F/ Cartaz do 14º Intereclesial das CEBs
"O adjetivo ‘eclesial’ é mais importante do que o substantivo ‘comunidade’ ..."
Por
Pe. Nelito Nonato Dornelas
1.
As origens das CEBs
As
Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) surgiram no Brasil como um meio de
evangelização que respondesse aos desafios de uma prática libertária no
contexto sociopolítico dos anos da ditadura militar e, ao mesmo tempo, como uma
forma de adequar as estruturas da Igreja às resoluções pastorais do Concílio
Vaticano II, realizado de 1962 a 1965. Encontraram sua cidadania eclesial na
feliz expressão do Cardeal Aloísio Lorscheider: “A CEB no Brasil é Igreja — um
novo modo de ser Igreja”.
Em 1979,
reunidos em Puebla, os bispos latino-americanos firmaram o seguinte
compromisso:
“Como pastores, queremos resolutamente
promover, orientar
e acompanhar as comunidades eclesiais de base, de acordo com o espírito de
Medellín e os
critérios da Evangelii Nuntiandi; favorecer o descobrimento e a formação gradual de
animadores para elas. Em especial, é preciso procurar como podem as pequenas
comunidades, que se multiplicam nas periferias e zonas rurais, adaptar-se
também à pastoral das grandes cidades do nosso continente” (Pb
648).
Os bispos
do Brasil já haviam feito a opção pelas “comunidades de base” desde 1966, para
tornar a Igreja mais viva, mais corresponsável e mais integrada. As CEBs foram
consideradas atividade “urgente” pelos bispos, para renovar as paróquias. Esse plano
foi sistematizado e lançado em 1968, pela Editora Vozes, na obra do Pe.
Raimundo Caramuru Comunidades
eclesiais de base: uma opção decisiva.
E o Sínodo
Extraordinário dos Bispos de 1985, em Roma, afirmou: “Sendo que a Igreja é comunhão, as novas
‘comunidades eclesiais de base’, se verdadeiramente vivem em unidade com a
Igreja, são uma verdadeira expressão de comunhão e início para construir uma
comunhão mais profunda. Por isso, são motivo de grande esperança para a vida da
Igreja”.
O teólogo
Leonardo Boff, falando sobre o termo “eclesial” das CEBs, em seu livro Eclesiogênese, diz: “O adjetivo ‘eclesial’ é mais importante
do que o substantivo ‘comunidade’ porque ele é o princípio constituinte e
estruturante da comunidade. A inspiração religiosa e cristã aglutina o grupo e
confere a todos os seus objetivos, também aqueles sociais e libertadores,
características evangelizadoras. A consciência e a explicitação cristã
constitui, portanto, a característica das CEBs e o elemento de discernimento
face a outros tipos de comunidade”.
As CEBs,
fruto da eclesiologia do Vaticano II e nascidas especificamente para atualizar
a Igreja e adaptá-la ao mundo atual, tiveram profundas implicações na Igreja e
na sociedade.
Devido ao
contexto específico da sociedade brasileira, que vivia sob o regime de exceção,
com cerceamento dos direitos civis, as CEBs se tornaram uma plataforma válida e
eficiente para as mudanças sociais, apresentando ainda as bases de uma nova
sociedade.
Hoje,
passada a euforia inicial e tomando a devida distância, podemos constatar que
as CEBs estão na raiz de vários movimentos sociais e têm contribuído para a
formação de muitas lideranças no campo social e político. Foram responsáveis
também pela formação de lideranças leigas no interior da Igreja, que assumiram
o jeito de viver e celebrar a fé de uma maneira nova. Muitas vocações
religiosas e sacerdotais foram despertadas pelas CEBs, possibilitando uma nova
imagem do(a) consagrado(a).
No início
do cristianismo, quem tentava viver como Jesus viveu, conforme seu testemunho e
ensinamento, era identificado como alguém que estava no caminho, na caminhada. Não é fora de
propósito que, em grego, caminho é método. As CEBs foram capazes de criar um
método novo de ler a Bíblia, de celebrar a fé e de olhar a realidade. E,
identificados com este novo método, o caminho, muitos foram tombados, deram a
vida, foram martirizados. A profecia e o martírio têm sido uma das marcas mais
fortes das CEBs. Além disso, as CEBs têm participado do amplo movimento de promoção
e restauração da ética na economia, na política, na cultura, nas relações de
gênero, nas relações ecológicas etc.
Em razão
dos volumosos problemas humanos, com sua orientação excludente, que o atual
sistema neoliberal vem criando em níveis globais, as CEBs têm procurado formar
cristãos(ãs) “adultos(as) na fé”, desejosos de uma Igreja que leve adiante as
intuições e teses do Concílio Vaticano II. Em linhas gerais, querem: uma Igreja
inserida na complexidade de seu momento histórico, com a audácia tanto de ser
profética como de estar aberta a aprender dos outros, das outras tradições
cristãs e das outras religiões e culturas;
— assumir
os valores do mundo moderno, acolhidos pelo Concílio Vaticano II, no campo
institucional, teológico e pastoral;
— reformar
as estruturas de governo da Igreja, ação capaz de desencadear outras reformas;
—
autonomia das conferências episcopais e mais autonomia das Igrejas locais;
— maior
protagonismo dos(as) leigos(as) no âmbito dos ministérios;
—
reconhecimento canônico-jurídico das CEBs como Igreja;
— cultivar
uma espiritualidade libertadora, enraizada no seguimento de Jesus Cristo,
comprometida com os(as) excluídos(as).
Passadas
quatro gerações, as CEBs construíram sua história e hoje são conclamadas a se
pronunciar sobre sua identidade.
Fonte:
Vida Pastoral
http://revista.olutador.org.br/noticia/a-identidade-das-cebs-08052019-103700
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