninguém dava a ele ( 16). Et cupiebat implere ventrem suum de siliquis
quas porci manducabant et nemo illi dabat. O único alimento que tinha
eram as glandes ou bolotas do carvalho,
que os judeus chamavam alimento de bestas. Mas ninguém dava a ele. É um tanto irreal,
ou kafkiano como dizem, pensar que ele não pudesse comer de um fruto que naturalmente
cai dos carvalhos e é de livre escolha no chão inculto da floresta.É uma maneira
exagerada de descrever a fome intensa do jovem da narração parabólica. Ou talvez
por considerar essa alimentação de um fruto que não lhe pertencia como um roubo.
O ARREPENDIMENTO:
Voltando, pois, em si disse: Quantos
jornaleiros do meu pai abundam de pães, porém eu pereço de fome (17). In se autem
reversus dixit quanti mercennarii patris mei abundant panibus ego autem hic fame
pereo. VOLTAR EM SI significa
em termos bíblicos arrepender-se ou fazer penitência. São duas as causas principais
que o incitam ao arrependimento: a diferença entre a comida atual, e o pão abundante.
E a outra é a comparação entre ele, um filho e os jornaleiros do campo que percebiam
um mínimo de jornal, e não obstante estavam em condições muito melhores. Como ele
depois dirá ao pai, quer ser tratado como um desses jornaleiros e não como filho.
O PROPÓSITO:
Tendo-me levantado, irei a meu
pai e lhe direi: Pai, pequei contra o céu e diante de ti (18). E de modo algum sou
digno de ser chamado teu filho, faz-me como um de teus jornaleiros (19).
Surgam et ibo ad patrem meum et
dicam illi pater peccavi in caelum et coram te. Et iam non sum dignus vocari filius tuus
fac me sicut unum de mercennariis tuis. TENDO-ME LEVANTADO, em aoristo, é uma maneira de falar dos
semitas, quesempre estavam sentados nas tendas e era assim que falavam e decidiam
seus compromissos. A menção do céu está no lugar de Deus e as duas preposições contra e diante são mera variação literária.
De fato o jovem admite seu pecado que sempre tem uma origem na desobediência feita
a Deus, e sabe que causou uma grande aflição a seu pai. A frase é uma fórmula estereotipada
do AT como em Êxodo 10, 16 quando o faraó admite seu erro: Pequei contra Javé e contra vós. Ele
tinha perdido todo direito a ser considerado como filho ao receber a herança na
vida do pai e não podia pedir ajuda do mesmo. Por isso pede que seja tratado como
um dos jornaleiros que trabalhavam no campo do pai. Assim devemos traduzir o faz-me
[ou trata-me] como a um de teus jornaleiros.
O ENCONTRO: E tendo-se levantado, veio para seu pai;
estando ele ainda longe o viu seu pai e se enterneceu (nas entranhas); e tendo corrido caiu sobre seu colo e o
beijou repetidamente (20). Et surgens venit ad patrem suum cum autem adhuc longe
esset vidit illum pater ipsius et misericordia motus est et adcurrens cecidit supra
collum eius et osculatus est illum A descrição do pai, como se adiantando
ao filho antes deste pedir seu perdão, e do sentimento expressado pelo verbo que
significa um sentimento profundo que comoveu intimamente seu interior, o verbo correr
ao encontro do filho, o abraço antes deste pronunciar uma só palavra e o beijo repetido
que seria cumular de beijos, indicam como o pai esperava o filho e estava disposto
a esquecer e perdoar. São detalhes que vão além do aspecto puramente literário para
descrever o fundo do amor paterno em toda sua intensidade.
A CONFISSÃO:
Lhe disse o filho: Pai, pequei
contra o céu e diante de ti e em modo algum sou digno de ser chamado teu filho(21
Dixitque ei filius pater peccavi
in caelum et coram te iam non sum dignus vocari filius tuus. As palavras
do filho são calcadas do seu propósito que vimos no parágrafo dos versículos 18
e 19.
REAÇÃO DO PAI:
Disse o pai a seus escravos: Trazei
a veste [stolë <4749> stole], a principal; vesti-o; e dai um anel na mão dele, e calçado nos
seus pés(22). E, tendo trazido o terneiro engordado, matai e, comendo, regozijemos
(23). Dixit autem pater ad servos suos cito proferte stolam primam et induite illum
et date anulum in manum eius et calciamenta in pedes. Et adducite
vitulum saginatum et occidite et manducemus et epulemur. A palavra que o latim traduz propriamente
por servi, que na época apontava aos
escravos, mas que, nas línguas vernáculas, perdeu seu primitivo significado ao confundi-lo
com os servos da terra medieva, com o qual se dulcifica o verdadeiro significado.
