O Cordeiro Glorioso e Pedro, pastor e porta-voz do rebanho.
Padre Wagner Augusto Portugal.
Estamos vivendo este momento
maravilhoso do tempo da Páscoa. São cinqüenta dias em que damos glórias e
louvores pelo Senhor Jesus que venceu a morte, saindo da mansão dos mortos, e
ressuscitando para assentar-se à direita de Deus Pai para proporcionar aos
homens pecadores a vida da graça, a vida da plenitude eterna.
A Primeira Leitura (cf. At 5,27b-32.40b-41) nos apresenta o
Testemunho diante do sumo sacerdote, colocada como a segunda defesa de Pedro
diante do Sinédrio. “Importa mais obedecer a Deus do que aos homens”. Trata-se
de um resumo do querigma cristão: anúncio do ressuscitado como salvador, pela
remissão do pecado, o que supõe a conversão. De fato, na história da Igreja,
Pedro aparece como líder e porta-voz. É ele que, diante do Sinédrio, em nome
dos outros apóstolos, dirige ao sumo sacerdote a atrevida palavra, que parece
ter sido um “slogan” dos primeiros cristãos: “É preciso obedecer antes a Deus
do que aos homens”(cf. At. 5,29) e pronuncia mais um testemunho da ressurreição
de Cristo, que os chefes judaicos mataram.
O testemunho de São Pedro e dos
outros apóstolos acerca de Jesus é a mensagem da primeira leitura. Presos e
miraculosamente libertados (cf. At 5,17-19), os apóstolos voltaram ao Templo
para dar testemunho de Cristo ressuscitado (cf. At 5,20-25). De novo presos,
conduzidos à presença da suprema autoridade religiosa da nação (o Sinédrio) e
formalmente proibidos de dar testemunho de Jesus, os apóstolos responderam
apresentando um resumo do kerigma primitivo.
A proposta
de Jesus é uma proposta libertadora, que não se compadece nem pactua com
esquemas egoístas, injustos, opressores. É uma mensagem transformadora que põe
em causa tudo o que gera injustiça, morte, opressão; por isso, é uma proposta
que é rejeitada e combatida por aqueles que dominam o mundo e que oprimem os
débeis e os pobres. Isto explica bem porque é que o testemunho sobre Jesus (se
é coerente e verdadeiro) não é um caminho fácil de glória, de aplausos, de
honras, de popularidade, mas um caminho de cruz. Não temos, portanto, que nos
admirar se a mensagem que propomos e o testemunho que damos não encontram eco
entre os que dominam o mundo; temos é de nos questionar e de nos inquietar se
não somos importunados por aqueles que oprimem e que escravizam os irmãos: isso
quererá dizer que o nosso testemunho não é coerente com a proposta de Jesus.
A liturgia de hoje tem duas
vertentes que devem ser consideradas: o Cordeiro Glorioso e Pedro, pastor e
porta-voz do rebanho. A origem destes temas parece diferente, mas sendo a
liturgia uma interpretação eclesial dos temas bíblicos, vale a pena interpretar
um tema pelo outro. Aparece, por conseguinte, que o Cordeiro do Apocalipse, ou
seja, da segunda leitura, deve ser visto como o Cordeiro que guia o Rebanho.
Não é um cordeirinho, mas um carneiro. Solidário com o rebanho, o conduz à
vitória. A este Cordeiro vencedor são dados os atributos de Deus: honra,
glória, poder e louvor.
Mas todos os fiéis poderiam me
perguntar: Por que Jesus é chamado o Cordeiro? A literatura do Apocalipse gosta
de indicar pessoas e potências por figuras de animais. Além disso, Jesus foi
logo considerado vítima expiatória e vitima pascal, como mostram o evangelho e
a primeira carta de João, oriundos do mesmo ambiente que o Apocalipse. Como
vítima expiatória, Jesus vence os poderes do pecado, representados, no
Apocalipse, por feras. Portanto, o Cordeiro é um vencedor, não pelas armas, mas
pela solidariedade com o rebanho, assumindo a morte por suas ovelhas.
