Para
2023, nossa esperança está no poder ou no amor?
Que 2023 se revele, para todos nós, para o Brasil e para o
mundo, um tempo de crescimento no amor e de libertação da idolatria ao poder
Nos
últimos meses de 2022, em função das eleições e seus desdobramentos, todos
fomos tentados a uma entre três posturas profundamente anticristãs, ainda que
muito comuns. Quem viu seu candidato vencer, se viu tentado a uma euforia
desproporcional, como se os governos pudessem resolver os problemas do mundo e
como se tudo fosse andar bem só porque nosso candidato ganhou. No extremo oposto,
quem viu o político em quem depositava esperança perder, tende a uma depressão
e uma raiva desproporcionais, como se o mundo fosse acabar porque o opositor
venceu. Também temos uma tendência intermediária, uma certa “sabedoria” cética
que considera que todos são iguais, como se o resultado da eleição não fosse
influenciar a história.
Ora,
o fato da eleição ter sido vencida por um ou outro candidato fará muita
diferença em nosso futuro. Contudo, é verdade que nenhum eleito garantirá por
si só o bem comum ou nos levará a uma catástrofe irremediável. Cada governante
tem méritos e defeitos, em qualquer caso devemos estar atentos para apoiar os
acertos e combater os erros. Valendo-nos do sábio conselho de Santo Inácio de
Loyola, temos que agir como se tudo dependesse de nós, mas sabendo que tudo
depende de Deus. Essa postura nos traz o justo equilíbrio para não desanimarmos
nem nos descomprometermos, ao mesmo tempo que vivemos confiantes na ação de
Deus.
A
ilusão do poder
Estas
situações acontecem principalmente pela tentação de depositar nossa esperança
no poder. Citando as reflexões de Romano Guardini, na Laudato
si’, o Papa Francisco observa: “Tende-se a crer que ‘toda a
aquisição de poder seja simplesmente progresso, aumento de segurança, de
utilidade, de bem-estar, de força vital, de plenitude de valores’ (GUARDINI,
R. O fim dos tempos
modernos. Brasília: Ed. Monergismo, 2021)” (LS 105).
A
palavra poder tem duas acepções básicas: capacidade (o poder de fazer as
coisas) e dominação (o poder sobre os demais). Tendemos a crer que as coisas
vão mal simplesmente porque nossos adversários têm poder/dominação e que elas
irão bem quando nossos correligionários passarem a ter esse poder. Mas, na
verdade, as coisas são muito mais complicadas.
Para
começar o poder/dominação não garante o poder/capacidade. Por exemplo, nenhum
governante, por mais poderoso que fosse, teve capacidade de evitar que seu país
sofresse as consequências da pandemia de Covid ou não fosse afetado pela crise
financeira internacional de 2008. Os fenômenos naturais, a vida econômica, as
relações internacionais e o próprio coração do ser humano não obedecem docilmente
à dominação. Quanto mais tentamos forçá-los, ao invés de nos valermos da
capacidade que vem do conhecimento e da sabedoria, mais erros cometemos.
Além
disso, o poder/dominação corrompe. Todos os governantes que se perpetuaram no
tempo e que adquiriram grande poder enfrentaram cada vez mais problemas de
corrupção e mau uso de sua autoridade – por parte deles mesmos e/ou de seus
correligionários. Entre as lições mais importantes das ciências políticas
modernas estão a necessidade de um equilíbrio de forças no Estado (os chamados
três poderes) e a positividade da alternância de governo entre grupos
diferentes.
A
confiança no amor
Para
os cristãos, o problema mais profundo dessa crença no poder é a perda da
capacidade de amar. Em um trecho famoso, C.G. Jung considera que “onde o amor
impera, não há desejo de poder; e onde o poder predomina há falta de amor”. A
frase está no contexto da teoria psicanalítica, mas se tornou muito conhecida
porque reflete uma grande verdade sobre o ser humano. Quem se sente oprimido,
não se sente amado. Quem insiste em dominar, perde a capacidade de amar.
Podemos
observar como a confiança e a luta pelo poder nos últimos anos tornou nossa
sociedade mais ressentida e raivosa, como nosso coração se endureceu muitas
vezes, como muitas amizades ficaram mais difíceis. Muitas vezes, em nome da
defesa de valores cristãos, nos afastamos do maior valor cristão, que é o amor
gratuito para com o outro – a caridade.
Quem
não se descobre amado por Deus não é capaz de ter uma verdadeira esperança.
Precisa se apegar às ilusões da força ou do pensamento positivo. Quem confia no
poder humano, na sua capacidade de dominação, não é capaz de perceber o amor de
Deus se movendo nas entranhas da realidade. Ao cedermos à ilusão do poder,
caímos numa espiral crescente de crença na dominação e descrença em Deus e seu
amor.
Que
2023 se revele, para todos nós, para o Brasil e para o mundo, um tempo de
crescimento no amor e de libertação da idolatria ao poder.
https://pt.aleteia.org/2023/01/01/para-2023-nossa-esperanca-esta-no-poder-ou-no-amor/
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