José recebe do faraó como seu grande visir
um vestido novo, um anel e um colar de ouro no pescoço (Gn 41, 42). A veste chamada estola era um distintivo das classes sociais
altas, um vestido longo até os calcanhares, impróprio da túnica dos trabalhadores,
curta até as coxas. Era a túnica
talar ou estola,
o vestido talar próprio dos oficiais e das mulheres, que chegava até os calcanhares,
pois talares eram chamadas as asas de que estavam dotadas as sandálias de Mercúrio
para melhor correr. Mercúrio era o deus grego do comércio e mensageiro dos outros
deuses. A veste que o pai pede para o filho
era a estola primeira ou principal, que alguns traduzem como de festa. Hoje diríamos
a melhor de todas. No oriente significa uma distinção especial. Pois não existiam
condecorações. O anel não era um adorno,
mas um sinal de distinção e de que pertencia a um determinado clã, e era próprio
das pessoas distinguidas que com ele assinavam documentos e selavam as cartas ou
missivas. E o calçado, sandálias em geral, era próprio dos senhores, pois os escravos,
em cuja categoria queria ser contado o filho, andavam descalços. A morte do terneiro, com artigo determinado, indica um dia especial
de festa, pois era o animal cevado, ou alimentado especialmente para o engorde,
que era reservado para os grandes dias de festa, como o casamento de um filho, ou o nascimento
do primogênito. Ele era a base de um banquete especial, numa sociedade em que a
carne não era alimento comum. O pai quer que todos reconheçam no jovem arrependido
o filho, anterior a seus desvarios. Restitui-lhe o estado anterior, como se nada
tivesse acontecido. Mais que perdão o pai oferece uma total reabilitação, superando
toda expectativa possível. A razão desta conduta a explicará imediatamente no versículo
seguinte.
RAZÃO DA ALEGRIA DO PAI:
Porque este, o meu filho, estava
morto e reviveu; e perdido era e foi encontrado. E começaram a regozijar-se (24).
Quia hic filius meus mortuus erat et revixit perierat et inventus est et coeperunt
epulari. Era a mesma alegria do pastor, da mulher dona-de-casa, por
recobrar o que se pensava perdido; mas agora era maior, porque é a alegria do pai
que pensava nunca mais volver a ver o filho, pois estava como morto para ele. Era
ter um filho vivo, após pensar tê-lo perdido para sempre. E assim, sem mais demora,
começaram a gozar da alegria comum. Ao banquete acompanhava a música com coros de
palmas e baile dos varões presentes. Este seria o fim da parábola; mas ela tem uma
segunda parte também dirigida aos espectadores, fariseus e escribas, não tanto para
demonstrar por que Jesus aceitava pecadores, mas para recriminar a conduta deles
como totalmente infundada e maldosa por causa da inveja.
2ª parte: A CENSURA
O FILHO MAIOR:
Estava, pois, o seu filho, o
maior, no campo e, como voltasse, se aproximou da casa, escutou a música e as danças
(25). Então tendo chamado um dos servos dele perguntou que seriam aquelas coisas
(26). Erat autem filius eius senior in agro et cum veniret et adpropinquaret domui
audivit symphoniam et chorum. Et
vocavit unum de servis et interrogavit quae haec essent. A jornada de
trabalho terminava com a luz do sol, e era quando começava o jantar, a comida principal,
e a hora do início dos banquetes. Estes estavam acompanhados de um coro de músicos
que dançavam ao som de palmas e pandeiros com uma certa algaravia própria da exaltação
sentimental dos orientais. Esta música e gritos ouviu o filho maior no meio do silêncio
da entrada da noite, próprio dos tempos antigos. Estranhando, perguntou a causa
de tudo isso.
A PERGUNTA: Ele então lhe disse: porque teu irmão veio,
e matou teu pai o novilho cevado porque o recebeu saudável (27). Isque dixit illi
frater tuus venit et occidit pater tuus vitulum saginatum quia salvum illum recepit
O empregado, que o texto grego chama de pais [<3816>], cujo significado primeiro é
menino, infante, filho, e que pode ter frequentemente o significado de criado, servo,
especialmente quando o serviço é dentro da casa, responde fielmente à pergunta do
seu amo.