Todos nós somos convidados a
acreditar e dar testemunho na ressurreição de Jesus. Não uma opção que seja
meramente com provas históricas. Mais do que isso a ressurreição só pode ser
entendida se vivenciada com absoluta convicção de que Jesus, o vencedor da
morte, ressuscitou verdadeiramente. Aleluia!
A ressurreição marca um novo
começo da presença histórica de Jesus no mundo. Mas em condições diferentes do
tempo de sua vida pública. Os Evangelhos e as Cartas chamam Jesus de “Senhor”. Diante
dele, fala Paulo que: “dobre-se todo joelho de quantos há no céu, na
terra e no inferno, e toda língua proclame que Jesus Cristo é o Senhor!” (cf Fl
2,10-11).
A partir da ressurreição os
discípulos passam a se considerarem “servos do Senhor Jesus”. Assim
foi Tiago, foi Pedro, foi Paulo e continua sendo os sucessores de Pedro na Sua
Cátedra. Assim tem sido o novo Papa Francisco, como foi o peregrino Bento XVI,
que lutando contra toda a esperança humana continua servo do Senhor
Ressuscitado.
Mas, realmente, o Evangelho de
hoje é esplendoroso em significados. Ali estava à beira do Mar Tiberíades um
pequeno grupo de discípulos de Jesus. Todos estavam desanimados e se colocaram
a pescar. Não estavam preocupados com o anúncio da ressurreição de Jesus e com
as coisas de Jesus. Para eles o importante era pescar e pensar em si mesmos.
Uma atitude bem humana. De Pedro foi à iniciativa para a Pesca: Vou pescar.
Mas, infelizmente, nada pegaram com suas redes.
A pesca de que fala o Evangelho é
muito superior: vamos pescar homens e mulheres para o Reino de Deus. Pescar é o
iniciar a missão e a atividade apostólica que foi legada por Jesus a seus
discípulos.
O fracasso da pesca de Pedro e
dos companheiros, embora excelentes conhecedores do mar e dos peixes, não é
apenas a conclusão de uma pesca sem êxito, mas a tradução concreta do que Jesus
dissera na Última Ceia: “Sem mim nada podeis” (Jo. 15,5).
Ressurreição, tempo novo de Deus
para a humanidade e, particularmente, para a comunidade que acreditou que Jesus
verdadeiramente ressuscitou para lavar nossos pecados. Com Cristo, por Cristo e
em Cristo Jesus nos ensina o caminho a ser trilhado para dilatar o Reino de
Deus e para sermos fiel ao mandato e a missão de evangelizadores que todos,
batizados, indistintamente, são convidados a se empenharem.
No Evangelho deste domingo (cf. Jo 21,1-19 ou 1-14) apresenta a
aparição do ressuscitado e a vocação de Pedro a guiar o rebanho que lhe confiado
pelo Senhor. A Mãe Igreja aparece como barco de Pedro e como pesca milagrosa (cf.
Jo 21,1-14), mas somente pela palavra do Senhor Ressuscitado! Em Jo 21,15-19,
utilizando a imagem do rebanho São Pedro é instituído Pastor do Rebanho que é o
de Cristo. Pedro, e não o discípulo amigo por excelência. Por três vezes –
quantas vezes o negou – Pedro tem que confirmar sua afeição ao Senhor, porque a
vocação é sempre graça de Deus, de quem chama para o serviço generoso do
seguimento de Cristo.
Jesus acentua na sua conversa com
Pedro a dimensão do Seu Seguimento. O discípulo não irá à frente do Mestre. Não
é próprio do discípulo inventar novidades. Ao discípulo verdadeiro cabe ir
atrás do Mestre, pondo os pés nas marcas de seus pés. De tal maneira que, quem
vir as pegadas, veja só as de Cristo, que são também nossas, ou as nossas que
se identificam com as de Cristo.
