O voto é soberano!
O resultado das eleições é uma das principais
manifestações da soberania popular. É um evento único na democracia, em que o
poder do povo transparece no resultado de uma disputa eleitoral para a escolha
dos próximos governantes. É essa soberania que os legitima a tomarem a frente
do povo, representando-o.
O exercício do poder é legitimado pela
escolha popular, portanto o governante regularmente eleito nas urnas estará
apto a exercer o mandato eletivo. Tornar-se legítimo, pela literalidade da
palavra, é o mesmo que tornar-se legal, válido, puro, perfeito ou regular.
“Assim, a soberania popular se revela no poder incontrastável de decidir. É ela
que confere legitimidade ao exercício do poder estatal. Tal legitimidade só é
alcançada pelo consenso expresso na escolha feita nas urnas.”2 Logo,
permite-se, por meio da soberania popular, que os mandatos eletivos sejam
exercidos de maneira legal, em conformidade com a lei, pelo simples fato de
terem sido regularmente preenchidos por pessoas escolhidas pelo povo.
Porém, essa não é uma escolha tão
simples, visto que se trata de uma manifestação política, de tal forma que
apenas as pessoas em regularidade com seus direitos políticos poderão votar. Em
virtude disso, não poderão participar desse processo de escolha quem sofrer a
perda ou a suspensão de seus direitos políticos, o que, de acordo com o art. 15
da Constituição Federal, somente ocorrerá nas hipóteses de: cancelamento da
naturalização por sentença transitada em julgado; incapacidade civil absoluta;
condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;
recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa; e
improbidade administrativa.
Dessa forma, no pleito eleitoral,
reúnem-se pessoas com direitos políticos no intuito de eleger seus governantes,
utilizando-se, para tal empreitada, da soberania popular.
A soberania popular vem preconizada,
de plano, no primeiro artigo da Constituição Federal, segundo o qual:
Todo o poder emana do povo, que o
exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição.
No art. 14 da CF/88, podemos
encontrar a forma como se exerce essa soberania:
A soberania popular será exercida pelo
sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos
[...].
Diante dos artigos mencionados,
pode-se observar que não há outro poder acima do poder do povo (soberania
popular) e que esse poder é repartido de forma igual (princípio da igualdade)
entre todos os cidadãos.
Por soberania entende-se:
[...] o poder supremo, ou o poder que
se sobrepõe ou está acima de qualquer outro, não admitindo limitações, exceto
quando dispostas voluntariamente por ele, em firmando tratados internacionais,
ou em dispondo regras e princípios de ordem constitucional.3
O poder do povo é soberano, conforme
determina o próprio texto constitucional, o que lhe confere a característica de
se sobrepor a qualquer outro que venha a surgir, cabendo apenas limitações
criadas pelo próprio poder popular.
O poder é de titularidade do povo, que
é composto por milhões de pessoas. Assim, a única forma justa de distribuí-lo é
colocá-lo em iguais medidas nas mãos de cada cidadão, primando pelo princípio
da igualdade. Portanto, cada cidadão carrega consigo uma parcela do poder
soberano, que, sozinha, não representa mais que um contra milhões, mas que,
juntas, representam o mais elevado poder existente em nosso ordenamento
jurídico: a soberania popular. José Afonso da Silva, fazendo referência aos
ensinamentos de eminente filósofo, afirma:
Aristóteles já dizia que a democracia
é o governo onde domina o número, isto é, a maioria, mas também disse que a
alma da democracia consiste na liberdade, sendo todos iguais. A igualdade, diz,
é o primeiro atributo que os democratas põem como fundamento e fim da democracia.
E assim ele acaba concluindo que toda democracia se funda no direito de
igualdade, e tanto mais pronunciada quanto mais se avança na igualdade.4
Nesse contexto, a igualdade é um dos
alicerces fundamentais da soberania popular, não podendo, sequer, cogitar a
existência de apenas um cidadão com mais poderes políticos que outro. Para cada
homem, um voto.
Portanto, nas eleições, os cidadãos
juntos (detentores de parcela do poder soberano), decidem, em condições de
igualdade, o futuro político do país, elegendo os candidatos que acharem mais
aptos ao exercício do mandato. O povo é governado, então, por um representante
democraticamente indicado nas urnas, que, a partir daí, conduzirá o país
pautado pela vontade do povo.
Em função disso, não importa quão apertada
seja uma disputa eleitoral, o resultado das eleições sempre refletirá a vontade
do povo, e o candidato eleito sempre deverá governar para todos, em vez de
governar apenas para seus eleitores. Em outras palavras, a condução de nosso
país não pode ser feita de costas para o povo ou para parte dele. Assim quis a
Constituição Federal quando atribuiu o poder soberano à população. O
acirramento do resultado das eleições não deslegitima o governo eleito, logo,
ainda que por pequena diferença de votos, o candidato eleito estará
perfeitamente legitimado para o exercício do cargo eletivo. Consequentemente, o
resultado das eleições revela a vontade de todos, a vontade do povo.
É natural que a parcela da população
que atribuiu seu voto ao candidato perdedor sinta algum tipo de incômodo pela
chegada ao poder do candidato adversário. Entretanto, esse é um peso que o
cidadão tem de carregar para que a vida democrática em um país civilizado seja
viável; caso contrário, teríamos governos autoritários, o que, de fato, agradaria
menos que a aceitação da derrota de um candidato nas urnas.
1 Bacharel em
Direito, servidor do Tribunal Superior Eleitoral lotado na Escola Judiciária
Eleitoral.
2 GOMES, José
Jairo. Direito
Eleitoral. 7. ed. São Paulo: Atlas Jurídico, 2011, p. 38.
3 SILVA, De
Plácido e. Vocabulário
Jurídico. Atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 27. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2007, p. 1.308.
4 SILVA, José
Afonso. Curso
de Direito Constitucional Positivo. 27. ed. São Paulo: Malheiros Editores,
2006, p. 129.
https://www.tse.jus.br/o-tse/escola-judiciaria-eleitoral/publicacoes/revistas-da-eje/artigos/revista-eletronica-eje-n.-1-ano-5/ilegitimidade-do-comite-financeiro-para-interpor-recurso-eleitoral
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