INDIGNAÇÃO DO FILHO:
Enfureceu-se, portanto, e não queria
entrar. Por isso o pai dele saiu rogando-lhe (28). Ele, pois, tendo respondido, disse a seu
pai: Eis que todos estes anos te sirvo e nunca preteri mandato teu e a mim jamais
deste um cabrito para que com meus amigos me regozijasse (29). Quando, pois, este teu filho, o que há devorado
teu patrimônio com meretrizes, veio, mataste para ele o novilho cevado (30). Indignatus
est autem et nolebat introire pater ergo illius egressus coepit rogare illum.
At ille respondens dixit patri
suo ecce tot annis servio tibi et numquam mandatum tuum praeterii et numquam dedisti
mihi hedum ut cum amicis meis epularer. Sed postquam filius tuus hic qui devoravit
substantiam suam cum meretricibus venit occidisti illi vitulum saginatum. A
indignação do filho o afasta do banquete, da alegria de ver de novo seu irmão e
o obriga a se indispor com a conduta do pai. Ele se nega rotundamente a admitir
o irmão, seja qual fosse a atitude deste último e as condições em que se encontrava
atualmente. Possivelmente a herança estava no meio dos dois irmãos. O pai teve que
sair da casa e lhe dizia com boas palavras, ou seja, lhe rogava. O filho dá razões
de peso para demonstrar que sua indignação tinha um motivo realmente forte: Tenho
te servido fielmente. E qual tem sido a resposta? Nem um cabritinho me deste para
comemorar numa festinha alegre, um dia com meus amigos. E contrasta a conduta do
pai com respeito a ele, com a conduta atual com a qual o pai recebe o outro filho,
a quem não quer chamar de irmão [este
teu filho],
como se ele, o irmão correto, não tivesse sido nunca tratado como filho pelo pai.
E dá uma razão negativa para ser considerado verdadeiro filho: há devorado teu patrimônio com meretrizes.
A conduta do irmão era duplamente vergonhosa: dilapidar o patrimônio do pai e fazê-lo
de modo vexatório: com meretrizes, sem cabeça, sem proveito nenhum, como um pervertido.
O contraste entre as condutas dos irmãos é evidente. O contraste na conduta do pai
para com os dois filhos é palpável. Que espera o pai dele, o filho correto, a não
ser a indignação e a repulsa mais justa e mais lógica como resposta?
AS RAZÕES DO PAI:
Ele então lhe disse: Filho, tu
sempre estás comigo e todas as minhas coisas são tuas (31). Regozijar-se, pois e
dançar convém, porque este, o teu irmão, estava morto e reviveu, e perdido estava
e foi encontrado (32). At ipse dixit illi fili tu semper mecum es et omnia mea tua
sunt. Epulari autem et gaudere oportebat quia frater tuus hic mortuus erat et revixit
perierat et inventus est. O pai começa por usar um nome que indica ternura,
teknon [<5043>] em oposição a huios [<5207>].
Este último não está unido a um afeto particular, mas indica unicamente o fruto
de uma geração paternal. Já teknon
é o filho querido, como descendente, como aquele que em si leva a imagem do pai,
é o filho a quem se dedica amor e ternura. O pai afirma que não unicamente o bezerro
cevado, mas tudo é dele, seu filho preferido. Mas nesse momento e circunstâncias
existia uma poderosa razão para uma alegria extraordinária: Teu irmão estava praticamente morto, desaparecido
e agora o encontramos de novo vivo e saudável. Não é isto um fato extraordinário
e único para comemorarmos do modo mais alegre e festivo possível? CONCLUSÃO: Era preciso
(dei em grego), necessário. Dos três verbos em que o grego indica uma certa obrigação
(dei, chre e ofei) o dei é o mais incisivo, pois indica uma obrigação moral inevitável
como quando Jesus afirma que o Filho do homem devia padecer para assim entrar na
sua glória (Lc 24, 26). Era, pois, uma obrigação moral iniludível, não só admitir
o filho extraviado, mas alegrar-se e recebê-lo com festa grande, porque era como
quem recebesse um filho que estava praticamente morto e se salva do último transe.
REFLEXÕES: Jesus
conta uma série de parábolas para indicar que sua conduta não está determinada por
leis saídas de uma tradição humana (Mt 15, 6), mas pelo mais elementar procedimento
que segue à lei natural das coisas. Será a ovelha ou a moeda perdida, e agora a
conduta do pai que tem dois filhos. Nos três casos Jesus entra como figura simbólica
que encontra o que estava aparentemente e irremediavelmente perdido e em cuja busca
se empenha até conseguir de novo o extraviado. A alegria do encontro supera as dificuldades
da busca e é razão suficiente para a exultação do momento (15, 32). OS DOIS FILHOS: O motivo é porque a liberdade, o desejo de
viver sem preocupações e com o máximo de desfrute é próprio dos mais novos e as
despesas com os vícios de ostentação e luxúria facilmente dilapidam fortunas. Essas
coisas não são objeto direto da parábola. A fome e o pastoreio dos porcos servem
para destacar o infortúnio do filho rebelde. Jesus salientará a perda do filho como
morto, diante do irmão e a nova vida quando encontrado de volta. A restituição do
pai, que o trata como filho que nasce de novo, é o importante na parábola. Mas quem
são os dois filhos e a que status correspondem eles? Pensamos não existir modelo
preciso para afirmar representações específicas nas personagens da parábola. O importante
era o retrato que se faz do amor do pai. Mas caso cheguemos a outras conclusões
sobre a conduta dos filhos, acreditamos que o início do capítulo pode dar uma pista
para a interpretação alegórica de sua identidade e suas respectivas condutas. Por
isso é razoável pensar que o maior, obediente desde o nascimento e leal ao pai,
é figura dos fariseus e doutores da lei. Em verdade eles eram fiéis à mesma, até
nos pequenos detalhes (Mt 23, 23), introduzidos pela tradição. Homens santos que
tinham dois grandes defeitos: a sua hipocrisia (Lc 12, 1) e a sua ostentação ou
vaidade (Mt 6, 1). O filho menor representa o idólatra, o gentio. Era rejeitado
e até odiado pelo judeu ortodoxo, porque, como temos visto antes, existia entre
as duas raças ou classes um muro de separação, que Jesus destruiu na cruz, acabando
com esse ódio secular (Ef 2, 14-16). Receber o filho que chamamos pródigo, como
verdadeiro, era incompreensível para quem se tinha mantido a vida inteira fiel e
observante. O PAI: Será Deus, ou será Jesus?
Cremos que a parábola não pode se transformar numa alegoria em que cada personagem
é uma figura simbólica de uma realidade. Por isso, mantenhamos a parábola no seu
justo termo e pensemos que o pai é um pai comum que realmente ama seus filhos e
sente a perda de um deles de modo a não poder resistir à alegria de encontrá-lo
de novo. O pai está na mesma linha que o pastor que encontrou a ovelha desgarrada,
que a mulher que achou a moeda perdida. Logicamente podemos pensar numa figura alegórica,
o próprio Deus segundo aquilo que se diz: ¨Se
vós que sois maus sabeis dar coisas boas aos vossos filhos, quanto mais o vosso
Pai que está nos céus dará coisas boas aos que lhas pedem¨(Mt 7,11).
PISTAS:
1) Jesus defende sua implicação com os ¨pecadores¨(gentios
em particular) como parte do perdão que é acolhimento aos mesmos, oferecendo o exemplo
do pai que recebe o filho perdoando-o totalmente, como se nada acontecesse ou melhor
o encontro fosse com um filho bom. É um perdão sem limites, nem recriminações a
uma conduta anterior por mais péssima que tivesse sido, pois é um filho que volta
e merece ser amado e acolhido.
2) Jesus mostra o verdadeiro rosto de Deus,
o Deus em quem devemos acreditar porque é o Pai que Jesus amava e que nos revelou
como nosso Pai. Na parábola se revela como o amor que deseja salvar o que estava
perdido. Ele deixa que o filho se perca. Mas sempre espera a sua volta, para recebê-lo
sem recriminar sua conduta anterior.
3) Aparentemente o pai se despreocupa do
filho que o abandonou. Porém não é assim. Ele sabe esperar, pois conhece que não
pode forçar uma vontade alheia, mas reforçar um arrependimento, uma conversão que
brotará do íntimo de uma consciência que finalmente reconhece seu erro e detesta
sua conduta anterior. É então que o acolhimento é puro amor: esse dia é festa e
júbilo.
4) Perante a opinião comum que pensa que
uma vida só é digna se na balança os atos positivos de bem superarem os atos de
delinquência e pecados, devemos supor que uma vida é positivamente julgada por Deus
quando um ato bom pode nela ser contemplado. O mal não prescreve quando o bem, um
ato mesmo solitário de bondade pode desequilibrar a balança do julgamento.
5) Podemos agir de duas maneiras diferentes: Criticando o perdão, resmungando sobre a aparente superioridade do mal que nos rodeia, como faziam os fariseus, ou esperando como o pai para que alguém retorne arrependido, dispostos a acolher como Jesus fez, amando os pecadores embora entregasse sua vida em sacrifício pelo pecado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário