REFLEXÃO
DOMINICAL I
PERDOAR
SEMPRE: UMA EXPRESSÃO DO AMOR MISERICORDIOSO DO PAI
O Tempo Comum, na
liturgia, nos permite contemplar o extraordi- nário no ordinário e nos ensina,
a partir da vida de Jesus, um cami- nho de aprendizado e esperança. E o
ensinamento que ele nos pro- põe, neste 24º domingo, é o exercício do perdão.
As leituras mostram que o ato de perdoar é uma forma de expressar o amor. A
primeira leitura, do livro do Eclesiástico, apresenta um ensinamento prático:
engana- -se quem pensa que a sabedoria está em deixar-se consumir pelos
sentimentos de rancor, raiva ou vingança. O autor sagrado destaca que ser sábio
é justamente fazer o contrário, isto é, saber perdoar e compadecer-se do
próximo. E esse exercício do perdão se rela- ciona diretamente ao perdão de
Deus. Ele se pergunta: “se alguém guarda raiva contra o outro, como poderá
pedir a Deus a cura?” (Eclo, 28,3). Pelo contrário, quem perdoa a ofensa
alheia, recebe para si o perdão divino. Por isso, como o autor exorta, devemos
nos recordar sempre do nosso fim, perseverar nos mandamentos e não nutrir em
nosso coração esses sentimentos que nos desu- manizam. Nossas relações humanas
devem nos conduzir ao que é bom e, certamente, isso passa pelo perdão e pela
compaixão. Só assim a confiança no perdão de Deus começará a ser possível,
visto que, como descreve o Salmo 102(103), o Senhor é bondoso, compassivo e
carinhoso. No Evangelho, São Mateus dirige o discurso a toda Igreja, aos discípulos
de ontem e hoje. A antiga tradição religiosa de Israel ensina- va o perdão ao
próximo em ocasiões específicas, restrito a alguns casos limitados. Pedro
pergunta a Jesus quantas vezes era preciso perdoar o seu irmão, até sete vezes?
(Mt, 18,21). Lembrando que, na Bíblia, o número “sete” indica também a
totalidade. Cristo vai além do ensinamento da tradição judaica e responde: “não
te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete” (Mt, 18,22), quer dizer, o
perdão precisa ser dado a todos, sem restrição, de modo contínuo e ilimitado.
Em seguida, Jesus narra aos discípulos a parábola do patrão e seus empregados
para ilustrar como a misericórdia de Deus é infinita. O empregado implora ao
patrão e recebe dele o perdão de sua dívida, mas, quando deveria fazer o mesmo
com seu próximo, é incapaz de agir com a mesma compaixão que recebeu. Essa
atitude indigna o patrão, que alerta ao empregado e a todos nós sobre o
verdadeiro exercício da compaixão e da misericórdia, tal como as recebemos
infinitamente do nosso Pai. No entanto, sabemos que, no dia a dia, o ato de
perdoar os ir- mãos e irmãs nem sempre segue a mesma lógica da infinitude e da
gratuidade. Muitas vezes, quando somos tomados por sentimentos de ira, rancor,
ódio, vingança, afastamo-nos daquilo que Deus espera de nós: ser a expressão de
seu amor misericordioso e perdoar nosso próximo infinita- mente. O perdão é uma
tarefa diária, exige conversão e oxigena nossa vida de fé. No exercício do
perdão, tal como Jesus, transformamos nossa condição humana frágil em expressão
concreta do amor de Deus, que nos pede sempre abertura ao outro, a bon- dade, a
fraternidade e vida em comunhão. Portanto, que o Senhor nos conceda a graça de
perdoar sempre, mesmo aqueles que, por qualquer eventualidade, possam ter nos
magoado ou ofendido, pois é somente com o coração perdoado que iremos promover
uma cultura de paz, de fraternidade e ser a expressão do amor misericordioso do
Pai.
Dom Carlos Silva, OFMCap Bispo auxiliar de São Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário