"Bom dia, bom Tempo Natalino, e bom Novo Ano!”
Por Lindolivo Soares
Moura(*)
Seguimos com o idioma
"nem pátrio e nem mátrio", desta vez! "Thinking", vamos
chamá-lo, em homenagem a quem está ainda indeciso pela paternidade ou a
maternidade! Pensem devagar, não há pressa! Mas pensem com responsabilidade!
Dica de hoje: "'na
minha ausência, não deixem por favor de regar as minhas plantas!': que plantas
você está deixando para serem regadas?".
Quem ama a natureza, e
por vezes chega a cultivar uma verdadeira floresta dentro de casa, certamente
já usou e abusou dessa expressão: "na minha ausência por favor não deixe
de regar as minhas plantas!". Se a solicitação foi feita em decorrência de
uma viagem mais longa, demorada, então o pedido é meticulosamente feito, e
todas as orientações são passadas! Comecei a pensar então aqui com meus botões
- de onde vem essa expressão, hein gente? - : e se a viagem fosse mesmo longe, longe demais, tipo aquela que a
gente vai e não volta mais!? Viagem para a qual só se adquire bilhete de ida, e
não de volta, e na despedida o tchau vira um "adeus", e é uma choradeira
que não acaba mais! Uma viagem na qual ninguém gostaria de ir, menos ainda
sendo obrigado, e que só se vai sendo meio que "despachado", pois se
assim não fosse a gente brigaria, o "pau comia", de tanto que a gente
gosta de viver nesse bendito planeta chamado terra! Viver é bom demais! É ou não
é, fale a verdade!? Quem não gosta da vida tem que fazer terapia, pois só pode
estar lelé : ou é ruim da cabeça ou doente do pé e de todo resto! chiii!!! E se
for o terapeuta que resolveu que quer morrer!? Aí não tem jeito: serão duas
vacas que acabam indo juntas, lado a lado, pro mesmo brejo! "Um dia -
pronto! Me acabo! Pois seja o que tem que ser! Morrer!? Que me importa!!! O
diabo é deixar de viver!!!". Esse Mário Quintana sabia das coisas!
Terapeutão, esse cara!
De vaga eu entendo bem,
"divagação" não, ninguém gosta! Então vamos sair do atalho e retomar
os trilhos! "Olha o trem!!!" Te peguei, hein!? Mas já que parou,
olhe, escute...aproveite e reflita: se você estivesse às portas da morte,
prestes a partir - você pode até achar a expressão chata mas retardá-la não
resolve a questão! - e tivesse que lançar mão pela última vez do pedido:
"na minha ausência, por favor, reguem as minhas plantas", de que tipo
de "plantas" você estaria falando? Porque se for da sua floresta real
que você tem em casa, toda verdinha - se você cuidou bem, claro! -
independentemente do tamanho da sua selva, das duas uma: ou quem você amou em
vida vai dar um jeitinho, de qualquer jeito - mesmo que para isso tenha que
diminuí-la de tamanho:um terço, metade, sei lá - e vai continuar cuidando da
plantaiada direitinho, ou... - chora pelo que eu vou dizer não! - mal você tenha colocado os pés nas profundezas da terra, das
suas plantas e da sua floresta não vai sobrar um raminho! Nadinha! Nem uma
hortênsia para contar a sua história! "No lugar da ausência, um ramo de
hortênsias", como diria o Cassiano Ricardo! Nem isso, no seu caso! Aí você
pergunta: "falando sério!? Nem um raminho!?". Nem!!! Tipo aquele que
a pombinha - é pombinha mesmo ou corvo, Antônio Rocha? - trouxe no bico e
entregou para seu Noé, que há dias não conseguia sair daquela bendita barca!
Melhor, creio que é arca!
É triste, mas é
verdade! Nem é bom se preocupar muito com isso não! Bobagem ficar se lamentando
demais! Falando sério? Não sempre os
"amores" de uns são os mesmos amores de outros! Aqui me vem uma dúvida: se o problema estaria
"nos amores" que deixamos, ou "nos outros" com os quais em
vida convivemos! Vixe!!! Isso daria um livro! Meu cunhado Pedrinho diria:
"livro não, filme! Vou esperar virar filme - é assim que ele fala - quando
lhe envio meus "testões", como ele diz ! Não lê um, o bendito!
"Epa!!! Olha a divagação aí de novo!", agora é você quem diz! Cai
novamente na tentação! Desculpe! Vou rezar o "Ato de Contrição", viu,
Frei João, e depois da absolvição eu continuo! Olha o tamanho da penitência,
hein!!! Qualquer coisa leia aí o "Do delito e das penas", do
Beccaria! Não era frade nem padre, mas o que de pena esse homem entendia, era
de se tirar o chapéu! E se entendia de pena deveria por tabela entender de
penitência. Afinal elas jogam juntas no mesmo time, time esse cujo nome é
"punição"! Enquanto isso puxemos pelo fio a meada, e deixemos de
muito "blá blá blá!". Essa
expressão eu também não sei de onde veio não!
Se houve alguma graça
no que eu disse, ou se por ter dito o que disse acabei caindo em desgraça,
difícil vai ser agora dizer alguma coisa que faça você voltar a sério, se
recompor, que é o que vamos precisar daqui pra frente. Melhor sair, tomar uma
gelada -estou falando de água, viu gente! - pois tem feito um calorão danado, e
depois retornar! Melhor assim! E antes de retomar a leitura dê em você mesmo
uns dois ou três beliscões! Sem exagero, vamos! O suficiente para fazer você
acordar e voltar a ficar sério! Pronto!? Então vamos lá! Havíamos parado na
parte em que você estava às portas da morte! Você, não eu! Eu, hein!!! Se a
expressão fez você, "tremer de medo", que bom! Consegui o que eu
precisava: fazer você se recompor e se aprumar! Agora a pergunta que não
gostaria de ter sido, mas foi a contragosto calada: "que tipo de planta
você está deixando para seus filhos, netos, ou para quem você imagina que
devera continuar cuidando delas!? É!!! Muita gente jamais sequer havia pensado
nisso! Hora de começar então, gente! Senão você acaba sendo
"despachado", como eu já disse, e aí não dá mais tempo!
Agora vou sair de cena
por um momento, e deixar você com vocês meu grande Mestre, Rubem Alves! Devo
muito, mas muito mais do que isso a ele: recolocá-lo em cena do jeito que for
possível. Como você deve saber, o Rubem também já foi "despachado".
Entra aí por favor, Rubem! Chegou sua hora! E nos conte um pouco da sua
história!
"Ok! Tudo bem! Bom
dia, gente! Vou começar dizendo que quando 'desfiz 75 anos' - tem até um livro
meu com esse nome - me dei conta de que já era chegada a hora de pensar em meu
Testamento. Logo me vieram à mente as palavras de um certo lee Iacocca. Ele
diz: 'seu legado deveria ser o fato de ter transformado as coisas em melhores
do que eram quando você as recebeu!". Vi que não havia começado tão mal!
Fiquei todo otimista! Em seguida perguntei-me em pensamento por onde andaria o
Victor Hugo. Quando o encontrei, o que então dele me veio à mente foi: 'a
suprema felicidade da vida é a convicção de ser amado por aquilo que você é,
ou, mais corretamente, de ser amado apesar daquilo que você é!". Sorri
satisfeito! Passei no teste, pensei! Mas
aí um tal de Mulière se intrometeu na conversa, e parecendo querer me sacanear
disse assim, exatamente: 'somos responsáveis não só pelo que fizemos - seu
Rubem - mas também pelo que deixamos de fazer!'. Tá querendo insinuar alguma
coisa, Mulière?, perguntei. 'Não, ele respondeu! Era só por falar mesmo!'.
Para cutucar com vara
ainda mais curta minha autoestima, um tal de Gonzaguinha bateu de frente com a
minha mente, e jogou pesado: 'chega de tentar dissimular e disfarçar e esconder
o que não dá mais pra ocultar, e eu não posso mais calar, já que o brilho desse
olhar foi traidor e entregou o que você tentou conter, o que você não quis
desabafar e me cortou!'. Eu já estava
meio que passado, quase desacordado, de tanta bordoada, quando então para
atingir ainda mais meu ego - fechar pra
balanço - um tal de John Rhoades apontou seu dedão pra mim e disparou:
'Lembra-se do que eu lhe disse há algum tempo, seu Rubem!?: faça mais do que
existir - viva! Faça mais do que tocar - sinta! Faça mais do que olhar -
observe! Faça mais do que ler - absorva! Faça mais do que escutar - ouça! Faça
mais que ouvir - compreenda!'. Quando eu já ia tentando me justificar, ele veio
de novo: "nada de explicação não! Já tô de saco cheio de tanta
racionalização!'. Putz! - eu pensei! Me lasquei! Depois pensei melhor e
conclui: tudo bem, não tenho sido tão mal; até onde eu sei, eu fui leal: não prometi
milagres, não falei de inferno...Enfim, nada mal! Ninguém é perfeito mesmo! Se
eu pudesse viver a minha vida novamente, conclui, eu a viveria tal e qual!
O certo é que a essa
altura eu já havia me dado conta de que havia juntado muitas coisas, e agora
estava sendo perturbado pela pergunta da Parábola: 'para quem ficará tudo que
acumulaste?'. Quando o que se acumula se resume a bens e dinheiro, a resposta é
fácil! Mas e as outras coisas que eu havia acumulado? Cada pessoa tem um
tesouro que é único, só seu!".
Licença um minutinho ai
Rubem - disse eu interrompendo sua fala - porque a gente ainda há pouco falava
de certos "amores" que são só nossos, e de mais ninguém! Desculpe aí,
ter interrompido! Pode por favor continuar!
"Bem, aí eu
comecei a me lembrar de que no meu tesouro havia uma quantidade enorme de
coisas absolutamente inúteis, que não tinham nenhum valor de mercado! Livros
usados, alguns, os que tanto amo, já caindo aos pedaços de tanto amor que
fizemos! Os CDs - gosto particular meu! Quadros! - o mais querido sendo 'Mulher
lendo uma carta', de Vermeer, livros de poesia, literatura, arte, jardins. Até
um peso de papel de vidro verde-claro todo estilhaçado havia, além de
fotografias, cartas, memórias, e por aí vai! Achei meio estranho o fato de que memórias
estivessem dentre os objetos acumulados, e que havia centenas, talvez milhares
delas, guardadas no meu tesouro! Enfim, pareceu-me um tanto esquisito, o tipo
de herança que, em Testamento, eu estava deixando pra “fiarada”! Foi aí que eu
me dei conta de que acumular é um dos mais profundos instintos da alma humana!
Por que será? - eu pensei! Meu 'daimon' interior, 'meu amigo secreto das horas
incertas, como diz o Roberto, me respondeu quase cochichando: 'porque a alma
ama, meu caro Rubem! O amor deseja possuir! Isso tem o seu lado bom e o seu
lado ruim! Só é preciso ter cuidado'. Lembrei-me do 'princípio do duplo poder'
de Marinoff, naquela hora! E pensei: então é por isso que a alma dos poetas
está cheia de objetos decrépitos! Misericórdia! Fiz então uma promessa - um
juramento para mim mesmo: inventaria uma máquina de faxinar memórias, pois me
dei conta de que encheria um caminhão, aquelas das quais eu me livraria com
prazer! Uma vez a cada início de Novo Ano, limpeza completa, das memórias que
vinham me fazendo sofrer! Ficaria apenas
com as memórias que eu amo, prometi a mim mesmo!! E aí veio a surpresa: vi que
nenhuma delas era sobre acontecimentos importantes. Pelo contrário, eram
memorias-brinquedos, vejam só! Passaria o restante de minha vida com elas
brincando! Era isso que eu havia decidido!
Por fim me dei conta de
mais duas coisas importantes: a primeira era que o que a gente acumula é parte
da gente porque somente o amado é acumulado! Shiii!!! - pensei! Então será que
quem só acumulou dinheiro é porque só amou dinheiro!? Se for isso - disse eu -
a coisa é realmente muito triste. Isso explicaria - pensei eu - o motivo pelo
qual quem acumula muito dinheiro dá tanto pouco sorriso e tanta gargalhada! A
segunda coisa foi meio esquisita, uma ideia tanto curiosa quanto estranha: o
que fazer quando o que se juntou foram ovelhas? Deus meu! De repente eu me dei
conta de que estava falando de mim mesmo! Preciso encontrar urgente alguém que
também ame minhas ovelhas, me veio à mente, alguém que tenha alma de Pastor,
que as chame pelo nome! Que as conduza por pastos verdes e fontes de águas
frescas, as defenda dos lobos e as acaricie ao fim da tarde, leve-as para
passear em dias bons e as recolha ao aprisco em dias maus!".
Dito isso Rubem se
abaixou e pareceu escrever alguma coisa no chão! Depois começou a se erguer lentamente,
enquanto duas pequenas lágrimas furtivas insistiam em rolar pelo seu rosto!
"Esqueçam tudo que eu lhes disse!" - ele continuou. "O fato é
que não é possível acumular coisa alguma! O acumular é uma ilusão! Por isso
Deus chamou o rico de 'insensato', 'louco', alguém que 'perdeu o juízo'. Quem
pensa que acumula não é senão isso: um doido varrido! E se o acumular coisas é
uma ilusão, todo homem deveria suplicar para que uma graça especial lhe fosse
concedida: poder preparar o fim da sua vida como um compositor termina sua
sonata: buscando deixá-la o mais perfeita e o mais completa possível, para
então deixá-la como herança àqueles que ele ama! Uma obra de arte bela e bem
acabada! Essa, e nenhuma outra, é sem dúvida a maior das heranças!". Essa
foi a última fala do Rubem! Abaixou a cabeça, agradeceu, e saiu!
Estou reentrando em
cena apenas para uma perguntinha básica mesmo: já pensou que tipo de plantas
você está cultivando, e solicitará para que alguém as regue quando você estiver
viajando, quem sabe pra não voltar mais!? Se não pensou, melhor ir pensando!
Dinheiro, coisas, herança, bem ou mal a gente "se vira": compra,
vende, troca, financia; dá-se um jeito!". Mas tem certas coisas que nenhum
"jeitinho brasileiro" dá jeito: só plantando!
L.S.M. 01/23
(*) Reflexão enviada de
Vitória(ES) por whatsapp.
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