Não quero realizar os meus
desejos. Tenho que realizar a vontade que Cristo tem para a minha vida. E todos
os desejos de Cristo, expressos em seus ensinamentos e em sua vida, trazem
sempre um gosto pascal de morte/ressurreição. Assim o desapego. Assim o amor
gratuito. Assim o acolhimento, o serviço, a compreensão, o perdão, a
misericórdia, a acolhida, a vida de comunidade, o cotidiano de nossa vida que
sempre deve ser Páscoa e santidade de vida e de estado.
A praia, cenário onde Jesus dá de
comer pão e peixe, nos relembra a instituição da Eucaristia, a abundância das
graças que os discípulos passam a ser dispensadores. Assim, as celebrações
eucarísticas são força de unidade e refazimento do mistério da Encarnação e da
Redenção de Jesus. Até hoje, como agora, a comunidade reúne-se e cresce em
torno da refeição eucarística. É nela que “anunciamos sua morte e
proclamamos a sua ressurreição!” É na Eucaristia que conseguimos o
destino eterno.
A mensagem fundamental que brota
do Evangelho de hoje nos convida a constatar a centralidade de Cristo, vivo e
ressuscitado, na missão que nos foi confiada. Podemos esforçar-nos imenso e
dedicar todas as horas do dia ao esforço de mudar o mundo; mas se Cristo não
estiver presente, se não escutarmos a sua voz, se não ouvirmos as suas
propostas, se não estivermos atentos à Palavra que Ele continuamente nos
dirige, os nossos esforços não farão qualquer sentido e não terão qualquer
êxito duradouro. É preciso ter a consciência nítida de que o êxito da missão
cristã não depende do esforço humano, mas da presença viva do Senhor Jesus.
A Segunda Leitura (cf. Ap. 5,11-14) nos ensina que devemos honrar e
dar a glória, o louvor e o poder ao Cordeiro de Deus. Como por uma porta, o
visionário entrevê os mistérios de Deus: o Cordeiro imolado recebe os atributos
do poder decisivo e escatológico. As criaturas que o adoram estão na luz de sua
glória: esta é a sua salvação.
A mensagem final do Livro do
Apocalipse pode resumir-se na frase: “não tenhais medo, pois a vossa libertação
está a chegar”. É uma mensagem “eterna”, que revigora a nossa fé, que renova a
nossa esperança e que fortalece a nossa capacidade de enfrentar a injustiça, o
egoísmo, o sofrimento e o pecado. Diante deste “cordeiro” vencedor, que nos
trouxe a libertação, os cristãos veem renovada a sua confiança nesse Deus
salvador e libertador em quem acreditam.
Jesus Cristo é o Senhor. Esse é o
resumo de nossa fé no Filho de Deus, que morreu e ressuscitou para reinar, para
ser a cabeça de todos os poderes, para mandar ou permitir o que quiser. Os
cristãos fazem esta profissão de fé: “Creio num só Senhor, Jesus
Cristo!”.
Na história da Igreja, Pedro
aparece como líder e porta-voz. É ele que, diante do Sinédrio, em nome dos
outros apóstolos, dirige ao sumo sacerdote a atrevida palavra, que parece ter
sido um slogan dos primeiros cristãos: “É preciso obedecer antes a
Deus do que aos homens” (Cf At 5,29), e pronuncia mais um
testemunho da ressurreição de Cristo, que os chefes judeus mataram, conforme
nos ensinou a primeira leitura.
Como o Cordeiro, por
solidariedade e amor, deu a sua vida em prol do rebanho, assim também o Pastor
que recebe seu encargo por seu amor não deixará de dar a sua vida em prol de
seu rebanho.
Peçamos, pois, com fé, que possamos viver como cristãos a palavra do Redentor e Salvador. Esta palavra é instancia suprema de nossas vidas. O Senhor ressurgiu e continua a ressuscitar ainda hoje. Ele ressuscita de modo especial na Missa. A verdade central da ressurreição de Cristo aí é comemorada e se torna realidade. Vivamos, pois, com fé, esta realidade e peçamos ao Senhor que nos mantenha sempre firmes em seu seguimento. Aleluia!
https://catequizar.com.br/liturgia/homilia-do-3o-domingo-da-pascoa/
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